Artesãs entram na mira de clubes de futebol por uso irregular de marcas


Empresa que representa 13 equipes cobrava por acordos extrajudiciais sob ameaça de processos; sócios foram presos por suspeita de faturar R$ 4 milhões em extorsão, mas acusam de ‘frágil’ a ordem de prisão

Por Leonardo Catto

Empreendedores de produtos artesanais, decoração de festas temáticas e bolos de aniversário – a maioria mulheres – entraram na mira de clubes de futebol pelo uso não-licenciado de marcas. A busca e contato era feita por uma empresa cujos sócios foram presos, sob suspeita de extorsão nas negociações, além de lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Entre os clientes da NoFake está o Palmeiras. Segundo apurou o Estadão, o setor jurídico do clube analisa o contrato, firmado em maio. A empresa, que teve as atividades suspensas, lamenta o que chama de ação “fundamentada em provas frágeis”, enquanto representantes buscam a soltura dos sócios. Além da investigação da Polícia Civil de Minas Gerais, o Ministério Público mineiro endossou a prisão dos dois.

Decoração do Vitória desencadeou caso que repercutiu na comunidade online de confeiteiras. Foto: @arts_pedreiras via Instagram
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A paulista Adriana Carvalho trabalhava com produção de canecas, cadernos e camisetas há oito anos. Ela foi notificada pela NoFake por causa de um copo térmico que postou em uma página em que divulgava produtos. O copo tinha o escudo do Palmeiras.

Para não ser processada, Adriana fez um acordo, no qual pagou R$ 1,6 mil. Desde então, parou de produzir itens com escudos de clubes de futebol, o que se tornou um problema. “Os personalizados de times saem muito. Tem muitos pedidos, principalmente em datas comemorativas”, conta ao Estadão. Hoje, ela procura emprego para trabalhar com atendimento ao público.

“Infelizmente, por não poder mais fazer, acaba limitando meu trabalho. E, além dos gastos de casa, tive o acordo”, lamenta a empreendedora que tentou migrar seu negócio para Bíblias personalizadas, mas não conseguiu receita necessária para se manter.

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Casos semelhantes ao de Adriana se tornaram mais comuns entre as empreendedoras do ramo. “Não podemos mais fazer bolos com topos de time. Imagine se isso pega, e a gente não pode fazer mais bolo de princesa?”, questiona a influenciadora Danni Confeiteira, em um vídeo no qual ela comenta outro caso. Além do clube paulista, a NoFake também tem ou já teve parceria com ASA-AL, Avaí, América-MG, Atlético-MG, Atlético-GO, Botafogo, Cruzeiro, Joinville, Paysandu, Vasco e Vitória.

O Palmeiras afirmou ao Estadão que conta com uma área destinada ao combate à pirataria, da qual fazem parte empresas especializadas em identificar produtos e serviços comercializados sem a devida autorização do clube. O clube tem registro e proteção de marcas junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi).

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A reportagem apurou que duas artesãs pagaram ao Palmeiras para poder produzir copos térmicos com a marca palmeirense. Internamente, há o entendimento de que não cobrar, mesmo no caso de pequenos comerciantes, seria injusto com empresas licenciadas.

Decoração de clubes de futebol e até mesmo da CBF, em referência à seleção brasileira, tem grande demanda, segundo empreendedoras. Foto: @arts_pedreiras via Instagram

O primeiro caso de maior repercussão foi quando a NoFake e o Vitória notificaram a artesã Patrícia França por ela produzir uma decoração de festa de aniversário com o tema do clube. A página em que Patrícia divulgava seus trabalhos foi derrubada no Instagram.

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A situação ficou conhecida após uma live em que Patrícia participou. Outras artesãs e confeiteiras passaram a arquivar publicações em que divulgavam produtos e bolos com emblemas de times, com medo de que a situação se repetisse.

