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A voz que já narrou cinco gols de Lewandowski pelo Bayern de Munique e é conhecida pelos gritos de ‘Belligol’, quando o astro Bellingham vai às redes pelo Real Madrid, é a mesma que descreve o comportamento de leões na savana africana e conta histórias de personalidades como Albert Einstein. Narrador número 1 da ESPN após a saída de Paulo Andrade para a Globo, Rogério Vaughan vai além do futebol.
O telespectador que assina canais pagos e troca um jogo narrado pelo comunicador para assistir às curiosidades do Discovery ou do History Channel pode se deparar novamente com a voz de Vaughan, porém na locução de documentários sobre os mais variados temas. Participar desse tipo de produção é uma realização pessoal do paraense de Santarém, que, agora como titular da emissora esportiva, tem menos tempo para se dedicar a esse lado, embora continue atuando na área.
“Sempre fui apaixonado por fazer essa espécie de documentário. Comecei a me colocar à disposição , a abrir essa janela da minha vida. Veio o primeiro, depois o segundo, o terceiro. Eu já fiz muito mais, faço menos”, afirma. “Você vai falar sobre o oceano, sobre as baleias, história do Egito, biografia de Albert Einstein, personalidades que marcaram a história do mundo, documentários sobre a vida selvagem das savanas africanas. É muito bacana”, contra o narrador em entrevista ao Estadão.
Criado no rádio e dono de uma voz rara, Vaughan desenvolveu seu talento como locutor convivendo com Luiz Alberto Volpi, jornalista conhecido por sua habilidade na locução de offs - como se chama no jornalismo o texto narrado pelos repórteres -, morto em 2020. “Era muito bacana trabalhar com ele, fazendo documentários, narrando as histórias olímpicas, as histórias de Copa do Mundo. Levei isso para o mundo das produtoras.”
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Dedicado, o narrador acumula um pouco de conhecimento sobre ciência, história, tecnologia e geografia, que dividem espaço em seu cérebro com a pronúncia correta de centenas de nomes de jogadores europeus, após tantas narrações em competições do Velho Continente em 25 anos de ESPN. “É muito legal porque você mergulha, é uma imersão no tema. É como no Esporte, para fazer tem de mergulhar. Se não mergulha, não pega o que tem de melhor, fica sempre na superficialidade.”
Quando começou na comunicação, Rogério Vaughan não sabia que iria ter o esporte como foco. Enviado pelo pai para fazer o ensino médio na Inglaterra, voltou ao Pará com uma fita cheia de músicas que queria anunciar no programa comandado por seu irmão na Rádio 94 FM de Santarém. Eram canções que costumavam ser reproduzidas na rádio londrina Capital UK.
Mais do que o conteúdo da fita, chamou a atenção a voz do ainda jovem Vaughan, que passou a trabalhar no local. Virou apresentador e migrou para a telinha, tornando-se âncora do jornal local da afiliada da TV Globo na região. Em seguida, trabalhou na TV Cultura de Manaus, onde arrumou um estágio na sede da rede de televisão publica, em São Paulo.
Narração ‘de brincadeira’ com lenda do basquete abriu portas
Durante o estágio, o então apresentador teve a voz notada por um colega que conhecia José Trajano, diretor de jornalismo da ESPN. “Ele me recebeu, mesmo eu não tendo histórico na área esportiva, porque eu trabalhava com jornalismo no geral. O Trajano com aquele jeitão dele: ‘Acho que você dá para o negócio’. Ele apostou no meu trabalho, no meu talento, e já faz 25 anos que estou aqui”, diz o narrador.
O início foi fazendo offs, até ganhar a oportunidade de narrar partidas, depois de uma narração descompromissada feita sem câmeras durante uma edição dos Jogos do Abertos do Interior, em São José do Rio Preto, acompanhado pela lenda do basquete Wlamir Marques, bicampeão mundial e dono de dois bronzes olímpicos.
“O Wlamir estava sentado no ginásio e eu sentado do lado dele. Na hora, eu falei: ‘se eu narrar esse jogo que está aí na quadra, você comenta?’. Ele falou:: ‘comento’. O Wlamir Marques, bicampeão do mundo Eu comecei a narrar, como se tivesse uma narração ao vivo, e as pessoas que estavam no entorno começaram a pensar que aquilo era real. Eles estão narrando da arquibancada, que máximo”, lembra, rindo.
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“Começou a chegar o juiz, veio cumprimentar o Wlamir, e eu coloquei na roda: foi falta, isso é falta técnica. E o cara começava, ele entrou na vibe e começou a falar. Daí, o Wlamir encampou, chegamos com a chefia, olha o que aconteceu o Rogério Vaughan narrou na arquibancada, e ali deu o start de fazer. A primeira transmissão foi em um jogo de basquete, que depois foi feito um compacto, que foi no ar à noite. Tudo começou com o Wlamir Marques na arquibancada, da arquibancada para a vida real”, completa.
