Fórmula 1: Lewis Hamilton revela que vai trazer seu projeto social para o Brasil


Em entrevista exclusiva ao ‘Estadão’, piloto da Mercedes analisa temporada, fala sobre hobbies e aponta qual legado vai deixar para a F-1

Por Felipe Rosa Mendes
Entrevista comLewis Hamiltonheptacampeão mundial de Fórmula 1

Cada vez mais “brasileiro”, Lewis Hamilton agora quer atuar mais diretamente no País que lhe concedeu o status de cidadão honorário há um ano. O piloto britânico, heptacampeão mundial de Fórmula 1, revelou, em entrevista exclusiva ao Estadão nesta quarta-feira, que pretende criar uma base do seu projeto social no Brasil no futuro. Ele afirmou que o Mission 44, nome da sua organização sem fins lucrativos, deve fincar raízes no Brasil num prazo de dois anos.

Hamilton revelou também que algumas das crianças que ele atende em Londres estarão no País no fim de semana para acompanhar de perto o GP de São Paulo de Fórmula 1, no Autódromo de Interlagos. “Quero mostrar a elas uma realidade que também pode ser possível no futuro”, disse o piloto da Mercedes.

Neste bate-papo, Hamilton falou com sinceridade sobre as dificuldades que ele e sua equipe vêm enfrentando na F-1 nas últimas duas temporadas. Afirmou que a categoria não ocupa mais o pináculo da tecnologia em algumas áreas técnicas. Também comentou sobre sua vida fora das pistas, seu legado e sobre como pensa que será sua vida pós-F-1.

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Lewis Hamilton concede entrevista na capital paulista antes do GP em Interlagos. Foto: Nelson Almeida/ AFP

Como você avalia sua temporada até agora?

Acho que vem sendo uma temporada interessante. A passada foi dura em diferentes níveis. E um deles era o próprio carro, tão difícil de ser pilotado e de trabalhar com ele. Não apenas para mim, mas para toda a equipe. São coisas que as pessoas mal sabem. Mas, num treino livre, de apenas uma hora, para fazermos qualquer mudança no carro, temos apenas de oito a 15 minutos. Então, não dá para fazer muitas mudanças ao longo de um treino. Os mecânicos têm dificuldade para mexer no carro porque não têm acesso, não podem abrir o carro. O carro do ano passado não era um carro agradável de pilotar.

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E o carro desta temporada?

Começamos o ano esperando que tivéssemos aprendido muitas lições com o carro do ano passado. Esperávamos que fosse um pouco melhor, mas não foi o caso. Trabalhamos duro para fazer o carro melhorar. Conseguimos obter consistência e confiabilidade. Mas não conseguimos brigar novamente pelas primeiras posições durante toda a temporada. Fizemos muitos avanços, um deles no GP dos EUA. Foi um momento muito positivo para mim, com as atualizações que tivemos no carro. Foram dois segundos lugares seguidos, embora um deles tem sido a desclassificação (em Austin). Eu quero mais, quero desenvolver ainda mais este carro. E estou rezando para que este carro goste da pista de Interlagos.

É mais fácil pilotar os carros atuais, maiores que os modelos anteriores?

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O tamanho é parecido com os modelos que usamos desde 2017, um pouco maiores. Mas é um carro difícil de pilotar, é pesado. Eu não sei o motivo mas podemos ver que continuamente os carros estão ficando maiores e mais pesados nos últimos anos. A Fórmula 1 costumava ser o verdadeiro pináculo da tecnologia no automobilismo, mas algumas partes não são mais assim por questão de custos. É o que acontece com os pneus, de 18 polegadas, muito pesados. Não são mais o pináculo da tecnologia, são o padrão que quase todos os campeonatos têm. No passado, eram feitos com o melhor material possível, super leves. Mas temos que continuar a buscar o melhor rendimento mesmo assim.

Como você e a Mercedes estão se preparando para a próxima temporada?

A cada ano, eu cresço como piloto. Quando eu tinha 22, 25 anos, eu era tão jovem que não sabia o quanto poderia me envolver no desenvolvimento do carro. Me sentia apenas um piloto. Claro que fazia comentários sobre o carro, o que sentia. Mas eu não tinha toda a informação para saber como desenvolver um carro. E agora tenho o conhecimento de como liderar um time, de como estimular as pessoas e colocar todas juntas no mesmo projeto.

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Sinto que nunca estive tão integrado no desenvolvimento do time na minha carreira. Passo mais tempo não apenas nos simuladores, mas conversando com os chefes de cada departamento, engenharia, aerodinâmica, para mergulhar fundo em cada detalhe para termos certeza de que nada esteja faltando. Se tivermos uma conversa rápida, pode acontecer de algum engenheiro interpretar errado algum comentário meu. Tenho até um grupo de Whatsapp com os engenheiros para conversar sobre as novidades: ‘Ei, já testou isso? E aquela asa? E como está o carro novo?’. Estou otimista para a próxima temporada. Acho que podemos voltar a brigar por vitórias.

Jornalista grava Lewis Hamilton durante entrevista em São Paulo. Foto: Andre Penner / AP

Você costuma se envolver em muitas atividades fora das pistas. Consegue ter tempo para lazer e diversão?

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Sou muito ocupado quando o assunto é trabalho. Tem muita coisa acontecendo na minha vida. Mesmo quando não estamos em fim de semana de corrida, temos vários compromissos com a equipe e com nossos parceiros. Do meu lado pessoal, estou envolvido em alguns projetos, que me empolgam bastante. Projetos sociais com crianças, marcas de moda com as quais colaboro. Eu acabei de lançar minha própria marca de tequila não alcoólica. Adoro desenhar coisas, é divertido, mas não encaro como trabalho porque me enche de energia. Como diversão, gosto muito de surfar e saltar de paraquedas. Gosto de sair para caminhar, se possível na natureza. E gosto de ficar com meus amigos e minha família. Eu tento encaixar tudo porque não é fácil ficar perto deles quando a gente precisa viajar tanto ao longo do ano.

