Mão de obra brasileira no Catar é motor da Copa do Mundo 2022


Cerca de 300 brasileiros atuam em diferentes funções e cargos de liderança e ajudam a construir o torneio no país

Por Elcio Padovez
Atualização:

Não é só em campo que o Brasil espera fazer bonito na primeira Copa do Mundo realizada em um país do Oriente Médio. Fora dele, um time de cerca de 300 brasileiros vem ajudando a construir o torneio no Catar nas mais diferentes funções e em cargos de liderança. São profissionais que adquiriram experiência na realização de megaeventos esportivos e culturais no Brasil e hoje, viajam pelo planeta como mão de obra especializada na Fifa, no Comitê Organizador Local nos torneios e em empresas privadas de logística, hospitalidade, marketing esportivo e consultoria. Alguns vivem por lá desde antes de o emirado ser escolhido como país-sede do Mundial. Outros chegaram recentemente.

A carioca Patrícia Rezende, de 60 anos, ama tanto uma Copa do Mundo que resolveu nascer no ano de uma delas. Foi na edição do Chile, em 1962, que ela veio ao mundo e herdou a paixão pelo torneio do pai, João. Por 40 anos, trabalhou e teve uma empresa de turismo e eventos e, em 2019, decidiu que queria ser mais autônoma. “A primeira Copa que fiz in loco foi a da Itália, em 1990, trabalhando com logística de acomodação.

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Quatro anos atrás, conversando com amigos sobre meu desejo de trabalhar mais por conta, recebi o convite para trabalhar na Pretorian Logística, empresa brasileira com sede em Doha e que possui uma frota de mil veículos de luxo (carros e vans) para o transporte de clientes durante o Mundial.”

A gerente de projetos explica que a operação da empresa é toda feita por brasileiros e para dar conta da alta demanda, cadastraram 1.200 motoristas, sendo dez vindos do Brasil, com três mulheres que dirigem vans no Rio de Janeiro, e países da África e da Ásia. “Temos um desafio enorme aqui porque os clientes não precisam ser levados apenas aos jogos. Muitos terão reuniões de negócios no Catar, querem se deslocar para restaurantes, experiências. Imagine manter uma frota desse tamanho de veículos abastecidos, limpos e com manutenção em dia num curto espaço de tempo?”.

Patrícia Resende durante inspeção de carros em Doha Foto: Arquivo Pessoal
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Segundo ela, a expertise nacional em transportes, como receptivo e ônibus, por exemplo, joga a favor e tem ajudado a mudar a infraestrutura dentro do Catar. “A empresa investe em pessoas que já estiveram em outros eventos internacionais e que possam ajudar na construção do torneio. A força de trabalho do país vem dos imigrantes e isso é o que toca o país.”

Em relação às diferenças culturais com os árabes, Patrícia reflete que é importante respeitar as normas impostas pelo islamismo e que se sente bem lá. “Existem os momentos de reza, por exemplo. É algo novo para nós e como temos motoristas muçulmanos, estamos buscando soluções para que ele não precise parar uma viagem no meio para praticar sua fé e o passageiro precisar esperar 40 minutos para seguir”.

CONSTRUÇÃO E CONTRATAÇÕES

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O Catar também conta com o suporte de outras empresas nascidas com DNA 100% brasileiro, como a Arena, que conta hoje com 100 funcionários no país do Golfo Pérsico, e opera em duas frentes: Com funcionários que trabalham internamente e outros que são recrutados para operações de clientes, como o Comitê Organizador Local. O negócio surgiu em 2007, e começou a ganhar corpo a partir da sociedade entre o engenheiro Pedro Lima e o arquiteto Carlos de la Corte, ambos de São Paulo.

