Oponente de Leila Pereira na eleição à presidência do Palmeiras, Savério Orlandi faz reiteradas críticas à empresária favorita à reeleição no pleito marcado para novembro. Ele afirma que, embora não pareça, há bastante insatisfação no clube em relação à gestão da mandatária. Sua visão é de que a dirigente usa a agremiação para se autopromover e beneficiar suas empresas.
“Essa insatisfação é por causa do caráter da atual gestão, um caráter personalíssimo, que tem na autopromoção o seu grande viés, o que traz outros problemas, como o comprometimento da democracia, a diminuição da transparência, uma visão imediatista - e não de média e curto prazo”, afirma Savério em entrevista ao Estadão. Conselheiro do Palmeiras há 23 anos, o advogado diz que seu maior desafio é mostrar que a situação financeira do Palmeiras não é tão confortável como parece e que os dez anos de glória do time, com títulos empilhados consecutivamente, não são resultado das ações de Leila.
“O futebol do Palmeiras se consolidou num patamar não por causa de uma pessoa, tampouco por causa da Leila”, diz o advogado, diretor de futebol do Palmeiras entre 2007 e 2010. “É um patamar que é irreversível em termos de excelência, é um lugar muito difícil de sair. O bom e barato não vai voltar, esse caminho não tem volta”. Sua ideia, caso desbanque Leila, é profissionalizar o departamento de marketing e investir em um reforço midiático, embora não mencione nomes.
Por que decidiu ser candidato à presidência do Palmeiras?
Basicamente porque existe muita insatisfação dentro do clube, embora não pareça para quem está fora. Existe uma aparente sensação de conforto financeiro, mas não é uma situação de absoluto conforto, existem problemas para pagar conta, há muito a fazer nesse aspecto. Existe uma insatisfação, seja entre conselheiros seja entre associados do clube. Sou abordado pelas pessoas com demandas específicas, são coisas relevantes, não reclamações corriqueiras. Há insatisfação muito grande também na própria coletividade, fora do clube, torcedor, organizado ou não, formadores de opinião, enfim, pessoas ligadas ao Palmeiras. Essa insatisfação é por causa do caráter da atual gestão, um caráter personalíssimo, que tem na autopromoção o seu grande viés, o que traz outros problemas, como o comprometimento da democracia, a diminuição da transparência, uma visão imediatista - e não de média e curto prazo. O nosso plano de gestão passa por uma visão de futuro. Inegavelmente, a gestão de hoje tem pensamento de curto prazo, ela pensa até o dia em que ela estiver no clube, tanto que ela falou já sobre o dia em que ela sair como vai ficar o Palmeiras. Isso é complicado, o São Paulo passou por isso na década passada. Não estou dizendo que vai acontecer a mesma coisa, mas existe o receio.
Os associados e os palmeirenses de fora do clube têm a percepção de que o clube não está tão bem como parece, como você diz?
Para o associado é flagrante essa percepção. Tem problemas no uso dos equipamentos, adensamento muito grande, tem muitos problemas. Quem está do lado de fora, especialmente quem não tem nenhuma ligação ao clube social, acaba tendo uma visão mais restrita, até porque não é do interesse dele ter uma visão maior. O torcedor, em geral, não quer saber, se o momento esportivo é bom ele não quer saber do clube social.
Seu maior desafio é tentar convencer as pessoas de que são necessárias mudanças na gestão do Palmeiras?
Sim, é o maior. As pessoas se esquecem de algumas situações. Por exemplo: no começo da gestão (atual) haviam departamentos que não cobravam taxas e passaram a cobrar, houve taxas que sofreram acréscimos, existiu a história da reforma da piscina que demorou três anos para fazer. No início da gestão, essas medidas menos simpáticas eram mais sensíveis. As coisas vão melhorando, se acomodando, ela (Leila) patrocina shows, eventos, com acesso à cerveja de graça, e o associado acaba esquecendo tudo o que passou no início da gestão. O clube é superavitário, então, em cima desse resultado, o clube tem que se reinvestir, já que não é uma empresa, não distribui dividendos, o que sobra no caixa tem que ser destinado a investimento. Hoje, o clube tem fontes de receita para pagar pela sua piscina, pela sauna, para fazer adaptação numa quadra de beach tênis. O associado não pode esperar um mecenato.
O que você quer resgatar que não existe mais hoje no clube?
A participação, a democracia, a transparência. Existe um patrulhamento enorme hoje no clube, algo que não acontecia. Sou conselheiro há 23 anos, mesmo nos anos difíceis, na época do Mustafá (Contursi), havia debate, se permitiam discussões, a oposição se manifestava, propunha emendas. Na eleição do Mustafá contra o (Luiz Gonzaga) Belluzzo (ex-presidente) os dois sentaram juntos, na primeira fileira, se cumprimentaram. Posso te dar vários exemplos. Ora, o que aconteceu em menos de oito anos para a gente chegar onde estamos? O debate está reduzido. Eu, por exemplo, enderecei ao Palmeiras um convite que recebi para o Palmeiras integrar o movimento pela integridade no futebol, que vai transformar a gestão dos clubes do Brasil, e o clube não responde. Por quê? Por que o Savério indicou ou por que não há interesse em trilhar o caminho das boas práticas. Existe, também, retaliação por meio de ação judicial. Aconteceu com o (ex-presidente) Mustafá (Contursi), com a Mancha Verde, com outros conselheiros.
