Como o Brasil se tornou uma potência paralímpica e quebrou recordes em Paris


País bateu marcas na edição 2024 e teve virada de chave após investimentos voltados especificamente para os atletas paralímpicos

Por Vinícius Harfush
Atualização:

No dia 28 de agosto, o Brasil iniciou a caminhada em busca de uma marca histórica no esporte paralímpico. A conquista veio: a 400ª medalha em Jogos. Na edição de Paris-2024, a delegação do Comitê Paralímpico do Brasil (CPB) é composta por 255 atletas com deficiência, um recorde para o País.

Aliás, a palavra “recorde” é muito mais comum do que se imagina quando falamos do desempenho de brasileiros nas Paralimpíadas. Neste ano, o Brasil também buscou sua melhor colocação no quadro geral de medalhas (até então um 7º lugar em Tóquio) e superou a marca de 72 pódios conquistados na última edição dos Jogos. Diante do cenário positivo, é fácil determinar que o Brasil é uma potência paralímpica mundial. Mas qual a razão para esse desempenho de alto nível?

Aline dos Santos Rocha e Vanessa Cristina de Souza competindo nos Jogos Parapan-Americanos de Santiago, 2023 Foto: Cris Mattos/CPB
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A resposta é, de fato, complexa, mas é possível traçar um caminho feito pelas organizações e atletas paralímpicos ao longo das últimas décadas e que explicam o salto de qualidade que o Brasil teve e que foi obtido nas provas na capital francesa.

As principais razões que apontam o País como um dos destaques paralímpicos passam desde a lógica de que os investimentos geram resultados, principalmente a longo prazo, até um contexto social que é muito forte no Brasil. Em um país onde as pessoas com deficiência encontram barreiras para praticar suas atividades mais simples do dia a dia nas ruas de quase todas as cidades, o esporte surge como uma realidade onde há, de fato, uma valorização diante do esforço e evolução constante de quem tem alguma limitação.

E a combinação desses fatores com o talento de cada um dos atletas, vem colocando o Brasil como um destaque mundial. De 2008, na edição de Pequim, para cá, o País sempre figurou no top 10 de melhores nações da competição. Mas o recorte de medalhas conquistadas evidencia um crescimento do esporte paralímpico a partir da realização dos jogos do Rio, em 2016. Nas duas últimas edições, o País levou 72 medalhas para casa. A título de comparação, em Londres, 2012, quando o Brasil também foi 7º colocado, foram “apenas” 43 pódios nos Jogos.

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Mizael Conrado, presidente do CPB e bicampeão paralímpico do futebol de cegos, entende que uma das principais viradas de chave vividas pelo País e que alavancaram o desenvolvimento das modalidades paralímpicas veio em 2017, quando foi instituído o Planejamento Estratégico do CPB, que atribuiu metas e qual caminho seria construído pela entidade para melhorar ainda mais o participação do Brasil nas competições.

“Não está ligado só aos atletas de alto rendimento, mas a principal mudança nos últimos anos foi o planejamento estratégico de 2017. Lá, por conta da formação do planejamento, decidimos mudar a lógica do desenvolvimento do esporte paralímpico no Brasil. Antigamente, CPB agia de forma mais passiva, no sentido de organizar as competições no País, selecionar os melhores atletas e depois levar para essas missões de Pan e Paralimpíadas”, explica.

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Presidente do CPB Mizael Conrado durante cerimônia de entrega do Prêmio Paralímpicos, em 2023 Foto: Alessandra Cabral/CPB

Hoje, a participação do CPB está muito mais voltada para a formação de atletas e desenvolvimento das modalidades paralímpicas. Uma das heranças deixadas pela Rio 2016 foi justamente o centro de treinamento oficial do CPB, localizado em São Paulo. O espaço com mais de 100 mil metros quadrados é responsável por desenvolver 17 modalidades paralímpicas, tendo abrigado quase 1.500 eventos esportivos paralímpicos entre os Jogos do Rio e o começo de 2023.

No total, quase 90 mil atletas passaram pelas instalações, que custou R$ 264,2 milhões, investidos pelo Governo do Estado de São Paulo e pelo Governo Federal, por meio do Ministério dos Esportes.

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“Com essa mudança, passamos a ir até as pessoas, criamos uma série de projetos, como o Festival Paralímpico e o Camping Escolar, que é um evento que reúne os melhores das Paralimpíadas escolares duas vezes no ano. Os atletas são levados ao CT para treinamento e já iniciam essa trajetória em seleções de base”, afirma Conrado.

Mas os investimento não trariam os mesmos resultados se não houvesse, da parte do atleta, o foco e a vontade de se colocar em posição de destaque dentro de cada uma das modalidades. O gestor voltou a citar como o esporte ocupa um espaço de destaque na vida das pessoas com deficiência e como isso contribui para a manutenção de um bom desempenho.

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“O esporte é onde a pessoa com deficiência tem mais reconhecimento. O esporte é importante pelas competições, sim, mas também no contexto de sociedade. As pessoas param para ver alguém com alguma limitação demonstrar o contrário disso. Param para ver toda sua eficiência e capacidade de entregar grandes coisas”, afirma.