Carlos, que possui doutorado em arquitetura esportiva de megaeventos, trabalhou nos Jogos Pan- Americanos do Rio, Copa de 2014 e Comitê Local da Olimpíada de 2016 nas áreas de instalações temporárias, como tendas e pisos. Ele conta que prestou consultoria ao Mundial sub-17 e Copa América de 2019, ambos realizados no Brasil, e no Comitê da Copa da Rússia. Enquanto o Catar preparava sua candidatura para concorrer como sede do torneio de 2022, também foi consultor da Fifa na revisão dos projetos dos oito estádios.

Já Pedro, que vive em terras catarianas desde 2013, quando foi convidado a trabalhar em uma companhia de engenharia, vem atuado na construção da infraestrutura do atual país-sede da Copa do Mundo, como o Aeroporto de Doha, o novo porto e rodovias que precisam sair do zero para conectar o Catar de norte a sul. O aeroporto atrasou 10 anos para ser entregue. Essa é uma Copa muito diferente, pois quase tudo precisou ser construído aqui recebê-la. Quando cheguei aqui, as condições de trabalho dos chamados de blue color, o trabalhador assalariado, eram pouco favoráveis”, aponta.

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O engenheiro conta que, por conta da mobilização internacional em apontar que era preciso criar estruturas mais dignas, o Catar reformou a legislação trabalhista para oferecer melhores oportunidades para que os trabalhadores pudessem desenvolver melhor suas funções. “O país vai tem ainda pelo menos mais dez anos de agenda em sediar grandes eventos, como os Jogos Asiáticos, em 2030, e espero que esse avanço fique de legado.”

Pedro Lima e Carlos de la Corte sócios da empresa Arena durante teste de estádio para a Copa no Catar Foto: Arquivo pessoal

Os dois profissionais, junto da gerente carioca de RH da empresa, Bianca Berenguer, trabalham em parceria com o Comitê Organizador Local para fornece mão de obra especializada nos setores de realização de serviços, como estruturas para a mídia e segurança, por exemplo. “O brasileiro é um profissional de excelência quando se fala em megaeventos esportivos. Aqui, atuamos nas áreas de alimentação, TI, simulação de fluxo de multidões nos estádios, planejamento de transporte, estratégia de ingressos.”

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Bianca, que vive no Oriente Médio desde 2017, com experiência na Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, ressalta que nunca teve problemas em trabalhar por lá sendo mulher e estrangeira. “O brasileiro abraça as outras culturas e se você respeitar o modo de vida deles, é tranquilo conviver. Os catarianos são abertos ao diferente, mas querem manter suas tradições. Sempre reforço isso aos profissionais do Brasil e outros países que vamos contratar. Nós temos jogo de cintura e essa característica ajuda porque aqui muita coisa muda de última hora, em relação a custos, decisões. Essa Copa evidenciou isso e espero que nossa mão de obra especializada possa seguir contribuindo com os eventos mundo afora.”

MADE IN BRAZIL

A entidade máxima do futebol também valoriza a mão de obra especializada formada no Brasil. O mineiro Ricardo Trade, que é descendente de libaneses, esteve sete vezes no Catar como consultor do Comitê Local antes de assumir a função de chefe executivo de operações do torneio, em junho de 2021. “Cuido, junto com uma equipe, desde operações nos estádios, como entrada e saída de torcedores, de mídia, de segurança, logística e alimentação. É uma área incrível e há gente do mundo inteiro ajudando.”

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Ricardo conta que, em 2010, na primeira vez em que esteve no país, até hoje, houve um salto enorme na infraestrutura local, como a construção do metrô, investimento em asfalto de qualidade e na entrega do Aeroporto de Doha, considerado o melhor do mundo. “Há muita gente boa aqui e esse intercâmbio com os brasileiros é ótimo, pois temos muita capacidade e aprendemos, desde cedo, a improvisar”. O executivo, que fez curso de negociação em Harvard, diz que é preciso ser prático e razoáveis com os catarianos que ocupam cargos de liderança no torneio e no governo. “É preciso escolher as brigas que você vai comprar. Há uma cultura bastante enraizada aqui e você precisa respeitar os costumes locais.”

