Tento entender antes que a Copa acabe por que não estamos gostando da seleção brasileira. Procuro uma resposta simples e tropeço numa sequência de situações que talvez me ajude a compreender o momento exato em que paramos de admirar o trabalho de Tite e da equipe para torcer o nariz e achar que não vamos muito longe na Rússia. Os poucos com quem converso pensam o mesmo. A maioria concorda comigo. Não vamos longe. Tomara estejamos todos errados e esse sentimento mude.
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Ocorre que em algum momento desta caminhada para a Copa da Rússia, deixamos de aplaudir a seleção resgatada por Tite e que tinha nesses mesmos jogadores uma esperança de sucesso. O Brasil foi o primeiro a se classificar pelas Eliminatórias. Muitos brasileiros compraram ingressos acreditando que o time pudesse, de fato, resgatar sua tradição e minimizar o 7 a 1 quatro anos antes.
Mas a coisa desandou de certa forma que apenas as crianças apostam suas fichas e acreditam na turma de Neymar, conforme reportagem publicada neste jornal pela repórter Renata Cafardo.
É óbvio que Neymar tem tudo a ver com isso, mas não só ele. Nos foi vendido lá atrás pela comissão técnica que o jogador do PSG chegaria à competição “voando”. Ele ficaria em pé no tempo estipulado (e ficou) e passaria por cima da falta de ritmo provocada pelos três meses inativos. Isso não acorreu. Em duas partidas, ele foi comum.
Tite também nos fez crer (ou quisemos acreditar) que Neymar tinha amadurecido de uma Copa para outra (2014-2018) e que sua transferência para Paris o havia deixado mais firme diante das adversidades, afinal, agora ele era o “cara”, o camisa 10 de uma empreitada gigantesca na Europa. Voava por conta própria e por uma bandeira.
Bastaram algumas críticas, jogadas erradas e broncas dos árbitros para Neymar se transformar. E aí entram os outros problemas do grupo. Não há um capitão (já que todos o são) para chamá-lo de canto ou colocá-lo no canto de um quarto para poucas e boas, explicar o que é uma Copa do Mundo, mais ou menos como Dunga fez com Romário na edição de 1994, nos Estados Unidos.
No episódio do choro contra Costa Rica, os jogadores trataram de passar a mão na cabeça do atacante como se ele precisasse desse carinho “por tudo o que sofreu nos últimos meses”. Ora! E os outros jogadores também não vivenciaram momentos duros para chegar à Copa? Fagner não trabalhou dia e noite para atender ao chamado e se recuperar? E Fred, Renato Augusto, que quase foi cortado, Danilo e todos os outros que se cuidaram em seus respectivos clubes? Qual é a diferença desse esforço de todos comparado ao esforço de Neymar? Sofre mais quem ficou para trás, não viu seu nome na lista de Tite mesmo tendo ajudado o Brasil em algum momento antes da Copa.
Tite e sua comissão também falharam no procedimento com o jogador. Não era para passar a mão na cabeça de Neymar. Não vejo ninguém passando a mão na cabeça de Messi ou Cristiano Ronaldo. Precisavam dar um freio em Neymar e em suas estripulias. Torná-lo mais humano e mais parecido com os outros do mesmo elenco.
É claro que tudo isso não tira (ainda) da seleção a possibilidade de ela se classificar bem diante da Sérvia, recuperar parte do seu bom futebol e avançar para as oitavas de final mais sólida. Há quem diga que quando o time caminha no Mundial a trancos e barrancos, como agora na Rússia, os jogadores sentem mais a necessidade de dar a volta por cima e se fortalecem de modo a se desdobrar para dar tudo até o fim, encarar as partidas como se fossem finais antecipadas. Isso vale, claro. Não tenho dúvidas da força dos brasileiros, nem na qualidade do time. Mas é preciso jogar um pouquinho de bom futebol também. A bem da verdade, perdemos esse bom futebol quando deixamos a Europa, após dois amistosos, para desembarcar na Rússia como um dos favoritos.
Nesse momento, não temos nem como avaliar o que o time anda fazendo, dada a quantidade de treinos fechados e trabalhos longe dos holofotes. Tudo é um mistério, nada é transparente. Não há explicações disso ou daquilo. As informações são oficiais e dadas nos canais da própria CBF, onde o mundo é verde e amarelo e seu maior personagem é o divertido Canarinho ‘Pistola’.
*ROBSON MORELLI É EDITOR DE ESPORTES DO ‘ESTADÃO’