Peru


Futebolisticamente, fazia tempo que não me ocupava com a seleção peruana

Por Ugo Giorgetti

Como não há qualquer outro jogo de futebol com algum atrativo, minhas atenções se voltaram para a final da Copa América. E pensei na seleção do Peru. Futebolisticamente, fazia tempo que não me ocupava dela. No entanto, algumas vezes no passado, estivemos, eu e ela, envolvidos de alguma maneira. Poucas, mas significativas vezes.

Minhas memórias do Peru são, como quase todas as memórias, incertas, vacilantes, envolvidas numa neblina que se move, às vezes espessa, às vezes tão fina que dá para lembrar detalhes. Poderia procurar no Google, me certificar, ver a verdade da coisa que na minha mente oscila. Não faço isso. A pesquisa pela certeza anula a memória, ou pelo menos, tira o encanto do passar do tempo e da incerteza que isso implica. Consultado o Google, a memória, até então algo que envolvia saudade, afeição, procura de mim mesmo, se transforma em exercício de estatística, contabilidade, números frios.

Cineasta Ugo Giorgetti é colunista de Esportesdo 'Estado' Foto: Estadão
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Não quero isso, fico com as minhas incertezas. A primeira coisa que me ocorre do Peru, no futebol, é um jogo, acho que pelas Eliminatórias da Copa de 1958 no Maracanã. Estou quase certo que era a Copa de 58, mas se não for é qualquer outra em que no meio-campo do Brasil estava, frio, sereno e genial, o grande Didi. Como Didi ganhou a Copa de 58, dou como certo que era ela. 

O jogo definia, ou quase, a presença do Brasil na Copa. Era decisivo. E estava duro, se mantendo num perigoso zero a zero. Até que, com a torcida quase em desespero, há uma falta perto da área. Eram essas faltas a delícia de batedores como o dr. Rubis, do Flamengo, ou Cláudio Cristovam de Pinho, do Corinthians, mas só as cobranças de Didi, dessa distância e posição, tinham um nome: “folha seca”. Quem deu esse nome não sei, certamente alguém do Rio.

O fato é que a bola, como as de Cláudio e do dr. Rubis, subia para evitar a barreira e despencava subitamente no gol, como uma folha seca. Com a folha seca de Didi o Brasil ia à Copa. E foi, graças à vitória de 1 a 0 contra esse mesmo Peru, dessa mesma camisa branca atravessada por uma faixa vermelha, no estilo das do Vasco e Ponte Preta. 

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O Peru só voltou a me preocupar anos depois. Foi na Copa de 1970, quando o Brasil tinha o poderoso e mágico time de Gérson, Tostão, Pelé e Rivellino. Não me lembro de nenhum craque do Peru, exceto Cubillas, um fora de série, atacante perigoso, rápido, artilheiro. O fato de o Peru estar naquela Copa cheia de grandes equipes como Itália, Alemanha, Inglaterra, com jogos antológicos, já era um atestado do time que tinha. E fez um belo papel indo à frente na competição. Para contrabalancear, me lembro que tinha um goleiro estranho, meio baixo até pelos padrões da época, e inseguro. Aquele tipo de goleiro que todos achavam, com razão ou sem, que estava sempre a ponto a aceitar gol. Era a esperança de muitos brasileiros quando, por azares do destino, tivemos pela frente o Peru. 

Havia algo, porém, fora o poderio do time do Peru, que fazia desse jogo um acontecimento especial aos brasileiros. É que estava no banco o mesmo negro incrivelmente elegante, aristocrático como um “Príncipe Etíope”, apelido que tenho quase certeza que lhe foi dado por Nelson Rodrigues, impassível olhando o jogo do time que comandava. Era Didi, o nosso Didi, da folha seca, agora transformado no técnico que tinha levado o Peru a esse lugar na Copa. 

Era estranho, quase inacreditável, ver alguém tão ligado ao Brasil, um exemplo de como se jogava bola neste País, sentado no banco do rival. E lá estava ele, calado, discreto como sempre. Uma recordação talvez inexata me sopra que ele estava no banco de terno e gravata. Não sei se é verdade, mas Didi parecia que estava de terno e gravata até em campo, jogando. O Brasil ganhou, mas o que ficou desse jogo para mim foi ele. Waldir Pereira, o “Príncipe Etíope”.