A qualificação das estruturas de treinamento dos atletas também foi sentida por quem viveu, na prática, o centro de treinamento dedicado ao esporte paralímpico. Daniel Dias, nadador e maior medalhista da história do Brasil nas Paralimpíadas com 27 medalhas, sendo 14 de ouro, se despediu da competição na última edição, em 2021. Agora, como torcedor, lembra do importante papel que o espaço teve no crescimento dos competidores.

“A gente tinha que buscar isso fora do país para treinar, e hoje os atletas têm em casa, e treinar em casa é muito melhor. Você fazer a preparação e saber que essa preparação está sendo a melhor possível, isso faz uma grande diferença no psicológico do atleta também. Então, eu fico feliz de ter feito parte da história disso, porque ali é uma história que o CPB construiu com os seus atletas, e hoje fica esse grande legado para os atletas paralímpicos brasileiros”, diz.

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Daniel Dias quebra o recorde mundial dos 50m livre e conquista a medalha de ouro na edição de Londres, 2012 Foto: Marcio Rodrigues/CPB

O nadador ainda projeta que o grande desempenho do Brasil acontecerá em Los Angeles, na edição de 2028. O cenário também é desenhado por Mizael Conrado, que explica que a formação dos atletas que está sendo feita agora renderá ainda mais daqui a alguns ciclos paralímpicos.

“O futuro é mais e mais promissor. Daqui a oito anos, essas 7 mil crianças atendidas pelos projetos criados pelo CPB estarão vivendo o alto rendimento. Temos atletas agora em Paris que passaram pelo aperfeiçoamento das seleções de base e competições como a paralimpíada escolar. Então, daqui a oito ou dez anos teremos um outro nível de esporte paralímpico no País”, completa.

O que explica o desempenho do Brasil ser melhor nas Paralimpíadas do que nas Olimpíadas

O questionamento sobre o bom desempenho do Brasil nos Jogos Paralímpicos também enviesa para o lado da comparação com os resultados do Brasil nos Jogos Olímpicos. Na edição de Paris, por exemplo, não conseguiu quebrar sua melhor marca da história. Em números absolutos, é possível criar uma balança que pesa mais para as disputas paralímpicas, já que o Brasil tem, antes de Paris, 373 medalhas conquistadas, enquanto os esportes olímpicos somam 170 pódios já contando com esta última edição na capital francesa.

Há também uma diferença de recursos chamativa entre o que foi recebido pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB) e o CPB. A maior fonte de investimentos recebidos pelo CPB é a Lei das Loterias. Em pouco mais de duas décadas, o CPB recebeu R$ 1,64 bilhão do Governo Federal, valor 40% menor do que o COB recebeu no mesmo período. Segundo Mizael, a lei é responsável por 80% de todos os recursos de financiamento ao esporte brasileiro.

Uma resposta mais objetiva para o questionamento é que os Jogos Paralímpicos apresentam uma variedade maior de categorias dentro da mesma modalidade. Adria Santos, maior medalhista entre as mulheres na história dos Jogos Paralímpicos, conquistou 13 medalhas, sendo quatro ouros, na classe T11, onde os competidores correm ao lado do atleta-guia e usam o cordão de ligação.

No atletismo, existem classes para amputados, cadeirantes, deficientes intelectuais e visuais, por exemplo. Ou seja, se cada uma das classes tiverem mais de um atleta brasileiro competindo, a chance de medalha já torna-se maior do que nas Olimpíadas, onde as categorias são divididas entre masculino e feminino. Mas, muito além da quantidade, é preciso olhar para a qualidade desses atletas que representam o Brasil.

“Os atletas se dedicam tanto quanto os olímpicos. Treinam para dar o seu melhor. Percebo que, no paradesporto, muitas pessoas acham que o deficiente está sempre tendo de provar que é capaz. Mas o atleta consegue mostrar além disso e tirar olhar da deficiência, mostrar o próprio atleta. Não é aquela coisa do herói, de estar num patamar diferente”, afirma Adria.

Ádria Santos e seu guia, Chocolate, comemoram o ouro nos 100m rasos da classe T11, em Atenas 2004. Foto: Comitê Paralímpico Brasileiro (CBP)/Divulgação

Mizael ressalta que o teor de comparação não contribui para a melhora de nenhuma das duas realidades esportivas do Brasil. “São sistemas distintos, culturas diferentes. Difícil estabelecer paralelos. Por mais que tenha mais modalidades em disputa, a gente tem o Brasil no top 10 desde 2008, então isso fala também sobre a qualidade do desempenho e a posição do País no ranking”.

A cultura citada pelo presidente do CPB vem tentando ser mudada principalmente por meio das ações de formação dos atletas. Historicamente, atletas paralímpicos iniciam mais tardiamente no esporte. É o caso de Daniel Dias, que só entrou, de fato, no universo da natação aos 16 anos. Hoje, com 36, gerencia o instituto que leva seu nome e atende mais de 500 crianças com deficiência em quatro cidades, Curitiba, Ponta Grossa, Valinhos e Hortolândia.

A intenção do instituto, que recebe investimento pelas leis de incentivo ao esporte, é tornar a entrada de crianças com deficiência no esporte cada vez mais precoce.

