Liga dos EUA ameaça Brasileirão com nova estratégia no mercado do futebol para atrair revelações


Com Argentina e México em baixa, campeonato americano abandona foco em medalhões e veteranos e aposta em novos talentos para competir com as ligas europeias

Por Rodrigo Almonacid
Atualização:

Um novo centro ameaça destronar o Campeonato Brasileiro como protagonista do futebol das Américas: a Major League Soccer (MLS), que ganha terreno a passos largos ao aproveitar o declive dos mercados tradicionais de Argentina e México. Os clubes americanos mudaram a estratégia de contratar jogadores famosos à beira da aposentadoria, com a qual buscaram durante anos atrair as atenções para seu campeonato, lançado em 1996. Agora, disputam as joias do continente com os times brasileiros e desbancam argentinos e mexicanos, outrora grandes predadores do mercado, mas que perderam espaço devido a dificuldades financeiras e mudanças de regulamento.

A mudança de postura do soccer nos EUA garante melhorar o nível da MLS e as margens de lucro com a eventual venda de jogadores para a Europa, recursos que as potências sul-americanas costumavam monopolizar. “Tem a ver com a visão que tiveram os donos das equipes para que (a MLS) se torne uma das maiores ligas do mundo”, disse à AFP Alfonso Mondelo, diretor de competições da MLS.

Talles Magno (à direita) é um dos talentos brasileiros que atua na MLS. Foto: Winslow Townson/ USA TODAY Sports
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De “implorar” a convocar

A liga de futebol dos Estados Unidos, da qual participam três equipes canadenses, é desde 2021 a que mais gasta em contratações na América, segundo uma análise da AFP a partir de relatórios da Fifa sobre transferências entre 2018 e 2022 (exceto 2020, por conta da pandemia da covid-19).

Em 2021, foram gastos US$ 159,9 milhões (R$ 827 milhões, na cotação atual), três vezes mais do que no Brasil, 11 vezes mais do que na Argentina e cinco vezes mais do que no México. Na temporada passada, foram US$ 181,5 milhões (R$ 938,8 milhões), mais do que o dobro de argentinos e mexicanos e 1,6 a mais do que a movimentação do mercado brasileiro. “Nos primeiros anos da MLS, era preciso quase implorar aos jogadores para que viessem aos EUA. Agora, eles entram em contato conosco devido à organização e porque depois podem ir à Europa”, afirma Mondelo.

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Em fevereiro de 2022, o Atlanta United deu uma mostra dessa nova estratégia: pagou ao Vélez Sarsfield (ARG) o valor recorde para esse mercado de US$ 16 milhões (R$ 82,7 milhões) por Thiago Almada, então com 20 anos e cobiçado por europeus. “Quero fazer uma boa temporada e ter a oportunidade de ir à Europa”, afirmou Almada depois da transferência.

Dez meses depois, o argentino se tornou o primeiro jogador da MLS a ser campeão da Copa do Mundo. Em janelas anteriores, foram contratados outros jovens com futuro no ‘Velho Continente’: o argentino Alan Velasco, o uruguaio Diego Rossi e o brasileiro Talles Magno (ex-Vasco).

Alan Velasco (direita) saiu do Independiente de Avellaneda para o futebol dos EUA. Foto: Kevin Jairaj/ USA TODAY Sports
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Salto competitivo

Contratar estrangeiros e fortalecer a base rendeu frutos: o valor dos 29 elencos da MLS (US$ 1,250 bilhão ou R$ 6,465 bilhões) é o segundo maior em termos absolutos desde 2022, próximo ao dos 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro (US$ 1,450 bilhão ou R$ 7,5 bilhões).

Atrás aparecem os 18 da elite do Campeonato Mexicano (US$ 880,5 milhões ou R$ 4,554 bilhões) e os 28 da Argentina (US$ 852 milhões ou R$ 4,407 bilhões), segundo o portal especializado Transfermarkt. “Os Estados Unidos, em termos de valor de mercado, vão acabar passando porque eles sabem fazer negócios gigantescos, estão crescendo de uma forma correta, gradual”, afirma o agente de jogadores brasileiro Marcelo Mascagni.

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No entanto, a liga dos EUA, uma das sedes da Copa do Mundo de 2026 ao lado de Canadá e México, ainda tem um longo caminho a percorrer. As conquistas internacionais de seus clubes são poucas: três títulos da ‘Concachampions’, contra 37 do México e seis da Costa Rica. “É importante primeiramente se tornar a liga mais poderosa da Concacaf, nosso próximo desafio, e depois ver como podemos alcançar as melhores ligas do mundo”, explica Mondelo.

