Morumbi vê pressão por modernização aumentar em meio a alagamentos e reclamações


Pontos de inundações fora e dentro do estádio e do complexo social, dificuldade para chegar e estrutura antiga geram insatisfação dos torcedores e de quem frequenta o local para shows, como foi nesta semana com o Coldplay

Por Ricardo Magatti e Murillo César Alves
Atualização:

Enquanto o Palmeiras comemora há nove anos o sucesso do Allianz Parque e o Corinthians - embora tenha dívida milionária com a Caixa Econômica Federal - também tira proveito da Neo Química Arena, o seu estádio inaugurado também em 2014, e sempre com lotação máxima, o São Paulo convive com críticas em relação ao Morumbi.

Maior estádio particular do Brasil, o Cícero Pompeu de Toledo é, como o Allianz Parque, palco de jogos e shows, incluindo de bandas estelares, como o Coldplay, como ocorreu nesta semana. Foram as apresentações dos britânicos e as chuvas em São Paulo que jogaram luz novamente para um problema antigo no estádio: a infraestrutura no entorno da casa do São Paulo e no interior dela.

Relatos e cenas registradas pelos fãs do Coldplay nos últimos shows da banda no local revelaram pontos de alagamento dentro e fora do Morumbi, desmaios em aglomerações, fãs instalados em regiões improvisadas e confusão nas arquibancadas, além da dificuldade de se deslocar até a casa tricolor. O pior transtorno aconteceu na última segunda-feira, 13. dia em que a forte chuva provocou alagamentos em vários pontos da capital paulista, deixou carros boiando e inundou até uma escola.

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A responsabilidade pelos problemas nos shows do Coldplay, vale lembrar, é da produtora musical Live Nation, que trouxe a banda para o País. Na semana passada, a empresa americana foi notificada pelo Procon, que pediu esclarecimentos sobre superlotação, dificuldade para acessar os locais, alagamentos e a impossibilidade de assistir ao evento.

O alagamento, sobretudo nas ruas que cercam o Morumbi, e o transtorno para chegar ao estádio são problemas históricos do local, como publicou o Estadão em 2 de outubro de 1960, data da inauguração do estádio Cícero Pompeu de Toledo. Segundo o relato da reportagem, “os milhares que se descolaram de automóvel ou ônibus, demoraram duas horas e mais (sic) para efetuar um trajeto que pode se fazer, em circunstâncias normais, em cerca de 10 minutos”.

Enchentes são registradas com frequência nas ruas que cercam o Morumbi. E cenas insólitas, como um torcedor nadando na “piscina” que se formou entre as cadeiras nas arquibancadas, ganharam as capas de várias publicações no passado. Existe uma antiga dificuldade de escoamento da água nas arquibancadas, fato que foi observado durante a série de shows do Colplay nos últimos dias.

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Casa do São Paulo, Morumbi foi inaugurado em 1960 Foto: Alex Silva/Estadão

Desde sua fundação até os anos 1960, o São Paulo passou por diversos estádios - como o Canindé e na Mooca - até chamar o Morumbi de casa. Construído durante quase uma década, o local foi fundamental para urbanizar o bairro homônimo, em uma região afastada da zona oeste de São Paulo. O terreno onde hoje se localiza o estádio foi uma doação do Governo do Estado. O gigante de concreto foi desenhado em 1952 e construído por meio da verba obtida após a venda do Canindé.

Em nota enviada ao Estadão, o São Paulo citou algumas iniciativas que foram feitas para atenuar problemas relacionados às inundações no complexo social e também no estádio. “Construímos um muro de 4,5 metros de altura, que ajuda a evitar que a água entre no complexo do Morumbi. Recuperamos uma galeria, que passa embaixo do estádio, e temos diversas bombas que ajudam a tirar a água em excesso, que entra no clube e no estádio em dias de chuva torrencial. Contamos com um sistema de comportas em todas as entradas e internamente, em salas com potencial para inundações”, mencionou o clube, que ainda informou sobre medidas preventivas.