“Quanto mais cedo essa criança com deficiência começar a praticar esporte, mais cedo a gente pode contribuir na vida dela, não necessariamente ela vai ser um campeão no esporte, mas campeão na vida todos nós podemos ser, e oportunidades nós podemos gerar através de uma prática esportiva, através do instituto”.

No dia 28 de agosto, o Brasil iniciou a caminhada em busca de uma marca histórica no esporte paralímpico. A conquista veio: a 400ª medalha em Jogos. Na edição de Paris-2024, a delegação do Comitê Paralímpico do Brasil (CPB) é composta por 255 atletas com deficiência, um recorde para o País.

Aliás, a palavra “recorde” é muito mais comum do que se imagina quando falamos do desempenho de brasileiros nas Paralimpíadas. Neste ano, o Brasil também buscou sua melhor colocação no quadro geral de medalhas (até então um 7º lugar em Tóquio) e superou a marca de 72 pódios conquistados na última edição dos Jogos. Diante do cenário positivo, é fácil determinar que o Brasil é uma potência paralímpica mundial. Mas qual a razão para esse desempenho de alto nível?

Aline dos Santos Rocha e Vanessa Cristina de Souza competindo nos Jogos Parapan-Americanos de Santiago, 2023 Foto: Cris Mattos/CPB

A resposta é, de fato, complexa, mas é possível traçar um caminho feito pelas organizações e atletas paralímpicos ao longo das últimas décadas e que explicam o salto de qualidade que o Brasil teve e que foi obtido nas provas na capital francesa.

As principais razões que apontam o País como um dos destaques paralímpicos passam desde a lógica de que os investimentos geram resultados, principalmente a longo prazo, até um contexto social que é muito forte no Brasil. Em um país onde as pessoas com deficiência encontram barreiras para praticar suas atividades mais simples do dia a dia nas ruas de quase todas as cidades, o esporte surge como uma realidade onde há, de fato, uma valorização diante do esforço e evolução constante de quem tem alguma limitação.

E a combinação desses fatores com o talento de cada um dos atletas, vem colocando o Brasil como um destaque mundial. De 2008, na edição de Pequim, para cá, o País sempre figurou no top 10 de melhores nações da competição. Mas o recorte de medalhas conquistadas evidencia um crescimento do esporte paralímpico a partir da realização dos jogos do Rio, em 2016. Nas duas últimas edições, o País levou 72 medalhas para casa. A título de comparação, em Londres, 2012, quando o Brasil também foi 7º colocado, foram “apenas” 43 pódios nos Jogos.

Mizael Conrado, presidente do CPB e bicampeão paralímpico do futebol de cegos, entende que uma das principais viradas de chave vividas pelo País e que alavancaram o desenvolvimento das modalidades paralímpicas veio em 2017, quando foi instituído o Planejamento Estratégico do CPB, que atribuiu metas e qual caminho seria construído pela entidade para melhorar ainda mais o participação do Brasil nas competições.

“Não está ligado só aos atletas de alto rendimento, mas a principal mudança nos últimos anos foi o planejamento estratégico de 2017. Lá, por conta da formação do planejamento, decidimos mudar a lógica do desenvolvimento do esporte paralímpico no Brasil. Antigamente, CPB agia de forma mais passiva, no sentido de organizar as competições no País, selecionar os melhores atletas e depois levar para essas missões de Pan e Paralimpíadas”, explica.

Presidente do CPB Mizael Conrado durante cerimônia de entrega do Prêmio Paralímpicos, em 2023 Foto: Alessandra Cabral/CPB

Hoje, a participação do CPB está muito mais voltada para a formação de atletas e desenvolvimento das modalidades paralímpicas. Uma das heranças deixadas pela Rio 2016 foi justamente o centro de treinamento oficial do CPB, localizado em São Paulo. O espaço com mais de 100 mil metros quadrados é responsável por desenvolver 17 modalidades paralímpicas, tendo abrigado quase 1.500 eventos esportivos paralímpicos entre os Jogos do Rio e o começo de 2023.

No total, quase 90 mil atletas passaram pelas instalações, que custou R$ 264,2 milhões, investidos pelo Governo do Estado de São Paulo e pelo Governo Federal, por meio do Ministério dos Esportes.

“Com essa mudança, passamos a ir até as pessoas, criamos uma série de projetos, como o Festival Paralímpico e o Camping Escolar, que é um evento que reúne os melhores das Paralimpíadas escolares duas vezes no ano. Os atletas são levados ao CT para treinamento e já iniciam essa trajetória em seleções de base”, afirma Conrado.

Mas os investimento não trariam os mesmos resultados se não houvesse, da parte do atleta, o foco e a vontade de se colocar em posição de destaque dentro de cada uma das modalidades. O gestor voltou a citar como o esporte ocupa um espaço de destaque na vida das pessoas com deficiência e como isso contribui para a manutenção de um bom desempenho.

“O esporte é onde a pessoa com deficiência tem mais reconhecimento. O esporte é importante pelas competições, sim, mas também no contexto de sociedade. As pessoas param para ver alguém com alguma limitação demonstrar o contrário disso. Param para ver toda sua eficiência e capacidade de entregar grandes coisas”, afirma.