Como não há qualquer outro jogo de futebol com algum atrativo, minhas atenções se voltaram para a final da Copa América. E pensei na seleção do Peru. Futebolisticamente, fazia tempo que não me ocupava dela. No entanto, algumas vezes no passado, estivemos, eu e ela, envolvidos de alguma maneira. Poucas, mas significativas vezes.

Minhas memórias do Peru são, como quase todas as memórias, incertas, vacilantes, envolvidas numa neblina que se move, às vezes espessa, às vezes tão fina que dá para lembrar detalhes. Poderia procurar no Google, me certificar, ver a verdade da coisa que na minha mente oscila. Não faço isso. A pesquisa pela certeza anula a memória, ou pelo menos, tira o encanto do passar do tempo e da incerteza que isso implica. Consultado o Google, a memória, até então algo que envolvia saudade, afeição, procura de mim mesmo, se transforma em exercício de estatística, contabilidade, números frios.

Cineasta Ugo Giorgetti é colunista de Esportesdo 'Estado' Foto: Estadão

Não quero isso, fico com as minhas incertezas. A primeira coisa que me ocorre do Peru, no futebol, é um jogo, acho que pelas Eliminatórias da Copa de 1958 no Maracanã. Estou quase certo que era a Copa de 58, mas se não for é qualquer outra em que no meio-campo do Brasil estava, frio, sereno e genial, o grande Didi. Como Didi ganhou a Copa de 58, dou como certo que era ela. 

O jogo definia, ou quase, a presença do Brasil na Copa. Era decisivo. E estava duro, se mantendo num perigoso zero a zero. Até que, com a torcida quase em desespero, há uma falta perto da área. Eram essas faltas a delícia de batedores como o dr. Rubis, do Flamengo, ou Cláudio Cristovam de Pinho, do Corinthians, mas só as cobranças de Didi, dessa distância e posição, tinham um nome: “folha seca”. Quem deu esse nome não sei, certamente alguém do Rio.

O fato é que a bola, como as de Cláudio e do dr. Rubis, subia para evitar a barreira e despencava subitamente no gol, como uma folha seca. Com a folha seca de Didi o Brasil ia à Copa. E foi, graças à vitória de 1 a 0 contra esse mesmo Peru, dessa mesma camisa branca atravessada por uma faixa vermelha, no estilo das do Vasco e Ponte Preta. 

O Peru só voltou a me preocupar anos depois. Foi na Copa de 1970, quando o Brasil tinha o poderoso e mágico time de Gérson, Tostão, Pelé e Rivellino. Não me lembro de nenhum craque do Peru, exceto Cubillas, um fora de série, atacante perigoso, rápido, artilheiro. O fato de o Peru estar naquela Copa cheia de grandes equipes como Itália, Alemanha, Inglaterra, com jogos antológicos, já era um atestado do time que tinha. E fez um belo papel indo à frente na competição. Para contrabalancear, me lembro que tinha um goleiro estranho, meio baixo até pelos padrões da época, e inseguro. Aquele tipo de goleiro que todos achavam, com razão ou sem, que estava sempre a ponto a aceitar gol. Era a esperança de muitos brasileiros quando, por azares do destino, tivemos pela frente o Peru. 

Havia algo, porém, fora o poderio do time do Peru, que fazia desse jogo um acontecimento especial aos brasileiros. É que estava no banco o mesmo negro incrivelmente elegante, aristocrático como um “Príncipe Etíope”, apelido que tenho quase certeza que lhe foi dado por Nelson Rodrigues, impassível olhando o jogo do time que comandava. Era Didi, o nosso Didi, da folha seca, agora transformado no técnico que tinha levado o Peru a esse lugar na Copa. 

Era estranho, quase inacreditável, ver alguém tão ligado ao Brasil, um exemplo de como se jogava bola neste País, sentado no banco do rival. E lá estava ele, calado, discreto como sempre. Uma recordação talvez inexata me sopra que ele estava no banco de terno e gravata. Não sei se é verdade, mas Didi parecia que estava de terno e gravata até em campo, jogando. O Brasil ganhou, mas o que ficou desse jogo para mim foi ele. Waldir Pereira, o “Príncipe Etíope”.

