Um passeio pela cultura sneakerhead no Brasil e no mundo

Vert mostra no Acre como está revolucionando a produção de tênis


Fui ao Acre, na reserva Chico Mendes, ver como a Vert, por meio do comércio justo, está mudando a vida das famílias extrativistas das seringueiras e a forma como fabricar tênis

Por Diego Ortiz
Atualização:
Vert Dekkan na floresta nativa Foto: Talys Kasper/Estadão

O calor estava grande naquele 25 de abril, quando recebi o convite da Vert para conhecer o ciclo da borracha no Acre, de onde vem grande parte da matéria prima usada pela marca em seus tênis. Dei três olhadas para o ventilador, quase como um prenúncio do suadouro que seria dentro da floresta, respondi sim, claro, e segui ansioso até o dia 2 de agosto, data do embarque só com uma mala de mão. Congonhas para Brasília. Brasília para Rio Branco. Durmo em Rio Branco. 6 da manhã acordo, três horas de van Acre adentro só com uma mochila nas mãos para quatro dias, saio da estrada e mais meia hora de van por dentro da floresta a 20 km/h. Desço da van, vou de uma margem do rio para a outra de barco, subo uma rampa de uns 50 metros de areia e chego no centro nervoso da estrutura do extrativismo das seringueiras, um galpão recém reformado onde acontece as reuniões das famílias com as cooperativas, as festas e único local com internet da região. Cansado? Sim. Feliz? Muito. Tudo isso para uma constatação definitiva. Por tudo que a marca faz e pela revolução que acontece lá, se Chico Mendes estivesse vivo, hoje ele calçaria Vert.

A diferença da Veja, Vert no Brasil, para a maioria das marcas de tênis do mercado já nasceu na essência. François-Ghislain Morillion e Sébastien Kopp, fundadores da empresa, depois de prestar consultoria para uma série de empresas, atravessaram o mundo e estudaram 56 projetos diferentes pela ótica da governança corporativa francesa, especialidade dos dois, para elaborar um projeto de fair trade, ou comércio justo. Em 2003, fizeram uma viagem de um ano por Brasil, China e Índia, até que se depararam com a francesa Alter Eco que vendia pupunha brasileiro no mundo como fair trade. “Foi ali que bateu”, conta Morillion, que descreve ainda que escolheu os tênis ao ver os modelos da Rainha, que eram usados por pessoas em São Paulo e no Acre, com uma construção básica e minimalista. “Um produto democrático e amplo poderia mudar o panorama de verdade, tanto do ponto de vista do consumo, quanto das famílias que produzem os insumos para produção. Então também pensamos: o que mais compramos na viagem? Tênis. Então vamos de tênis”, afirma Morillion.

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Látex sendo tirado da seringueira nativa Foto: Talys Kasper/Estadão

Desta forma começa a produção dos tênis da Veja no Brasil, usando matéria-prima brasileira desde sempre. Por problemas de registro, a Veja teve que se chamar Vert no Brasil (que é veja em francês), mas isso já muda no ano que vem, quando será Veja globalmente. Mas, independentemente do nome, o que chama atenção para a Vert é que na guerra ideológica entre capitalismo e socialismo, a marca escolheu a virtude do caminho do meio. Vende os tênis com alto valor agregado e ticket médio graúdo para quem pode pagar e bonifica as famílias produtoras de borracha, por exemplo, bem acima da média do mercado.

François-Ghislain Morillion, fundador da Vert, explicando a proposta de valor da marca Foto: Talys Kasper/Estadão
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O mercado paga atualmente R$ 3 o quilo do CVP, o cernambi virgem prensado de borracha. A Vert paga a mais R$ 0,50 por qualidade e R$ 10,50 pelo adicional de pagamento por serviços socioambientais, o que dá um valor de R$ 14 o quilo. Este adicional é pago para as famílias que não desmatarem suas terras além do permitido por lei para abrir caminho para o gado ou soja. Tal iniciativa, além de garantir a produção do látex vindo de seringueiras nativas, ainda ajuda a minimizar o desmatamento. Mas isso tem um custo corporativo. Para a Vert conseguir pagar quatro vezes mais às famílias, a marca teve que abrir mão do marketing, que consome boa parte da verba da outras multinacionais de sneakers. A Vert não investe em anúncios, ações comerciais e trabalha sempre com estoque zero para evitar ao máximo estes custos que inviabilizariam a base de fair trade da empresa.