A qualificação das estruturas de treinamento dos atletas também foi sentida por quem viveu, na prática, o centro de treinamento dedicado ao esporte paralímpico. Daniel Dias, nadador e maior medalhista da história do Brasil nas Paralimpíadas com 27 medalhas, sendo 14 de ouro, se despediu da competição na última edição, em 2021. Agora, como torcedor, lembra do importante papel que o espaço teve no crescimento dos competidores.

“A gente tinha que buscar isso fora do país para treinar, e hoje os atletas têm em casa, e treinar em casa é muito melhor. Você fazer a preparação e saber que essa preparação está sendo a melhor possível, isso faz uma grande diferença no psicológico do atleta também. Então, eu fico feliz de ter feito parte da história disso, porque ali é uma história que o CPB construiu com os seus atletas, e hoje fica esse grande legado para os atletas paralímpicos brasileiros”, diz.

Daniel Dias quebra o recorde mundial dos 50m livre e conquista a medalha de ouro na edição de Londres, 2012 Foto: Marcio Rodrigues/CPB

O nadador ainda projeta que o grande desempenho do Brasil acontecerá em Los Angeles, na edição de 2028. O cenário também é desenhado por Mizael Conrado, que explica que a formação dos atletas que está sendo feita agora renderá ainda mais daqui a alguns ciclos paralímpicos.

“O futuro é mais e mais promissor. Daqui a oito anos, essas 7 mil crianças atendidas pelos projetos criados pelo CPB estarão vivendo o alto rendimento. Temos atletas agora em Paris que passaram pelo aperfeiçoamento das seleções de base e competições como a paralimpíada escolar. Então, daqui a oito ou dez anos teremos um outro nível de esporte paralímpico no País”, completa.

O que explica o desempenho do Brasil ser melhor nas Paralimpíadas do que nas Olimpíadas

O questionamento sobre o bom desempenho do Brasil nos Jogos Paralímpicos também enviesa para o lado da comparação com os resultados do Brasil nos Jogos Olímpicos. Na edição de Paris, por exemplo, não conseguiu quebrar sua melhor marca da história. Em números absolutos, é possível criar uma balança que pesa mais para as disputas paralímpicas, já que o Brasil tem, antes de Paris, 373 medalhas conquistadas, enquanto os esportes olímpicos somam 170 pódios já contando com esta última edição na capital francesa.

Há também uma diferença de recursos chamativa entre o que foi recebido pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB) e o CPB. A maior fonte de investimentos recebidos pelo CPB é a Lei das Loterias. Em pouco mais de duas décadas, o CPB recebeu R$ 1,64 bilhão do Governo Federal, valor 40% menor do que o COB recebeu no mesmo período. Segundo Mizael, a lei é responsável por 80% de todos os recursos de financiamento ao esporte brasileiro.

Uma resposta mais objetiva para o questionamento é que os Jogos Paralímpicos apresentam uma variedade maior de categorias dentro da mesma modalidade. Adria Santos, maior medalhista entre as mulheres na história dos Jogos Paralímpicos, conquistou 13 medalhas, sendo quatro ouros, na classe T11, onde os competidores correm ao lado do atleta-guia e usam o cordão de ligação.

No atletismo, existem classes para amputados, cadeirantes, deficientes intelectuais e visuais, por exemplo. Ou seja, se cada uma das classes tiverem mais de um atleta brasileiro competindo, a chance de medalha já torna-se maior do que nas Olimpíadas, onde as categorias são divididas entre masculino e feminino. Mas, muito além da quantidade, é preciso olhar para a qualidade desses atletas que representam o Brasil.

“Os atletas se dedicam tanto quanto os olímpicos. Treinam para dar o seu melhor. Percebo que, no paradesporto, muitas pessoas acham que o deficiente está sempre tendo de provar que é capaz. Mas o atleta consegue mostrar além disso e tirar olhar da deficiência, mostrar o próprio atleta. Não é aquela coisa do herói, de estar num patamar diferente”, afirma Adria.

Ádria Santos e seu guia, Chocolate, comemoram o ouro nos 100m rasos da classe T11, em Atenas 2004. Foto: Comitê Paralímpico Brasileiro (CBP)/Divulgação

Mizael ressalta que o teor de comparação não contribui para a melhora de nenhuma das duas realidades esportivas do Brasil. “São sistemas distintos, culturas diferentes. Difícil estabelecer paralelos. Por mais que tenha mais modalidades em disputa, a gente tem o Brasil no top 10 desde 2008, então isso fala também sobre a qualidade do desempenho e a posição do País no ranking”.

A cultura citada pelo presidente do CPB vem tentando ser mudada principalmente por meio das ações de formação dos atletas. Historicamente, atletas paralímpicos iniciam mais tardiamente no esporte. É o caso de Daniel Dias, que só entrou, de fato, no universo da natação aos 16 anos. Hoje, com 36, gerencia o instituto que leva seu nome e atende mais de 500 crianças com deficiência em quatro cidades, Curitiba, Ponta Grossa, Valinhos e Hortolândia.

A intenção do instituto, que recebe investimento pelas leis de incentivo ao esporte, é tornar a entrada de crianças com deficiência no esporte cada vez mais precoce.

“Quanto mais cedo essa criança com deficiência começar a praticar esporte, mais cedo a gente pode contribuir na vida dela, não necessariamente ela vai ser um campeão no esporte, mas campeão na vida todos nós podemos ser, e oportunidades nós podemos gerar através de uma prática esportiva, através do instituto”.