Ele, que vive em Doha com a mulher, Ana Maria, e o filho, Mauricio, que trabalha na área de acomodações do Comitê Organizador Local, conta que a presença de outros brasileiros em cargos-chave na Copa, como Flavia Dias, gerente de TI, Estevão Sanches, gerente da Fifa Fan Festival, João Aguiar, gerente do aeroporto, Daniel Robles e João Vitor França, gerente do Estádio Cidade da Educação e 974, respectivamente. Há também lideranças nas áreas de Voluntários que tem ajudado a dar o toque brasileiro ao torneio e no dia a dia de trabalho.

O mineiro acredita que o país está pronto para o dia 20, com os estádios sendo entregues e testados com antecedência, além de o grosso da infraestrutura estar funcionando plenamente. Há pontos mais sensíveis, como a oferta de acomodação, e como evitar conflitos de torcidas rivais circulando dentro de um espaço pequeno. “A fase de grupos deve trazer esse desafio para nós, pois o volume de pessoas aqui será maior.”

VIAJANDO E TRABALHANDO PELO MUNDO

Bruno Miguel e Victoria Farina vivem como nômades desde 2016. Antes de chegarem ao Catar para um frila na Copa, rodaram e trabalharam na Ásia e Europa. O casal paulistano, com experiência em cruzeiros, atuou no setor de hospitalidade na Copa de 2014 e na Olimpíada de 2016. Também estiveram Rússia, em 2018, e iam aos Jogos de Tóquio, no Japão, mas precisam cancelar os planos por causa da pandemia da covid-19. No emirado, cuidam da recepção de hóspedes do mundo inteiro.

Ambos trabalham bastante de forma remota e em jornadas que chegam a 15 horas por dia, pois ainda administram um negócio próprio no Brasil à distância. Pelo fato de viverem uma vida mais nômade, eles acreditam que têm facilidade para se adaptarem rápido a mudanças culturais em um curto espaço de tempo. “Aprender algumas palavras no idioma local te ajuda a abrir portas. A temperatura muda bastante aqui e é sempre bom ter uma roupa de frio, pois as noites esfriam com rapidez. A comida é boa e variada, o povo é silencioso e destoa dos arranha-céus, luzes e estrutura barulhenta”, conta Bruno.

Ele pontua que a questão de como funcionará o transporte público para o Mundial ainda não está clara, mas acredita que esta semana esse fato seja esclarecido pelas autoridades catarianas. O casal não conheceu nenhum local, pois eles são bem reservados. “Convivemos com estrangeiros da África, de outros países árabes e asiáticos até agora. Eles estão animados e não veem a hora de a Copa começar. O pessoal gosta muito do Brasil aqui.”

Não é só em campo que o Brasil espera fazer bonito na primeira Copa do Mundo realizada em um país do Oriente Médio. Fora dele, um time de cerca de 300 brasileiros vem ajudando a construir o torneio no Catar nas mais diferentes funções e em cargos de liderança. São profissionais que adquiriram experiência na realização de megaeventos esportivos e culturais no Brasil e hoje, viajam pelo planeta como mão de obra especializada na Fifa, no Comitê Organizador Local nos torneios e em empresas privadas de logística, hospitalidade, marketing esportivo e consultoria. Alguns vivem por lá desde antes de o emirado ser escolhido como país-sede do Mundial. Outros chegaram recentemente.

A carioca Patrícia Rezende, de 60 anos, ama tanto uma Copa do Mundo que resolveu nascer no ano de uma delas. Foi na edição do Chile, em 1962, que ela veio ao mundo e herdou a paixão pelo torneio do pai, João. Por 40 anos, trabalhou e teve uma empresa de turismo e eventos e, em 2019, decidiu que queria ser mais autônoma. “A primeira Copa que fiz in loco foi a da Itália, em 1990, trabalhando com logística de acomodação.

