A saga do tenista brasileiro que decidiu se arriscar no circuito profissional aos 30 anos


Karue Sell escolheu o tênis universitário, se formou na UCLA e treinou com Naomi Osaka; agora, quer ver até onde pode ir no ranking da ATP e registra a jornada em vídeos

Por Bruno Accorsi
Atualização:

Karue Sell escolheu o caminho do tênis universitário, pouco mais de uma década atrás, depois de ser top 50 no circuito mundial juvenil, em 2010. Não se arrependeu, pois queria estudar e se formou em Relações Internacionais na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), embora nunca tenha exercido a profissão. É que a paixão pelo tênis falou mais alto e o levou até a trabalhar como rebatedor - profissional que participa dos treinos de tenistas simulando seus adversários - de nomes como a estrela japonesa Naomi Osaka. Agora, aos 30 anos, o catarinense de Jaraguá do Sul quer ver o quão longe consegue chegar no circuito profissional.

Ao longo dos anos, Karue, radicado em Los Angeles desde os tempos de UCLA, fez incursões pontuais por torneios que contam pontos para o ranking da Associação de Tenistas Profissionais (ATP) e teve o 371º lugar como melhor colocação, em 2018. A meta é superar a própria marca, antes de pensar em escalar mais.

Sem participar de competições profissionais desde 2019, ele decidiu fazer uma nova investida por que conseguiu abrir portas por meio do canal que mantém no YouTube com o amigo Guilherme Hadlich, o My Tennis HQ. Dentro da plataforma, na qual tem mais de 130 mil inscritos, lançou a série Virando profissional aos 30. Essa exposição o ajuda a se manter no circuito, com a ajuda de patrocinadores.

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“Começar do zero, financeiramente, é muito difícil. Mas, no final do ano passado, o canal cresceu bastante e começou a abrir oportunidades que eu pensei: ‘Dá para jogar e dá para se manter financeiramente jogando, e eu acho que é uma história legal para contar no canal’. Imaginei que o pessoal que esteve junto nesses três, quatro anos, iria gostar me ver jogar. Muitos seguidores perguntavam ‘por que você não está jogando?’”, conta o tenista ao Estadão.

Karue Sell voltou a se arriscar no circuito profissional aos 30 anos. Foto: João Pires/Instituto Sports

“Se estivesse só trabalhando com treinos, não daria, porque é saber que você vai ter que gastar 40, 50 mil dólares no ano com viagens, coisas assim. Então, lógico você não vai fazer isso, ainda mais com 30 anos. Eu tenho noiva e dois cachorros, não é um negócio tipo: ‘ah, eu estou sozinho aqui e vamos fazer isso’. Não é um trabalho fácil, requer bastante tempo isso de trabalhar com conteúdo, nos três primeiros anos não dá dinheiro nenhum, mas pelo menos há a possibilidade de vender sua história, sua imagem”, completa.

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O My Tennis HQ cresceu por oferecer um conteúdo de dicas de tênis com foco em praticantes de nível mais avançado e pela forma que Karue mostra sua rotina no esporte, incluindo seu trabalho como rebatedor. Um vídeo de 21 minutos do brasileiro treinando com Naomi Osaka foi visto por 148 mil pessoas, e um corte de pouco menos de um minuto do mesmo vídeo bateu 946 mil visualizações. A comunidade que ele construiu o inspirou a voltar a se arriscar como profissional, porém sem colocar grandes expectativas sobre si.

“Não estou muito preocupado com ‘vou chegar ao top 100′. É mais na linha de que nível que eu posso jogar. Quais são as histórias que eu também posso contar que são interessantes? Foi uma progressão natural, não só pessoal, em termos de querer tentar, porque eu também não vou ter muito mais tempo para fazer isso. Tenho 30 anos, é agora ou nunca. O tênis é aquela coisa: não dá para jogar o teu maior nível quando você já tem 40. Então ,claro, vamos tentar agora me dar uns dois anos assim para ver o que acontece”, diz.