No dia 28 de agosto, o Brasil iniciou a caminhada em busca de uma marca histórica no esporte paralímpico. A conquista veio: a 400ª medalha em Jogos. Na edição de Paris-2024, a delegação do Comitê Paralímpico do Brasil (CPB) é composta por 255 atletas com deficiência, um recorde para o País.

Aliás, a palavra “recorde” é muito mais comum do que se imagina quando falamos do desempenho de brasileiros nas Paralimpíadas. Neste ano, o Brasil também buscou sua melhor colocação no quadro geral de medalhas (até então um 7º lugar em Tóquio) e superou a marca de 72 pódios conquistados na última edição dos Jogos. Diante do cenário positivo, é fácil determinar que o Brasil é uma potência paralímpica mundial. Mas qual a razão para esse desempenho de alto nível?

Aline dos Santos Rocha e Vanessa Cristina de Souza competindo nos Jogos Parapan-Americanos de Santiago, 2023 Foto: Cris Mattos/CPB

A resposta é, de fato, complexa, mas é possível traçar um caminho feito pelas organizações e atletas paralímpicos ao longo das últimas décadas e que explicam o salto de qualidade que o Brasil teve e que foi obtido nas provas na capital francesa.

As principais razões que apontam o País como um dos destaques paralímpicos passam desde a lógica de que os investimentos geram resultados, principalmente a longo prazo, até um contexto social que é muito forte no Brasil. Em um país onde as pessoas com deficiência encontram barreiras para praticar suas atividades mais simples do dia a dia nas ruas de quase todas as cidades, o esporte surge como uma realidade onde há, de fato, uma valorização diante do esforço e evolução constante de quem tem alguma limitação.

E a combinação desses fatores com o talento de cada um dos atletas, vem colocando o Brasil como um destaque mundial. De 2008, na edição de Pequim, para cá, o País sempre figurou no top 10 de melhores nações da competição. Mas o recorte de medalhas conquistadas evidencia um crescimento do esporte paralímpico a partir da realização dos jogos do Rio, em 2016. Nas duas últimas edições, o País levou 72 medalhas para casa. A título de comparação, em Londres, 2012, quando o Brasil também foi 7º colocado, foram “apenas” 43 pódios nos Jogos.

Mizael Conrado, presidente do CPB e bicampeão paralímpico do futebol de cegos, entende que uma das principais viradas de chave vividas pelo País e que alavancaram o desenvolvimento das modalidades paralímpicas veio em 2017, quando foi instituído o Planejamento Estratégico do CPB, que atribuiu metas e qual caminho seria construído pela entidade para melhorar ainda mais o participação do Brasil nas competições.

“Não está ligado só aos atletas de alto rendimento, mas a principal mudança nos últimos anos foi o planejamento estratégico de 2017. Lá, por conta da formação do planejamento, decidimos mudar a lógica do desenvolvimento do esporte paralímpico no Brasil. Antigamente, CPB agia de forma mais passiva, no sentido de organizar as competições no País, selecionar os melhores atletas e depois levar para essas missões de Pan e Paralimpíadas”, explica.

Presidente do CPB Mizael Conrado durante cerimônia de entrega do Prêmio Paralímpicos, em 2023 Foto: Alessandra Cabral/CPB

Hoje, a participação do CPB está muito mais voltada para a formação de atletas e desenvolvimento das modalidades paralímpicas. Uma das heranças deixadas pela Rio 2016 foi justamente o centro de treinamento oficial do CPB, localizado em São Paulo. O espaço com mais de 100 mil metros quadrados é responsável por desenvolver 17 modalidades paralímpicas, tendo abrigado quase 1.500 eventos esportivos paralímpicos entre os Jogos do Rio e o começo de 2023.

No total, quase 90 mil atletas passaram pelas instalações, que custou R$ 264,2 milhões, investidos pelo Governo do Estado de São Paulo e pelo Governo Federal, por meio do Ministério dos Esportes.

“Com essa mudança, passamos a ir até as pessoas, criamos uma série de projetos, como o Festival Paralímpico e o Camping Escolar, que é um evento que reúne os melhores das Paralimpíadas escolares duas vezes no ano. Os atletas são levados ao CT para treinamento e já iniciam essa trajetória em seleções de base”, afirma Conrado.

Mas os investimento não trariam os mesmos resultados se não houvesse, da parte do atleta, o foco e a vontade de se colocar em posição de destaque dentro de cada uma das modalidades. O gestor voltou a citar como o esporte ocupa um espaço de destaque na vida das pessoas com deficiência e como isso contribui para a manutenção de um bom desempenho.

“O esporte é onde a pessoa com deficiência tem mais reconhecimento. O esporte é importante pelas competições, sim, mas também no contexto de sociedade. As pessoas param para ver alguém com alguma limitação demonstrar o contrário disso. Param para ver toda sua eficiência e capacidade de entregar grandes coisas”, afirma.