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“Também temos um controle pluviométrico da região, que a gente consegue prever com grande precisão, quando terá chuvas mais fortes. Isso permite nos preparar melhor. Há ainda um sistema de sirene, que avisa sobre a chegada de uma chuva mais forte e também um sistema de fechamento das comportas em dias de tempestades. Dessa forma, reduzimos drasticamente os efeitos das chuvas dentro do clube”.

E a modernização?

Durante seus mais de 60 anos, o Morumbi passou por algumas pequenas reformas, mas nunca foi realizada uma reestruturação grandiosa. Há estudos, mas não um projeto definido para modernizar o estádio, segundo apurou a reportagem do Estadão. Entre 1994 e 1996, a estrutura, que apresentava falhas, foi modificada. Também foram colocados assentos nas arquibancadas e nas chamadas “gerais”, o que reduziu a capacidade em 10 mil pessoas. Não há nenhuma arquibancada sem cadeira atualmente.

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Anos depois, para se enquadrar no padrão exigido pela Conmebol e receber jogos da Copa América 2019, foi necessária mais uma reforma. Os vestiários foram ampliados e um novo túnel de acesso ao gramado foi construído para que os atletas dos dois times subissem juntos. Também houve adequação para a instalação da cabine do árbitro de vídeo, o VAR, mais recentemente. Os dois telões tiveram sua instalação concluída em meados de maio de 2019 e estão dispostos nas arquibancadas.

Alagamentos dentro do Morumbi e nos arredores são comuns na região Foto: Sérgio Neves/AE

O estádio são-paulino, cabe lembrar, passaria por um processo de remodelação para sediar a abertura da Copa do Mundo de 2014 no Brasil. Ele seria coberto, reformado e modernizado. Deveria ser o local da abertura da competição. No entanto, o clube e o Comitê de São Paulo não entregaram as garantias financeiras referentes ao projeto.

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Surgiu, então, o projeto do estádio do Corinthians, aprovado pela Fifa para ser a sede paulista na Copa depois de articulação coordenada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então no fim de seu segundo mandato, e o ex-presidente do clube, Andrés Sanchez. A arena corintiana sediou a cerimônia de abertura, a primeira partida daquele Mundial, outros três jogos da fase de grupos, um das oitavas e a semifinal entre Argentina e Holanda.

Alagamentos, enchentes e tumultos

Conhecido por seus casarões, prédios luxuosos e zonas arborizadas, o bairro do Morumbi é resultado de loteamentos de fazendas e pequenas chácaras. Registros fotográficos da época da construção do estádio revelam uma zona basicamente rural e pouco povoada. Com a chegada do São Paulo, com seu clube social, a região ganhou relevância até chegar aos seus mais de 45 mil moradores atualmente.

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As enchentes, observadas recentemente durante os shows da banda Coldplay, são recorrentes muito por causa da localização do estádio, do bairro e do clima de São Paulo, além de fatores antrópicos, como a ocupação irregular de terras. Localizada no relevo de Mar de Morros, a região é composta por morros, vales e cercada por córregos.

“Uma das características do relevo paulistano é ter morros com declives bastante acentuados e com esses córregos pronunciados. Isso é uma característica que também vale para o Morumbi”, explica Fábio Adorno Esposito, professor de geografia, doutorando e Mestre em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

O estádio se localiza na parte inferior desse aglomerado de morros e próximo a rios e córregos da região - mas esse fator não é exclusividade da casa do São Paulo, cujo complexo social também é recorrentemente afetado pelas fortes chuvas, com danos causados por inundações que, geralmente, provocam a interdição do espaço.

O Canindé, a Fazendinha - antigo estádio do Corinthians - e o Pacaembu compartilham uma mesma característica: a localização às margens de rios que costumam encher, ao longo de diversas épocas do ano. “Os rios tropicais, como são os localizados, possuem uma característica de cheias sazonais. Os córregos e rios do Morumbi vão desaguar no Pinheiros e, consequentemente, no Tietê”, observa.

Além disso, o próprio clima da capital paulista é propenso para que episódios como os vistos nos dias do show do Coldplay continuem a ocorrer. O volume de chuvas, principalmente nesses primeiros meses do ano, sujeitos à influência do verão, faz com que as cenas se repitam periodicamente.