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Novos primeiros passos e forma física

A decisão de voltar ao circuito amadureceu no fim do ano passado. Zerado em pontuação, Karue pediu um wild card, espécie de convite, para disputar um ITF 15 em Monastir, na Tunísia. Foi eliminado nas quartas de final do torneio e somou dois pontos. Disputou ainda mais duas competições em 2023 “para se testar” e iniciou 2024 focado em se preparar, levar a rotina adequada para competir em alto nível.

Neste ano, já competiu em dez torneios. Entre o fim de abril e o começo de maio, jogou os Challengers de Santos e de Porto Alegre, chegando a bater atletas mais bem ranqueados, como o francês Calvin Hemery, número 194 do mundo. Neste momento, Karue ocupa a 506ª posição, mas acredita que consegue entrar no top 300 em breve.

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“Acho que consigo passar até o final do verão americano, até setembro. Vou jogar bastante, então eu acho que até lá eu passo. Se eu conseguir entrar no top 300, aí eu posso jogar bastante Challenger, aí consigo me manter nesse ranking porque você está jogando por mais ponto, mas eu preciso ganhar um torneio grande, fazer uma semifinal de Challenger”, explica.

Os Challengers fazem parte do circuito intermediário da ATP, acima dos ITF, e são divididos em cinco níveis - o mais alto é o 175. O circuito principal é o ATP, que compreende do nível ATP 250 aos Grand Slams. A participação nesse torneios depende da classificação dos atletas no ranking, mas existe a possibilidade de vagas por meio de wild cards. Karuel Sell tem o objetivo de conseguir disputar um torneio de nível ATP. Desde que começou a nova jornada como profissional, tem se sentido bem física e tecnicamente para isso, mas trabalha com inteligência na escolha dos torneios.

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“Estou jogando bem. Gosto muito dos dos jogos, gosto de treinar, mas eu não gosto do circuito, ter que viajar tanto. Isso meio que acaba com o corpo, e as gente não está viajando de primeira classe como muitos jogadores top. Eu tenho jogado mais ou menos duas semanas por mês, porque eu sei que eu quero me dar a melhor chance de ganhar”, diz.

“Vai quatro, cinco semanas, e na terceira semana a gente já está meio cansado mentalmente. Estou mentalmente bem para para ganhar o torneio ou não? Fisicamente tem sido meio difícil a parte de às vezes se recuperar de semana a semana, então às vezes você vai bem na primeira semana, que nem eu fui em Porto Alegre. E aí você tem que viajar e chega no outro torneio já meio cansado. Estou buscando um equilíbrio”, conclui.

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A opção pelo tênis universitário

O ingrato mundo do tênis sempre colocou questionamentos na cabeça do tenista catarinense, até por isso ele acabou optando pelo tênis universitário, em 2011, decisão que considera mais que acertada. “Eu estava saindo do Juniors e começando a jogar Futures (atual ITF), começando a sentir o que ia ser jogar profissional. E na minha cabeça eu pensava ‘não estou preparado para isso, acho que vou jogar um ano e querer parar, não vou gostar disso’. Sempre pensei em tênis universitário. Na verdade, foi uma decisão fácil. Foi só achar o lugar certo.”

Estava tudo encaminhado para ingressar em uma universidade da Flórida, mas surgiu a oportunidade de uma bolsa na UCLA, que tem um time muito forte de tênis. Karue aceitou sem nem mesmo visitar as dependências da universidade, convicto de que lhe faria bem poder continuar jogando ao mesmo tempo em que se formava em uma instituição renomada. Ali, se viu fora da pressão gerada pela expectativa colocada sobre jovens talentos do tênis brasileiro, situação vivida por João Fonseca, uma das principais promessas do Brasil, com participações em torneios da ATP aos 17 anos.

