A novela Vale Tudo, exibida originalmente entre 16 de maio de 1988 e 6 de janeiro de 1989, está de volta, disponível na plataforma Globoplay a partir desta segunda-feira, 20. A trama escrita por Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères trouxe o famoso "Quem matou Odete Roitman (Beatriz Segall)?" e também contava com destaque das personagens Raquel (Regina Duarte) e Maria de Fátima (Gloria Pires), Outros atores conhecidos estavam no elenco, como Renata Sorrah (Helena), Antonio Fagundes (Ivan), Lilia Cabral (Aldeíde), Marcos Palmeira (Mário Sérgio), Carlos Alberto Riccelli (César), Reginaldo Faria (Marco Aurélio) e Cassia Kis (Leila).
"A novela não é sobre trambiques, e sim sobre ética - se vale a pena ser honesto, se quem é honesto consegue vencer. Não quero fazer uma denúncia e sim divertir, mas toda história tem uma moral", explicava Gilberto Braga ao Estadão no mês de estreia de Vale Tudo. Parte da trama girava em torno da empresa fictícia TCA (Transcapital Aerolinhas). Segundo Braga, a ideia inicial era outra, mas foi mudada para a área de aviação por sugestão de Daniel Filho.
"Mudamos o negócio da família rica de indústria de guerra para uma grande empresa de aviação. Quando nós fomos pesquisar, vimos que essa história de indústria de armas é tão nojenta que não teríamos como conviver bem com os personagens", explicava.
Na sequência, prosseguia: "Mais da metade deles vive do trabalho na fábrica, e não seria possível mostrá-los como pessoas boas, há muita sujeira nessa história". Sobre idas e vindas de personagens em destaque na trama, justificava: "Em 180 capítulos de uma novela, gosto de trocar de protagonista de vez em quando, tento jogar com todo mundo, porque há personagens interessantes, tanta gente com histórias importantes..."
Quem matou Odete Roitman?
O mistério que 'parou o Brasil' foi reveleado apenas no último capítulo de Vale Tudo. Leila, vivida por Cassia Kis, foi a responsável pela morte da personagem mais lembrada da carreira de Beatriz Segall, atriz que morreu aos 92 anos, em setembro de 2018.
Em 12 de dezembro de 1988, quase um mês antes do fim da novela, foram distribuídas cerca de 50 cópias do roteiro do capítulo final para a equipe de produção, atores e diretores envolvidos na gravação. "No roteiro, há um buraco negro, com apenas uma indicação: 'cena de três a quatro minutos'. Essa cena revelará o nome do assassino ou o destino de Odete Roitman e será distribuída, gravada, sonorizada e editada no mesmo dia em que irá ao ar", relatava o Estadão à época. A gravação das oito cenas com a sequência que mostrava quem matou Odete Roitman foi gravada no próprio dia do último capítulo da novela ir ao ar, 6 de janeiro, uma sexta-feira, entre as 10h e as 14h30.
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À época, especulava-se que cinco versões haviam sido escritas, mas uma semana antes a final foi escolhida e guardada sob sigilo na sala do produtor Evaldo Lemos. Dennis Carvalho, diretor-geral de Vale Tudo, entrou na ilha de edição por volta das 15h para buscar a fita com o capítulo final da novela, que só saiu de suas mãos por volta das 20h30, minutos antes de a atração ser exibida. "Imagine se um ator fundamental quebrasse o pé ou se faltasse luz durante a edição. Não teríamos o capítulo! Mas valeu a pena", contava o diretor Ricardo Waddington após ter dado tudo certo.
Apesar de na época a produção de Vale Tudo e a Globo terem dado a entender que ninguém do elenco sabia quem, de fato, teria matado Odete Roitman até a reta final das gravações, a atriz Cassia Kis revelou que sabia que seria Leila cerca de três meses antes. "Eu tanto guardei segredo que passaram-se dois, três meses eu falei assim: 'Mas será que é a Leila mesmo que matou?'", contou, em entrevista à CBN em 2018. Leia mais sobre o fato aqui.
Estafa de Gloria Pires durante Vale Tudo
A atriz Gloria Pires chegou a ter problemas com estafapor conta de sua interpretação de Maria de Fátima. "É pesado. É difícil. Você fica colocando uma coisa ruim para fora o tempo inteiro, cultivando ódio e rancor das coisas, e eu não sou assim", contou ao Estadão, enquanto estava nas gravações de Vale Tudo.
Em seguida, continuava: "Eu procuro não trazer [a personagem da novela 'para casa'] e acho, inclusive, que esta minha estafa é também por causa disso, porque é uma briga constante." "Cada cena que faço, meu coração dispara. As coisas que ela diz, que ela faz. Ela é muito louca, na realidade. Aí eu chego em casa e não relaxo. Muitas vezes, de madrugada, sem sono, eu vou varrer a casa", explicava. Maria de Fátima aparecia em cenas de traição e aplicava o 'golpe do baú' ao longo da trama, o que fez com que, na época, surgissem relatos de que Gloria Pires precisaria de seguranças para andar pelas ruas e não ser hostilizada - o que era negado por ela.
Censura em Vale Tudo
Diversas cenas entre as personagens Laís (Cristina Prochaska) e Cecília (Lala Deheinzelin) sofreram com a censura federal à época e precisaram ser reescritas. As duas viviam um romance homossexual na trama.
"Na época, não houve preconceito. O tema era herança num casamento gay, inspirado no caso do Jorge Guinle Filho. As personagens foram muito bem aceitas", afirmou Gilberto Braga anos depois.
Oficialmente, a censura foi encerrada no Brasil após a promulgação da Constituição de 1988, fato ocorrido durante o período de exibição de Vale Tudo.
A Divisão de Censura Federal, órgão vinculado à Polícia Federal que censurava conteúdos artísticos, foi substituído pelo Departamento de Classificação Indicativa (leia mais aqui). Com isso, houve mudanças, como a expressão "proibido para..." sendo substituída por "não recomendado para...".