Como não há qualquer outro jogo de futebol com algum atrativo, minhas atenções se voltaram para a final da Copa América. E pensei na seleção do Peru. Futebolisticamente, fazia tempo que não me ocupava dela. No entanto, algumas vezes no passado, estivemos, eu e ela, envolvidos de alguma maneira. Poucas, mas significativas vezes.

Minhas memórias do Peru são, como quase todas as memórias, incertas, vacilantes, envolvidas numa neblina que se move, às vezes espessa, às vezes tão fina que dá para lembrar detalhes. Poderia procurar no Google, me certificar, ver a verdade da coisa que na minha mente oscila. Não faço isso. A pesquisa pela certeza anula a memória, ou pelo menos, tira o encanto do passar do tempo e da incerteza que isso implica. Consultado o Google, a memória, até então algo que envolvia saudade, afeição, procura de mim mesmo, se transforma em exercício de estatística, contabilidade, números frios.

Cineasta Ugo Giorgetti é colunista de Esportesdo 'Estado' Foto: Estadão

Não quero isso, fico com as minhas incertezas. A primeira coisa que me ocorre do Peru, no futebol, é um jogo, acho que pelas Eliminatórias da Copa de 1958 no Maracanã. Estou quase certo que era a Copa de 58, mas se não for é qualquer outra em que no meio-campo do Brasil estava, frio, sereno e genial, o grande Didi. Como Didi ganhou a Copa de 58, dou como certo que era ela. 

O jogo definia, ou quase, a presença do Brasil na Copa. Era decisivo. E estava duro, se mantendo num perigoso zero a zero. Até que, com a torcida quase em desespero, há uma falta perto da área. Eram essas faltas a delícia de batedores como o dr. Rubis, do Flamengo, ou Cláudio Cristovam de Pinho, do Corinthians, mas só as cobranças de Didi, dessa distância e posição, tinham um nome: “folha seca”. Quem deu esse nome não sei, certamente alguém do Rio.

O fato é que a bola, como as de Cláudio e do dr. Rubis, subia para evitar a barreira e despencava subitamente no gol, como uma folha seca. Com a folha seca de Didi o Brasil ia à Copa. E foi, graças à vitória de 1 a 0 contra esse mesmo Peru, dessa mesma camisa branca atravessada por uma faixa vermelha, no estilo das do Vasco e Ponte Preta. 

O Peru só voltou a me preocupar anos depois. Foi na Copa de 1970, quando o Brasil tinha o poderoso e mágico time de Gérson, Tostão, Pelé e Rivellino. Não me lembro de nenhum craque do Peru, exceto Cubillas, um fora de série, atacante perigoso, rápido, artilheiro. O fato de o Peru estar naquela Copa cheia de grandes equipes como Itália, Alemanha, Inglaterra, com jogos antológicos, já era um atestado do time que tinha. E fez um belo papel indo à frente na competição. Para contrabalancear, me lembro que tinha um goleiro estranho, meio baixo até pelos padrões da época, e inseguro. Aquele tipo de goleiro que todos achavam, com razão ou sem, que estava sempre a ponto a aceitar gol. Era a esperança de muitos brasileiros quando, por azares do destino, tivemos pela frente o Peru. 

Havia algo, porém, fora o poderio do time do Peru, que fazia desse jogo um acontecimento especial aos brasileiros. É que estava no banco o mesmo negro incrivelmente elegante, aristocrático como um “Príncipe Etíope”, apelido que tenho quase certeza que lhe foi dado por Nelson Rodrigues, impassível olhando o jogo do time que comandava. Era Didi, o nosso Didi, da folha seca, agora transformado no técnico que tinha levado o Peru a esse lugar na Copa. 

Era estranho, quase inacreditável, ver alguém tão ligado ao Brasil, um exemplo de como se jogava bola neste País, sentado no banco do rival. E lá estava ele, calado, discreto como sempre. Uma recordação talvez inexata me sopra que ele estava no banco de terno e gravata. Não sei se é verdade, mas Didi parecia que estava de terno e gravata até em campo, jogando. O Brasil ganhou, mas o que ficou desse jogo para mim foi ele. Waldir Pereira, o “Príncipe Etíope”.