Você pensa no seu futuro pós-Fórmula 1?

Sim, com certeza. Venho pensando nisso faz uns sete anos mais ou menos. Eu já conheci muitos atletas do passado e do presente que conversaram comigo sobre suas preocupações com a aposentadoria. Teve aqueles que pararam muito cedo, outros, tarde demais. A maioria não estava preparada para o que aconteceria na aposentadoria. Foi por isso que há sete anos comecei a pensar sobre as coisas e as causas que me apaixonam. Conhecer e testar coisas diferentes e descobrir coisas em que posso ser bom, em que posso colaborar com outras pessoas. Olhar para o mercado para ver as lacunas, como aconteceu no caso da tequila. E comecei a ver onde eu poderia ter um impacto positivo. Há tanto a fazer. E vou continuar a fazer, principalmente com a Mission 44, minha organização sem fins lucrativos. Com certeza, vou me dedicar mais ao projeto, buscar arrecadar mais fundos.

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Já pensou em trazer a Mission 44 para o Brasil?

Sim, inclusive o projeto está aqui neste fim de semana. Vamos ter um grupo de crianças carentes aqui. Elas estarão no autódromo, quero mostrar a elas uma realidade possível (que elas podem alcançar também). Quero criar uma base da Mission 44 aqui no Brasil, trabalhando com as escolas. É um sonho que tenho. E não apenas aqui. Quero levar para a África também. Quero deixar esse legado. E vou continuar atuando nos negócios. Neste momento, iniciar um novo negócio é algo sempre empolgante. Com certeza, no futuro estarei envolvido em mais negócios e projetos, sempre de olho na sustentabilidade. Quero fazer mais parte desta luta pelo planeta. E vou estar sempre querendo unir as pessoas, em vez de dividi-las.

Você tem alguma data planejada para criar essa base da Mission 44 no Brasil?

Está no nosso planejamento. É que precisamos de muito tempo para criar e estabelecer a Mission 44 na Inglaterra, para fazer as coisas da forma certa e para subir um degrau por vez. E agora queremos expandir para a América do Norte, para o Brasil e para a África. Mas temos um plano, queremos colocar em prática num prazo de dois anos.

Lewis Hamilton ganhou o título de cidadão brasileiro em 2022. Foto: Andre Penner/ AP

Além deste projeto, o que pretende deixar como legado para a Fórmula 1 no futuro?

Esta é a pergunta que me faço durante toda a minha carreira. Quando eu tinha uns 22 anos, não fazia ideia de qual seria a resposta. O mesmo aconteceu até os 28. Agora tenho 38. Inicialmente, eu queria ser lembrado como um dos maiores pilotos da história. Mas agora isso não é o mais importante para mim. Quero ser lembrado como um ser humano que se preocupa com as pessoas, com o meio ambiente, com as crianças, que tinha consciência da plataforma que tinha a sua disposição e soube usar da melhor forma para ter um impacto positivo. E o mais importante: quero ser lembrado por ter criado oportunidades para as pessoas que nem sabiam que poderiam ter uma chance na vida. E não apenas no esporte, mas também na indústria, por exemplo. Eu não estou desafiando apenas o meu esporte, mas também nossos parceiros e patrocinadores para também terem maior diversidade em suas empresas. Eu pergunto a eles: ‘o que você está fazendo para promover a diversidade e a inclusão em seu ambiente? Consegue criar uma escada para as pessoas subirem?’. Isso é muito importante para nós.

Você lembra quando decidiu começar a agir publicamente contra a desigualdade?

Acho que, nas redes sociais, eu sempre falei a respeito antes de 2020. Eu postava sobre muitas coisas que estava vendo no mundo, principalmente sobre diversidade. No caso da discriminação, eu realmente comecei a me expressar de forma mais firme no fim de 2019, quando olhei as fotos de todas as equipes da F-1… Toda vez que eu ia ao escritório (da Mercedes) eu olhava ao meu redor e eu percebia que era o único negro no ambiente. E não havia mulheres. Não havia diversidade nem nas nacionalidades. E eu ficava me perguntando ‘por quê?’ na minha cabeça, durante as reuniões.

Como você se sentia?

Eu pensava: ‘Por que as coisas ainda são assim?’ E, quando vi as fotos das equipes, fiquei frustrado e irritado. E pensei: ‘como posso mudar isso de um jeito positivo em vez de simplesmente ficar irritado?’. Foi por isso que criei uma comissão para investigar esta falta de diversidade. Entreguei o resultado da pesquisa aos responsáveis no automobilismo e pedi para fazermos algo a respeito. Claro que eu também precisava fazer alguma coisa. Foi por isso que criei a Mission 44.

A Mercedes encampou seu ideal, certo?

Na minha equipe, precisamos ser líderes não apenas em termos de performance, ganhando corridas. Mas também precisamos ter certeza de que estamos liderando pelo exemplo. E aí lançamos o ‘Accelerate 25′, através do qual levamos as crianças para a nossa fábrica para mostrar o que fazemos lá. E depois elas levam esse conhecimento para suas escolas, conversam com seus amiguinhos. É uma forma de abrir os olhos das crianças para o que é possível conquistar se você levar a sério a escola. Eu gostaria de ter recebido esta oportunidade quando eu era criança. Eu gostaria de saber que poderia me tornar um engenheiro ou cientista. Eu poderia até ser um piloto ainda melhor hoje porque eu seria um melhor engenheiro.