A qualificação das estruturas de treinamento dos atletas também foi sentida por quem viveu, na prática, o centro de treinamento dedicado ao esporte paralímpico. Daniel Dias, nadador e maior medalhista da história do Brasil nas Paralimpíadas com 27 medalhas, sendo 14 de ouro, se despediu da competição na última edição, em 2021. Agora, como torcedor, lembra do importante papel que o espaço teve no crescimento dos competidores.

“A gente tinha que buscar isso fora do país para treinar, e hoje os atletas têm em casa, e treinar em casa é muito melhor. Você fazer a preparação e saber que essa preparação está sendo a melhor possível, isso faz uma grande diferença no psicológico do atleta também. Então, eu fico feliz de ter feito parte da história disso, porque ali é uma história que o CPB construiu com os seus atletas, e hoje fica esse grande legado para os atletas paralímpicos brasileiros”, diz.

Daniel Dias quebra o recorde mundial dos 50m livre e conquista a medalha de ouro na edição de Londres, 2012 Foto: Marcio Rodrigues/CPB

O nadador ainda projeta que o grande desempenho do Brasil acontecerá em Los Angeles, na edição de 2028. O cenário também é desenhado por Mizael Conrado, que explica que a formação dos atletas que está sendo feita agora renderá ainda mais daqui a alguns ciclos paralímpicos.

“O futuro é mais e mais promissor. Daqui a oito anos, essas 7 mil crianças atendidas pelos projetos criados pelo CPB estarão vivendo o alto rendimento. Temos atletas agora em Paris que passaram pelo aperfeiçoamento das seleções de base e competições como a paralimpíada escolar. Então, daqui a oito ou dez anos teremos um outro nível de esporte paralímpico no País”, completa.

O que explica o desempenho do Brasil ser melhor nas Paralimpíadas do que nas Olimpíadas

O questionamento sobre o bom desempenho do Brasil nos Jogos Paralímpicos também enviesa para o lado da comparação com os resultados do Brasil nos Jogos Olímpicos. Na edição de Paris, por exemplo, não conseguiu quebrar sua melhor marca da história. Em números absolutos, é possível criar uma balança que pesa mais para as disputas paralímpicas, já que o Brasil tem, antes de Paris, 373 medalhas conquistadas, enquanto os esportes olímpicos somam 170 pódios já contando com esta última edição na capital francesa.

Há também uma diferença de recursos chamativa entre o que foi recebido pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB) e o CPB. A maior fonte de investimentos recebidos pelo CPB é a Lei das Loterias. Em pouco mais de duas décadas, o CPB recebeu R$ 1,64 bilhão do Governo Federal, valor 40% menor do que o COB recebeu no mesmo período. Segundo Mizael, a lei é responsável por 80% de todos os recursos de financiamento ao esporte brasileiro.

Uma resposta mais objetiva para o questionamento é que os Jogos Paralímpicos apresentam uma variedade maior de categorias dentro da mesma modalidade. Adria Santos, maior medalhista entre as mulheres na história dos Jogos Paralímpicos, conquistou 13 medalhas, sendo quatro ouros, na classe T11, onde os competidores correm ao lado do atleta-guia e usam o cordão de ligação.

No atletismo, existem classes para amputados, cadeirantes, deficientes intelectuais e visuais, por exemplo. Ou seja, se cada uma das classes tiverem mais de um atleta brasileiro competindo, a chance de medalha já torna-se maior do que nas Olimpíadas, onde as categorias são divididas entre masculino e feminino. Mas, muito além da quantidade, é preciso olhar para a qualidade desses atletas que representam o Brasil.

“Os atletas se dedicam tanto quanto os olímpicos. Treinam para dar o seu melhor. Percebo que, no paradesporto, muitas pessoas acham que o deficiente está sempre tendo de provar que é capaz. Mas o atleta consegue mostrar além disso e tirar olhar da deficiência, mostrar o próprio atleta. Não é aquela coisa do herói, de estar num patamar diferente”, afirma Adria.

Ádria Santos e seu guia, Chocolate, comemoram o ouro nos 100m rasos da classe T11, em Atenas 2004. Foto: Comitê Paralímpico Brasileiro (CBP)/Divulgação

Mizael ressalta que o teor de comparação não contribui para a melhora de nenhuma das duas realidades esportivas do Brasil. “São sistemas distintos, culturas diferentes. Difícil estabelecer paralelos. Por mais que tenha mais modalidades em disputa, a gente tem o Brasil no top 10 desde 2008, então isso fala também sobre a qualidade do desempenho e a posição do País no ranking”.

A cultura citada pelo presidente do CPB vem tentando ser mudada principalmente por meio das ações de formação dos atletas. Historicamente, atletas paralímpicos iniciam mais tardiamente no esporte. É o caso de Daniel Dias, que só entrou, de fato, no universo da natação aos 16 anos. Hoje, com 36, gerencia o instituto que leva seu nome e atende mais de 500 crianças com deficiência em quatro cidades, Curitiba, Ponta Grossa, Valinhos e Hortolândia.

A intenção do instituto, que recebe investimento pelas leis de incentivo ao esporte, é tornar a entrada de crianças com deficiência no esporte cada vez mais precoce.

“Quanto mais cedo essa criança com deficiência começar a praticar esporte, mais cedo a gente pode contribuir na vida dela, não necessariamente ela vai ser um campeão no esporte, mas campeão na vida todos nós podemos ser, e oportunidades nós podemos gerar através de uma prática esportiva, através do instituto”.