Quatro anos atrás, conversando com amigos sobre meu desejo de trabalhar mais por conta, recebi o convite para trabalhar na Pretorian Logística, empresa brasileira com sede em Doha e que possui uma frota de mil veículos de luxo (carros e vans) para o transporte de clientes durante o Mundial.”

A gerente de projetos explica que a operação da empresa é toda feita por brasileiros e para dar conta da alta demanda, cadastraram 1.200 motoristas, sendo dez vindos do Brasil, com três mulheres que dirigem vans no Rio de Janeiro, e países da África e da Ásia. “Temos um desafio enorme aqui porque os clientes não precisam ser levados apenas aos jogos. Muitos terão reuniões de negócios no Catar, querem se deslocar para restaurantes, experiências. Imagine manter uma frota desse tamanho de veículos abastecidos, limpos e com manutenção em dia num curto espaço de tempo?”.

Patrícia Resende durante inspeção de carros em Doha Foto: Arquivo Pessoal

Segundo ela, a expertise nacional em transportes, como receptivo e ônibus, por exemplo, joga a favor e tem ajudado a mudar a infraestrutura dentro do Catar. “A empresa investe em pessoas que já estiveram em outros eventos internacionais e que possam ajudar na construção do torneio. A força de trabalho do país vem dos imigrantes e isso é o que toca o país.”

Em relação às diferenças culturais com os árabes, Patrícia reflete que é importante respeitar as normas impostas pelo islamismo e que se sente bem lá. “Existem os momentos de reza, por exemplo. É algo novo para nós e como temos motoristas muçulmanos, estamos buscando soluções para que ele não precise parar uma viagem no meio para praticar sua fé e o passageiro precisar esperar 40 minutos para seguir”.

CONSTRUÇÃO E CONTRATAÇÕES

O Catar também conta com o suporte de outras empresas nascidas com DNA 100% brasileiro, como a Arena, que conta hoje com 100 funcionários no país do Golfo Pérsico, e opera em duas frentes: Com funcionários que trabalham internamente e outros que são recrutados para operações de clientes, como o Comitê Organizador Local. O negócio surgiu em 2007, e começou a ganhar corpo a partir da sociedade entre o engenheiro Pedro Lima e o arquiteto Carlos de la Corte, ambos de São Paulo.

Carlos, que possui doutorado em arquitetura esportiva de megaeventos, trabalhou nos Jogos Pan- Americanos do Rio, Copa de 2014 e Comitê Local da Olimpíada de 2016 nas áreas de instalações temporárias, como tendas e pisos. Ele conta que prestou consultoria ao Mundial sub-17 e Copa América de 2019, ambos realizados no Brasil, e no Comitê da Copa da Rússia. Enquanto o Catar preparava sua candidatura para concorrer como sede do torneio de 2022, também foi consultor da Fifa na revisão dos projetos dos oito estádios.

Já Pedro, que vive em terras catarianas desde 2013, quando foi convidado a trabalhar em uma companhia de engenharia, vem atuado na construção da infraestrutura do atual país-sede da Copa do Mundo, como o Aeroporto de Doha, o novo porto e rodovias que precisam sair do zero para conectar o Catar de norte a sul. O aeroporto atrasou 10 anos para ser entregue. Essa é uma Copa muito diferente, pois quase tudo precisou ser construído aqui recebê-la. Quando cheguei aqui, as condições de trabalho dos chamados de blue color, o trabalhador assalariado, eram pouco favoráveis”, aponta.

O engenheiro conta que, por conta da mobilização internacional em apontar que era preciso criar estruturas mais dignas, o Catar reformou a legislação trabalhista para oferecer melhores oportunidades para que os trabalhadores pudessem desenvolver melhor suas funções. “O país vai tem ainda pelo menos mais dez anos de agenda em sediar grandes eventos, como os Jogos Asiáticos, em 2030, e espero que esse avanço fique de legado.”