Cada vez mais “brasileiro”, Lewis Hamilton agora quer atuar mais diretamente no País que lhe concedeu o status de cidadão honorário há um ano. O piloto britânico, heptacampeão mundial de Fórmula 1, revelou, em entrevista exclusiva ao Estadão nesta quarta-feira, que pretende criar uma base do seu projeto social no Brasil no futuro. Ele afirmou que o Mission 44, nome da sua organização sem fins lucrativos, deve fincar raízes no Brasil num prazo de dois anos.

Hamilton revelou também que algumas das crianças que ele atende em Londres estarão no País no fim de semana para acompanhar de perto o GP de São Paulo de Fórmula 1, no Autódromo de Interlagos. “Quero mostrar a elas uma realidade que também pode ser possível no futuro”, disse o piloto da Mercedes.

Neste bate-papo, Hamilton falou com sinceridade sobre as dificuldades que ele e sua equipe vêm enfrentando na F-1 nas últimas duas temporadas. Afirmou que a categoria não ocupa mais o pináculo da tecnologia em algumas áreas técnicas. Também comentou sobre sua vida fora das pistas, seu legado e sobre como pensa que será sua vida pós-F-1.

Lewis Hamilton concede entrevista na capital paulista antes do GP em Interlagos. Foto: Nelson Almeida/ AFP

Como você avalia sua temporada até agora?

Acho que vem sendo uma temporada interessante. A passada foi dura em diferentes níveis. E um deles era o próprio carro, tão difícil de ser pilotado e de trabalhar com ele. Não apenas para mim, mas para toda a equipe. São coisas que as pessoas mal sabem. Mas, num treino livre, de apenas uma hora, para fazermos qualquer mudança no carro, temos apenas de oito a 15 minutos. Então, não dá para fazer muitas mudanças ao longo de um treino. Os mecânicos têm dificuldade para mexer no carro porque não têm acesso, não podem abrir o carro. O carro do ano passado não era um carro agradável de pilotar.

E o carro desta temporada?

Começamos o ano esperando que tivéssemos aprendido muitas lições com o carro do ano passado. Esperávamos que fosse um pouco melhor, mas não foi o caso. Trabalhamos duro para fazer o carro melhorar. Conseguimos obter consistência e confiabilidade. Mas não conseguimos brigar novamente pelas primeiras posições durante toda a temporada. Fizemos muitos avanços, um deles no GP dos EUA. Foi um momento muito positivo para mim, com as atualizações que tivemos no carro. Foram dois segundos lugares seguidos, embora um deles tem sido a desclassificação (em Austin). Eu quero mais, quero desenvolver ainda mais este carro. E estou rezando para que este carro goste da pista de Interlagos.

É mais fácil pilotar os carros atuais, maiores que os modelos anteriores?

O tamanho é parecido com os modelos que usamos desde 2017, um pouco maiores. Mas é um carro difícil de pilotar, é pesado. Eu não sei o motivo mas podemos ver que continuamente os carros estão ficando maiores e mais pesados nos últimos anos. A Fórmula 1 costumava ser o verdadeiro pináculo da tecnologia no automobilismo, mas algumas partes não são mais assim por questão de custos. É o que acontece com os pneus, de 18 polegadas, muito pesados. Não são mais o pináculo da tecnologia, são o padrão que quase todos os campeonatos têm. No passado, eram feitos com o melhor material possível, super leves. Mas temos que continuar a buscar o melhor rendimento mesmo assim.

Como você e a Mercedes estão se preparando para a próxima temporada?

A cada ano, eu cresço como piloto. Quando eu tinha 22, 25 anos, eu era tão jovem que não sabia o quanto poderia me envolver no desenvolvimento do carro. Me sentia apenas um piloto. Claro que fazia comentários sobre o carro, o que sentia. Mas eu não tinha toda a informação para saber como desenvolver um carro. E agora tenho o conhecimento de como liderar um time, de como estimular as pessoas e colocar todas juntas no mesmo projeto.

Sinto que nunca estive tão integrado no desenvolvimento do time na minha carreira. Passo mais tempo não apenas nos simuladores, mas conversando com os chefes de cada departamento, engenharia, aerodinâmica, para mergulhar fundo em cada detalhe para termos certeza de que nada esteja faltando. Se tivermos uma conversa rápida, pode acontecer de algum engenheiro interpretar errado algum comentário meu. Tenho até um grupo de Whatsapp com os engenheiros para conversar sobre as novidades: ‘Ei, já testou isso? E aquela asa? E como está o carro novo?’. Estou otimista para a próxima temporada. Acho que podemos voltar a brigar por vitórias.

Jornalista grava Lewis Hamilton durante entrevista em São Paulo. Foto: Andre Penner / AP

Você costuma se envolver em muitas atividades fora das pistas. Consegue ter tempo para lazer e diversão?

Sou muito ocupado quando o assunto é trabalho. Tem muita coisa acontecendo na minha vida. Mesmo quando não estamos em fim de semana de corrida, temos vários compromissos com a equipe e com nossos parceiros. Do meu lado pessoal, estou envolvido em alguns projetos, que me empolgam bastante. Projetos sociais com crianças, marcas de moda com as quais colaboro. Eu acabei de lançar minha própria marca de tequila não alcoólica. Adoro desenhar coisas, é divertido, mas não encaro como trabalho porque me enche de energia. Como diversão, gosto muito de surfar e saltar de paraquedas. Gosto de sair para caminhar, se possível na natureza. E gosto de ficar com meus amigos e minha família. Eu tento encaixar tudo porque não é fácil ficar perto deles quando a gente precisa viajar tanto ao longo do ano.