Como não há qualquer outro jogo de futebol com algum atrativo, minhas atenções se voltaram para a final da Copa América. E pensei na seleção do Peru. Futebolisticamente, fazia tempo que não me ocupava dela. No entanto, algumas vezes no passado, estivemos, eu e ela, envolvidos de alguma maneira. Poucas, mas significativas vezes.

Minhas memórias do Peru são, como quase todas as memórias, incertas, vacilantes, envolvidas numa neblina que se move, às vezes espessa, às vezes tão fina que dá para lembrar detalhes. Poderia procurar no Google, me certificar, ver a verdade da coisa que na minha mente oscila. Não faço isso. A pesquisa pela certeza anula a memória, ou pelo menos, tira o encanto do passar do tempo e da incerteza que isso implica. Consultado o Google, a memória, até então algo que envolvia saudade, afeição, procura de mim mesmo, se transforma em exercício de estatística, contabilidade, números frios.

Cineasta Ugo Giorgetti é colunista de Esportesdo 'Estado' Foto: Estadão

Não quero isso, fico com as minhas incertezas. A primeira coisa que me ocorre do Peru, no futebol, é um jogo, acho que pelas Eliminatórias da Copa de 1958 no Maracanã. Estou quase certo que era a Copa de 58, mas se não for é qualquer outra em que no meio-campo do Brasil estava, frio, sereno e genial, o grande Didi. Como Didi ganhou a Copa de 58, dou como certo que era ela. 

O jogo definia, ou quase, a presença do Brasil na Copa. Era decisivo. E estava duro, se mantendo num perigoso zero a zero. Até que, com a torcida quase em desespero, há uma falta perto da área. Eram essas faltas a delícia de batedores como o dr. Rubis, do Flamengo, ou Cláudio Cristovam de Pinho, do Corinthians, mas só as cobranças de Didi, dessa distância e posição, tinham um nome: “folha seca”. Quem deu esse nome não sei, certamente alguém do Rio.

O fato é que a bola, como as de Cláudio e do dr. Rubis, subia para evitar a barreira e despencava subitamente no gol, como uma folha seca. Com a folha seca de Didi o Brasil ia à Copa. E foi, graças à vitória de 1 a 0 contra esse mesmo Peru, dessa mesma camisa branca atravessada por uma faixa vermelha, no estilo das do Vasco e Ponte Preta. 

O Peru só voltou a me preocupar anos depois. Foi na Copa de 1970, quando o Brasil tinha o poderoso e mágico time de Gérson, Tostão, Pelé e Rivellino. Não me lembro de nenhum craque do Peru, exceto Cubillas, um fora de série, atacante perigoso, rápido, artilheiro. O fato de o Peru estar naquela Copa cheia de grandes equipes como Itália, Alemanha, Inglaterra, com jogos antológicos, já era um atestado do time que tinha. E fez um belo papel indo à frente na competição. Para contrabalancear, me lembro que tinha um goleiro estranho, meio baixo até pelos padrões da época, e inseguro. Aquele tipo de goleiro que todos achavam, com razão ou sem, que estava sempre a ponto a aceitar gol. Era a esperança de muitos brasileiros quando, por azares do destino, tivemos pela frente o Peru. 

Havia algo, porém, fora o poderio do time do Peru, que fazia desse jogo um acontecimento especial aos brasileiros. É que estava no banco o mesmo negro incrivelmente elegante, aristocrático como um “Príncipe Etíope”, apelido que tenho quase certeza que lhe foi dado por Nelson Rodrigues, impassível olhando o jogo do time que comandava. Era Didi, o nosso Didi, da folha seca, agora transformado no técnico que tinha levado o Peru a esse lugar na Copa. 

Era estranho, quase inacreditável, ver alguém tão ligado ao Brasil, um exemplo de como se jogava bola neste País, sentado no banco do rival. E lá estava ele, calado, discreto como sempre. Uma recordação talvez inexata me sopra que ele estava no banco de terno e gravata. Não sei se é verdade, mas Didi parecia que estava de terno e gravata até em campo, jogando. O Brasil ganhou, mas o que ficou desse jogo para mim foi ele. Waldir Pereira, o “Príncipe Etíope”.

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