O América de Natal é um time de tradição, com 15 participações na elite do futebol brasileiro, mas não disputa a primeira divisão desde 2007 e esteve na Série B pela última vez há dez anos, em 2014. Fora suas aparições pontuais em edições da Copa do Brasil, como fará nesta quarta-feira contra o Corinthians, passa longe do olhar do grande público, situação que pretende mudar em curto prazo nos próximos anos.
Como tantos no caminho da reconstrução, o clube potiguar apostou no modelo de Sociedade Anônima de Futebol (SAF) e concluiu a transição em setembro do ano passado. No meio do caminho de transformação, caiu da Série C para Série D, o que atrapalhou os planos, porém sem desanimar os investidores, reunidos dentro do grupo HI.PE S/A, que adquiriu 80% da SAF.
O lateral-esquerdo Marcelo, do Fluminense, tem participação na sociedade por meio de sua holding, a Doze. Anteriormente, foi acionista do Azuriz, do Paraná, ao lado dos mesmos investidores que formam a HI.PE. O jogador de 38 anos resolveu colocar dinheiro em clubes de futebol a partir de sua proximidade com Pedro Weber, economista que atuou como representante do grupo durante as negociações com o América e hoje é CEO da SAF do clube.
“A agência de representação do meu irmão foi a agência que cuidou do Marcelo por muito tempo. Aí, no Azuris, ele já entrou como investidor e saiu com o investidor, vamos dizer assim, na venda. E aí, entrou de novo no América. Então, já tem uma relação de bastante confiança e ele está cada vez mais entusiasmado”, conta Weber ao Estadão.
A ideia é que, quando Marcelo se aposentar dos gramados, passe a associar mais sua imagem à do time potiguar. Por enquanto, ele tem se dedicado a manifestações discretas de apoio, como uma publicação no Instagram no dia em que o time passou pelo São Luiz na segunda fase da Copa do Brasil e se classificou para enfrentar o Corinthians. “Ainda tem essa essa limitação de poder participar mais. Ele às vezes posta no Instagram, mas ainda é uma relação mais de investidor à distância, que está sempre ajudando, participando de tudo”.
Ainda jogador do Fluminense, o lateral-esquerdo pode enfrentar o próprio time no qual investe caso a zebra se faça presente nos duelos entre América e Corinthians, pela terceira fase da Copa do Brasil. O primeiro é nesta quarta-feira, às 20 horas, na Arena das Dunos, e o segundo é apenas no dia 21, na Neo Química Arena. O Fluminense está disputando vaga com o Sampaio Corrêa. Da terceira fase, os times passam para as oitavas de final, que terão os duelos definidos por sorteio. Assim, caso o time de Natal e os tricolores do Rio passem, podem se cruzar.
A escolha pelo América
Depois da experiência com o Azuriz, clube-empresa voltado à formação de atletas e revendido em dezembro de 2022, o grupo, atento à aprovação da lei da SAF, passou procurar um time com torcida consolidada para investir. Estudaram cerca de 16 clubes, como Santa Cruz, Paraná, Avaí e Figueirense, mas entenderam que o América-RN era o time ideal para o projeto.
“Vimos um clube muito tradicional, que estava vindo de seis anos de série D e com um acesso à série C, mas, vamos dizer assim, bem parado no tempo. Sem estrutura de CT, ainda numa operação muito amadora de de gestão. A associação recebe com aluguéis de receita recorrente, mas sem dívidas. Estava arrumadinho neste sentido”, diz Weber. “Por isso falamos em ‘SAF do futuro’. Entramos para impulsionar o crescimento, botar a estrutura no CT, impactar mesmo com um orçamento grande, mais do que a receita recorrente do clube, para recuperar o clube nos próximos três, quatro anos.”
O planejamento para os próximos cinco anos inclui um investimento de até R$ 174 milhões, que vai depender das metas desportivas alcançadas, especialmente os acessos de divisão. Deste montante, R$ 10 milhões são destinados ao CT, que já recebeu mais de R$ 3 milhões em melhorias desde a chegada do grupo. “A divisão depende muito. Esse ano a gente está com, provavelmente, um dos maiores orçamentos da Série D, bem acima. É um orçamento que seria para a Série C”.
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Início traumático e expectativa em 2024
A ideia inicial era assumir o clube na Série C, mas a queda de divisão no ano passado atrasou os planos. Durante a campanha do rebaixamento, a HI.PE ainda não havia concluído o processo de SAF. Assinou, contudo, uma vinculante com o América em maio e entrou com um aporte financeiro, parecido ao que foi feito entre Vasco e 777 Partners. Webber classifica o período como traumático.
“Não deu certo. Vieram reforços, dividiu o grupo... Enfim, fez um efeito contrário, bem dividido. Tinha bastante tumulto na construção da SAF até o fechamento e acabou acabou dando tudo errado. Foi legal que os investidores continuaram super convictos com a operação, mesmo caindo. A gente enxerga que o valor da América não está na divisão. Está no tamanho, na grandeza da torcida”, afirma.
O investimento feito no CT inclui a Arena América, que se encontra dentro das mesmas dependências. O estádio, que já recebeu melhorias e comporta 5 mil torcedores, é visto como uma alternativa para mandar jogos quando a Arena das Dunas não estiver disponível.
Além do resgate do local, a gestão promete desenvolver mais a formação de base do clube e já aprimorou o programa de sócio-torcedor, que atingiu a marca recorde de 23 mil sócios. Em sua diretoria, tem nomes como Marcelo Sant’Ana, ex-presidente do Bahia, no cargo de executivo de futebol, e Bruno Dias, ex-Flamengo, no comando do marketing.
Em campo, o América, atual campeão potiguar, sustenta uma invencibilidade de 16 jogos em partidas de Copa do Brasil, Copa do Nordeste, Estadual e Série D. São nove vitórias, sete empates, 25 gols marcados e nove sofridos. No total desta temporada, em 24 jogos, o time comandando pelo técnico Marquinhos Santos somou 13 vitórias, nove empates e três derrotas, a última no dia 15 de fevereiro, para o Bahia.