Você pensa no seu futuro pós-Fórmula 1?

Sim, com certeza. Venho pensando nisso faz uns sete anos mais ou menos. Eu já conheci muitos atletas do passado e do presente que conversaram comigo sobre suas preocupações com a aposentadoria. Teve aqueles que pararam muito cedo, outros, tarde demais. A maioria não estava preparada para o que aconteceria na aposentadoria. Foi por isso que há sete anos comecei a pensar sobre as coisas e as causas que me apaixonam. Conhecer e testar coisas diferentes e descobrir coisas em que posso ser bom, em que posso colaborar com outras pessoas. Olhar para o mercado para ver as lacunas, como aconteceu no caso da tequila. E comecei a ver onde eu poderia ter um impacto positivo. Há tanto a fazer. E vou continuar a fazer, principalmente com a Mission 44, minha organização sem fins lucrativos. Com certeza, vou me dedicar mais ao projeto, buscar arrecadar mais fundos.

Já pensou em trazer a Mission 44 para o Brasil?

Sim, inclusive o projeto está aqui neste fim de semana. Vamos ter um grupo de crianças carentes aqui. Elas estarão no autódromo, quero mostrar a elas uma realidade possível (que elas podem alcançar também). Quero criar uma base da Mission 44 aqui no Brasil, trabalhando com as escolas. É um sonho que tenho. E não apenas aqui. Quero levar para a África também. Quero deixar esse legado. E vou continuar atuando nos negócios. Neste momento, iniciar um novo negócio é algo sempre empolgante. Com certeza, no futuro estarei envolvido em mais negócios e projetos, sempre de olho na sustentabilidade. Quero fazer mais parte desta luta pelo planeta. E vou estar sempre querendo unir as pessoas, em vez de dividi-las.

Você tem alguma data planejada para criar essa base da Mission 44 no Brasil?

Está no nosso planejamento. É que precisamos de muito tempo para criar e estabelecer a Mission 44 na Inglaterra, para fazer as coisas da forma certa e para subir um degrau por vez. E agora queremos expandir para a América do Norte, para o Brasil e para a África. Mas temos um plano, queremos colocar em prática num prazo de dois anos.

Lewis Hamilton ganhou o título de cidadão brasileiro em 2022. Foto: Andre Penner/ AP

Além deste projeto, o que pretende deixar como legado para a Fórmula 1 no futuro?

Esta é a pergunta que me faço durante toda a minha carreira. Quando eu tinha uns 22 anos, não fazia ideia de qual seria a resposta. O mesmo aconteceu até os 28. Agora tenho 38. Inicialmente, eu queria ser lembrado como um dos maiores pilotos da história. Mas agora isso não é o mais importante para mim. Quero ser lembrado como um ser humano que se preocupa com as pessoas, com o meio ambiente, com as crianças, que tinha consciência da plataforma que tinha a sua disposição e soube usar da melhor forma para ter um impacto positivo. E o mais importante: quero ser lembrado por ter criado oportunidades para as pessoas que nem sabiam que poderiam ter uma chance na vida. E não apenas no esporte, mas também na indústria, por exemplo. Eu não estou desafiando apenas o meu esporte, mas também nossos parceiros e patrocinadores para também terem maior diversidade em suas empresas. Eu pergunto a eles: ‘o que você está fazendo para promover a diversidade e a inclusão em seu ambiente? Consegue criar uma escada para as pessoas subirem?’. Isso é muito importante para nós.

Você lembra quando decidiu começar a agir publicamente contra a desigualdade?

Acho que, nas redes sociais, eu sempre falei a respeito antes de 2020. Eu postava sobre muitas coisas que estava vendo no mundo, principalmente sobre diversidade. No caso da discriminação, eu realmente comecei a me expressar de forma mais firme no fim de 2019, quando olhei as fotos de todas as equipes da F-1… Toda vez que eu ia ao escritório (da Mercedes) eu olhava ao meu redor e eu percebia que era o único negro no ambiente. E não havia mulheres. Não havia diversidade nem nas nacionalidades. E eu ficava me perguntando ‘por quê?’ na minha cabeça, durante as reuniões.

Como você se sentia?

Eu pensava: ‘Por que as coisas ainda são assim?’ E, quando vi as fotos das equipes, fiquei frustrado e irritado. E pensei: ‘como posso mudar isso de um jeito positivo em vez de simplesmente ficar irritado?’. Foi por isso que criei uma comissão para investigar esta falta de diversidade. Entreguei o resultado da pesquisa aos responsáveis no automobilismo e pedi para fazermos algo a respeito. Claro que eu também precisava fazer alguma coisa. Foi por isso que criei a Mission 44.

A Mercedes encampou seu ideal, certo?

Na minha equipe, precisamos ser líderes não apenas em termos de performance, ganhando corridas. Mas também precisamos ter certeza de que estamos liderando pelo exemplo. E aí lançamos o ‘Accelerate 25′, através do qual levamos as crianças para a nossa fábrica para mostrar o que fazemos lá. E depois elas levam esse conhecimento para suas escolas, conversam com seus amiguinhos. É uma forma de abrir os olhos das crianças para o que é possível conquistar se você levar a sério a escola. Eu gostaria de ter recebido esta oportunidade quando eu era criança. Eu gostaria de saber que poderia me tornar um engenheiro ou cientista. Eu poderia até ser um piloto ainda melhor hoje porque eu seria um melhor engenheiro.