“Acho que no Brasil a gente ainda que ver caras tipo o Fonseca ganhando torneios grandes e tal, mas na verdade isso não acontece. Acontece com uma pequena fração de jogadores que são muito fora da curva, mas para a maioria da galera, dos 18 até os 22, você vai estar tomando na cabeça em Future. Aí, com 22 talvez você consiga passar para os Challenger, você vai levar mais quatro anos, essa progressão é muito longa”, afirma. “Eu terminei o college com 22, tirei um ano praticamente off, aí voltei a jogar e estava na frente de muitos caras da minha idade que estavam jogando desde os 18. Falei: ‘não sei como vocês estão seis anos jogando no mesmo lugar’. Para mim, não daria certo”.

Treinando com uma superstar

Depois de se formar, chegou a trabalhar por um ano como técnico na Universidade Pepperdine, em Malibu, na Califórnia, mas parou para voltar a jogar. Em um momento de menos atividade em competições, começou a fazer alguns contatos, como com a americana Shelby Rogers, que o permitiram começar a atuar como rebatedor. Fez a função, inclusive, na comissão da seleção dos EUA que disputou a Fed Cup, antigo nome da atual Billie Jean King, em 2017.

Em 2019, Naomi Osaka se mudou da Flórida para Los Angeles, e seus agentes estavam procurando rebatedores na cidade. Karue foi indicado e começou a trabalhar com ela em dezembro. A pandemia atrapalhou os treinamentos, até porque torneios foram cancelados, mas a retomada foi de glórias. Com o brasileiro na equipe, Osaka foi campeã do US Open em 2020 e do Aberto da Austrália em 2021, Grand Slams que já havia vencido em 2018 e 2019, respectivamente.

“Não era algo que eu estava procurando, mas acabou acontecendo”, conta. “Quando eu entrei, o coach era novo, o Wim Fissette, que está com ela até hoje, e a gente entrou juntos. Ele é um cara novo, mas com bastante experiência, já levou várias meninas a ganhar Grand Slam. A gente treinou bastante, aprendi bastante, ele era um cara aberto às minhas opiniões. Viu que entendia de tênis e não era só ‘cala boca e bate na bola’. Ele me fazia perguntas, pedia para eu conversar com a Naomi. Foi bem legal e deu pra ver como ela era muito superstar, mais do que jogadores masculinos. Viajei com o Marcos Giron ano passado, e é diferente”.

Foi enquanto trabalhava com Naomi que o tenista catarinense começou a desenvolver o canal My Tennis HQ. Ele produz o conteúdo em inglês e recebe visualizações de todo mundo, mas conquistar o público brasileiro é uma de suas grandes satisfações. O projeto Virando profissional aos 30 está ajudando nesta conexão.

“A gente está conseguindo ter um pouco mais de a galera no Brasil. Lógico que eu faço tudo em inglês no canal, porque no final as contas fazer em português me limitaria. Mas quando fui jogar no Brasil, eu recebi bastante apoio, o pessoal do Brasil entendendo: ‘ah é um brasileiro aqui’. Muita gente comentava que não sabia que eu era brasileiro. Então, esse último mês tem sido bem legal de ver que deu a comunidade brasileira comentando nos vídeos e realmente está ajudando a gente a crescer.”

Karue Sell escolheu o caminho do tênis universitário, pouco mais de uma década atrás, depois de ser top 50 no circuito mundial juvenil, em 2010. Não se arrependeu, pois queria estudar e se formou em Relações Internacionais na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), embora nunca tenha exercido a profissão. É que a paixão pelo tênis falou mais alto e o levou até a trabalhar como rebatedor - profissional que participa dos treinos de tenistas simulando seus adversários - de nomes como a estrela japonesa Naomi Osaka. Agora, aos 30 anos, o catarinense de Jaraguá do Sul quer ver o quão longe consegue chegar no circuito profissional.

Ao longo dos anos, Karue, radicado em Los Angeles desde os tempos de UCLA, fez incursões pontuais por torneios que contam pontos para o ranking da Associação de Tenistas Profissionais (ATP) e teve o 371º lugar como melhor colocação, em 2018. A meta é superar a própria marca, antes de pensar em escalar mais.