Contradição brasileira

O Brasil tem o que os EUA estão buscando: domínio internacional, principalmente com os títulos de Flamengo e Palmeiras nas últimas quatro edições da Copa Libertadores. Embora vários clubes do País estejam em crise financeira, eles exploram o status de principal produtor e exportador mundial de jogadores para montar elencos competitivos e melhorar sua estrutura.

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A saída de jogadores jovens vem sendo suprida com a chegada de nomes de peso no final de suas carreiras - o uruguaio Luis Suárez, o chileno Arturo Vidal, o brasileiro Marcelo - e promessas de outros países da América do Sul. Seja pela matéria-prima ou com a revenda de estrangeiros, o Brasil se consolidou como o país do continente que mais fatura com transferências.

Em 2022, 998 jogadores do futebol brasileiro foram vendidos por US$ 267,2 milhões (R$ 1,3 bilhão), muito à frente de Argentina (US$ 146,6 milhões ou R$ 758,3 milhões) e EUA (US$ 135,2 milhões ou R$ 699,3 milhões), segundo a Fifa. Mas nem tudo é festa: embora as exportações tenham aumentado, o volume de dinheiro diminuiu. No ano passado, as receitas com vendas foram 30% menores do que em 2018, mesmo com a venda de 166 jogadores a mais.

Isto se deve à “desorganização dos clubes, que deixam ir de graça os jogadores. Às vezes, preferem não ganhar nada a vender barato”, acredita Mascagni. Para ele, muitas vezes os clubes perdem o ‘timing’ da venda e por isso acabam negociando valores menores, então “os europeus levam as promessas brasileiras cada vez mais jovens”, quando custam menos. O Brasil também vê talentos sendo exportados para os Estados Unidos. São os casos de Luiz Araújo (Atlanta United), Brenner (Cincinatti FC), Talles Magno (NY City), Calegari (Los Angeles Galaxy) e Elias Manoel (NY Red Bulls), entre outros.

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Calegari teve de ajudar na defesa para salvar o Los Angeles Galaxy. Foto: Ringo H.W. Chiu/ AP

Vitrine em crise

O fortalecimento brasileiro contrasta com a crise da maior rival: a Argentina, com escassez de dólares - usados para transações e salários -, a desvalorização do peso argentino e a inflação alta. As promessas que surgiam em mercados emergentes agora vão para Brasil ou Estados Unidos. Dessa forma, o Campeonato Argentino envelhece: a média de idade dos jogadores é atualmente de 26,7 anos, frente aos 24 de 2018.

“A Argentina não é um mercado atrativo”, exceto por River Plate e Boca Juniors, aponta Jaime Rascón, especialista em mercado com experiências no América do México e no Barcelona da Espanha. “Tem a desvalorização da moeda, que complica muito para qualquer jogador manter seu poder aquisitivo e padrão de vida”, acrescenta.

Por isso, o futebol do país perdeu figuras emblemáticas, como o meia Nacho Fernández, que deixou o River em 2021, último clube não brasileiro a vencer a Libertadores (2018), para assinar com o Atlético-MG. O talentoso jogador, de 33 anos, retornou ao clube de Buenos Aires para a temporada 2023.

Mercado que ‘desapareceu’

Clubes que antes alimentavam o futebol argentino também se assustaram com as disputas judiciais com times da Argentina devido à falta de pagamento. “Fazer negócio com os Estados Unidos se tornou o primeiro foco”, diz Ramiro Ruiz, presidente do Envigado, que tem uma das categorias de base mais conceituadas da Colômbia.

O clube vendeu James Rodríguez ao Banfield (ARG) em 2008. De lá, o meia foi direto para a Europa. Mas os argentinos ainda mantêm uma vantagem: vendem com frequência suas promessas diretamente para o futebol europeu, garantindo maior lucro, como nas transferências milionárias de Enzo Fernández ao Chelsea e de Julián Álvarez ao Manchester City, ambos do River Plate e campeões mundiais em 2022.

Historicamente conhecido por contratações envolvendo grandes valores e salários atrativos, o mercado mexicano também está em baixa. “Existe um acordo da liga de baixar os salários dos elencos” e reduzir o número de estrangeiros, explica Rascón. Nos últimos cinco anos, houve queda de gastos (37%) e receitas (50%) com transferências, assim como vendas (34%) e contratações (23%). “Mas um mercado que estava sempre de olho do jogador daqui (Brasil) deu uma sumida”, lamenta Mascagni./ AFP.