Cada vez mais “brasileiro”, Lewis Hamilton agora quer atuar mais diretamente no País que lhe concedeu o status de cidadão honorário há um ano. O piloto britânico, heptacampeão mundial de Fórmula 1, revelou, em entrevista exclusiva ao Estadão nesta quarta-feira, que pretende criar uma base do seu projeto social no Brasil no futuro. Ele afirmou que o Mission 44, nome da sua organização sem fins lucrativos, deve fincar raízes no Brasil num prazo de dois anos.

Hamilton revelou também que algumas das crianças que ele atende em Londres estarão no País no fim de semana para acompanhar de perto o GP de São Paulo de Fórmula 1, no Autódromo de Interlagos. “Quero mostrar a elas uma realidade que também pode ser possível no futuro”, disse o piloto da Mercedes.

Neste bate-papo, Hamilton falou com sinceridade sobre as dificuldades que ele e sua equipe vêm enfrentando na F-1 nas últimas duas temporadas. Afirmou que a categoria não ocupa mais o pináculo da tecnologia em algumas áreas técnicas. Também comentou sobre sua vida fora das pistas, seu legado e sobre como pensa que será sua vida pós-F-1.

Lewis Hamilton concede entrevista na capital paulista antes do GP em Interlagos. Foto: Nelson Almeida/ AFP

Como você avalia sua temporada até agora?

Acho que vem sendo uma temporada interessante. A passada foi dura em diferentes níveis. E um deles era o próprio carro, tão difícil de ser pilotado e de trabalhar com ele. Não apenas para mim, mas para toda a equipe. São coisas que as pessoas mal sabem. Mas, num treino livre, de apenas uma hora, para fazermos qualquer mudança no carro, temos apenas de oito a 15 minutos. Então, não dá para fazer muitas mudanças ao longo de um treino. Os mecânicos têm dificuldade para mexer no carro porque não têm acesso, não podem abrir o carro. O carro do ano passado não era um carro agradável de pilotar.

E o carro desta temporada?

Começamos o ano esperando que tivéssemos aprendido muitas lições com o carro do ano passado. Esperávamos que fosse um pouco melhor, mas não foi o caso. Trabalhamos duro para fazer o carro melhorar. Conseguimos obter consistência e confiabilidade. Mas não conseguimos brigar novamente pelas primeiras posições durante toda a temporada. Fizemos muitos avanços, um deles no GP dos EUA. Foi um momento muito positivo para mim, com as atualizações que tivemos no carro. Foram dois segundos lugares seguidos, embora um deles tem sido a desclassificação (em Austin). Eu quero mais, quero desenvolver ainda mais este carro. E estou rezando para que este carro goste da pista de Interlagos.

É mais fácil pilotar os carros atuais, maiores que os modelos anteriores?

O tamanho é parecido com os modelos que usamos desde 2017, um pouco maiores. Mas é um carro difícil de pilotar, é pesado. Eu não sei o motivo mas podemos ver que continuamente os carros estão ficando maiores e mais pesados nos últimos anos. A Fórmula 1 costumava ser o verdadeiro pináculo da tecnologia no automobilismo, mas algumas partes não são mais assim por questão de custos. É o que acontece com os pneus, de 18 polegadas, muito pesados. Não são mais o pináculo da tecnologia, são o padrão que quase todos os campeonatos têm. No passado, eram feitos com o melhor material possível, super leves. Mas temos que continuar a buscar o melhor rendimento mesmo assim.

Como você e a Mercedes estão se preparando para a próxima temporada?

A cada ano, eu cresço como piloto. Quando eu tinha 22, 25 anos, eu era tão jovem que não sabia o quanto poderia me envolver no desenvolvimento do carro. Me sentia apenas um piloto. Claro que fazia comentários sobre o carro, o que sentia. Mas eu não tinha toda a informação para saber como desenvolver um carro. E agora tenho o conhecimento de como liderar um time, de como estimular as pessoas e colocar todas juntas no mesmo projeto.

Sinto que nunca estive tão integrado no desenvolvimento do time na minha carreira. Passo mais tempo não apenas nos simuladores, mas conversando com os chefes de cada departamento, engenharia, aerodinâmica, para mergulhar fundo em cada detalhe para termos certeza de que nada esteja faltando. Se tivermos uma conversa rápida, pode acontecer de algum engenheiro interpretar errado algum comentário meu. Tenho até um grupo de Whatsapp com os engenheiros para conversar sobre as novidades: ‘Ei, já testou isso? E aquela asa? E como está o carro novo?’. Estou otimista para a próxima temporada. Acho que podemos voltar a brigar por vitórias.

Jornalista grava Lewis Hamilton durante entrevista em São Paulo. Foto: Andre Penner / AP

Você costuma se envolver em muitas atividades fora das pistas. Consegue ter tempo para lazer e diversão?

Sou muito ocupado quando o assunto é trabalho. Tem muita coisa acontecendo na minha vida. Mesmo quando não estamos em fim de semana de corrida, temos vários compromissos com a equipe e com nossos parceiros. Do meu lado pessoal, estou envolvido em alguns projetos, que me empolgam bastante. Projetos sociais com crianças, marcas de moda com as quais colaboro. Eu acabei de lançar minha própria marca de tequila não alcoólica. Adoro desenhar coisas, é divertido, mas não encaro como trabalho porque me enche de energia. Como diversão, gosto muito de surfar e saltar de paraquedas. Gosto de sair para caminhar, se possível na natureza. E gosto de ficar com meus amigos e minha família. Eu tento encaixar tudo porque não é fácil ficar perto deles quando a gente precisa viajar tanto ao longo do ano.

Você pensa no seu futuro pós-Fórmula 1?