Sem participar de competições profissionais desde 2019, ele decidiu fazer uma nova investida por que conseguiu abrir portas por meio do canal que mantém no YouTube com o amigo Guilherme Hadlich, o My Tennis HQ. Dentro da plataforma, na qual tem mais de 130 mil inscritos, lançou a série Virando profissional aos 30. Essa exposição o ajuda a se manter no circuito, com a ajuda de patrocinadores.

“Começar do zero, financeiramente, é muito difícil. Mas, no final do ano passado, o canal cresceu bastante e começou a abrir oportunidades que eu pensei: ‘Dá para jogar e dá para se manter financeiramente jogando, e eu acho que é uma história legal para contar no canal’. Imaginei que o pessoal que esteve junto nesses três, quatro anos, iria gostar me ver jogar. Muitos seguidores perguntavam ‘por que você não está jogando?’”, conta o tenista ao Estadão.

Karue Sell voltou a se arriscar no circuito profissional aos 30 anos. Foto: João Pires/Instituto Sports

“Se estivesse só trabalhando com treinos, não daria, porque é saber que você vai ter que gastar 40, 50 mil dólares no ano com viagens, coisas assim. Então, lógico você não vai fazer isso, ainda mais com 30 anos. Eu tenho noiva e dois cachorros, não é um negócio tipo: ‘ah, eu estou sozinho aqui e vamos fazer isso’. Não é um trabalho fácil, requer bastante tempo isso de trabalhar com conteúdo, nos três primeiros anos não dá dinheiro nenhum, mas pelo menos há a possibilidade de vender sua história, sua imagem”, completa.

O My Tennis HQ cresceu por oferecer um conteúdo de dicas de tênis com foco em praticantes de nível mais avançado e pela forma que Karue mostra sua rotina no esporte, incluindo seu trabalho como rebatedor. Um vídeo de 21 minutos do brasileiro treinando com Naomi Osaka foi visto por 148 mil pessoas, e um corte de pouco menos de um minuto do mesmo vídeo bateu 946 mil visualizações. A comunidade que ele construiu o inspirou a voltar a se arriscar como profissional, porém sem colocar grandes expectativas sobre si.

“Não estou muito preocupado com ‘vou chegar ao top 100′. É mais na linha de que nível que eu posso jogar. Quais são as histórias que eu também posso contar que são interessantes? Foi uma progressão natural, não só pessoal, em termos de querer tentar, porque eu também não vou ter muito mais tempo para fazer isso. Tenho 30 anos, é agora ou nunca. O tênis é aquela coisa: não dá para jogar o teu maior nível quando você já tem 40. Então ,claro, vamos tentar agora me dar uns dois anos assim para ver o que acontece”, diz.

Novos primeiros passos e forma física

A decisão de voltar ao circuito amadureceu no fim do ano passado. Zerado em pontuação, Karue pediu um wild card, espécie de convite, para disputar um ITF 15 em Monastir, na Tunísia. Foi eliminado nas quartas de final do torneio e somou dois pontos. Disputou ainda mais duas competições em 2023 “para se testar” e iniciou 2024 focado em se preparar, levar a rotina adequada para competir em alto nível.

Neste ano, já competiu em dez torneios. Entre o fim de abril e o começo de maio, jogou os Challengers de Santos e de Porto Alegre, chegando a bater atletas mais bem ranqueados, como o francês Calvin Hemery, número 194 do mundo. Neste momento, Karue ocupa a 506ª posição, mas acredita que consegue entrar no top 300 em breve.

“Acho que consigo passar até o final do verão americano, até setembro. Vou jogar bastante, então eu acho que até lá eu passo. Se eu conseguir entrar no top 300, aí eu posso jogar bastante Challenger, aí consigo me manter nesse ranking porque você está jogando por mais ponto, mas eu preciso ganhar um torneio grande, fazer uma semifinal de Challenger”, explica.

Os Challengers fazem parte do circuito intermediário da ATP, acima dos ITF, e são divididos em cinco níveis - o mais alto é o 175. O circuito principal é o ATP, que compreende do nível ATP 250 aos Grand Slams. A participação nesse torneios depende da classificação dos atletas no ranking, mas existe a possibilidade de vagas por meio de wild cards. Karuel Sell tem o objetivo de conseguir disputar um torneio de nível ATP. Desde que começou a nova jornada como profissional, tem se sentido bem física e tecnicamente para isso, mas trabalha com inteligência na escolha dos torneios.