No dia 28 de agosto, o Brasil iniciou a caminhada em busca de uma marca histórica no esporte paralímpico. A conquista veio: a 400ª medalha em Jogos. Na edição de Paris-2024, a delegação do Comitê Paralímpico do Brasil (CPB) é composta por 255 atletas com deficiência, um recorde para o País.

Aliás, a palavra “recorde” é muito mais comum do que se imagina quando falamos do desempenho de brasileiros nas Paralimpíadas. Neste ano, o Brasil também buscou sua melhor colocação no quadro geral de medalhas (até então um 7º lugar em Tóquio) e superou a marca de 72 pódios conquistados na última edição dos Jogos. Diante do cenário positivo, é fácil determinar que o Brasil é uma potência paralímpica mundial. Mas qual a razão para esse desempenho de alto nível?

Aline dos Santos Rocha e Vanessa Cristina de Souza competindo nos Jogos Parapan-Americanos de Santiago, 2023 Foto: Cris Mattos/CPB

A resposta é, de fato, complexa, mas é possível traçar um caminho feito pelas organizações e atletas paralímpicos ao longo das últimas décadas e que explicam o salto de qualidade que o Brasil teve e que foi obtido nas provas na capital francesa.

As principais razões que apontam o País como um dos destaques paralímpicos passam desde a lógica de que os investimentos geram resultados, principalmente a longo prazo, até um contexto social que é muito forte no Brasil. Em um país onde as pessoas com deficiência encontram barreiras para praticar suas atividades mais simples do dia a dia nas ruas de quase todas as cidades, o esporte surge como uma realidade onde há, de fato, uma valorização diante do esforço e evolução constante de quem tem alguma limitação.

E a combinação desses fatores com o talento de cada um dos atletas, vem colocando o Brasil como um destaque mundial. De 2008, na edição de Pequim, para cá, o País sempre figurou no top 10 de melhores nações da competição. Mas o recorte de medalhas conquistadas evidencia um crescimento do esporte paralímpico a partir da realização dos jogos do Rio, em 2016. Nas duas últimas edições, o País levou 72 medalhas para casa. A título de comparação, em Londres, 2012, quando o Brasil também foi 7º colocado, foram “apenas” 43 pódios nos Jogos.

Mizael Conrado, presidente do CPB e bicampeão paralímpico do futebol de cegos, entende que uma das principais viradas de chave vividas pelo País e que alavancaram o desenvolvimento das modalidades paralímpicas veio em 2017, quando foi instituído o Planejamento Estratégico do CPB, que atribuiu metas e qual caminho seria construído pela entidade para melhorar ainda mais o participação do Brasil nas competições.

“Não está ligado só aos atletas de alto rendimento, mas a principal mudança nos últimos anos foi o planejamento estratégico de 2017. Lá, por conta da formação do planejamento, decidimos mudar a lógica do desenvolvimento do esporte paralímpico no Brasil. Antigamente, CPB agia de forma mais passiva, no sentido de organizar as competições no País, selecionar os melhores atletas e depois levar para essas missões de Pan e Paralimpíadas”, explica.

Presidente do CPB Mizael Conrado durante cerimônia de entrega do Prêmio Paralímpicos, em 2023 Foto: Alessandra Cabral/CPB

Hoje, a participação do CPB está muito mais voltada para a formação de atletas e desenvolvimento das modalidades paralímpicas. Uma das heranças deixadas pela Rio 2016 foi justamente o centro de treinamento oficial do CPB, localizado em São Paulo. O espaço com mais de 100 mil metros quadrados é responsável por desenvolver 17 modalidades paralímpicas, tendo abrigado quase 1.500 eventos esportivos paralímpicos entre os Jogos do Rio e o começo de 2023.

No total, quase 90 mil atletas passaram pelas instalações, que custou R$ 264,2 milhões, investidos pelo Governo do Estado de São Paulo e pelo Governo Federal, por meio do Ministério dos Esportes.

“Com essa mudança, passamos a ir até as pessoas, criamos uma série de projetos, como o Festival Paralímpico e o Camping Escolar, que é um evento que reúne os melhores das Paralimpíadas escolares duas vezes no ano. Os atletas são levados ao CT para treinamento e já iniciam essa trajetória em seleções de base”, afirma Conrado.

Mas os investimento não trariam os mesmos resultados se não houvesse, da parte do atleta, o foco e a vontade de se colocar em posição de destaque dentro de cada uma das modalidades. O gestor voltou a citar como o esporte ocupa um espaço de destaque na vida das pessoas com deficiência e como isso contribui para a manutenção de um bom desempenho.

“O esporte é onde a pessoa com deficiência tem mais reconhecimento. O esporte é importante pelas competições, sim, mas também no contexto de sociedade. As pessoas param para ver alguém com alguma limitação demonstrar o contrário disso. Param para ver toda sua eficiência e capacidade de entregar grandes coisas”, afirma.

A qualificação das estruturas de treinamento dos atletas também foi sentida por quem viveu, na prática, o centro de treinamento dedicado ao esporte paralímpico. Daniel Dias, nadador e maior medalhista da história do Brasil nas Paralimpíadas com 27 medalhas, sendo 14 de ouro, se despediu da competição na última edição, em 2021. Agora, como torcedor, lembra do importante papel que o espaço teve no crescimento dos competidores.