Na época, o Vitória disse que previa notificações para empresas, e não a pessoas físicas, mas observou a necessidade de um “novo alinhamento”. “As novas diretrizes estabeleceram que o foco será voltado para grandes empresas, e as pequenas, como o caso de Patrícia França, serão notificadas sem a cobrança inicial de multa”, publicou o clube.

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A aplicação de multa, contudo, seria apenas em caso de uma empresa continuar comercializando a marca sem autorização. Além disso, o time manifestou solidariedade à artesã e a convidou para participar de um vídeo de esclarecimento da situação.

A página de Patrícia já foi restabelecida. Nos produtos por ela divulgados mais recentemente, não constam mais fotos de decorações de times de futebol. Em fotos antigas, ainda há imagens de escudos esportivos.

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No site da NoFake, há uma seção que explica como entrar em contato caso tenha recebido uma notificação extrajudicial. A empresa afirma contar com um time de advogados para auxiliar nas tratativas.

Dupla é suspeita de faturar de R$ 4 milhões com extorsão a artesãs por uso de marcas de clubes

A operação Verita Visus, desencadeada pela Polícia Civil de Minas Gerais, prendeu os dois sócios da empresa NoFake. A ação aconteceu na segunda-feira, 30, na cidade de Santos Dumont, a cerca de 215 km de Belo Horizonte. Segundo a investigação, o faturamento ilegal dos dois chegou a R$ 4 milhões.

O homem, de 30 anos, e a mulher, de 26, detidos na operação atuam com o serviço de proteção a marcas, buscando compensações e acordos com quem comercializa produtos sem licenciamento.

Conforme divulgou a Polícia Civil, a empresa atuava com busca em redes sociais por perfis que vendiam produtos com marca dos clientes, mas sem licença. A NoFake, então, simulava interesse em uma compra, para conseguir mais informações dos vendedores.

Operação da Polícia Civil apreendeu computadores, celulares, notebooks, livros de registro, equipamento de informática e um veículo de luxo. Foto: Polícia Civil-MG/Divulgação

Depois, outro setor fazia contato, sob a ameaça de registrar ocorrência. Para evitar um processo por violação de direitos intelectuais, era exigido o pagamento de um acordo extrajudicial. Também eram apontados como possíveis medidas a retirada de páginas online, como aconteceu com Patrícia, e denúncia ao Procon.

A polícia apontou que os valores tratados eram estabelecidos conforme o número de seguidores nas redes sociais dos vendedores. Era usado o argumento de que o acordo seria mais barato do que uma possível ação judicial proposta contra o vendedor.

Quando o acordo não era cumprido, a empresa denunciava o perfil da rede social utilizada e o derrubava do ar. Conforme o delegado responsável pelo caso, Daniel Gomes de Oliveira, essas negociações não seriam suficientes para livrar a responsabilidade criminal dos vendedores pelo uso irregular de marcas, caso fosse comprovada a prática criminosa. Isso porque o pagamento era apontado para cobrir “custos operacionais” e não como compensação por danos morais e materiais às marcas.

A investigação da Polícia de Minas começou a partir do registro de diferentes locais do Brasil. As ocorrências tinham em comum o modo de operação da NoFake, o qual foi considerado como extorsão pela autoridade policial.

A mulher foi presa na sede da empresa em Santos Dumont. Há, ainda, outros dois escritórios, em Brasília e em São Paulo, segundo o site da NoFake. A prisão do homem foi na residência dele, também na cidade mineira.

Os dois sócios tiveram bloqueio de contas bancárias, assim como a própria empresa. As atividades da empresa estão suspensas. Foram apreendidos computadores, celulares, notebooks, livros de registro, equipamento de informática e um veículo de luxo.

Em nota, a NoFake lamentou a suspensão das atividades e afirmou que a decisão judicial “desconsidera o modelo de negócio da empresa e ignora as licenças oficiais concedidas por todos os seus clientes que a credenciam para o exercício legitimo de combate aos ilícitos desta natureza”.