Pedro Lima e Carlos de la Corte sócios da empresa Arena durante teste de estádio para a Copa no Catar Foto: Arquivo pessoal

Os dois profissionais, junto da gerente carioca de RH da empresa, Bianca Berenguer, trabalham em parceria com o Comitê Organizador Local para fornece mão de obra especializada nos setores de realização de serviços, como estruturas para a mídia e segurança, por exemplo. “O brasileiro é um profissional de excelência quando se fala em megaeventos esportivos. Aqui, atuamos nas áreas de alimentação, TI, simulação de fluxo de multidões nos estádios, planejamento de transporte, estratégia de ingressos.”

Bianca, que vive no Oriente Médio desde 2017, com experiência na Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, ressalta que nunca teve problemas em trabalhar por lá sendo mulher e estrangeira. “O brasileiro abraça as outras culturas e se você respeitar o modo de vida deles, é tranquilo conviver. Os catarianos são abertos ao diferente, mas querem manter suas tradições. Sempre reforço isso aos profissionais do Brasil e outros países que vamos contratar. Nós temos jogo de cintura e essa característica ajuda porque aqui muita coisa muda de última hora, em relação a custos, decisões. Essa Copa evidenciou isso e espero que nossa mão de obra especializada possa seguir contribuindo com os eventos mundo afora.”

MADE IN BRAZIL

A entidade máxima do futebol também valoriza a mão de obra especializada formada no Brasil. O mineiro Ricardo Trade, que é descendente de libaneses, esteve sete vezes no Catar como consultor do Comitê Local antes de assumir a função de chefe executivo de operações do torneio, em junho de 2021. “Cuido, junto com uma equipe, desde operações nos estádios, como entrada e saída de torcedores, de mídia, de segurança, logística e alimentação. É uma área incrível e há gente do mundo inteiro ajudando.”

Ricardo conta que, em 2010, na primeira vez em que esteve no país, até hoje, houve um salto enorme na infraestrutura local, como a construção do metrô, investimento em asfalto de qualidade e na entrega do Aeroporto de Doha, considerado o melhor do mundo. “Há muita gente boa aqui e esse intercâmbio com os brasileiros é ótimo, pois temos muita capacidade e aprendemos, desde cedo, a improvisar”. O executivo, que fez curso de negociação em Harvard, diz que é preciso ser prático e razoáveis com os catarianos que ocupam cargos de liderança no torneio e no governo. “É preciso escolher as brigas que você vai comprar. Há uma cultura bastante enraizada aqui e você precisa respeitar os costumes locais.”

Ele, que vive em Doha com a mulher, Ana Maria, e o filho, Mauricio, que trabalha na área de acomodações do Comitê Organizador Local, conta que a presença de outros brasileiros em cargos-chave na Copa, como Flavia Dias, gerente de TI, Estevão Sanches, gerente da Fifa Fan Festival, João Aguiar, gerente do aeroporto, Daniel Robles e João Vitor França, gerente do Estádio Cidade da Educação e 974, respectivamente. Há também lideranças nas áreas de Voluntários que tem ajudado a dar o toque brasileiro ao torneio e no dia a dia de trabalho.

O mineiro acredita que o país está pronto para o dia 20, com os estádios sendo entregues e testados com antecedência, além de o grosso da infraestrutura estar funcionando plenamente. Há pontos mais sensíveis, como a oferta de acomodação, e como evitar conflitos de torcidas rivais circulando dentro de um espaço pequeno. “A fase de grupos deve trazer esse desafio para nós, pois o volume de pessoas aqui será maior.”