“A gente tinha que buscar isso fora do país para treinar, e hoje os atletas têm em casa, e treinar em casa é muito melhor. Você fazer a preparação e saber que essa preparação está sendo a melhor possível, isso faz uma grande diferença no psicológico do atleta também. Então, eu fico feliz de ter feito parte da história disso, porque ali é uma história que o CPB construiu com os seus atletas, e hoje fica esse grande legado para os atletas paralímpicos brasileiros”, diz.

Daniel Dias quebra o recorde mundial dos 50m livre e conquista a medalha de ouro na edição de Londres, 2012 Foto: Marcio Rodrigues/CPB

O nadador ainda projeta que o grande desempenho do Brasil acontecerá em Los Angeles, na edição de 2028. O cenário também é desenhado por Mizael Conrado, que explica que a formação dos atletas que está sendo feita agora renderá ainda mais daqui a alguns ciclos paralímpicos.

“O futuro é mais e mais promissor. Daqui a oito anos, essas 7 mil crianças atendidas pelos projetos criados pelo CPB estarão vivendo o alto rendimento. Temos atletas agora em Paris que passaram pelo aperfeiçoamento das seleções de base e competições como a paralimpíada escolar. Então, daqui a oito ou dez anos teremos um outro nível de esporte paralímpico no País”, completa.

O que explica o desempenho do Brasil ser melhor nas Paralimpíadas do que nas Olimpíadas

O questionamento sobre o bom desempenho do Brasil nos Jogos Paralímpicos também enviesa para o lado da comparação com os resultados do Brasil nos Jogos Olímpicos. Na edição de Paris, por exemplo, não conseguiu quebrar sua melhor marca da história. Em números absolutos, é possível criar uma balança que pesa mais para as disputas paralímpicas, já que o Brasil tem, antes de Paris, 373 medalhas conquistadas, enquanto os esportes olímpicos somam 170 pódios já contando com esta última edição na capital francesa.

Há também uma diferença de recursos chamativa entre o que foi recebido pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB) e o CPB. A maior fonte de investimentos recebidos pelo CPB é a Lei das Loterias. Em pouco mais de duas décadas, o CPB recebeu R$ 1,64 bilhão do Governo Federal, valor 40% menor do que o COB recebeu no mesmo período. Segundo Mizael, a lei é responsável por 80% de todos os recursos de financiamento ao esporte brasileiro.

Uma resposta mais objetiva para o questionamento é que os Jogos Paralímpicos apresentam uma variedade maior de categorias dentro da mesma modalidade. Adria Santos, maior medalhista entre as mulheres na história dos Jogos Paralímpicos, conquistou 13 medalhas, sendo quatro ouros, na classe T11, onde os competidores correm ao lado do atleta-guia e usam o cordão de ligação.

No atletismo, existem classes para amputados, cadeirantes, deficientes intelectuais e visuais, por exemplo. Ou seja, se cada uma das classes tiverem mais de um atleta brasileiro competindo, a chance de medalha já torna-se maior do que nas Olimpíadas, onde as categorias são divididas entre masculino e feminino. Mas, muito além da quantidade, é preciso olhar para a qualidade desses atletas que representam o Brasil.

“Os atletas se dedicam tanto quanto os olímpicos. Treinam para dar o seu melhor. Percebo que, no paradesporto, muitas pessoas acham que o deficiente está sempre tendo de provar que é capaz. Mas o atleta consegue mostrar além disso e tirar olhar da deficiência, mostrar o próprio atleta. Não é aquela coisa do herói, de estar num patamar diferente”, afirma Adria.

Ádria Santos e seu guia, Chocolate, comemoram o ouro nos 100m rasos da classe T11, em Atenas 2004. Foto: Comitê Paralímpico Brasileiro (CBP)/Divulgação

Mizael ressalta que o teor de comparação não contribui para a melhora de nenhuma das duas realidades esportivas do Brasil. “São sistemas distintos, culturas diferentes. Difícil estabelecer paralelos. Por mais que tenha mais modalidades em disputa, a gente tem o Brasil no top 10 desde 2008, então isso fala também sobre a qualidade do desempenho e a posição do País no ranking”.

A cultura citada pelo presidente do CPB vem tentando ser mudada principalmente por meio das ações de formação dos atletas. Historicamente, atletas paralímpicos iniciam mais tardiamente no esporte. É o caso de Daniel Dias, que só entrou, de fato, no universo da natação aos 16 anos. Hoje, com 36, gerencia o instituto que leva seu nome e atende mais de 500 crianças com deficiência em quatro cidades, Curitiba, Ponta Grossa, Valinhos e Hortolândia.

A intenção do instituto, que recebe investimento pelas leis de incentivo ao esporte, é tornar a entrada de crianças com deficiência no esporte cada vez mais precoce.

“Quanto mais cedo essa criança com deficiência começar a praticar esporte, mais cedo a gente pode contribuir na vida dela, não necessariamente ela vai ser um campeão no esporte, mas campeão na vida todos nós podemos ser, e oportunidades nós podemos gerar através de uma prática esportiva, através do instituto”.

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