Sim, com certeza. Venho pensando nisso faz uns sete anos mais ou menos. Eu já conheci muitos atletas do passado e do presente que conversaram comigo sobre suas preocupações com a aposentadoria. Teve aqueles que pararam muito cedo, outros, tarde demais. A maioria não estava preparada para o que aconteceria na aposentadoria. Foi por isso que há sete anos comecei a pensar sobre as coisas e as causas que me apaixonam. Conhecer e testar coisas diferentes e descobrir coisas em que posso ser bom, em que posso colaborar com outras pessoas. Olhar para o mercado para ver as lacunas, como aconteceu no caso da tequila. E comecei a ver onde eu poderia ter um impacto positivo. Há tanto a fazer. E vou continuar a fazer, principalmente com a Mission 44, minha organização sem fins lucrativos. Com certeza, vou me dedicar mais ao projeto, buscar arrecadar mais fundos.

Já pensou em trazer a Mission 44 para o Brasil?

Sim, inclusive o projeto está aqui neste fim de semana. Vamos ter um grupo de crianças carentes aqui. Elas estarão no autódromo, quero mostrar a elas uma realidade possível (que elas podem alcançar também). Quero criar uma base da Mission 44 aqui no Brasil, trabalhando com as escolas. É um sonho que tenho. E não apenas aqui. Quero levar para a África também. Quero deixar esse legado. E vou continuar atuando nos negócios. Neste momento, iniciar um novo negócio é algo sempre empolgante. Com certeza, no futuro estarei envolvido em mais negócios e projetos, sempre de olho na sustentabilidade. Quero fazer mais parte desta luta pelo planeta. E vou estar sempre querendo unir as pessoas, em vez de dividi-las.

Você tem alguma data planejada para criar essa base da Mission 44 no Brasil?

Está no nosso planejamento. É que precisamos de muito tempo para criar e estabelecer a Mission 44 na Inglaterra, para fazer as coisas da forma certa e para subir um degrau por vez. E agora queremos expandir para a América do Norte, para o Brasil e para a África. Mas temos um plano, queremos colocar em prática num prazo de dois anos.

Lewis Hamilton ganhou o título de cidadão brasileiro em 2022. Foto: Andre Penner/ AP

Além deste projeto, o que pretende deixar como legado para a Fórmula 1 no futuro?

Esta é a pergunta que me faço durante toda a minha carreira. Quando eu tinha uns 22 anos, não fazia ideia de qual seria a resposta. O mesmo aconteceu até os 28. Agora tenho 38. Inicialmente, eu queria ser lembrado como um dos maiores pilotos da história. Mas agora isso não é o mais importante para mim. Quero ser lembrado como um ser humano que se preocupa com as pessoas, com o meio ambiente, com as crianças, que tinha consciência da plataforma que tinha a sua disposição e soube usar da melhor forma para ter um impacto positivo. E o mais importante: quero ser lembrado por ter criado oportunidades para as pessoas que nem sabiam que poderiam ter uma chance na vida. E não apenas no esporte, mas também na indústria, por exemplo. Eu não estou desafiando apenas o meu esporte, mas também nossos parceiros e patrocinadores para também terem maior diversidade em suas empresas. Eu pergunto a eles: ‘o que você está fazendo para promover a diversidade e a inclusão em seu ambiente? Consegue criar uma escada para as pessoas subirem?’. Isso é muito importante para nós.

Você lembra quando decidiu começar a agir publicamente contra a desigualdade?

Acho que, nas redes sociais, eu sempre falei a respeito antes de 2020. Eu postava sobre muitas coisas que estava vendo no mundo, principalmente sobre diversidade. No caso da discriminação, eu realmente comecei a me expressar de forma mais firme no fim de 2019, quando olhei as fotos de todas as equipes da F-1… Toda vez que eu ia ao escritório (da Mercedes) eu olhava ao meu redor e eu percebia que era o único negro no ambiente. E não havia mulheres. Não havia diversidade nem nas nacionalidades. E eu ficava me perguntando ‘por quê?’ na minha cabeça, durante as reuniões.

Como você se sentia?

Eu pensava: ‘Por que as coisas ainda são assim?’ E, quando vi as fotos das equipes, fiquei frustrado e irritado. E pensei: ‘como posso mudar isso de um jeito positivo em vez de simplesmente ficar irritado?’. Foi por isso que criei uma comissão para investigar esta falta de diversidade. Entreguei o resultado da pesquisa aos responsáveis no automobilismo e pedi para fazermos algo a respeito. Claro que eu também precisava fazer alguma coisa. Foi por isso que criei a Mission 44.

A Mercedes encampou seu ideal, certo?

Na minha equipe, precisamos ser líderes não apenas em termos de performance, ganhando corridas. Mas também precisamos ter certeza de que estamos liderando pelo exemplo. E aí lançamos o ‘Accelerate 25′, através do qual levamos as crianças para a nossa fábrica para mostrar o que fazemos lá. E depois elas levam esse conhecimento para suas escolas, conversam com seus amiguinhos. É uma forma de abrir os olhos das crianças para o que é possível conquistar se você levar a sério a escola. Eu gostaria de ter recebido esta oportunidade quando eu era criança. Eu gostaria de saber que poderia me tornar um engenheiro ou cientista. Eu poderia até ser um piloto ainda melhor hoje porque eu seria um melhor engenheiro.

Cada vez mais “brasileiro”, Lewis Hamilton agora quer atuar mais diretamente no País que lhe concedeu o status de cidadão honorário há um ano. O piloto britânico, heptacampeão mundial de Fórmula 1, revelou, em entrevista exclusiva ao Estadão nesta quarta-feira, que pretende criar uma base do seu projeto social no Brasil no futuro. Ele afirmou que o Mission 44, nome da sua organização sem fins lucrativos, deve fincar raízes no Brasil num prazo de dois anos.