“São Paulo está sob efeito de um clima tropical de altitude, quente e úmido. Uma das características desse domínio morfoclimático é ter uma umidade e pluviosidade desequilibrados”, analisa Espósito. Em climas como o temperado, as chuvas são bem distribuídas ao longo do ano; no caso de São Paulo, a prefeitura afirma que o mês de março acumulou, até a última terça-feira, 14, 154,6mm, o que equivale aproximadamente a 87% dos 177,6mm esperados para o mês. Ajuda a explicar, mas não convence os torcedores nem os frequentadores de shows, que pagam caro pelos ingressos e querem ser mais bem tratados.

Fora do estádio, a urbanização da região do Morumbi tem influência direta para as enchentes. “A canalização dos córregos e a poluição por falta de tratamento de esgoto agravam a situação. Essas canalizações foram dimensionadas para volumes de chuva muito abaixo dos atuais. Os córregos extravasam e voltam ao leito natural”, explica Ivan Carlos Maglio, engenheiro civil e doutor em saúde ambiental pela USP.

Obra de R$ 152 milhões no entorno

Ao Estadão, a Prefeitura afirmou que a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (SIURB) trabalha na contratação das obras de combate às enchentes na bacia do Córrego Antonico, no Morumbi. Essa intervenção urbana, de acordo com a gestão municipal, “vai minimizar os recorrentes alagamentos na Avenida Jules Rimet, Praça Alfredo Gomes e todo entorno do Estádio do Morumbi”.

O projeto, cuja licitação ainda será publicada, inclui construção de reservatório na Praça Roberto Gomes Pedrosa, canalização do Córrego Antonico na altura do Colégio Visconde de Porto Seguro, entre a praça Alfredo Gomes e Rua Eng. João Ortiz Monteiro e a implantação de novas galerias na Rua Senador Otávio Mangabeira, entre as ruas Eng. João Ortiz Monteiro e Dr. Flavio Américo Maurano.

Morumbi passou por algumas melhorias ao longo de seus 62 anos Foto: Eversol de Freitas/AE

“É necessário um estudo de vulnerabilidade socioambiental sobre o risco climático na região. O bairro do Morumbi, assim como os demais, precisam desse mapeamento e projetos de adaptação aos riscos climáticos”, explica Maglio, que coordenou o plano de ação climática, lançado pela prefeitura de Santos em 2022.

Segundo a prefeitura de São Paulo, o investimento previsto para as obras no entorno do Morumbi é de R$ 152,5 milhões. O plano é que as intervenções programadas reduzam em 87% a mancha de alagamento da região. A execução das obras será dividida entre a Prefeitura e o Governo do Estado. A expectativa é de que as obras comecem neste primeiro semestre. A gestão afirmou também que as galerias da região do Morumbi estão em “perfeito funcionamento” e o volume de água “tem baixado rapidamente” com a limpeza das vias e galeria.

Enquanto o Palmeiras comemora há nove anos o sucesso do Allianz Parque e o Corinthians - embora tenha dívida milionária com a Caixa Econômica Federal - também tira proveito da Neo Química Arena, o seu estádio inaugurado também em 2014, e sempre com lotação máxima, o São Paulo convive com críticas em relação ao Morumbi.

Maior estádio particular do Brasil, o Cícero Pompeu de Toledo é, como o Allianz Parque, palco de jogos e shows, incluindo de bandas estelares, como o Coldplay, como ocorreu nesta semana. Foram as apresentações dos britânicos e as chuvas em São Paulo que jogaram luz novamente para um problema antigo no estádio: a infraestrutura no entorno da casa do São Paulo e no interior dela.

Relatos e cenas registradas pelos fãs do Coldplay nos últimos shows da banda no local revelaram pontos de alagamento dentro e fora do Morumbi, desmaios em aglomerações, fãs instalados em regiões improvisadas e confusão nas arquibancadas, além da dificuldade de se deslocar até a casa tricolor. O pior transtorno aconteceu na última segunda-feira, 13. dia em que a forte chuva provocou alagamentos em vários pontos da capital paulista, deixou carros boiando e inundou até uma escola.