Prensa manual e cernambi virgem prensado Foto: Talys Kasper/Estadão

Mas foi com esta demanda orgânica e oferta botânica que a Vert passou de 5 mil pares anuais para 4 milhões, todos produzidos com borracha do Acre (70%), Amazonas, Rondônia e Mato Grosso. E é legal ver nos discursos das famílias extrativistas o sentimento de pertencimento a uma iniciativa que resguarda a floresta, resgata dignidade e que vai parar nos pés de pessoas do mundo todo. “É muito bonito ver esta aliança dos povos da floresta com o mesmo objetivo, tentando preservar o nosso futuro e tirando o leite da seringueira que vai parar nos tênis de gente de tanto lugar”, exalta Leide Aquino, liderança feminina da comunidade. Morillion completa: “Quando chegamos ao Brasil vimos que a ecologia não é só uma iniciativa, é um movimento social, uma luta pelos direitos dos povos originários e tradicionais do campo”.

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Residência de uma das famílias extrativistas Foto: Talys Kasper/Estadão

Crescendo com propriedade

Além da unificação dos nomes, que ocorre no ano que vem, a Veja também vai abrir sua primeira loja própria no País, em São Paulo, em 2024. Atualmente a marca só vende seus modelos em parceiros, inclusive alguns focados exclusivamente na cena sneakerhead, como a Your ID. Hoje, a Veja tem lojas apenas em Paris, a primeira de todas, Bordeaux, Nova Iorque, Berlim e Madri. Mas, além da do Brasil, os planos contemplam mais outras cinco lojas nos próximos três anos.

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Com isso, a produção brasileira também deve ser ampliada, dos cerca de 4 mil funcionários (500 diretos pela Veja), e a compra de matéria-prima também. A marca já ruma em conversas para o Peru no intuito de negociar borracha das seringueiras nativas de lá. Mas como as famílias peruanas não têm o hábito de se unir em cooperativas, a negociação com cada família extrativista tende a ser mais complicada. “Não abrimos mão dos nossos conceitos. Preferimos produzir e vender menos do que a demanda exige e seguir nosso caminho, a Veja foi criada assim e permanecerá assim”, finaliza Morillion.

Vert Dekkan na floresta nativa Foto: Talys Kasper/Estadão

O calor estava grande naquele 25 de abril, quando recebi o convite da Vert para conhecer o ciclo da borracha no Acre, de onde vem grande parte da matéria prima usada pela marca em seus tênis. Dei três olhadas para o ventilador, quase como um prenúncio do suadouro que seria dentro da floresta, respondi sim, claro, e segui ansioso até o dia 2 de agosto, data do embarque só com uma mala de mão. Congonhas para Brasília. Brasília para Rio Branco. Durmo em Rio Branco. 6 da manhã acordo, três horas de van Acre adentro só com uma mochila nas mãos para quatro dias, saio da estrada e mais meia hora de van por dentro da floresta a 20 km/h. Desço da van, vou de uma margem do rio para a outra de barco, subo uma rampa de uns 50 metros de areia e chego no centro nervoso da estrutura do extrativismo das seringueiras, um galpão recém reformado onde acontece as reuniões das famílias com as cooperativas, as festas e único local com internet da região. Cansado? Sim. Feliz? Muito. Tudo isso para uma constatação definitiva. Por tudo que a marca faz e pela revolução que acontece lá, se Chico Mendes estivesse vivo, hoje ele calçaria Vert.

A diferença da Veja, Vert no Brasil, para a maioria das marcas de tênis do mercado já nasceu na essência. François-Ghislain Morillion e Sébastien Kopp, fundadores da empresa, depois de prestar consultoria para uma série de empresas, atravessaram o mundo e estudaram 56 projetos diferentes pela ótica da governança corporativa francesa, especialidade dos dois, para elaborar um projeto de fair trade, ou comércio justo. Em 2003, fizeram uma viagem de um ano por Brasil, China e Índia, até que se depararam com a francesa Alter Eco que vendia pupunha brasileiro no mundo como fair trade. “Foi ali que bateu”, conta Morillion, que descreve ainda que escolheu os tênis ao ver os modelos da Rainha, que eram usados por pessoas em São Paulo e no Acre, com uma construção básica e minimalista. “Um produto democrático e amplo poderia mudar o panorama de verdade, tanto do ponto de vista do consumo, quanto das famílias que produzem os insumos para produção. Então também pensamos: o que mais compramos na viagem? Tênis. Então vamos de tênis”, afirma Morillion.

Látex sendo tirado da seringueira nativa Foto: Talys Kasper/Estadão

Desta forma começa a produção dos tênis da Veja no Brasil, usando matéria-prima brasileira desde sempre. Por problemas de registro, a Veja teve que se chamar Vert no Brasil (que é veja em francês), mas isso já muda no ano que vem, quando será Veja globalmente. Mas, independentemente do nome, o que chama atenção para a Vert é que na guerra ideológica entre capitalismo e socialismo, a marca escolheu a virtude do caminho do meio. Vende os tênis com alto valor agregado e ticket médio graúdo para quem pode pagar e bonifica as famílias produtoras de borracha, por exemplo, bem acima da média do mercado.