“Estou jogando bem. Gosto muito dos dos jogos, gosto de treinar, mas eu não gosto do circuito, ter que viajar tanto. Isso meio que acaba com o corpo, e as gente não está viajando de primeira classe como muitos jogadores top. Eu tenho jogado mais ou menos duas semanas por mês, porque eu sei que eu quero me dar a melhor chance de ganhar”, diz.

“Vai quatro, cinco semanas, e na terceira semana a gente já está meio cansado mentalmente. Estou mentalmente bem para para ganhar o torneio ou não? Fisicamente tem sido meio difícil a parte de às vezes se recuperar de semana a semana, então às vezes você vai bem na primeira semana, que nem eu fui em Porto Alegre. E aí você tem que viajar e chega no outro torneio já meio cansado. Estou buscando um equilíbrio”, conclui.

A opção pelo tênis universitário

O ingrato mundo do tênis sempre colocou questionamentos na cabeça do tenista catarinense, até por isso ele acabou optando pelo tênis universitário, em 2011, decisão que considera mais que acertada. “Eu estava saindo do Juniors e começando a jogar Futures (atual ITF), começando a sentir o que ia ser jogar profissional. E na minha cabeça eu pensava ‘não estou preparado para isso, acho que vou jogar um ano e querer parar, não vou gostar disso’. Sempre pensei em tênis universitário. Na verdade, foi uma decisão fácil. Foi só achar o lugar certo.”

Estava tudo encaminhado para ingressar em uma universidade da Flórida, mas surgiu a oportunidade de uma bolsa na UCLA, que tem um time muito forte de tênis. Karue aceitou sem nem mesmo visitar as dependências da universidade, convicto de que lhe faria bem poder continuar jogando ao mesmo tempo em que se formava em uma instituição renomada. Ali, se viu fora da pressão gerada pela expectativa colocada sobre jovens talentos do tênis brasileiro, situação vivida por João Fonseca, uma das principais promessas do Brasil, com participações em torneios da ATP aos 17 anos.

“Acho que no Brasil a gente ainda que ver caras tipo o Fonseca ganhando torneios grandes e tal, mas na verdade isso não acontece. Acontece com uma pequena fração de jogadores que são muito fora da curva, mas para a maioria da galera, dos 18 até os 22, você vai estar tomando na cabeça em Future. Aí, com 22 talvez você consiga passar para os Challenger, você vai levar mais quatro anos, essa progressão é muito longa”, afirma. “Eu terminei o college com 22, tirei um ano praticamente off, aí voltei a jogar e estava na frente de muitos caras da minha idade que estavam jogando desde os 18. Falei: ‘não sei como vocês estão seis anos jogando no mesmo lugar’. Para mim, não daria certo”.

Treinando com uma superstar

Depois de se formar, chegou a trabalhar por um ano como técnico na Universidade Pepperdine, em Malibu, na Califórnia, mas parou para voltar a jogar. Em um momento de menos atividade em competições, começou a fazer alguns contatos, como com a americana Shelby Rogers, que o permitiram começar a atuar como rebatedor. Fez a função, inclusive, na comissão da seleção dos EUA que disputou a Fed Cup, antigo nome da atual Billie Jean King, em 2017.

Em 2019, Naomi Osaka se mudou da Flórida para Los Angeles, e seus agentes estavam procurando rebatedores na cidade. Karue foi indicado e começou a trabalhar com ela em dezembro. A pandemia atrapalhou os treinamentos, até porque torneios foram cancelados, mas a retomada foi de glórias. Com o brasileiro na equipe, Osaka foi campeã do US Open em 2020 e do Aberto da Austrália em 2021, Grand Slams que já havia vencido em 2018 e 2019, respectivamente.