“Ao longo de sua trajetória, a NoFake desenvolveu uma metodologia eficaz e especializada no combate à pirataria, conquistando a confiança de seus clientes e parceiros de negócios”, continua o texto.

Conforme representantes legais da NoFake, foram tomadas medidas para tentar reverter as prisões, o que ainda não surtiu efeito.

Clubes podem adotar ‘postura mais simpática’, avalia especialista

A lei de propriedade intelectual não faz distinção entre o porte do chamado ofensor (quem utiliza a marca de forma irregular). “Um pequeno empreendedor que utiliza uma marca de clube sem autorização está infringindo a lei, assim como um grande CNPJ. O valor do licenciamento é determinado exclusivamente pelo titular do direito, e não há caminho legal para que pequenos empreendedores obtenham licenças a preços mais baixos simplesmente por seu tamanho”, explica Luciano Andrade Pinheiro, mestre em propriedade intelectual e sócio do Corrêa da Veiga Advogados.

“No entanto, os clubes poderiam adotar uma postura mais simpática e acessível, criando linhas de licenciamento mais econômicas para pequenos empreendedores. Isso seria uma medida mais eficaz para a proteção de sua propriedade intelectual e, ao mesmo tempo, ajudaria a evitar uma percepção negativa por parte do público”, completa Pinheiro.

Ainda conforme Pinheiro, a prática de clubes e empresas pode ser contraproducente, mesmo dentro do direito. Ele sugere recalcular a estratégia para manter o equilíbrio entre a proteção da marca e a empatia social.

Empreendedores de produtos artesanais, decoração de festas temáticas e bolos de aniversário – a maioria mulheres – entraram na mira de clubes de futebol pelo uso não-licenciado de marcas. A busca e contato era feita por uma empresa cujos sócios foram presos, sob suspeita de extorsão nas negociações, além de lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Entre os clientes da NoFake está o Palmeiras. Segundo apurou o Estadão, o setor jurídico do clube analisa o contrato, firmado em maio. A empresa, que teve as atividades suspensas, lamenta o que chama de ação “fundamentada em provas frágeis”, enquanto representantes buscam a soltura dos sócios. Além da investigação da Polícia Civil de Minas Gerais, o Ministério Público mineiro endossou a prisão dos dois.

Decoração do Vitória desencadeou caso que repercutiu na comunidade online de confeiteiras. Foto: @arts_pedreiras via Instagram

A paulista Adriana Carvalho trabalhava com produção de canecas, cadernos e camisetas há oito anos. Ela foi notificada pela NoFake por causa de um copo térmico que postou em uma página em que divulgava produtos. O copo tinha o escudo do Palmeiras.

Para não ser processada, Adriana fez um acordo, no qual pagou R$ 1,6 mil. Desde então, parou de produzir itens com escudos de clubes de futebol, o que se tornou um problema. “Os personalizados de times saem muito. Tem muitos pedidos, principalmente em datas comemorativas”, conta ao Estadão. Hoje, ela procura emprego para trabalhar com atendimento ao público.

“Infelizmente, por não poder mais fazer, acaba limitando meu trabalho. E, além dos gastos de casa, tive o acordo”, lamenta a empreendedora que tentou migrar seu negócio para Bíblias personalizadas, mas não conseguiu receita necessária para se manter.

Casos semelhantes ao de Adriana se tornaram mais comuns entre as empreendedoras do ramo. “Não podemos mais fazer bolos com topos de time. Imagine se isso pega, e a gente não pode fazer mais bolo de princesa?”, questiona a influenciadora Danni Confeiteira, em um vídeo no qual ela comenta outro caso. Além do clube paulista, a NoFake também tem ou já teve parceria com ASA-AL, Avaí, América-MG, Atlético-MG, Atlético-GO, Botafogo, Cruzeiro, Joinville, Paysandu, Vasco e Vitória.