François-Ghislain Morillion, fundador da Vert, explicando a proposta de valor da marca Foto: Talys Kasper/Estadão

O mercado paga atualmente R$ 3 o quilo do CVP, o cernambi virgem prensado de borracha. A Vert paga a mais R$ 0,50 por qualidade e R$ 10,50 pelo adicional de pagamento por serviços socioambientais, o que dá um valor de R$ 14 o quilo. Este adicional é pago para as famílias que não desmatarem suas terras além do permitido por lei para abrir caminho para o gado ou soja. Tal iniciativa, além de garantir a produção do látex vindo de seringueiras nativas, ainda ajuda a minimizar o desmatamento. Mas isso tem um custo corporativo. Para a Vert conseguir pagar quatro vezes mais às famílias, a marca teve que abrir mão do marketing, que consome boa parte da verba da outras multinacionais de sneakers. A Vert não investe em anúncios, ações comerciais e trabalha sempre com estoque zero para evitar ao máximo estes custos que inviabilizariam a base de fair trade da empresa.

Prensa manual e cernambi virgem prensado Foto: Talys Kasper/Estadão

Mas foi com esta demanda orgânica e oferta botânica que a Vert passou de 5 mil pares anuais para 4 milhões, todos produzidos com borracha do Acre (70%), Amazonas, Rondônia e Mato Grosso. E é legal ver nos discursos das famílias extrativistas o sentimento de pertencimento a uma iniciativa que resguarda a floresta, resgata dignidade e que vai parar nos pés de pessoas do mundo todo. “É muito bonito ver esta aliança dos povos da floresta com o mesmo objetivo, tentando preservar o nosso futuro e tirando o leite da seringueira que vai parar nos tênis de gente de tanto lugar”, exalta Leide Aquino, liderança feminina da comunidade. Morillion completa: “Quando chegamos ao Brasil vimos que a ecologia não é só uma iniciativa, é um movimento social, uma luta pelos direitos dos povos originários e tradicionais do campo”.

Residência de uma das famílias extrativistas Foto: Talys Kasper/Estadão

Crescendo com propriedade

Além da unificação dos nomes, que ocorre no ano que vem, a Veja também vai abrir sua primeira loja própria no País, em São Paulo, em 2024. Atualmente a marca só vende seus modelos em parceiros, inclusive alguns focados exclusivamente na cena sneakerhead, como a Your ID. Hoje, a Veja tem lojas apenas em Paris, a primeira de todas, Bordeaux, Nova Iorque, Berlim e Madri. Mas, além da do Brasil, os planos contemplam mais outras cinco lojas nos próximos três anos.

Com isso, a produção brasileira também deve ser ampliada, dos cerca de 4 mil funcionários (500 diretos pela Veja), e a compra de matéria-prima também. A marca já ruma em conversas para o Peru no intuito de negociar borracha das seringueiras nativas de lá. Mas como as famílias peruanas não têm o hábito de se unir em cooperativas, a negociação com cada família extrativista tende a ser mais complicada. “Não abrimos mão dos nossos conceitos. Preferimos produzir e vender menos do que a demanda exige e seguir nosso caminho, a Veja foi criada assim e permanecerá assim”, finaliza Morillion.

Vert Dekkan na floresta nativa Foto: Talys Kasper/Estadão

O calor estava grande naquele 25 de abril, quando recebi o convite da Vert para conhecer o ciclo da borracha no Acre, de onde vem grande parte da matéria prima usada pela marca em seus tênis. Dei três olhadas para o ventilador, quase como um prenúncio do suadouro que seria dentro da floresta, respondi sim, claro, e segui ansioso até o dia 2 de agosto, data do embarque só com uma mala de mão. Congonhas para Brasília. Brasília para Rio Branco. Durmo em Rio Branco. 6 da manhã acordo, três horas de van Acre adentro só com uma mochila nas mãos para quatro dias, saio da estrada e mais meia hora de van por dentro da floresta a 20 km/h. Desço da van, vou de uma margem do rio para a outra de barco, subo uma rampa de uns 50 metros de areia e chego no centro nervoso da estrutura do extrativismo das seringueiras, um galpão recém reformado onde acontece as reuniões das famílias com as cooperativas, as festas e único local com internet da região. Cansado? Sim. Feliz? Muito. Tudo isso para uma constatação definitiva. Por tudo que a marca faz e pela revolução que acontece lá, se Chico Mendes estivesse vivo, hoje ele calçaria Vert.