Um novo centro ameaça destronar o Campeonato Brasileiro como protagonista do futebol das Américas: a Major League Soccer (MLS), que ganha terreno a passos largos ao aproveitar o declive dos mercados tradicionais de Argentina e México. Os clubes americanos mudaram a estratégia de contratar jogadores famosos à beira da aposentadoria, com a qual buscaram durante anos atrair as atenções para seu campeonato, lançado em 1996. Agora, disputam as joias do continente com os times brasileiros e desbancam argentinos e mexicanos, outrora grandes predadores do mercado, mas que perderam espaço devido a dificuldades financeiras e mudanças de regulamento.

A mudança de postura do soccer nos EUA garante melhorar o nível da MLS e as margens de lucro com a eventual venda de jogadores para a Europa, recursos que as potências sul-americanas costumavam monopolizar. “Tem a ver com a visão que tiveram os donos das equipes para que (a MLS) se torne uma das maiores ligas do mundo”, disse à AFP Alfonso Mondelo, diretor de competições da MLS.

Talles Magno (à direita) é um dos talentos brasileiros que atua na MLS. Foto: Winslow Townson/ USA TODAY Sports

De “implorar” a convocar

A liga de futebol dos Estados Unidos, da qual participam três equipes canadenses, é desde 2021 a que mais gasta em contratações na América, segundo uma análise da AFP a partir de relatórios da Fifa sobre transferências entre 2018 e 2022 (exceto 2020, por conta da pandemia da covid-19).

Em 2021, foram gastos US$ 159,9 milhões (R$ 827 milhões, na cotação atual), três vezes mais do que no Brasil, 11 vezes mais do que na Argentina e cinco vezes mais do que no México. Na temporada passada, foram US$ 181,5 milhões (R$ 938,8 milhões), mais do que o dobro de argentinos e mexicanos e 1,6 a mais do que a movimentação do mercado brasileiro. “Nos primeiros anos da MLS, era preciso quase implorar aos jogadores para que viessem aos EUA. Agora, eles entram em contato conosco devido à organização e porque depois podem ir à Europa”, afirma Mondelo.

Em fevereiro de 2022, o Atlanta United deu uma mostra dessa nova estratégia: pagou ao Vélez Sarsfield (ARG) o valor recorde para esse mercado de US$ 16 milhões (R$ 82,7 milhões) por Thiago Almada, então com 20 anos e cobiçado por europeus. “Quero fazer uma boa temporada e ter a oportunidade de ir à Europa”, afirmou Almada depois da transferência.

Dez meses depois, o argentino se tornou o primeiro jogador da MLS a ser campeão da Copa do Mundo. Em janelas anteriores, foram contratados outros jovens com futuro no ‘Velho Continente’: o argentino Alan Velasco, o uruguaio Diego Rossi e o brasileiro Talles Magno (ex-Vasco).

Alan Velasco (direita) saiu do Independiente de Avellaneda para o futebol dos EUA. Foto: Kevin Jairaj/ USA TODAY Sports

Salto competitivo

Contratar estrangeiros e fortalecer a base rendeu frutos: o valor dos 29 elencos da MLS (US$ 1,250 bilhão ou R$ 6,465 bilhões) é o segundo maior em termos absolutos desde 2022, próximo ao dos 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro (US$ 1,450 bilhão ou R$ 7,5 bilhões).

Atrás aparecem os 18 da elite do Campeonato Mexicano (US$ 880,5 milhões ou R$ 4,554 bilhões) e os 28 da Argentina (US$ 852 milhões ou R$ 4,407 bilhões), segundo o portal especializado Transfermarkt. “Os Estados Unidos, em termos de valor de mercado, vão acabar passando porque eles sabem fazer negócios gigantescos, estão crescendo de uma forma correta, gradual”, afirma o agente de jogadores brasileiro Marcelo Mascagni.

No entanto, a liga dos EUA, uma das sedes da Copa do Mundo de 2026 ao lado de Canadá e México, ainda tem um longo caminho a percorrer. As conquistas internacionais de seus clubes são poucas: três títulos da ‘Concachampions’, contra 37 do México e seis da Costa Rica. “É importante primeiramente se tornar a liga mais poderosa da Concacaf, nosso próximo desafio, e depois ver como podemos alcançar as melhores ligas do mundo”, explica Mondelo.