A responsabilidade pelos problemas nos shows do Coldplay, vale lembrar, é da produtora musical Live Nation, que trouxe a banda para o País. Na semana passada, a empresa americana foi notificada pelo Procon, que pediu esclarecimentos sobre superlotação, dificuldade para acessar os locais, alagamentos e a impossibilidade de assistir ao evento.

O alagamento, sobretudo nas ruas que cercam o Morumbi, e o transtorno para chegar ao estádio são problemas históricos do local, como publicou o Estadão em 2 de outubro de 1960, data da inauguração do estádio Cícero Pompeu de Toledo. Segundo o relato da reportagem, “os milhares que se descolaram de automóvel ou ônibus, demoraram duas horas e mais (sic) para efetuar um trajeto que pode se fazer, em circunstâncias normais, em cerca de 10 minutos”.

Enchentes são registradas com frequência nas ruas que cercam o Morumbi. E cenas insólitas, como um torcedor nadando na “piscina” que se formou entre as cadeiras nas arquibancadas, ganharam as capas de várias publicações no passado. Existe uma antiga dificuldade de escoamento da água nas arquibancadas, fato que foi observado durante a série de shows do Colplay nos últimos dias.

Casa do São Paulo, Morumbi foi inaugurado em 1960 Foto: Alex Silva/Estadão

Desde sua fundação até os anos 1960, o São Paulo passou por diversos estádios - como o Canindé e na Mooca - até chamar o Morumbi de casa. Construído durante quase uma década, o local foi fundamental para urbanizar o bairro homônimo, em uma região afastada da zona oeste de São Paulo. O terreno onde hoje se localiza o estádio foi uma doação do Governo do Estado. O gigante de concreto foi desenhado em 1952 e construído por meio da verba obtida após a venda do Canindé.

Em nota enviada ao Estadão, o São Paulo citou algumas iniciativas que foram feitas para atenuar problemas relacionados às inundações no complexo social e também no estádio. “Construímos um muro de 4,5 metros de altura, que ajuda a evitar que a água entre no complexo do Morumbi. Recuperamos uma galeria, que passa embaixo do estádio, e temos diversas bombas que ajudam a tirar a água em excesso, que entra no clube e no estádio em dias de chuva torrencial. Contamos com um sistema de comportas em todas as entradas e internamente, em salas com potencial para inundações”, mencionou o clube, que ainda informou sobre medidas preventivas.

“Também temos um controle pluviométrico da região, que a gente consegue prever com grande precisão, quando terá chuvas mais fortes. Isso permite nos preparar melhor. Há ainda um sistema de sirene, que avisa sobre a chegada de uma chuva mais forte e também um sistema de fechamento das comportas em dias de tempestades. Dessa forma, reduzimos drasticamente os efeitos das chuvas dentro do clube”.

E a modernização?

Durante seus mais de 60 anos, o Morumbi passou por algumas pequenas reformas, mas nunca foi realizada uma reestruturação grandiosa. Há estudos, mas não um projeto definido para modernizar o estádio, segundo apurou a reportagem do Estadão. Entre 1994 e 1996, a estrutura, que apresentava falhas, foi modificada. Também foram colocados assentos nas arquibancadas e nas chamadas “gerais”, o que reduziu a capacidade em 10 mil pessoas. Não há nenhuma arquibancada sem cadeira atualmente.

Anos depois, para se enquadrar no padrão exigido pela Conmebol e receber jogos da Copa América 2019, foi necessária mais uma reforma. Os vestiários foram ampliados e um novo túnel de acesso ao gramado foi construído para que os atletas dos dois times subissem juntos. Também houve adequação para a instalação da cabine do árbitro de vídeo, o VAR, mais recentemente. Os dois telões tiveram sua instalação concluída em meados de maio de 2019 e estão dispostos nas arquibancadas.