A transparência, hoje, é outro grande problema. Quando você tem uma pessoa que ocupa vários lugares na mesma relação, tem que ter regulamentação, uma disciplina que explique como essas relações se dão. Não é simplesmente falar que a CBF permite que seja assim. Não sabemos em que condições se dão as viagens (com o avião da presidente Leila).
Qual você considera ser o maior problema da gestão atual?
É o enredamento em que a instituição está. A presidente tornou, na prática, mais um CNPJ de um grupo empresarial dela. Esse é o grande problema. A inauguração do Allianz Parque foi o elemento transformador da nossa história. O Paulo Nobre era o cara certo no lugar certo e, na retaguarda desse elemento transformador, trouxe muita coisa que foi perenizada como procedimento dentro do clube, com os resultados expressivos dessa década. O Palmeiras está no melhor momento da visibilidade da sua marca, mas estamos encastelados por ela (Leila). Ninguém se aproxima do Palmeiras no momento em que ele é a noiva do dia, em que as empresas querem fazer negócios. Não é só patrocínio na camisa do futebol, tem outros negócios para sair.
A presidente Leila Pereira diz que você apenas debate ideias e que ela executa, é uma executiva.
Eu acho uma colocação muito inadequada, mas, na parte que me toca, não me sinto ofendido e magoado. Causa espécie em mim a pessoa falar que não gosta de debater. O líder de verdade é um debatedor de ideias. Não existe um ambiente decisivo sem ouvir, sem debater, é muito fácil a pessoa dizer “eu sou da execução”. É desconexo ela falar isso. O que ela faz? Toma decisões e não pensa, não ouve outro lado? Qualquer líder executa, mas, para alcançar isso, você precisa estressar uma ideia. Não vejo nenhum ambiente negocial sadio que não passe pela discussão e pela troca de ideias.
Como seria o departamento de marketing na sua gestão?
Um dos nossos pilares do plano de gestão é a profissionalização 100% da diretoria de marketing. A ideia é ter diretor remunerado, com remuneração de mercado, razoável, com critérios variáveis. E teria uma mudança de filosofia: o Palmeiras precisa ter uma abrangência maior. Tem que mudar essa mentalidade atual. Hoje, o departamento de marketing do Palmeiras está muito atrás dos clubes que têm gestões mais profissionais. A primeira estrutura de marketing ligada ao futebol foi na minha passagem como diretor de futebol. Teve a camisa verde limão, em 2007. Foi aí que as coisas começaram, de dentro pra fora.
Você faria mudanças significativas no departamento de futebol?
Num curto prazo, temos um campeonato importantíssimo, que é o Mundial, e temos que ir lá (nos Estados Unidos) pra ganhar. Em médio prazo, temos duas decisões importantes: sobre o comando técnico, o Abel tem contrato até o fim de 2025, e temos a transição de elenco também. O elenco foi bastante esticado, tem peças perto do fim do contrato.
O futebol do Palmeiras se consolidou num patamar não por causa de uma pessoa, tampouco por causa da Leila. É um patamar que é irreversível em termos de excelência, é um lugar muito difícil de sair. O torcedor tem que ter essa segurança. Estamos falando de aprimoramento, de aperfeiçoamento. A Leila pegou um modelo pronto. Esse processo passa por cinco pessoas: João Paulo Sampaio e Erasmo Damiani na base, por Alexandre Mattos e Anderson Barros no futebol profissional e pelo Cícero Souza, que, pra mim, é a pessoa mais importante nesse processo. O Palmeiras tem uma estrutura inabalável, que anda por si. O bom e barato não vai voltar, esse caminho não tem volta.
Contrataria algum reforço de grande impacto?
Savério Orlandi, candidato à presidência do Palmeiras
É possível reduzir os preços dos ingressos?
A presidente, na eleição passada, fez algumas promessas para a torcida organizada e não cumpriu porque não poderia entregar. Se tivesse conhecimento, saberia. Existe uma cláusula de precificação no contrato com a WTorre, esse contrato vale para os dois lados. Não posso falar que vai ter um setor popular, mas é fato que o Palmeiras erra a mão na precificação em determinados jogos. Posso analisar e mudar os preços sobretudo nos jogos de menor afluência, é uma promessa que posso fazer. E criar alternativas para esses jogos de menor afluência para ter mais público.
O Palmeiras, caso você seja eleito, vai investir em outros esportes além do futebol?
Com certeza. O Palmeiras é uma Sociedade Esportiva e tem essa característica de ter outras modalidades esportivas profissionais. Não é difícil arrumar patrocínio. O Palmeiras, se for a campo, vai trazer.
Na sua gestão, o Palmeiras jogaria na Arena Barueri, hoje administrada por uma empresa da Leila Pereira?
Jogaria. Não vejo problema nenhum, mas é importante que eu Palmeiras considere diversas opções quando não tiver o Allianz Parque. A Arena Barueri não é a segunda casa do Palmeiras. O Palmeiras tem uma casa só. Na impossibilidade de jogar na nossa casa, temos que pensar em alternativas. Tem o Pacaembu, tem estádios de cidades do interior. Do jeito que está hoje tem conflito de interesses, está materializado. E a presidente viu que o Abel não gosta e que os jogadores não gostam de jogar lá.
O que mudaria quanto à gestão do time feminino?
A primeira medida é trazer o time para São Paulo. O estádio do Nacional seria uma opção interessante, daria pra mandar jogos tranquilamente. Temos que pensar em desenvolver o público do futebol feminino. Não dá pra pensar que terá um deslocamento de torcedor do futebol masculino para o feminino. É preciso criar estratégias, na minha visão.