Contradição brasileira

O Brasil tem o que os EUA estão buscando: domínio internacional, principalmente com os títulos de Flamengo e Palmeiras nas últimas quatro edições da Copa Libertadores. Embora vários clubes do País estejam em crise financeira, eles exploram o status de principal produtor e exportador mundial de jogadores para montar elencos competitivos e melhorar sua estrutura.

A saída de jogadores jovens vem sendo suprida com a chegada de nomes de peso no final de suas carreiras - o uruguaio Luis Suárez, o chileno Arturo Vidal, o brasileiro Marcelo - e promessas de outros países da América do Sul. Seja pela matéria-prima ou com a revenda de estrangeiros, o Brasil se consolidou como o país do continente que mais fatura com transferências.

Em 2022, 998 jogadores do futebol brasileiro foram vendidos por US$ 267,2 milhões (R$ 1,3 bilhão), muito à frente de Argentina (US$ 146,6 milhões ou R$ 758,3 milhões) e EUA (US$ 135,2 milhões ou R$ 699,3 milhões), segundo a Fifa. Mas nem tudo é festa: embora as exportações tenham aumentado, o volume de dinheiro diminuiu. No ano passado, as receitas com vendas foram 30% menores do que em 2018, mesmo com a venda de 166 jogadores a mais.

Isto se deve à “desorganização dos clubes, que deixam ir de graça os jogadores. Às vezes, preferem não ganhar nada a vender barato”, acredita Mascagni. Para ele, muitas vezes os clubes perdem o ‘timing’ da venda e por isso acabam negociando valores menores, então “os europeus levam as promessas brasileiras cada vez mais jovens”, quando custam menos. O Brasil também vê talentos sendo exportados para os Estados Unidos. São os casos de Luiz Araújo (Atlanta United), Brenner (Cincinatti FC), Talles Magno (NY City), Calegari (Los Angeles Galaxy) e Elias Manoel (NY Red Bulls), entre outros.

Calegari teve de ajudar na defesa para salvar o Los Angeles Galaxy. Foto: Ringo H.W. Chiu/ AP

Vitrine em crise

O fortalecimento brasileiro contrasta com a crise da maior rival: a Argentina, com escassez de dólares - usados para transações e salários -, a desvalorização do peso argentino e a inflação alta. As promessas que surgiam em mercados emergentes agora vão para Brasil ou Estados Unidos. Dessa forma, o Campeonato Argentino envelhece: a média de idade dos jogadores é atualmente de 26,7 anos, frente aos 24 de 2018.

“A Argentina não é um mercado atrativo”, exceto por River Plate e Boca Juniors, aponta Jaime Rascón, especialista em mercado com experiências no América do México e no Barcelona da Espanha. “Tem a desvalorização da moeda, que complica muito para qualquer jogador manter seu poder aquisitivo e padrão de vida”, acrescenta.

Por isso, o futebol do país perdeu figuras emblemáticas, como o meia Nacho Fernández, que deixou o River em 2021, último clube não brasileiro a vencer a Libertadores (2018), para assinar com o Atlético-MG. O talentoso jogador, de 33 anos, retornou ao clube de Buenos Aires para a temporada 2023.

Mercado que ‘desapareceu’

Clubes que antes alimentavam o futebol argentino também se assustaram com as disputas judiciais com times da Argentina devido à falta de pagamento. “Fazer negócio com os Estados Unidos se tornou o primeiro foco”, diz Ramiro Ruiz, presidente do Envigado, que tem uma das categorias de base mais conceituadas da Colômbia.

O clube vendeu James Rodríguez ao Banfield (ARG) em 2008. De lá, o meia foi direto para a Europa. Mas os argentinos ainda mantêm uma vantagem: vendem com frequência suas promessas diretamente para o futebol europeu, garantindo maior lucro, como nas transferências milionárias de Enzo Fernández ao Chelsea e de Julián Álvarez ao Manchester City, ambos do River Plate e campeões mundiais em 2022.

Historicamente conhecido por contratações envolvendo grandes valores e salários atrativos, o mercado mexicano também está em baixa. “Existe um acordo da liga de baixar os salários dos elencos” e reduzir o número de estrangeiros, explica Rascón. Nos últimos cinco anos, houve queda de gastos (37%) e receitas (50%) com transferências, assim como vendas (34%) e contratações (23%). “Mas um mercado que estava sempre de olho do jogador daqui (Brasil) deu uma sumida”, lamenta Mascagni./ AFP.

