Na quarta-feira, dia 20, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai decidir se Robinho, condenado em todas as instâncias na Itália a nove anos de prisão pelo crime de estupro contra uma mulher albanesa em uma boate em Milão, em 2013, quando atuava pelo Milan, cumpre a pena no Brasil, a pedido da Justiça italiana. Em entrevista à Record TV neste domingo, ele alegou inocência e disse ter provas, apesar de não apresentá-las, além de afirmar que é alvo de racismo.
O processo será julgado por 15 dos 33 ministros com maior tempo de atuação no tribunal — eles que formam a Corte Especial. O relator da ação é o ministro Francisco Falcão. Para a condenação, é necessário que a maioria dos ministros vote a favor do cumprimento da pena no Brasil. “Não dá para prever nada”, diz ao Estadão Herman Benjamin, um dos que compõem o colegiado e que vai participar do julgamento.
O julgamento será aberto à imprensa e transmitido no canal do tribunal no YouTube. A sessão pode não terminar no dia 20, uma vez que existe a possibilidade de um dos ministros pedir vista ao processo (mais tempo para examinar o tema). “Se o STJ decidir pela transferência de execução da pena, ele poderá, sim, ter de cumprir a pena desde já, mas existe a possibilidade de recurso ainda, tanto no STJ quanto no STF em último caso”, explica Valério Mazzuoli, professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
A execução de sentença estrangeira está prevista na Constituição Federal. Trata-se de um procedimento comum. Ao STJ, cabe verificar aspectos formais da sentença, sem reexaminar o caso em si. O órgão examina se quem proferiu a sentença do país de origem era competente, se a sentença transitou em julgado, isto é, não há mais recursos, e se a documentação está traduzida por um tradutor juramento para o português e consularizada.
O STJ assumiu o caso há mais de um ano, em fevereiro do ano passado. O processo não andou tanto, já que ficou suspenso por meses em razão do pedido de vista do ministro João Otávio de Noronha. Em agosto, a Corte rejeitou o pedido da defesa do jogador para que a Justiça italiana enviasse ao Brasil uma cópia do processo na íntegra traduzida para o português.
Robinho entregou o passaporte e está proibido de deixar o Brasil, mas continua em liberdade porque a Constituição Federal de 1988 proíbe a extradição de brasileiros nascidos em território nacional, caso do jogador, natural de São Vicente, litoral paulista. Se a decisão for para não cumprir a pena, ele tem seu passaporte devolvido, mas continua com o risco de ser preso caso deixe o Brasil.
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“A opinião pública tentará de todas as formas pressionar o STJ para a transferência da execução da pena do jogador, mas legalmente a norma brasileira (Lei de Migração) e os tratados com a Itália impedem a transferência de execução da pena, porque só cabe essa medida quando couber solicitação de extradição executória, e não cabe solicitar extradição executória para brasileiros natos, como é o caso do jogador, além do que o tratado de cooperação em matéria penal entre Brasil e Itália impede textualmente transferência de medidas de execução de pena”, analisa Mazzuoli.
Em novembro, o Ministério Público Federal (MPF) encaminhou manifestação ao STJ defendendo que o ex-jogador cumpra a pena de nove anos no Brasil. A Procuradoria argumenta que foram cumpridos todos os requisitos legais para que a execução penal de Robinho seja transferida para o País.
No documento, o subprocurador-geral da República Carlos Frederico dos Santos cita jurisprudência que orienta que, o “Estado em que se encontra o imputado é obrigado a efetuar sua extradição ou, na impossibilidade de fazê-lo, deve promover a execução penal”.
Condenação de Daniel Alves pode influenciar análise
O julgamento de Robinho foi marcado menos de uma semana depois da condenação do ex-jogador Daniel Alves por um tribunal de Barcelona a quatro anos e seis meses de prisão pelo crime de estupro. Preso há 13 meses, o brasileiro já começou a cumprir a pena, enquanto aguarda também um recurso do julgamento.