VIAJANDO E TRABALHANDO PELO MUNDO

Bruno Miguel e Victoria Farina vivem como nômades desde 2016. Antes de chegarem ao Catar para um frila na Copa, rodaram e trabalharam na Ásia e Europa. O casal paulistano, com experiência em cruzeiros, atuou no setor de hospitalidade na Copa de 2014 e na Olimpíada de 2016. Também estiveram Rússia, em 2018, e iam aos Jogos de Tóquio, no Japão, mas precisam cancelar os planos por causa da pandemia da covid-19. No emirado, cuidam da recepção de hóspedes do mundo inteiro.

Ambos trabalham bastante de forma remota e em jornadas que chegam a 15 horas por dia, pois ainda administram um negócio próprio no Brasil à distância. Pelo fato de viverem uma vida mais nômade, eles acreditam que têm facilidade para se adaptarem rápido a mudanças culturais em um curto espaço de tempo. “Aprender algumas palavras no idioma local te ajuda a abrir portas. A temperatura muda bastante aqui e é sempre bom ter uma roupa de frio, pois as noites esfriam com rapidez. A comida é boa e variada, o povo é silencioso e destoa dos arranha-céus, luzes e estrutura barulhenta”, conta Bruno.

Ele pontua que a questão de como funcionará o transporte público para o Mundial ainda não está clara, mas acredita que esta semana esse fato seja esclarecido pelas autoridades catarianas. O casal não conheceu nenhum local, pois eles são bem reservados. “Convivemos com estrangeiros da África, de outros países árabes e asiáticos até agora. Eles estão animados e não veem a hora de a Copa começar. O pessoal gosta muito do Brasil aqui.”

Não é só em campo que o Brasil espera fazer bonito na primeira Copa do Mundo realizada em um país do Oriente Médio. Fora dele, um time de cerca de 300 brasileiros vem ajudando a construir o torneio no Catar nas mais diferentes funções e em cargos de liderança. São profissionais que adquiriram experiência na realização de megaeventos esportivos e culturais no Brasil e hoje, viajam pelo planeta como mão de obra especializada na Fifa, no Comitê Organizador Local nos torneios e em empresas privadas de logística, hospitalidade, marketing esportivo e consultoria. Alguns vivem por lá desde antes de o emirado ser escolhido como país-sede do Mundial. Outros chegaram recentemente.

A carioca Patrícia Rezende, de 60 anos, ama tanto uma Copa do Mundo que resolveu nascer no ano de uma delas. Foi na edição do Chile, em 1962, que ela veio ao mundo e herdou a paixão pelo torneio do pai, João. Por 40 anos, trabalhou e teve uma empresa de turismo e eventos e, em 2019, decidiu que queria ser mais autônoma. “A primeira Copa que fiz in loco foi a da Itália, em 1990, trabalhando com logística de acomodação.

Quatro anos atrás, conversando com amigos sobre meu desejo de trabalhar mais por conta, recebi o convite para trabalhar na Pretorian Logística, empresa brasileira com sede em Doha e que possui uma frota de mil veículos de luxo (carros e vans) para o transporte de clientes durante o Mundial.”

A gerente de projetos explica que a operação da empresa é toda feita por brasileiros e para dar conta da alta demanda, cadastraram 1.200 motoristas, sendo dez vindos do Brasil, com três mulheres que dirigem vans no Rio de Janeiro, e países da África e da Ásia. “Temos um desafio enorme aqui porque os clientes não precisam ser levados apenas aos jogos. Muitos terão reuniões de negócios no Catar, querem se deslocar para restaurantes, experiências. Imagine manter uma frota desse tamanho de veículos abastecidos, limpos e com manutenção em dia num curto espaço de tempo?”.

Patrícia Resende durante inspeção de carros em Doha Foto: Arquivo Pessoal

Segundo ela, a expertise nacional em transportes, como receptivo e ônibus, por exemplo, joga a favor e tem ajudado a mudar a infraestrutura dentro do Catar. “A empresa investe em pessoas que já estiveram em outros eventos internacionais e que possam ajudar na construção do torneio. A força de trabalho do país vem dos imigrantes e isso é o que toca o país.”