Um novo centro ameaça destronar o Campeonato Brasileiro como protagonista do futebol das Américas: a Major League Soccer (MLS), que ganha terreno a passos largos ao aproveitar o declive dos mercados tradicionais de Argentina e México. Os clubes americanos mudaram a estratégia de contratar jogadores famosos à beira da aposentadoria, com a qual buscaram durante anos atrair as atenções para seu campeonato, lançado em 1996. Agora, disputam as joias do continente com os times brasileiros e desbancam argentinos e mexicanos, outrora grandes predadores do mercado, mas que perderam espaço devido a dificuldades financeiras e mudanças de regulamento.

A mudança de postura do soccer nos EUA garante melhorar o nível da MLS e as margens de lucro com a eventual venda de jogadores para a Europa, recursos que as potências sul-americanas costumavam monopolizar. “Tem a ver com a visão que tiveram os donos das equipes para que (a MLS) se torne uma das maiores ligas do mundo”, disse à AFP Alfonso Mondelo, diretor de competições da MLS.

Talles Magno (à direita) é um dos talentos brasileiros que atua na MLS. Foto: Winslow Townson/ USA TODAY Sports

De “implorar” a convocar

A liga de futebol dos Estados Unidos, da qual participam três equipes canadenses, é desde 2021 a que mais gasta em contratações na América, segundo uma análise da AFP a partir de relatórios da Fifa sobre transferências entre 2018 e 2022 (exceto 2020, por conta da pandemia da covid-19).

Em 2021, foram gastos US$ 159,9 milhões (R$ 827 milhões, na cotação atual), três vezes mais do que no Brasil, 11 vezes mais do que na Argentina e cinco vezes mais do que no México. Na temporada passada, foram US$ 181,5 milhões (R$ 938,8 milhões), mais do que o dobro de argentinos e mexicanos e 1,6 a mais do que a movimentação do mercado brasileiro. “Nos primeiros anos da MLS, era preciso quase implorar aos jogadores para que viessem aos EUA. Agora, eles entram em contato conosco devido à organização e porque depois podem ir à Europa”, afirma Mondelo.

Em fevereiro de 2022, o Atlanta United deu uma mostra dessa nova estratégia: pagou ao Vélez Sarsfield (ARG) o valor recorde para esse mercado de US$ 16 milhões (R$ 82,7 milhões) por Thiago Almada, então com 20 anos e cobiçado por europeus. “Quero fazer uma boa temporada e ter a oportunidade de ir à Europa”, afirmou Almada depois da transferência.

Dez meses depois, o argentino se tornou o primeiro jogador da MLS a ser campeão da Copa do Mundo. Em janelas anteriores, foram contratados outros jovens com futuro no ‘Velho Continente’: o argentino Alan Velasco, o uruguaio Diego Rossi e o brasileiro Talles Magno (ex-Vasco).

Alan Velasco (direita) saiu do Independiente de Avellaneda para o futebol dos EUA. Foto: Kevin Jairaj/ USA TODAY Sports

Salto competitivo

Contratar estrangeiros e fortalecer a base rendeu frutos: o valor dos 29 elencos da MLS (US$ 1,250 bilhão ou R$ 6,465 bilhões) é o segundo maior em termos absolutos desde 2022, próximo ao dos 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro (US$ 1,450 bilhão ou R$ 7,5 bilhões).

Atrás aparecem os 18 da elite do Campeonato Mexicano (US$ 880,5 milhões ou R$ 4,554 bilhões) e os 28 da Argentina (US$ 852 milhões ou R$ 4,407 bilhões), segundo o portal especializado Transfermarkt. “Os Estados Unidos, em termos de valor de mercado, vão acabar passando porque eles sabem fazer negócios gigantescos, estão crescendo de uma forma correta, gradual”, afirma o agente de jogadores brasileiro Marcelo Mascagni.

No entanto, a liga dos EUA, uma das sedes da Copa do Mundo de 2026 ao lado de Canadá e México, ainda tem um longo caminho a percorrer. As conquistas internacionais de seus clubes são poucas: três títulos da ‘Concachampions’, contra 37 do México e seis da Costa Rica. “É importante primeiramente se tornar a liga mais poderosa da Concacaf, nosso próximo desafio, e depois ver como podemos alcançar as melhores ligas do mundo”, explica Mondelo.