“É bem possível que os fatores midiáticos e sociais tenham acelerado a marcação do julgamento de Robinho. Isso não é novidade. A Lava Jato mostrou muito isso, o quanto fatores midiáticos interferem na celeridade do processo”, opina a advogada criminalista Beatriz Alaia Colin.
Para a advogada Beatriz Vendramini Rausse, sócia da Borguezi e Vendramini Advogadas para Mulheres e Minorias, apesar de não ser possível prever como irá decidir o STJ, a condenação do Daniel Alves e o bom recebimento dessa sentença pela opinião pública colocam uma pressão no STJ para decidir pelo cumprimento da pena do Robinho no Brasil.
“O caso Daniel Alves é um catalisador, pode abrir espaço para uma nova perspectiva de julgamento no Brasil e no mundo, levando em consideração a palavra da vítima. Muito lentamente, a gente percebe que o judiciário brasileiro tem se alinhado a essa nova perspectiva”, afirma a advogada.
Pensamento semelhante tem Rafael Paiva — advogado criminalista e especialista em violência doméstica e professor de Direito Penal. Para ele, a prisão e condenação de Daniel Alves na Espanha impactam no andamento do caso de Robinho no Brasil. “A medida é importante para que a Justiça Brasileira demonstre que aqui não vivemos num celeiro de impunidade, e que não compactuamos com a liberdade de quem quer que seja que tenha praticado crimes tão graves como esses”, diz Paiva.
“Aliás, precisamos que o Brasil colabore com qualquer tipo de movimento internacional que objetive que cidadãos nacionais cumpram penas referentes a crimes que foram cometidos no exterior. Trata-se de um verdadeiro mecanismo de cooperação”, acrescenta.
Rafael Valentini, advogado criminalista, especialista em Direito e Processo Penal, lembra que, do ponto de vista jurídico, a condenação de Daniel Alves não produz qualquer impacto no processo que trata do cumprimento da decisão condenatória proferida pela Justiça Italiana contra Robinho. No entanto, fatores midiáticos e sociais podem, eventualmente, influenciar na tramitação do caso do atacante. “Os magistrados também são humanos e, portanto, sujeitos a esses fatores externos”, afirma.
Defesa de Robinho
Robinho contratou uma banca de advogados com décadas de experiência em tribunais superiores, incluindo três primos do vice-presidente da República e ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin: José Eduardo, José Augusto Rangel e João Paulo Chaves. O escritório tem uma forte atuação junto aos tribunais superiores, STF, STJ e TSE. Atua na área constitucional, penal, eleitoral, em direito público e privado. Rodrigo Otávio Barbosa de Alencastro e Pedro Junior Rosalino Braule Pinto também compõem a defesa do atleta.
Em entrevista ao Estadão no ano passado, José Eduardo disse que Robinho se considera injustiçado. “Ele considera que houve uma injustiça gritante, que prevaleceu uma compreensão muito diferente dos fatos que efetivamente ocorreram”. A defesa também alega que a possibilidade de a sentença ser aplicada no País fere a soberania nacional, uma vez que o processo penal italiano teria utilizado procedimentos de investigação considerados ilegais no Brasil.
Antes de apresentar defesa contra o pedido de homologação, os advogados de Robinho pediram ao tribunal que o governo italiano fosse intimado a apresentar cópia integral do processo, com a respectiva tradução, mas o requerimento foi rejeitado. À época, o ministro Francisco Falcão lembrou que a análise da homologação das decisões estrangeiras é limitada ao exame de requisitos meramente formais, não sendo possível a rediscussão do mérito da ação penal pelo STJ.
O jogador, que nega as acusações, fez sua última partida em julho de 2020 e vive recluso em sua casa, em um condomínio de Luxo no Guarujá. As poucas aparições públicas que faz são, geralmente, para jogar futevôlei na praia e para acompanhar o filho, Robson, no CT do Santos, como fez na semana passada.