Em relação às diferenças culturais com os árabes, Patrícia reflete que é importante respeitar as normas impostas pelo islamismo e que se sente bem lá. “Existem os momentos de reza, por exemplo. É algo novo para nós e como temos motoristas muçulmanos, estamos buscando soluções para que ele não precise parar uma viagem no meio para praticar sua fé e o passageiro precisar esperar 40 minutos para seguir”.

CONSTRUÇÃO E CONTRATAÇÕES

O Catar também conta com o suporte de outras empresas nascidas com DNA 100% brasileiro, como a Arena, que conta hoje com 100 funcionários no país do Golfo Pérsico, e opera em duas frentes: Com funcionários que trabalham internamente e outros que são recrutados para operações de clientes, como o Comitê Organizador Local. O negócio surgiu em 2007, e começou a ganhar corpo a partir da sociedade entre o engenheiro Pedro Lima e o arquiteto Carlos de la Corte, ambos de São Paulo.

Carlos, que possui doutorado em arquitetura esportiva de megaeventos, trabalhou nos Jogos Pan- Americanos do Rio, Copa de 2014 e Comitê Local da Olimpíada de 2016 nas áreas de instalações temporárias, como tendas e pisos. Ele conta que prestou consultoria ao Mundial sub-17 e Copa América de 2019, ambos realizados no Brasil, e no Comitê da Copa da Rússia. Enquanto o Catar preparava sua candidatura para concorrer como sede do torneio de 2022, também foi consultor da Fifa na revisão dos projetos dos oito estádios.

Já Pedro, que vive em terras catarianas desde 2013, quando foi convidado a trabalhar em uma companhia de engenharia, vem atuado na construção da infraestrutura do atual país-sede da Copa do Mundo, como o Aeroporto de Doha, o novo porto e rodovias que precisam sair do zero para conectar o Catar de norte a sul. O aeroporto atrasou 10 anos para ser entregue. Essa é uma Copa muito diferente, pois quase tudo precisou ser construído aqui recebê-la. Quando cheguei aqui, as condições de trabalho dos chamados de blue color, o trabalhador assalariado, eram pouco favoráveis”, aponta.

O engenheiro conta que, por conta da mobilização internacional em apontar que era preciso criar estruturas mais dignas, o Catar reformou a legislação trabalhista para oferecer melhores oportunidades para que os trabalhadores pudessem desenvolver melhor suas funções. “O país vai tem ainda pelo menos mais dez anos de agenda em sediar grandes eventos, como os Jogos Asiáticos, em 2030, e espero que esse avanço fique de legado.”

Pedro Lima e Carlos de la Corte sócios da empresa Arena durante teste de estádio para a Copa no Catar Foto: Arquivo pessoal

Os dois profissionais, junto da gerente carioca de RH da empresa, Bianca Berenguer, trabalham em parceria com o Comitê Organizador Local para fornece mão de obra especializada nos setores de realização de serviços, como estruturas para a mídia e segurança, por exemplo. “O brasileiro é um profissional de excelência quando se fala em megaeventos esportivos. Aqui, atuamos nas áreas de alimentação, TI, simulação de fluxo de multidões nos estádios, planejamento de transporte, estratégia de ingressos.”

Bianca, que vive no Oriente Médio desde 2017, com experiência na Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, ressalta que nunca teve problemas em trabalhar por lá sendo mulher e estrangeira. “O brasileiro abraça as outras culturas e se você respeitar o modo de vida deles, é tranquilo conviver. Os catarianos são abertos ao diferente, mas querem manter suas tradições. Sempre reforço isso aos profissionais do Brasil e outros países que vamos contratar. Nós temos jogo de cintura e essa característica ajuda porque aqui muita coisa muda de última hora, em relação a custos, decisões. Essa Copa evidenciou isso e espero que nossa mão de obra especializada possa seguir contribuindo com os eventos mundo afora.”