O Palmeiras afirmou ao Estadão que conta com uma área destinada ao combate à pirataria, da qual fazem parte empresas especializadas em identificar produtos e serviços comercializados sem a devida autorização do clube. O clube tem registro e proteção de marcas junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi).

A reportagem apurou que duas artesãs pagaram ao Palmeiras para poder produzir copos térmicos com a marca palmeirense. Internamente, há o entendimento de que não cobrar, mesmo no caso de pequenos comerciantes, seria injusto com empresas licenciadas.

Decoração de clubes de futebol e até mesmo da CBF, em referência à seleção brasileira, tem grande demanda, segundo empreendedoras. Foto: @arts_pedreiras via Instagram

O primeiro caso de maior repercussão foi quando a NoFake e o Vitória notificaram a artesã Patrícia França por ela produzir uma decoração de festa de aniversário com o tema do clube. A página em que Patrícia divulgava seus trabalhos foi derrubada no Instagram.

A situação ficou conhecida após uma live em que Patrícia participou. Outras artesãs e confeiteiras passaram a arquivar publicações em que divulgavam produtos e bolos com emblemas de times, com medo de que a situação se repetisse.

Na época, o Vitória disse que previa notificações para empresas, e não a pessoas físicas, mas observou a necessidade de um “novo alinhamento”. “As novas diretrizes estabeleceram que o foco será voltado para grandes empresas, e as pequenas, como o caso de Patrícia França, serão notificadas sem a cobrança inicial de multa”, publicou o clube.

A aplicação de multa, contudo, seria apenas em caso de uma empresa continuar comercializando a marca sem autorização. Além disso, o time manifestou solidariedade à artesã e a convidou para participar de um vídeo de esclarecimento da situação.

A página de Patrícia já foi restabelecida. Nos produtos por ela divulgados mais recentemente, não constam mais fotos de decorações de times de futebol. Em fotos antigas, ainda há imagens de escudos esportivos.

No site da NoFake, há uma seção que explica como entrar em contato caso tenha recebido uma notificação extrajudicial. A empresa afirma contar com um time de advogados para auxiliar nas tratativas.

Dupla é suspeita de faturar de R$ 4 milhões com extorsão a artesãs por uso de marcas de clubes

A operação Verita Visus, desencadeada pela Polícia Civil de Minas Gerais, prendeu os dois sócios da empresa NoFake. A ação aconteceu na segunda-feira, 30, na cidade de Santos Dumont, a cerca de 215 km de Belo Horizonte. Segundo a investigação, o faturamento ilegal dos dois chegou a R$ 4 milhões.

O homem, de 30 anos, e a mulher, de 26, detidos na operação atuam com o serviço de proteção a marcas, buscando compensações e acordos com quem comercializa produtos sem licenciamento.

Conforme divulgou a Polícia Civil, a empresa atuava com busca em redes sociais por perfis que vendiam produtos com marca dos clientes, mas sem licença. A NoFake, então, simulava interesse em uma compra, para conseguir mais informações dos vendedores.

Operação da Polícia Civil apreendeu computadores, celulares, notebooks, livros de registro, equipamento de informática e um veículo de luxo. Foto: Polícia Civil-MG/Divulgação

Depois, outro setor fazia contato, sob a ameaça de registrar ocorrência. Para evitar um processo por violação de direitos intelectuais, era exigido o pagamento de um acordo extrajudicial. Também eram apontados como possíveis medidas a retirada de páginas online, como aconteceu com Patrícia, e denúncia ao Procon.

A polícia apontou que os valores tratados eram estabelecidos conforme o número de seguidores nas redes sociais dos vendedores. Era usado o argumento de que o acordo seria mais barato do que uma possível ação judicial proposta contra o vendedor.

