O fato de o mercado de apostas ter valores inflacionados, com pagamento vultosos de patrocínios a clubes de futebol, fez algumas das principais casas de apostas esportivas do País mudarem sua estratégia de marketing. Em vez de patrocinar equipes, parte das bets tem investido em “embaixadores”, como são chamados os parceiros comerciais das empresas, sejam eles jogadores, atletas olímpicos, jornalistas, influenciadores ou criadores de conteúdo. O narrador Galvão Bueno e Vini Jr, astro do Real Madrid e da seleção brasileira, são algumas dessas figuras.
Algumas casas de apostas argumentam que não mais investem em times da Série A porque os valores estão inflacionados, sobretudo depois que a Vai de Bet decidiu pagar R$ 360 milhões ao Corinthians no maior contrato do tipo na história do futebol brasileiro. O acordo, porém, acabou rompido cinco meses depois em razão dos controversos pagamentos da intermediária do acordo a uma suposta empresa “laranja”.
Há casas de apostas que pensam em voltar a investir nos principais clubes do País quando a regulamentação do setor for colocada em prática. É o caso da Galera Bet, que chegou a patrocinar os times masculino e feminino do Corinthians e era, até o ano passado, patrocinador máster do Brasileirão.
“Quando optamos em sair de patrocínios de times masculinos de futebol, buscamos focar em uma estratégia construída em razão do contexto de mercado, decorrente do inflacionamento das propriedades de marketing associados ao futebol ocorrido recentemente, mas que não estão descartados no futuro próximo, especialmente no cenário pós regulamentação que organizará melhor o cenário”, justifica Marcos Sabiá, CEO do Galera.bet.
A empresa decidiu investir em outras frentes. Patrocina, hoje, o Carnaval de São Paulo, duas escolas de samba, dezenas de torcidas organizadas e se insere também em um dos camarotes do Allianz Parque, estádio do Palmeiras. É comum ver o nome da empresa estampado nas paredes de fora de bares no entorno da arena palmeirense.
A Casa de Apostas também não investe em clubes. A marca está associada à Copa do Nordeste, competição da qual é patrocinadora máster, e dá nome a dois estádios no Brasil: a Arena Fonte Nova e a Arena das Dunas, em Salvador e Natal, respectivamente, uma vez que é dona do naming right de ambas. “A busca, a partir desses variados movimentos que temos feito, é por marcar presença em espaços onde o entretenimento está”, afirma Anderson Nunes, diretor de negócios da empresa. “Esse é o nosso principal objetivo. A Casa de Apostas quer estar onde a alegria está”.
Trata-se de um movimento de algumas casas de apostas, não algo generalizado uma vez que dos clubes da Série A, 18 são patrocinados por empresas do setor. Anualmente, segundo levantamento do Estadão, os sites de apostas investem mais de R$ 500 milhões nos 18 clubes da elite do futebol brasileiro do qual são parceiros
Na estimativa da empresa de tráfego online SEMRush, Bet365, Betano e BetFair são hoje as empresas que têm os maiores números de audiência, sendo assim os preferidos dos jogadores. Na média mensal referente aos últimos 12 meses, os sites de apostas tiveram 194,2 milhões de visitas. O País está entre os que têm o maior número de audiência nessas plataformas, apesar de ainda não estar entre os grandes em faturamento.
Especialistas apontam que o mercado das “bets” surgiu como um atrativo financeiro, em substituição às saídas dos bancos, por exemplo. A estimativa é de que o setor invista R$ 3,5 bilhões em patrocínios no futebol anualmente. O valor abarca clubes, competições e transmissões na televisão.
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A Betano detém os naming rights dos principais campeonatos de futebol do País, o Brasileirão e a Copa do Brasil e é patrocinadora máster do Atlético Mineiro. Mas também associa sua marca a influenciadores, como o comediante Yuri Marçal, e tem o piloto Felipe Massa, hoje na Stock Car, como um de seus embaixadores. Giannis Antetokounmpo, estrela do Milwaukee Bucks, da NBA, é o grande embaixador global da marca. A ideia, diz a casa de aposta, é estar “muito próximos dos fãs do esporte e do entretenimento”.
“Queremos oferecer experiências especiais para todas as pessoas que não têm a oportunidade de estar em um estádio, uma corrida ou mais próximos de seus ídolos. Então, colocamos embaixadores para focar em interatividade e engajamento com o público, cada vez mais humanizando e aproximando da plataforma”, argumenta a Betano ao Estadão.
O marketing de influência é estratégia da Betnacional. Para chamar a atenção do consumidor, a empresa recrutou o narrador mais famoso do País. Galvão Bueno se tornou um dos embaixadores da marca no início deste ano. Um dos queridinhos do mercado publicitário, o comunicador participar de ações publicitárias e faz publicações relacionadas à marca em seus perfis nas redes sociais. “A sua associação com a nossa marca nos permite alcançar uma audiência mais ampla e diversa”, declara a Betnacional.
Casa de Galvão Bueno há mais de 40 anos, a Globo também é parceira da Betnacional, que patrocina o futebol na emissora pelo segundo ano seguido. Outro astro em quem investe a marca é Vini Jr., atacante do Real Madrid e da seleção brasileira e forte candidato a ser eleito o melhor jogador do mundo neste ano.
“Investimos em atletas e personalidades porque acreditamos que isso permite nos conectar de maneira mais direta e autêntica com o público”, ressalta a casa de aposta. “Nossos embaixadores possuem grande apelo e credibilidade, o que consideramos pontos-chave, e conseguimos engajar os fãs de esportes e entretenimento de uma maneira mais emocional”.
A plataforma de apostas passou a investir também em atletas olímpicos. De uma vez só, recrutou a judoca Bia Souza e a dupla do vôlei de praia Ana Patrícia e Duda depois que as três ganharam a medalha de ouro nos Jogos de Paris. Na música, os embaixadores da marca são Thiaguinho, Seu Jorge e Ludmilla. “São figuras que trazem consigo uma enorme credibilidade, brasilidade e alcance”, acredita a marca.
referenceMercado regulamentado vai enxugar bets no Brasil
Na visão de Magnho José, presidente do Instituto Jogo Legal, que representa o setor, o mercado de apostas brasileiro chegou ao estágio atual devido à falta de regulamentação no prazo inicialmente previsto. Na proposta do governo de Michel Temer, o setor deveria ter sido regulado dentro de dois anos, com prazo prorrogável por mais dois.
O setor foi regulamentado depois que o Congresso aprovou no fim do ano passado a lei, sancionada em 29 de dezembro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estabeleceu critérios sobre tributação e normas para a exploração comercial das apostas de quota fixa e definiu a distribuição da receita arrecadada e fixou sanções.
As regras deveriam começar a valer no fim do primeiro semestre, mas o prazo foi adiado e a regulamentação deve ser concluída apenas no ano que vem. Para operar no País, as casas de apostas terão de cumprir uma série de exigências determinadas pelo Ministério da Fazenda, entre elas ter sede no Brasil e pagar uma outorga de até R$ 30 milhões.
É consenso entre especialistas e quem opera no setor que, com o mercado regulado, cairá o número de casas de apostas, dando início a um processo antagônico à explosão de bets no futebol sem regras claras. Depois de atingir o teto, os valores com publicidade também devem despencar.