Ainda no começo de sua carreira trabalhando com esporte, nos mesmos Jogos do Interior, Vaughan passou por uma experiência desastrosa, que hoje conta com senso de humor. À época, contudo, passou grande nervosismo.
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“Eu ia muito ao ginásio e ficava passando por trás da mesa de transmissão. Eu passava e voltava. Acabei botando meu pé no cabo que ligava o placar eletrônico. Desligou, e desligou o placar do ginásio. Eu fiquei quietinho, não falei absolutamente nada. Foi uma experiência que eu nunca mais vou esquecer. Deu muito nervoso. O mundo ia acabar, imagina que descobrem que fui eu que fiz isso. Chama técnico, chama isso, e era só espetar na tomada para ligar”, conta.
Desde então, narrou de tudo. Dos ouros de Usain Bolt e Thiago Braz nos Jogos Olímpicos do Rio a diversos jogos marcantes das ligas europeias. Por muito tempo, comandou as transmissões do Campeonato Italiano com Antero Greco, morto em maio deste ano. Ao lado dele, também apresentou algumas edições do SportCenter.
Momento icônicos e reconhecimento
Narrou, ainda, os campeonatos Espanhol e Italiano. Foi narrando o Real Madrid que criou um dos termos pelo qual mais é lembrado atualmente, o “Belligol”, usado para narrar os muitos gols marcados pelo inglês Jude Bellingham.
“Eu estava em Punta Del Leste, no Uruguai, para fazer a final da Copa Sul-Americana do Fortaleza com a LDU, e de repente uma enxurrada, a bolha estourou, muita gente falando comigo sobre o ‘Belilgol’. Em todo jogo, tinha gol do Bellingham. É um nome lindo, mas até você falar Bellingham... teve um momento, uma jogada muito rápida, gol e: ‘Belligol, o iluminado’. Viralizou, foi bacana. Não conversei com ele, mas ele gostou, curtiu e postou, isso já vale”, afirma.
Realizado por ter sido reconhecido pelo meio-campista merengue, Vaughan ficou ainda mais contente com a oportunidade que teve de fazer uma narração para Aubameyang, então jogador do Barcelona, na zona mista de um jogo contra o Bétis.
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O centroavante gabonês viu, nas redes sociais, um gol seu narrado pelo brasileiro e mandou uma mensagem dizendo que queria conhecê-lo. Na época, ele ainda jogava no Borussia Dortmund, e o encontro veio alguns anos depois. O narrador estava no estádio com o colega Paulo Calçade, a convite da LaLiga, e queria tentar falar com Aubameyang, mas disseram que seria muito difícil. Ele insistiu e contou a história da narração para um dos responsáveis pela comunicação.
“Falei: ‘pesquisa na internet que você vai ver’. O cara falou: vou perguntar para o Aubameyang, se ele tiver realmente vontade de te conhecer, ele vem. Antes de começar tudo, o cara olhou pra mim e disse: ‘realmente ele quer falar com você’. Acabou o jogo, a gente foi para a zona mista, só que ele não ia passar. De repente, ele passa, com um sorriso largo. Falei para o Calçade ligar o celular para filmar, em zona mista não tem muito tempo. Foi uma quebra de protocolo, abracei ele. Ele falou, ‘narra pra mim: Auba!’. Foi um barulho enorme na zona mista, a gente levou uma dura, mas valeu”, conta.
Hoje, como titular da ESPN, Vaughan é o responsável pelas principais partidas do Campeonato Inglês e da Libertadores, produtos mais valorizados da casa. Narrar o torneio continental, ele admite, é uma experiência diferente. Até a aventura de trabalhar na altitude, como fez ao trabalhar em Bolívar x Flamengo, delicia o comunicador.
“Tem muito mais apelo, é direto com a emoção do torcedor. É muito diferente, é gostoso. Eu estava em La Paz agora, narrando jogo, nunca tinha ido. Você pousa em um aeroporto que fica a mil metros do nível do mar. Seu corpo não produz emacias suficientes para hemoglobina te levar oxigênio. Você puxa e o ar não vem. Eu estava com medo de ir para o estádio e faltar ar, mas deu pra fazer numa boa. Mas companheiros que sofreram bastante. É muito legal, maravilhoso, de conviver nesse ambiente, com O povo boliviano. Um povo com sorriso aberto, somos irmãos, você vê o dia a dia das pessoas”, diz.
Quanto ao título de número 1, Vaughan sente que seu trabalho foi reconhecido, mas não se envaidece e vê pouca diferença no trabalho que já realiza há 25 anos na mesma emissora. “Você fazer o que você gosta é uma das coisas mais maravilhosas do mundo, nem todo mundo tem esse privilégio. Ao longo desses 25 anos, eu convivi com pessoas maravilhosas, algumas já nos deixaram, já partiram, e fica a saudade, fica a lembrança. A gente tem de aproveitar cada momento, porque, como diria o poeta: ‘a vida é muito curta para ser pequena’”.