Quando o acordo não era cumprido, a empresa denunciava o perfil da rede social utilizada e o derrubava do ar. Conforme o delegado responsável pelo caso, Daniel Gomes de Oliveira, essas negociações não seriam suficientes para livrar a responsabilidade criminal dos vendedores pelo uso irregular de marcas, caso fosse comprovada a prática criminosa. Isso porque o pagamento era apontado para cobrir “custos operacionais” e não como compensação por danos morais e materiais às marcas.

A investigação da Polícia de Minas começou a partir do registro de diferentes locais do Brasil. As ocorrências tinham em comum o modo de operação da NoFake, o qual foi considerado como extorsão pela autoridade policial.

A mulher foi presa na sede da empresa em Santos Dumont. Há, ainda, outros dois escritórios, em Brasília e em São Paulo, segundo o site da NoFake. A prisão do homem foi na residência dele, também na cidade mineira.

Os dois sócios tiveram bloqueio de contas bancárias, assim como a própria empresa. As atividades da empresa estão suspensas. Foram apreendidos computadores, celulares, notebooks, livros de registro, equipamento de informática e um veículo de luxo.

Em nota, a NoFake lamentou a suspensão das atividades e afirmou que a decisão judicial “desconsidera o modelo de negócio da empresa e ignora as licenças oficiais concedidas por todos os seus clientes que a credenciam para o exercício legitimo de combate aos ilícitos desta natureza”.

“Ao longo de sua trajetória, a NoFake desenvolveu uma metodologia eficaz e especializada no combate à pirataria, conquistando a confiança de seus clientes e parceiros de negócios”, continua o texto.

Conforme representantes legais da NoFake, foram tomadas medidas para tentar reverter as prisões, o que ainda não surtiu efeito.

Clubes podem adotar ‘postura mais simpática’, avalia especialista

A lei de propriedade intelectual não faz distinção entre o porte do chamado ofensor (quem utiliza a marca de forma irregular). “Um pequeno empreendedor que utiliza uma marca de clube sem autorização está infringindo a lei, assim como um grande CNPJ. O valor do licenciamento é determinado exclusivamente pelo titular do direito, e não há caminho legal para que pequenos empreendedores obtenham licenças a preços mais baixos simplesmente por seu tamanho”, explica Luciano Andrade Pinheiro, mestre em propriedade intelectual e sócio do Corrêa da Veiga Advogados.

“No entanto, os clubes poderiam adotar uma postura mais simpática e acessível, criando linhas de licenciamento mais econômicas para pequenos empreendedores. Isso seria uma medida mais eficaz para a proteção de sua propriedade intelectual e, ao mesmo tempo, ajudaria a evitar uma percepção negativa por parte do público”, completa Pinheiro.

Ainda conforme Pinheiro, a prática de clubes e empresas pode ser contraproducente, mesmo dentro do direito. Ele sugere recalcular a estratégia para manter o equilíbrio entre a proteção da marca e a empatia social.

Empreendedores de produtos artesanais, decoração de festas temáticas e bolos de aniversário – a maioria mulheres – entraram na mira de clubes de futebol pelo uso não-licenciado de marcas. A busca e contato era feita por uma empresa cujos sócios foram presos, sob suspeita de extorsão nas negociações, além de lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Entre os clientes da NoFake está o Palmeiras. Segundo apurou o Estadão, o setor jurídico do clube analisa o contrato, firmado em maio. A empresa, que teve as atividades suspensas, lamenta o que chama de ação “fundamentada em provas frágeis”, enquanto representantes buscam a soltura dos sócios. Além da investigação da Polícia Civil de Minas Gerais, o Ministério Público mineiro endossou a prisão dos dois.

Decoração do Vitória desencadeou caso que repercutiu na comunidade online de confeiteiras. Foto: @arts_pedreiras via Instagram

A paulista Adriana Carvalho trabalhava com produção de canecas, cadernos e camisetas há oito anos. Ela foi notificada pela NoFake por causa de um copo térmico que postou em uma página em que divulgava produtos. O copo tinha o escudo do Palmeiras.