“Não era algo que eu estava procurando, mas acabou acontecendo”, conta. “Quando eu entrei, o coach era novo, o Wim Fissette, que está com ela até hoje, e a gente entrou juntos. Ele é um cara novo, mas com bastante experiência, já levou várias meninas a ganhar Grand Slam. A gente treinou bastante, aprendi bastante, ele era um cara aberto às minhas opiniões. Viu que entendia de tênis e não era só ‘cala boca e bate na bola’. Ele me fazia perguntas, pedia para eu conversar com a Naomi. Foi bem legal e deu pra ver como ela era muito superstar, mais do que jogadores masculinos. Viajei com o Marcos Giron ano passado, e é diferente”.

Foi enquanto trabalhava com Naomi que o tenista catarinense começou a desenvolver o canal My Tennis HQ. Ele produz o conteúdo em inglês e recebe visualizações de todo mundo, mas conquistar o público brasileiro é uma de suas grandes satisfações. O projeto Virando profissional aos 30 está ajudando nesta conexão.

“A gente está conseguindo ter um pouco mais de a galera no Brasil. Lógico que eu faço tudo em inglês no canal, porque no final as contas fazer em português me limitaria. Mas quando fui jogar no Brasil, eu recebi bastante apoio, o pessoal do Brasil entendendo: ‘ah é um brasileiro aqui’. Muita gente comentava que não sabia que eu era brasileiro. Então, esse último mês tem sido bem legal de ver que deu a comunidade brasileira comentando nos vídeos e realmente está ajudando a gente a crescer.”

Karue Sell escolheu o caminho do tênis universitário, pouco mais de uma década atrás, depois de ser top 50 no circuito mundial juvenil, em 2010. Não se arrependeu, pois queria estudar e se formou em Relações Internacionais na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), embora nunca tenha exercido a profissão. É que a paixão pelo tênis falou mais alto e o levou até a trabalhar como rebatedor - profissional que participa dos treinos de tenistas simulando seus adversários - de nomes como a estrela japonesa Naomi Osaka. Agora, aos 30 anos, o catarinense de Jaraguá do Sul quer ver o quão longe consegue chegar no circuito profissional.

Ao longo dos anos, Karue, radicado em Los Angeles desde os tempos de UCLA, fez incursões pontuais por torneios que contam pontos para o ranking da Associação de Tenistas Profissionais (ATP) e teve o 371º lugar como melhor colocação, em 2018. A meta é superar a própria marca, antes de pensar em escalar mais.

Sem participar de competições profissionais desde 2019, ele decidiu fazer uma nova investida por que conseguiu abrir portas por meio do canal que mantém no YouTube com o amigo Guilherme Hadlich, o My Tennis HQ. Dentro da plataforma, na qual tem mais de 130 mil inscritos, lançou a série Virando profissional aos 30. Essa exposição o ajuda a se manter no circuito, com a ajuda de patrocinadores.

“Começar do zero, financeiramente, é muito difícil. Mas, no final do ano passado, o canal cresceu bastante e começou a abrir oportunidades que eu pensei: ‘Dá para jogar e dá para se manter financeiramente jogando, e eu acho que é uma história legal para contar no canal’. Imaginei que o pessoal que esteve junto nesses três, quatro anos, iria gostar me ver jogar. Muitos seguidores perguntavam ‘por que você não está jogando?’”, conta o tenista ao Estadão.

Karue Sell voltou a se arriscar no circuito profissional aos 30 anos. Foto: João Pires/Instituto Sports

“Se estivesse só trabalhando com treinos, não daria, porque é saber que você vai ter que gastar 40, 50 mil dólares no ano com viagens, coisas assim. Então, lógico você não vai fazer isso, ainda mais com 30 anos. Eu tenho noiva e dois cachorros, não é um negócio tipo: ‘ah, eu estou sozinho aqui e vamos fazer isso’. Não é um trabalho fácil, requer bastante tempo isso de trabalhar com conteúdo, nos três primeiros anos não dá dinheiro nenhum, mas pelo menos há a possibilidade de vender sua história, sua imagem”, completa.

