Lúcia Alves, mãe do jogador Daniel Alves, chamou a atenção nesta terça-feira, 2, ao divulgar nas redes sociais a suposta identidade da mulher que acusa o seu filho de estupro em uma boate na cidade de Barcelona, na Espanha, em 2022. Na publicação, a mãe do jogador, que está preso aguardando julgamento, marcado para o dia 5 de fevereiro, expôs vídeos da jovem, supostamente vítima do crime, se divertindo em festas e questionou se ela realmente estava traumatizada pelo ocorrido.
As postagens tiveram grande repercussão ao longo do dia e causaram grande revolta nas redes sociais, pois até então, a identidade da mulher e sua imagem haviam sido preservadas, o que levantou questionamentos sobre a possibilidade de a mãe do jogador sofrer alguma punição criminal, já que o processo corre em segredo de Justiça na Espanha.
Especialistas consultados pelo Estadão foram unânimes em afirmar que as chances de Lúcia ser punida criminalmente à luz das leis brasileiras pela exposição são remotas, pois as investigações do caso correm na Espanha. No entanto, segundo dizem, não há dúvidas de que, caso seja confirmada a suposta identidade da vítima, poderá ser configurada uma quebra de sigilo, abrindo margem para uma indenização por danos morais, por exemplo, o que é regido pelo direito civil.
Doutor em Direito Constitucional e mestre em Direito Penal Internacional pela Universidade de Granada, o advogado Acácio Miranda da Silva Filho ressalta que o sigilo existe em prol da segurança da vítima e que a revelação da identidade da jovem, se confirmada, pode configurar uma violação à lisura do processo sob o olhar das leis espanholas.
“Qual a dificuldade nesse caso? O processo tramita na Espanha. Por mais que ele (Daniel Alves) seja brasileiro, o crime foi cometido na Espanha, ele está preso na Espanha e a vítima está na Espanha. A mãe é brasileira, está no Brasil e essa exposição toda foi feita aqui. Então, em regra, como o processo não tramita no Brasil, não há como o judiciário brasileiro responsabilizar a mãe do Daniel Alves”, argumenta.
Na avaliação do especialista, Lúcia poderia ser alvo de um inquérito na Espanha se estivesse no país europeu, pois a atitude seria considerada crime de tumulto processual, segundo a legislação local. A outra possibilidade de responsabilização ocorreria se houvesse uma investigação conjunta, o que, segundo ele, é pouco provável de acontecer, pois a conduta não é tipificada como crime no Brasil. Porém, o advogado crê que a Justiça da Espanha não ficará inerte.
“O judiciário espanhol deverá tomar alguma medida, porque obviamente isso irá gerar um tumulto no processo. A mãe poderá ser notificada ou a rede social onde a publicação foi feita também poderá ser notificada para que ela seja tirada do ar”, adicionou.
Enzo Fachini, especialista em direito penal econômico pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), entende que, como o caso foi colocado em segredo de Justiça na Espanha, o país estrangeiro seria responsável, em tese, por processar a mãe de Daniel Alves por violar a condição. “Nesse caso, já que o crime não diz respeito ao sistema judiciário do Brasil, nosso país teria uma atuação coadjuvante, apenas auxiliando a Espanha sempre que for demandando, por meio de um acordo de cooperação jurídica internacional”, sustenta.
Advogado criminalista e professor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Bruno Seligman de Menezes afirma que “não há dúvidas que quem promover a exposição de vítimas poderá responder na esfera cível por danos morais. “O bem jurídico atingido, porém, é o segredo de Justiça espanhol”, afirma.