Para não ser processada, Adriana fez um acordo, no qual pagou R$ 1,6 mil. Desde então, parou de produzir itens com escudos de clubes de futebol, o que se tornou um problema. “Os personalizados de times saem muito. Tem muitos pedidos, principalmente em datas comemorativas”, conta ao Estadão. Hoje, ela procura emprego para trabalhar com atendimento ao público.

“Infelizmente, por não poder mais fazer, acaba limitando meu trabalho. E, além dos gastos de casa, tive o acordo”, lamenta a empreendedora que tentou migrar seu negócio para Bíblias personalizadas, mas não conseguiu receita necessária para se manter.

Casos semelhantes ao de Adriana se tornaram mais comuns entre as empreendedoras do ramo. “Não podemos mais fazer bolos com topos de time. Imagine se isso pega, e a gente não pode fazer mais bolo de princesa?”, questiona a influenciadora Danni Confeiteira, em um vídeo no qual ela comenta outro caso. Além do clube paulista, a NoFake também tem ou já teve parceria com ASA-AL, Avaí, América-MG, Atlético-MG, Atlético-GO, Botafogo, Cruzeiro, Joinville, Paysandu, Vasco e Vitória.

O Palmeiras afirmou ao Estadão que conta com uma área destinada ao combate à pirataria, da qual fazem parte empresas especializadas em identificar produtos e serviços comercializados sem a devida autorização do clube. O clube tem registro e proteção de marcas junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi).

A reportagem apurou que duas artesãs pagaram ao Palmeiras para poder produzir copos térmicos com a marca palmeirense. Internamente, há o entendimento de que não cobrar, mesmo no caso de pequenos comerciantes, seria injusto com empresas licenciadas.

Decoração de clubes de futebol e até mesmo da CBF, em referência à seleção brasileira, tem grande demanda, segundo empreendedoras. Foto: @arts_pedreiras via Instagram

O primeiro caso de maior repercussão foi quando a NoFake e o Vitória notificaram a artesã Patrícia França por ela produzir uma decoração de festa de aniversário com o tema do clube. A página em que Patrícia divulgava seus trabalhos foi derrubada no Instagram.

A situação ficou conhecida após uma live em que Patrícia participou. Outras artesãs e confeiteiras passaram a arquivar publicações em que divulgavam produtos e bolos com emblemas de times, com medo de que a situação se repetisse.

Na época, o Vitória disse que previa notificações para empresas, e não a pessoas físicas, mas observou a necessidade de um “novo alinhamento”. “As novas diretrizes estabeleceram que o foco será voltado para grandes empresas, e as pequenas, como o caso de Patrícia França, serão notificadas sem a cobrança inicial de multa”, publicou o clube.

A aplicação de multa, contudo, seria apenas em caso de uma empresa continuar comercializando a marca sem autorização. Além disso, o time manifestou solidariedade à artesã e a convidou para participar de um vídeo de esclarecimento da situação.

A página de Patrícia já foi restabelecida. Nos produtos por ela divulgados mais recentemente, não constam mais fotos de decorações de times de futebol. Em fotos antigas, ainda há imagens de escudos esportivos.

No site da NoFake, há uma seção que explica como entrar em contato caso tenha recebido uma notificação extrajudicial. A empresa afirma contar com um time de advogados para auxiliar nas tratativas.

Dupla é suspeita de faturar de R$ 4 milhões com extorsão a artesãs por uso de marcas de clubes

A operação Verita Visus, desencadeada pela Polícia Civil de Minas Gerais, prendeu os dois sócios da empresa NoFake. A ação aconteceu na segunda-feira, 30, na cidade de Santos Dumont, a cerca de 215 km de Belo Horizonte. Segundo a investigação, o faturamento ilegal dos dois chegou a R$ 4 milhões.

O homem, de 30 anos, e a mulher, de 26, detidos na operação atuam com o serviço de proteção a marcas, buscando compensações e acordos com quem comercializa produtos sem licenciamento.