Contradição brasileira

O Brasil tem o que os EUA estão buscando: domínio internacional, principalmente com os títulos de Flamengo e Palmeiras nas últimas quatro edições da Copa Libertadores. Embora vários clubes do País estejam em crise financeira, eles exploram o status de principal produtor e exportador mundial de jogadores para montar elencos competitivos e melhorar sua estrutura.

A saída de jogadores jovens vem sendo suprida com a chegada de nomes de peso no final de suas carreiras - o uruguaio Luis Suárez, o chileno Arturo Vidal, o brasileiro Marcelo - e promessas de outros países da América do Sul. Seja pela matéria-prima ou com a revenda de estrangeiros, o Brasil se consolidou como o país do continente que mais fatura com transferências.

Em 2022, 998 jogadores do futebol brasileiro foram vendidos por US$ 267,2 milhões (R$ 1,3 bilhão), muito à frente de Argentina (US$ 146,6 milhões ou R$ 758,3 milhões) e EUA (US$ 135,2 milhões ou R$ 699,3 milhões), segundo a Fifa. Mas nem tudo é festa: embora as exportações tenham aumentado, o volume de dinheiro diminuiu. No ano passado, as receitas com vendas foram 30% menores do que em 2018, mesmo com a venda de 166 jogadores a mais.

Isto se deve à “desorganização dos clubes, que deixam ir de graça os jogadores. Às vezes, preferem não ganhar nada a vender barato”, acredita Mascagni. Para ele, muitas vezes os clubes perdem o ‘timing’ da venda e por isso acabam negociando valores menores, então “os europeus levam as promessas brasileiras cada vez mais jovens”, quando custam menos. O Brasil também vê talentos sendo exportados para os Estados Unidos. São os casos de Luiz Araújo (Atlanta United), Brenner (Cincinatti FC), Talles Magno (NY City), Calegari (Los Angeles Galaxy) e Elias Manoel (NY Red Bulls), entre outros.

Calegari teve de ajudar na defesa para salvar o Los Angeles Galaxy. Foto: Ringo H.W. Chiu/ AP

Vitrine em crise

O fortalecimento brasileiro contrasta com a crise da maior rival: a Argentina, com escassez de dólares - usados para transações e salários -, a desvalorização do peso argentino e a inflação alta. As promessas que surgiam em mercados emergentes agora vão para Brasil ou Estados Unidos. Dessa forma, o Campeonato Argentino envelhece: a média de idade dos jogadores é atualmente de 26,7 anos, frente aos 24 de 2018.

“A Argentina não é um mercado atrativo”, exceto por River Plate e Boca Juniors, aponta Jaime Rascón, especialista em mercado com experiências no América do México e no Barcelona da Espanha. “Tem a desvalorização da moeda, que complica muito para qualquer jogador manter seu poder aquisitivo e padrão de vida”, acrescenta.

Por isso, o futebol do país perdeu figuras emblemáticas, como o meia Nacho Fernández, que deixou o River em 2021, último clube não brasileiro a vencer a Libertadores (2018), para assinar com o Atlético-MG. O talentoso jogador, de 33 anos, retornou ao clube de Buenos Aires para a temporada 2023.

Mercado que ‘desapareceu’

Clubes que antes alimentavam o futebol argentino também se assustaram com as disputas judiciais com times da Argentina devido à falta de pagamento. “Fazer negócio com os Estados Unidos se tornou o primeiro foco”, diz Ramiro Ruiz, presidente do Envigado, que tem uma das categorias de base mais conceituadas da Colômbia.

O clube vendeu James Rodríguez ao Banfield (ARG) em 2008. De lá, o meia foi direto para a Europa. Mas os argentinos ainda mantêm uma vantagem: vendem com frequência suas promessas diretamente para o futebol europeu, garantindo maior lucro, como nas transferências milionárias de Enzo Fernández ao Chelsea e de Julián Álvarez ao Manchester City, ambos do River Plate e campeões mundiais em 2022.

Historicamente conhecido por contratações envolvendo grandes valores e salários atrativos, o mercado mexicano também está em baixa. “Existe um acordo da liga de baixar os salários dos elencos” e reduzir o número de estrangeiros, explica Rascón. Nos últimos cinco anos, houve queda de gastos (37%) e receitas (50%) com transferências, assim como vendas (34%) e contratações (23%). “Mas um mercado que estava sempre de olho do jogador daqui (Brasil) deu uma sumida”, lamenta Mascagni./ AFP.

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