A diferença da Veja, Vert no Brasil, para a maioria das marcas de tênis do mercado já nasceu na essência. François-Ghislain Morillion e Sébastien Kopp, fundadores da empresa, depois de prestar consultoria para uma série de empresas, atravessaram o mundo e estudaram 56 projetos diferentes pela ótica da governança corporativa francesa, especialidade dos dois, para elaborar um projeto de fair trade, ou comércio justo. Em 2003, fizeram uma viagem de um ano por Brasil, China e Índia, até que se depararam com a francesa Alter Eco que vendia pupunha brasileiro no mundo como fair trade. “Foi ali que bateu”, conta Morillion, que descreve ainda que escolheu os tênis ao ver os modelos da Rainha, que eram usados por pessoas em São Paulo e no Acre, com uma construção básica e minimalista. “Um produto democrático e amplo poderia mudar o panorama de verdade, tanto do ponto de vista do consumo, quanto das famílias que produzem os insumos para produção. Então também pensamos: o que mais compramos na viagem? Tênis. Então vamos de tênis”, afirma Morillion.

Látex sendo tirado da seringueira nativa Foto: Talys Kasper/Estadão

Desta forma começa a produção dos tênis da Veja no Brasil, usando matéria-prima brasileira desde sempre. Por problemas de registro, a Veja teve que se chamar Vert no Brasil (que é veja em francês), mas isso já muda no ano que vem, quando será Veja globalmente. Mas, independentemente do nome, o que chama atenção para a Vert é que na guerra ideológica entre capitalismo e socialismo, a marca escolheu a virtude do caminho do meio. Vende os tênis com alto valor agregado e ticket médio graúdo para quem pode pagar e bonifica as famílias produtoras de borracha, por exemplo, bem acima da média do mercado.

François-Ghislain Morillion, fundador da Vert, explicando a proposta de valor da marca Foto: Talys Kasper/Estadão

O mercado paga atualmente R$ 3 o quilo do CVP, o cernambi virgem prensado de borracha. A Vert paga a mais R$ 0,50 por qualidade e R$ 10,50 pelo adicional de pagamento por serviços socioambientais, o que dá um valor de R$ 14 o quilo. Este adicional é pago para as famílias que não desmatarem suas terras além do permitido por lei para abrir caminho para o gado ou soja. Tal iniciativa, além de garantir a produção do látex vindo de seringueiras nativas, ainda ajuda a minimizar o desmatamento. Mas isso tem um custo corporativo. Para a Vert conseguir pagar quatro vezes mais às famílias, a marca teve que abrir mão do marketing, que consome boa parte da verba da outras multinacionais de sneakers. A Vert não investe em anúncios, ações comerciais e trabalha sempre com estoque zero para evitar ao máximo estes custos que inviabilizariam a base de fair trade da empresa.

Prensa manual e cernambi virgem prensado Foto: Talys Kasper/Estadão

Mas foi com esta demanda orgânica e oferta botânica que a Vert passou de 5 mil pares anuais para 4 milhões, todos produzidos com borracha do Acre (70%), Amazonas, Rondônia e Mato Grosso. E é legal ver nos discursos das famílias extrativistas o sentimento de pertencimento a uma iniciativa que resguarda a floresta, resgata dignidade e que vai parar nos pés de pessoas do mundo todo. “É muito bonito ver esta aliança dos povos da floresta com o mesmo objetivo, tentando preservar o nosso futuro e tirando o leite da seringueira que vai parar nos tênis de gente de tanto lugar”, exalta Leide Aquino, liderança feminina da comunidade. Morillion completa: “Quando chegamos ao Brasil vimos que a ecologia não é só uma iniciativa, é um movimento social, uma luta pelos direitos dos povos originários e tradicionais do campo”.

Residência de uma das famílias extrativistas Foto: Talys Kasper/Estadão

Crescendo com propriedade

Além da unificação dos nomes, que ocorre no ano que vem, a Veja também vai abrir sua primeira loja própria no País, em São Paulo, em 2024. Atualmente a marca só vende seus modelos em parceiros, inclusive alguns focados exclusivamente na cena sneakerhead, como a Your ID. Hoje, a Veja tem lojas apenas em Paris, a primeira de todas, Bordeaux, Nova Iorque, Berlim e Madri. Mas, além da do Brasil, os planos contemplam mais outras cinco lojas nos próximos três anos.

Com isso, a produção brasileira também deve ser ampliada, dos cerca de 4 mil funcionários (500 diretos pela Veja), e a compra de matéria-prima também. A marca já ruma em conversas para o Peru no intuito de negociar borracha das seringueiras nativas de lá. Mas como as famílias peruanas não têm o hábito de se unir em cooperativas, a negociação com cada família extrativista tende a ser mais complicada. “Não abrimos mão dos nossos conceitos. Preferimos produzir e vender menos do que a demanda exige e seguir nosso caminho, a Veja foi criada assim e permanecerá assim”, finaliza Morillion.

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