Conforme divulgou a Polícia Civil, a empresa atuava com busca em redes sociais por perfis que vendiam produtos com marca dos clientes, mas sem licença. A NoFake, então, simulava interesse em uma compra, para conseguir mais informações dos vendedores.

Operação da Polícia Civil apreendeu computadores, celulares, notebooks, livros de registro, equipamento de informática e um veículo de luxo. Foto: Polícia Civil-MG/Divulgação

Depois, outro setor fazia contato, sob a ameaça de registrar ocorrência. Para evitar um processo por violação de direitos intelectuais, era exigido o pagamento de um acordo extrajudicial. Também eram apontados como possíveis medidas a retirada de páginas online, como aconteceu com Patrícia, e denúncia ao Procon.

A polícia apontou que os valores tratados eram estabelecidos conforme o número de seguidores nas redes sociais dos vendedores. Era usado o argumento de que o acordo seria mais barato do que uma possível ação judicial proposta contra o vendedor.

Quando o acordo não era cumprido, a empresa denunciava o perfil da rede social utilizada e o derrubava do ar. Conforme o delegado responsável pelo caso, Daniel Gomes de Oliveira, essas negociações não seriam suficientes para livrar a responsabilidade criminal dos vendedores pelo uso irregular de marcas, caso fosse comprovada a prática criminosa. Isso porque o pagamento era apontado para cobrir “custos operacionais” e não como compensação por danos morais e materiais às marcas.

A investigação da Polícia de Minas começou a partir do registro de diferentes locais do Brasil. As ocorrências tinham em comum o modo de operação da NoFake, o qual foi considerado como extorsão pela autoridade policial.

A mulher foi presa na sede da empresa em Santos Dumont. Há, ainda, outros dois escritórios, em Brasília e em São Paulo, segundo o site da NoFake. A prisão do homem foi na residência dele, também na cidade mineira.

Os dois sócios tiveram bloqueio de contas bancárias, assim como a própria empresa. As atividades da empresa estão suspensas. Foram apreendidos computadores, celulares, notebooks, livros de registro, equipamento de informática e um veículo de luxo.

Em nota, a NoFake lamentou a suspensão das atividades e afirmou que a decisão judicial “desconsidera o modelo de negócio da empresa e ignora as licenças oficiais concedidas por todos os seus clientes que a credenciam para o exercício legitimo de combate aos ilícitos desta natureza”.

“Ao longo de sua trajetória, a NoFake desenvolveu uma metodologia eficaz e especializada no combate à pirataria, conquistando a confiança de seus clientes e parceiros de negócios”, continua o texto.

Conforme representantes legais da NoFake, foram tomadas medidas para tentar reverter as prisões, o que ainda não surtiu efeito.

Clubes podem adotar ‘postura mais simpática’, avalia especialista

A lei de propriedade intelectual não faz distinção entre o porte do chamado ofensor (quem utiliza a marca de forma irregular). “Um pequeno empreendedor que utiliza uma marca de clube sem autorização está infringindo a lei, assim como um grande CNPJ. O valor do licenciamento é determinado exclusivamente pelo titular do direito, e não há caminho legal para que pequenos empreendedores obtenham licenças a preços mais baixos simplesmente por seu tamanho”, explica Luciano Andrade Pinheiro, mestre em propriedade intelectual e sócio do Corrêa da Veiga Advogados.

“No entanto, os clubes poderiam adotar uma postura mais simpática e acessível, criando linhas de licenciamento mais econômicas para pequenos empreendedores. Isso seria uma medida mais eficaz para a proteção de sua propriedade intelectual e, ao mesmo tempo, ajudaria a evitar uma percepção negativa por parte do público”, completa Pinheiro.

Ainda conforme Pinheiro, a prática de clubes e empresas pode ser contraproducente, mesmo dentro do direito. Ele sugere recalcular a estratégia para manter o equilíbrio entre a proteção da marca e a empatia social.

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