Alagamentos dentro do Morumbi e nos arredores são comuns na região Foto: Sérgio Neves/AE

O estádio são-paulino, cabe lembrar, passaria por um processo de remodelação para sediar a abertura da Copa do Mundo de 2014 no Brasil. Ele seria coberto, reformado e modernizado. Deveria ser o local da abertura da competição. No entanto, o clube e o Comitê de São Paulo não entregaram as garantias financeiras referentes ao projeto.

Surgiu, então, o projeto do estádio do Corinthians, aprovado pela Fifa para ser a sede paulista na Copa depois de articulação coordenada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então no fim de seu segundo mandato, e o ex-presidente do clube, Andrés Sanchez. A arena corintiana sediou a cerimônia de abertura, a primeira partida daquele Mundial, outros três jogos da fase de grupos, um das oitavas e a semifinal entre Argentina e Holanda.

Alagamentos, enchentes e tumultos

Conhecido por seus casarões, prédios luxuosos e zonas arborizadas, o bairro do Morumbi é resultado de loteamentos de fazendas e pequenas chácaras. Registros fotográficos da época da construção do estádio revelam uma zona basicamente rural e pouco povoada. Com a chegada do São Paulo, com seu clube social, a região ganhou relevância até chegar aos seus mais de 45 mil moradores atualmente.

As enchentes, observadas recentemente durante os shows da banda Coldplay, são recorrentes muito por causa da localização do estádio, do bairro e do clima de São Paulo, além de fatores antrópicos, como a ocupação irregular de terras. Localizada no relevo de Mar de Morros, a região é composta por morros, vales e cercada por córregos.

“Uma das características do relevo paulistano é ter morros com declives bastante acentuados e com esses córregos pronunciados. Isso é uma característica que também vale para o Morumbi”, explica Fábio Adorno Esposito, professor de geografia, doutorando e Mestre em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

O estádio se localiza na parte inferior desse aglomerado de morros e próximo a rios e córregos da região - mas esse fator não é exclusividade da casa do São Paulo, cujo complexo social também é recorrentemente afetado pelas fortes chuvas, com danos causados por inundações que, geralmente, provocam a interdição do espaço.

O Canindé, a Fazendinha - antigo estádio do Corinthians - e o Pacaembu compartilham uma mesma característica: a localização às margens de rios que costumam encher, ao longo de diversas épocas do ano. “Os rios tropicais, como são os localizados, possuem uma característica de cheias sazonais. Os córregos e rios do Morumbi vão desaguar no Pinheiros e, consequentemente, no Tietê”, observa.

Além disso, o próprio clima da capital paulista é propenso para que episódios como os vistos nos dias do show do Coldplay continuem a ocorrer. O volume de chuvas, principalmente nesses primeiros meses do ano, sujeitos à influência do verão, faz com que as cenas se repitam periodicamente.

“São Paulo está sob efeito de um clima tropical de altitude, quente e úmido. Uma das características desse domínio morfoclimático é ter uma umidade e pluviosidade desequilibrados”, analisa Espósito. Em climas como o temperado, as chuvas são bem distribuídas ao longo do ano; no caso de São Paulo, a prefeitura afirma que o mês de março acumulou, até a última terça-feira, 14, 154,6mm, o que equivale aproximadamente a 87% dos 177,6mm esperados para o mês. Ajuda a explicar, mas não convence os torcedores nem os frequentadores de shows, que pagam caro pelos ingressos e querem ser mais bem tratados.

Fora do estádio, a urbanização da região do Morumbi tem influência direta para as enchentes. “A canalização dos córregos e a poluição por falta de tratamento de esgoto agravam a situação. Essas canalizações foram dimensionadas para volumes de chuva muito abaixo dos atuais. Os córregos extravasam e voltam ao leito natural”, explica Ivan Carlos Maglio, engenheiro civil e doutor em saúde ambiental pela USP.

Obra de R$ 152 milhões no entorno

Ao Estadão, a Prefeitura afirmou que a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (SIURB) trabalha na contratação das obras de combate às enchentes na bacia do Córrego Antonico, no Morumbi. Essa intervenção urbana, de acordo com a gestão municipal, “vai minimizar os recorrentes alagamentos na Avenida Jules Rimet, Praça Alfredo Gomes e todo entorno do Estádio do Morumbi”.