Hamilton revelou também que algumas das crianças que ele atende em Londres estarão no País no fim de semana para acompanhar de perto o GP de São Paulo de Fórmula 1, no Autódromo de Interlagos. “Quero mostrar a elas uma realidade que também pode ser possível no futuro”, disse o piloto da Mercedes.

Neste bate-papo, Hamilton falou com sinceridade sobre as dificuldades que ele e sua equipe vêm enfrentando na F-1 nas últimas duas temporadas. Afirmou que a categoria não ocupa mais o pináculo da tecnologia em algumas áreas técnicas. Também comentou sobre sua vida fora das pistas, seu legado e sobre como pensa que será sua vida pós-F-1.

Lewis Hamilton concede entrevista na capital paulista antes do GP em Interlagos. Foto: Nelson Almeida/ AFP

Como você avalia sua temporada até agora?

Acho que vem sendo uma temporada interessante. A passada foi dura em diferentes níveis. E um deles era o próprio carro, tão difícil de ser pilotado e de trabalhar com ele. Não apenas para mim, mas para toda a equipe. São coisas que as pessoas mal sabem. Mas, num treino livre, de apenas uma hora, para fazermos qualquer mudança no carro, temos apenas de oito a 15 minutos. Então, não dá para fazer muitas mudanças ao longo de um treino. Os mecânicos têm dificuldade para mexer no carro porque não têm acesso, não podem abrir o carro. O carro do ano passado não era um carro agradável de pilotar.

E o carro desta temporada?

Começamos o ano esperando que tivéssemos aprendido muitas lições com o carro do ano passado. Esperávamos que fosse um pouco melhor, mas não foi o caso. Trabalhamos duro para fazer o carro melhorar. Conseguimos obter consistência e confiabilidade. Mas não conseguimos brigar novamente pelas primeiras posições durante toda a temporada. Fizemos muitos avanços, um deles no GP dos EUA. Foi um momento muito positivo para mim, com as atualizações que tivemos no carro. Foram dois segundos lugares seguidos, embora um deles tem sido a desclassificação (em Austin). Eu quero mais, quero desenvolver ainda mais este carro. E estou rezando para que este carro goste da pista de Interlagos.

É mais fácil pilotar os carros atuais, maiores que os modelos anteriores?

O tamanho é parecido com os modelos que usamos desde 2017, um pouco maiores. Mas é um carro difícil de pilotar, é pesado. Eu não sei o motivo mas podemos ver que continuamente os carros estão ficando maiores e mais pesados nos últimos anos. A Fórmula 1 costumava ser o verdadeiro pináculo da tecnologia no automobilismo, mas algumas partes não são mais assim por questão de custos. É o que acontece com os pneus, de 18 polegadas, muito pesados. Não são mais o pináculo da tecnologia, são o padrão que quase todos os campeonatos têm. No passado, eram feitos com o melhor material possível, super leves. Mas temos que continuar a buscar o melhor rendimento mesmo assim.

Como você e a Mercedes estão se preparando para a próxima temporada?

A cada ano, eu cresço como piloto. Quando eu tinha 22, 25 anos, eu era tão jovem que não sabia o quanto poderia me envolver no desenvolvimento do carro. Me sentia apenas um piloto. Claro que fazia comentários sobre o carro, o que sentia. Mas eu não tinha toda a informação para saber como desenvolver um carro. E agora tenho o conhecimento de como liderar um time, de como estimular as pessoas e colocar todas juntas no mesmo projeto.

Sinto que nunca estive tão integrado no desenvolvimento do time na minha carreira. Passo mais tempo não apenas nos simuladores, mas conversando com os chefes de cada departamento, engenharia, aerodinâmica, para mergulhar fundo em cada detalhe para termos certeza de que nada esteja faltando. Se tivermos uma conversa rápida, pode acontecer de algum engenheiro interpretar errado algum comentário meu. Tenho até um grupo de Whatsapp com os engenheiros para conversar sobre as novidades: ‘Ei, já testou isso? E aquela asa? E como está o carro novo?’. Estou otimista para a próxima temporada. Acho que podemos voltar a brigar por vitórias.

Jornalista grava Lewis Hamilton durante entrevista em São Paulo. Foto: Andre Penner / AP

Você costuma se envolver em muitas atividades fora das pistas. Consegue ter tempo para lazer e diversão?

Sou muito ocupado quando o assunto é trabalho. Tem muita coisa acontecendo na minha vida. Mesmo quando não estamos em fim de semana de corrida, temos vários compromissos com a equipe e com nossos parceiros. Do meu lado pessoal, estou envolvido em alguns projetos, que me empolgam bastante. Projetos sociais com crianças, marcas de moda com as quais colaboro. Eu acabei de lançar minha própria marca de tequila não alcoólica. Adoro desenhar coisas, é divertido, mas não encaro como trabalho porque me enche de energia. Como diversão, gosto muito de surfar e saltar de paraquedas. Gosto de sair para caminhar, se possível na natureza. E gosto de ficar com meus amigos e minha família. Eu tento encaixar tudo porque não é fácil ficar perto deles quando a gente precisa viajar tanto ao longo do ano.

Você pensa no seu futuro pós-Fórmula 1?