O My Tennis HQ cresceu por oferecer um conteúdo de dicas de tênis com foco em praticantes de nível mais avançado e pela forma que Karue mostra sua rotina no esporte, incluindo seu trabalho como rebatedor. Um vídeo de 21 minutos do brasileiro treinando com Naomi Osaka foi visto por 148 mil pessoas, e um corte de pouco menos de um minuto do mesmo vídeo bateu 946 mil visualizações. A comunidade que ele construiu o inspirou a voltar a se arriscar como profissional, porém sem colocar grandes expectativas sobre si.

“Não estou muito preocupado com ‘vou chegar ao top 100′. É mais na linha de que nível que eu posso jogar. Quais são as histórias que eu também posso contar que são interessantes? Foi uma progressão natural, não só pessoal, em termos de querer tentar, porque eu também não vou ter muito mais tempo para fazer isso. Tenho 30 anos, é agora ou nunca. O tênis é aquela coisa: não dá para jogar o teu maior nível quando você já tem 40. Então ,claro, vamos tentar agora me dar uns dois anos assim para ver o que acontece”, diz.

Novos primeiros passos e forma física

A decisão de voltar ao circuito amadureceu no fim do ano passado. Zerado em pontuação, Karue pediu um wild card, espécie de convite, para disputar um ITF 15 em Monastir, na Tunísia. Foi eliminado nas quartas de final do torneio e somou dois pontos. Disputou ainda mais duas competições em 2023 “para se testar” e iniciou 2024 focado em se preparar, levar a rotina adequada para competir em alto nível.

Neste ano, já competiu em dez torneios. Entre o fim de abril e o começo de maio, jogou os Challengers de Santos e de Porto Alegre, chegando a bater atletas mais bem ranqueados, como o francês Calvin Hemery, número 194 do mundo. Neste momento, Karue ocupa a 506ª posição, mas acredita que consegue entrar no top 300 em breve.

“Acho que consigo passar até o final do verão americano, até setembro. Vou jogar bastante, então eu acho que até lá eu passo. Se eu conseguir entrar no top 300, aí eu posso jogar bastante Challenger, aí consigo me manter nesse ranking porque você está jogando por mais ponto, mas eu preciso ganhar um torneio grande, fazer uma semifinal de Challenger”, explica.

Os Challengers fazem parte do circuito intermediário da ATP, acima dos ITF, e são divididos em cinco níveis - o mais alto é o 175. O circuito principal é o ATP, que compreende do nível ATP 250 aos Grand Slams. A participação nesse torneios depende da classificação dos atletas no ranking, mas existe a possibilidade de vagas por meio de wild cards. Karuel Sell tem o objetivo de conseguir disputar um torneio de nível ATP. Desde que começou a nova jornada como profissional, tem se sentido bem física e tecnicamente para isso, mas trabalha com inteligência na escolha dos torneios.

“Estou jogando bem. Gosto muito dos dos jogos, gosto de treinar, mas eu não gosto do circuito, ter que viajar tanto. Isso meio que acaba com o corpo, e as gente não está viajando de primeira classe como muitos jogadores top. Eu tenho jogado mais ou menos duas semanas por mês, porque eu sei que eu quero me dar a melhor chance de ganhar”, diz.

“Vai quatro, cinco semanas, e na terceira semana a gente já está meio cansado mentalmente. Estou mentalmente bem para para ganhar o torneio ou não? Fisicamente tem sido meio difícil a parte de às vezes se recuperar de semana a semana, então às vezes você vai bem na primeira semana, que nem eu fui em Porto Alegre. E aí você tem que viajar e chega no outro torneio já meio cansado. Estou buscando um equilíbrio”, conclui.

A opção pelo tênis universitário

O ingrato mundo do tênis sempre colocou questionamentos na cabeça do tenista catarinense, até por isso ele acabou optando pelo tênis universitário, em 2011, decisão que considera mais que acertada. “Eu estava saindo do Juniors e começando a jogar Futures (atual ITF), começando a sentir o que ia ser jogar profissional. E na minha cabeça eu pensava ‘não estou preparado para isso, acho que vou jogar um ano e querer parar, não vou gostar disso’. Sempre pensei em tênis universitário. Na verdade, foi uma decisão fácil. Foi só achar o lugar certo.”