O projeto, cuja licitação ainda será publicada, inclui construção de reservatório na Praça Roberto Gomes Pedrosa, canalização do Córrego Antonico na altura do Colégio Visconde de Porto Seguro, entre a praça Alfredo Gomes e Rua Eng. João Ortiz Monteiro e a implantação de novas galerias na Rua Senador Otávio Mangabeira, entre as ruas Eng. João Ortiz Monteiro e Dr. Flavio Américo Maurano.

Morumbi passou por algumas melhorias ao longo de seus 62 anos Foto: Eversol de Freitas/AE

“É necessário um estudo de vulnerabilidade socioambiental sobre o risco climático na região. O bairro do Morumbi, assim como os demais, precisam desse mapeamento e projetos de adaptação aos riscos climáticos”, explica Maglio, que coordenou o plano de ação climática, lançado pela prefeitura de Santos em 2022.

Segundo a prefeitura de São Paulo, o investimento previsto para as obras no entorno do Morumbi é de R$ 152,5 milhões. O plano é que as intervenções programadas reduzam em 87% a mancha de alagamento da região. A execução das obras será dividida entre a Prefeitura e o Governo do Estado. A expectativa é de que as obras comecem neste primeiro semestre. A gestão afirmou também que as galerias da região do Morumbi estão em “perfeito funcionamento” e o volume de água “tem baixado rapidamente” com a limpeza das vias e galeria.

Enquanto o Palmeiras comemora há nove anos o sucesso do Allianz Parque e o Corinthians - embora tenha dívida milionária com a Caixa Econômica Federal - também tira proveito da Neo Química Arena, o seu estádio inaugurado também em 2014, e sempre com lotação máxima, o São Paulo convive com críticas em relação ao Morumbi.

Maior estádio particular do Brasil, o Cícero Pompeu de Toledo é, como o Allianz Parque, palco de jogos e shows, incluindo de bandas estelares, como o Coldplay, como ocorreu nesta semana. Foram as apresentações dos britânicos e as chuvas em São Paulo que jogaram luz novamente para um problema antigo no estádio: a infraestrutura no entorno da casa do São Paulo e no interior dela.

Relatos e cenas registradas pelos fãs do Coldplay nos últimos shows da banda no local revelaram pontos de alagamento dentro e fora do Morumbi, desmaios em aglomerações, fãs instalados em regiões improvisadas e confusão nas arquibancadas, além da dificuldade de se deslocar até a casa tricolor. O pior transtorno aconteceu na última segunda-feira, 13. dia em que a forte chuva provocou alagamentos em vários pontos da capital paulista, deixou carros boiando e inundou até uma escola.

A responsabilidade pelos problemas nos shows do Coldplay, vale lembrar, é da produtora musical Live Nation, que trouxe a banda para o País. Na semana passada, a empresa americana foi notificada pelo Procon, que pediu esclarecimentos sobre superlotação, dificuldade para acessar os locais, alagamentos e a impossibilidade de assistir ao evento.

O alagamento, sobretudo nas ruas que cercam o Morumbi, e o transtorno para chegar ao estádio são problemas históricos do local, como publicou o Estadão em 2 de outubro de 1960, data da inauguração do estádio Cícero Pompeu de Toledo. Segundo o relato da reportagem, “os milhares que se descolaram de automóvel ou ônibus, demoraram duas horas e mais (sic) para efetuar um trajeto que pode se fazer, em circunstâncias normais, em cerca de 10 minutos”.

Enchentes são registradas com frequência nas ruas que cercam o Morumbi. E cenas insólitas, como um torcedor nadando na “piscina” que se formou entre as cadeiras nas arquibancadas, ganharam as capas de várias publicações no passado. Existe uma antiga dificuldade de escoamento da água nas arquibancadas, fato que foi observado durante a série de shows do Colplay nos últimos dias.