Sim, com certeza. Venho pensando nisso faz uns sete anos mais ou menos. Eu já conheci muitos atletas do passado e do presente que conversaram comigo sobre suas preocupações com a aposentadoria. Teve aqueles que pararam muito cedo, outros, tarde demais. A maioria não estava preparada para o que aconteceria na aposentadoria. Foi por isso que há sete anos comecei a pensar sobre as coisas e as causas que me apaixonam. Conhecer e testar coisas diferentes e descobrir coisas em que posso ser bom, em que posso colaborar com outras pessoas. Olhar para o mercado para ver as lacunas, como aconteceu no caso da tequila. E comecei a ver onde eu poderia ter um impacto positivo. Há tanto a fazer. E vou continuar a fazer, principalmente com a Mission 44, minha organização sem fins lucrativos. Com certeza, vou me dedicar mais ao projeto, buscar arrecadar mais fundos.

Já pensou em trazer a Mission 44 para o Brasil?

Sim, inclusive o projeto está aqui neste fim de semana. Vamos ter um grupo de crianças carentes aqui. Elas estarão no autódromo, quero mostrar a elas uma realidade possível (que elas podem alcançar também). Quero criar uma base da Mission 44 aqui no Brasil, trabalhando com as escolas. É um sonho que tenho. E não apenas aqui. Quero levar para a África também. Quero deixar esse legado. E vou continuar atuando nos negócios. Neste momento, iniciar um novo negócio é algo sempre empolgante. Com certeza, no futuro estarei envolvido em mais negócios e projetos, sempre de olho na sustentabilidade. Quero fazer mais parte desta luta pelo planeta. E vou estar sempre querendo unir as pessoas, em vez de dividi-las.

Você tem alguma data planejada para criar essa base da Mission 44 no Brasil?

Está no nosso planejamento. É que precisamos de muito tempo para criar e estabelecer a Mission 44 na Inglaterra, para fazer as coisas da forma certa e para subir um degrau por vez. E agora queremos expandir para a América do Norte, para o Brasil e para a África. Mas temos um plano, queremos colocar em prática num prazo de dois anos.

Lewis Hamilton ganhou o título de cidadão brasileiro em 2022. Foto: Andre Penner/ AP

Além deste projeto, o que pretende deixar como legado para a Fórmula 1 no futuro?

Esta é a pergunta que me faço durante toda a minha carreira. Quando eu tinha uns 22 anos, não fazia ideia de qual seria a resposta. O mesmo aconteceu até os 28. Agora tenho 38. Inicialmente, eu queria ser lembrado como um dos maiores pilotos da história. Mas agora isso não é o mais importante para mim. Quero ser lembrado como um ser humano que se preocupa com as pessoas, com o meio ambiente, com as crianças, que tinha consciência da plataforma que tinha a sua disposição e soube usar da melhor forma para ter um impacto positivo. E o mais importante: quero ser lembrado por ter criado oportunidades para as pessoas que nem sabiam que poderiam ter uma chance na vida. E não apenas no esporte, mas também na indústria, por exemplo. Eu não estou desafiando apenas o meu esporte, mas também nossos parceiros e patrocinadores para também terem maior diversidade em suas empresas. Eu pergunto a eles: ‘o que você está fazendo para promover a diversidade e a inclusão em seu ambiente? Consegue criar uma escada para as pessoas subirem?’. Isso é muito importante para nós.

Você lembra quando decidiu começar a agir publicamente contra a desigualdade?

Acho que, nas redes sociais, eu sempre falei a respeito antes de 2020. Eu postava sobre muitas coisas que estava vendo no mundo, principalmente sobre diversidade. No caso da discriminação, eu realmente comecei a me expressar de forma mais firme no fim de 2019, quando olhei as fotos de todas as equipes da F-1… Toda vez que eu ia ao escritório (da Mercedes) eu olhava ao meu redor e eu percebia que era o único negro no ambiente. E não havia mulheres. Não havia diversidade nem nas nacionalidades. E eu ficava me perguntando ‘por quê?’ na minha cabeça, durante as reuniões.

Como você se sentia?

Eu pensava: ‘Por que as coisas ainda são assim?’ E, quando vi as fotos das equipes, fiquei frustrado e irritado. E pensei: ‘como posso mudar isso de um jeito positivo em vez de simplesmente ficar irritado?’. Foi por isso que criei uma comissão para investigar esta falta de diversidade. Entreguei o resultado da pesquisa aos responsáveis no automobilismo e pedi para fazermos algo a respeito. Claro que eu também precisava fazer alguma coisa. Foi por isso que criei a Mission 44.

A Mercedes encampou seu ideal, certo?

Na minha equipe, precisamos ser líderes não apenas em termos de performance, ganhando corridas. Mas também precisamos ter certeza de que estamos liderando pelo exemplo. E aí lançamos o ‘Accelerate 25′, através do qual levamos as crianças para a nossa fábrica para mostrar o que fazemos lá. E depois elas levam esse conhecimento para suas escolas, conversam com seus amiguinhos. É uma forma de abrir os olhos das crianças para o que é possível conquistar se você levar a sério a escola. Eu gostaria de ter recebido esta oportunidade quando eu era criança. Eu gostaria de saber que poderia me tornar um engenheiro ou cientista. Eu poderia até ser um piloto ainda melhor hoje porque eu seria um melhor engenheiro.

Entrevista por Felipe Rosa Mendes

Jornalista natural de Florianópolis (SC), formado pela UFSC. Repórter de Esportes do Grupo Estado desde 2008. Já cobriu Copa do Mundo, Roland Garros e GPs de Fórmula 1 e da Fórmula E in loco. Integrou a 18ª turma do Curso Intensivo de Jornalismo Aplicado do Estadão e o 6º Curso de Jornalismo Econômico do Estadão em parceria com a FGV.

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