Estava tudo encaminhado para ingressar em uma universidade da Flórida, mas surgiu a oportunidade de uma bolsa na UCLA, que tem um time muito forte de tênis. Karue aceitou sem nem mesmo visitar as dependências da universidade, convicto de que lhe faria bem poder continuar jogando ao mesmo tempo em que se formava em uma instituição renomada. Ali, se viu fora da pressão gerada pela expectativa colocada sobre jovens talentos do tênis brasileiro, situação vivida por João Fonseca, uma das principais promessas do Brasil, com participações em torneios da ATP aos 17 anos.

“Acho que no Brasil a gente ainda que ver caras tipo o Fonseca ganhando torneios grandes e tal, mas na verdade isso não acontece. Acontece com uma pequena fração de jogadores que são muito fora da curva, mas para a maioria da galera, dos 18 até os 22, você vai estar tomando na cabeça em Future. Aí, com 22 talvez você consiga passar para os Challenger, você vai levar mais quatro anos, essa progressão é muito longa”, afirma. “Eu terminei o college com 22, tirei um ano praticamente off, aí voltei a jogar e estava na frente de muitos caras da minha idade que estavam jogando desde os 18. Falei: ‘não sei como vocês estão seis anos jogando no mesmo lugar’. Para mim, não daria certo”.

Treinando com uma superstar

Depois de se formar, chegou a trabalhar por um ano como técnico na Universidade Pepperdine, em Malibu, na Califórnia, mas parou para voltar a jogar. Em um momento de menos atividade em competições, começou a fazer alguns contatos, como com a americana Shelby Rogers, que o permitiram começar a atuar como rebatedor. Fez a função, inclusive, na comissão da seleção dos EUA que disputou a Fed Cup, antigo nome da atual Billie Jean King, em 2017.

Em 2019, Naomi Osaka se mudou da Flórida para Los Angeles, e seus agentes estavam procurando rebatedores na cidade. Karue foi indicado e começou a trabalhar com ela em dezembro. A pandemia atrapalhou os treinamentos, até porque torneios foram cancelados, mas a retomada foi de glórias. Com o brasileiro na equipe, Osaka foi campeã do US Open em 2020 e do Aberto da Austrália em 2021, Grand Slams que já havia vencido em 2018 e 2019, respectivamente.

“Não era algo que eu estava procurando, mas acabou acontecendo”, conta. “Quando eu entrei, o coach era novo, o Wim Fissette, que está com ela até hoje, e a gente entrou juntos. Ele é um cara novo, mas com bastante experiência, já levou várias meninas a ganhar Grand Slam. A gente treinou bastante, aprendi bastante, ele era um cara aberto às minhas opiniões. Viu que entendia de tênis e não era só ‘cala boca e bate na bola’. Ele me fazia perguntas, pedia para eu conversar com a Naomi. Foi bem legal e deu pra ver como ela era muito superstar, mais do que jogadores masculinos. Viajei com o Marcos Giron ano passado, e é diferente”.

Foi enquanto trabalhava com Naomi que o tenista catarinense começou a desenvolver o canal My Tennis HQ. Ele produz o conteúdo em inglês e recebe visualizações de todo mundo, mas conquistar o público brasileiro é uma de suas grandes satisfações. O projeto Virando profissional aos 30 está ajudando nesta conexão.

“A gente está conseguindo ter um pouco mais de a galera no Brasil. Lógico que eu faço tudo em inglês no canal, porque no final as contas fazer em português me limitaria. Mas quando fui jogar no Brasil, eu recebi bastante apoio, o pessoal do Brasil entendendo: ‘ah é um brasileiro aqui’. Muita gente comentava que não sabia que eu era brasileiro. Então, esse último mês tem sido bem legal de ver que deu a comunidade brasileira comentando nos vídeos e realmente está ajudando a gente a crescer.”

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