Casa do São Paulo, Morumbi foi inaugurado em 1960 Foto: Alex Silva/Estadão

Desde sua fundação até os anos 1960, o São Paulo passou por diversos estádios - como o Canindé e na Mooca - até chamar o Morumbi de casa. Construído durante quase uma década, o local foi fundamental para urbanizar o bairro homônimo, em uma região afastada da zona oeste de São Paulo. O terreno onde hoje se localiza o estádio foi uma doação do Governo do Estado. O gigante de concreto foi desenhado em 1952 e construído por meio da verba obtida após a venda do Canindé.

Em nota enviada ao Estadão, o São Paulo citou algumas iniciativas que foram feitas para atenuar problemas relacionados às inundações no complexo social e também no estádio. “Construímos um muro de 4,5 metros de altura, que ajuda a evitar que a água entre no complexo do Morumbi. Recuperamos uma galeria, que passa embaixo do estádio, e temos diversas bombas que ajudam a tirar a água em excesso, que entra no clube e no estádio em dias de chuva torrencial. Contamos com um sistema de comportas em todas as entradas e internamente, em salas com potencial para inundações”, mencionou o clube, que ainda informou sobre medidas preventivas.

“Também temos um controle pluviométrico da região, que a gente consegue prever com grande precisão, quando terá chuvas mais fortes. Isso permite nos preparar melhor. Há ainda um sistema de sirene, que avisa sobre a chegada de uma chuva mais forte e também um sistema de fechamento das comportas em dias de tempestades. Dessa forma, reduzimos drasticamente os efeitos das chuvas dentro do clube”.

E a modernização?

Durante seus mais de 60 anos, o Morumbi passou por algumas pequenas reformas, mas nunca foi realizada uma reestruturação grandiosa. Há estudos, mas não um projeto definido para modernizar o estádio, segundo apurou a reportagem do Estadão. Entre 1994 e 1996, a estrutura, que apresentava falhas, foi modificada. Também foram colocados assentos nas arquibancadas e nas chamadas “gerais”, o que reduziu a capacidade em 10 mil pessoas. Não há nenhuma arquibancada sem cadeira atualmente.

Anos depois, para se enquadrar no padrão exigido pela Conmebol e receber jogos da Copa América 2019, foi necessária mais uma reforma. Os vestiários foram ampliados e um novo túnel de acesso ao gramado foi construído para que os atletas dos dois times subissem juntos. Também houve adequação para a instalação da cabine do árbitro de vídeo, o VAR, mais recentemente. Os dois telões tiveram sua instalação concluída em meados de maio de 2019 e estão dispostos nas arquibancadas.

Alagamentos dentro do Morumbi e nos arredores são comuns na região Foto: Sérgio Neves/AE

O estádio são-paulino, cabe lembrar, passaria por um processo de remodelação para sediar a abertura da Copa do Mundo de 2014 no Brasil. Ele seria coberto, reformado e modernizado. Deveria ser o local da abertura da competição. No entanto, o clube e o Comitê de São Paulo não entregaram as garantias financeiras referentes ao projeto.

Surgiu, então, o projeto do estádio do Corinthians, aprovado pela Fifa para ser a sede paulista na Copa depois de articulação coordenada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então no fim de seu segundo mandato, e o ex-presidente do clube, Andrés Sanchez. A arena corintiana sediou a cerimônia de abertura, a primeira partida daquele Mundial, outros três jogos da fase de grupos, um das oitavas e a semifinal entre Argentina e Holanda.

Alagamentos, enchentes e tumultos

Conhecido por seus casarões, prédios luxuosos e zonas arborizadas, o bairro do Morumbi é resultado de loteamentos de fazendas e pequenas chácaras. Registros fotográficos da época da construção do estádio revelam uma zona basicamente rural e pouco povoada. Com a chegada do São Paulo, com seu clube social, a região ganhou relevância até chegar aos seus mais de 45 mil moradores atualmente.

As enchentes, observadas recentemente durante os shows da banda Coldplay, são recorrentes muito por causa da localização do estádio, do bairro e do clima de São Paulo, além de fatores antrópicos, como a ocupação irregular de terras. Localizada no relevo de Mar de Morros, a região é composta por morros, vales e cercada por córregos.