MADE IN BRAZIL

A entidade máxima do futebol também valoriza a mão de obra especializada formada no Brasil. O mineiro Ricardo Trade, que é descendente de libaneses, esteve sete vezes no Catar como consultor do Comitê Local antes de assumir a função de chefe executivo de operações do torneio, em junho de 2021. “Cuido, junto com uma equipe, desde operações nos estádios, como entrada e saída de torcedores, de mídia, de segurança, logística e alimentação. É uma área incrível e há gente do mundo inteiro ajudando.”

Ricardo conta que, em 2010, na primeira vez em que esteve no país, até hoje, houve um salto enorme na infraestrutura local, como a construção do metrô, investimento em asfalto de qualidade e na entrega do Aeroporto de Doha, considerado o melhor do mundo. “Há muita gente boa aqui e esse intercâmbio com os brasileiros é ótimo, pois temos muita capacidade e aprendemos, desde cedo, a improvisar”. O executivo, que fez curso de negociação em Harvard, diz que é preciso ser prático e razoáveis com os catarianos que ocupam cargos de liderança no torneio e no governo. “É preciso escolher as brigas que você vai comprar. Há uma cultura bastante enraizada aqui e você precisa respeitar os costumes locais.”

Ele, que vive em Doha com a mulher, Ana Maria, e o filho, Mauricio, que trabalha na área de acomodações do Comitê Organizador Local, conta que a presença de outros brasileiros em cargos-chave na Copa, como Flavia Dias, gerente de TI, Estevão Sanches, gerente da Fifa Fan Festival, João Aguiar, gerente do aeroporto, Daniel Robles e João Vitor França, gerente do Estádio Cidade da Educação e 974, respectivamente. Há também lideranças nas áreas de Voluntários que tem ajudado a dar o toque brasileiro ao torneio e no dia a dia de trabalho.

O mineiro acredita que o país está pronto para o dia 20, com os estádios sendo entregues e testados com antecedência, além de o grosso da infraestrutura estar funcionando plenamente. Há pontos mais sensíveis, como a oferta de acomodação, e como evitar conflitos de torcidas rivais circulando dentro de um espaço pequeno. “A fase de grupos deve trazer esse desafio para nós, pois o volume de pessoas aqui será maior.”

VIAJANDO E TRABALHANDO PELO MUNDO

Bruno Miguel e Victoria Farina vivem como nômades desde 2016. Antes de chegarem ao Catar para um frila na Copa, rodaram e trabalharam na Ásia e Europa. O casal paulistano, com experiência em cruzeiros, atuou no setor de hospitalidade na Copa de 2014 e na Olimpíada de 2016. Também estiveram Rússia, em 2018, e iam aos Jogos de Tóquio, no Japão, mas precisam cancelar os planos por causa da pandemia da covid-19. No emirado, cuidam da recepção de hóspedes do mundo inteiro.

Ambos trabalham bastante de forma remota e em jornadas que chegam a 15 horas por dia, pois ainda administram um negócio próprio no Brasil à distância. Pelo fato de viverem uma vida mais nômade, eles acreditam que têm facilidade para se adaptarem rápido a mudanças culturais em um curto espaço de tempo. “Aprender algumas palavras no idioma local te ajuda a abrir portas. A temperatura muda bastante aqui e é sempre bom ter uma roupa de frio, pois as noites esfriam com rapidez. A comida é boa e variada, o povo é silencioso e destoa dos arranha-céus, luzes e estrutura barulhenta”, conta Bruno.

Ele pontua que a questão de como funcionará o transporte público para o Mundial ainda não está clara, mas acredita que esta semana esse fato seja esclarecido pelas autoridades catarianas. O casal não conheceu nenhum local, pois eles são bem reservados. “Convivemos com estrangeiros da África, de outros países árabes e asiáticos até agora. Eles estão animados e não veem a hora de a Copa começar. O pessoal gosta muito do Brasil aqui.”

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