“Uma das características do relevo paulistano é ter morros com declives bastante acentuados e com esses córregos pronunciados. Isso é uma característica que também vale para o Morumbi”, explica Fábio Adorno Esposito, professor de geografia, doutorando e Mestre em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

O estádio se localiza na parte inferior desse aglomerado de morros e próximo a rios e córregos da região - mas esse fator não é exclusividade da casa do São Paulo, cujo complexo social também é recorrentemente afetado pelas fortes chuvas, com danos causados por inundações que, geralmente, provocam a interdição do espaço.

O Canindé, a Fazendinha - antigo estádio do Corinthians - e o Pacaembu compartilham uma mesma característica: a localização às margens de rios que costumam encher, ao longo de diversas épocas do ano. “Os rios tropicais, como são os localizados, possuem uma característica de cheias sazonais. Os córregos e rios do Morumbi vão desaguar no Pinheiros e, consequentemente, no Tietê”, observa.

Além disso, o próprio clima da capital paulista é propenso para que episódios como os vistos nos dias do show do Coldplay continuem a ocorrer. O volume de chuvas, principalmente nesses primeiros meses do ano, sujeitos à influência do verão, faz com que as cenas se repitam periodicamente.

“São Paulo está sob efeito de um clima tropical de altitude, quente e úmido. Uma das características desse domínio morfoclimático é ter uma umidade e pluviosidade desequilibrados”, analisa Espósito. Em climas como o temperado, as chuvas são bem distribuídas ao longo do ano; no caso de São Paulo, a prefeitura afirma que o mês de março acumulou, até a última terça-feira, 14, 154,6mm, o que equivale aproximadamente a 87% dos 177,6mm esperados para o mês. Ajuda a explicar, mas não convence os torcedores nem os frequentadores de shows, que pagam caro pelos ingressos e querem ser mais bem tratados.

Fora do estádio, a urbanização da região do Morumbi tem influência direta para as enchentes. “A canalização dos córregos e a poluição por falta de tratamento de esgoto agravam a situação. Essas canalizações foram dimensionadas para volumes de chuva muito abaixo dos atuais. Os córregos extravasam e voltam ao leito natural”, explica Ivan Carlos Maglio, engenheiro civil e doutor em saúde ambiental pela USP.

Obra de R$ 152 milhões no entorno

Ao Estadão, a Prefeitura afirmou que a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (SIURB) trabalha na contratação das obras de combate às enchentes na bacia do Córrego Antonico, no Morumbi. Essa intervenção urbana, de acordo com a gestão municipal, “vai minimizar os recorrentes alagamentos na Avenida Jules Rimet, Praça Alfredo Gomes e todo entorno do Estádio do Morumbi”.

O projeto, cuja licitação ainda será publicada, inclui construção de reservatório na Praça Roberto Gomes Pedrosa, canalização do Córrego Antonico na altura do Colégio Visconde de Porto Seguro, entre a praça Alfredo Gomes e Rua Eng. João Ortiz Monteiro e a implantação de novas galerias na Rua Senador Otávio Mangabeira, entre as ruas Eng. João Ortiz Monteiro e Dr. Flavio Américo Maurano.

Morumbi passou por algumas melhorias ao longo de seus 62 anos Foto: Eversol de Freitas/AE

“É necessário um estudo de vulnerabilidade socioambiental sobre o risco climático na região. O bairro do Morumbi, assim como os demais, precisam desse mapeamento e projetos de adaptação aos riscos climáticos”, explica Maglio, que coordenou o plano de ação climática, lançado pela prefeitura de Santos em 2022.

Segundo a prefeitura de São Paulo, o investimento previsto para as obras no entorno do Morumbi é de R$ 152,5 milhões. O plano é que as intervenções programadas reduzam em 87% a mancha de alagamento da região. A execução das obras será dividida entre a Prefeitura e o Governo do Estado. A expectativa é de que as obras comecem neste primeiro semestre. A gestão afirmou também que as galerias da região do Morumbi estão em “perfeito funcionamento” e o volume de água “tem baixado rapidamente” com a limpeza das vias e galeria.

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