Thaisa Daher foi vítima de bullying na infância e lida com cobranças, críticas e comentários de ódio ao longo de mais de duas décadas de carreira. Se um dia os xingamentos lhe afetaram, hoje, a postura em relação a eles é diferente. Ela não se importa com os “haters” e exibe tudo o que acha oportuno nas redes sociais, do vôlei à sua vida pessoal.
“Sempre vai ter gente para criticar tanto o vôlei quanto a minha vida pessoal, vai ter gente frustrada e com a vida bem infeliz para ir lá ficar comentando coisas ruins, e a maioria nem usa o perfil oficial, vai com o fake porque não tem nem coragem de mostrar a cara”, ressalta ela em entrevista ao Estadão.
Vibrante e sanguínea em quadra, a atleta que sofreu bullying na infância por ser muito alta e transformou as dores em raiva no vôlei, o que ajudou em sua performance, mudou sua percepção sobre os pensamentos alheios em relação à sua vida e carreira e diz ser indiferente quanto ao que pensam dela, sobretudo quando os comentários são ruins. “Eu nunca, pode ter certeza, vou deixar me atingir por pessoas tão frustradas”.
Thaisa, bicampeã olímpica
O mesmo pensamento a jogadora tem quanto aos comentários sobre sua aparência. Thaisa mudou seu rosto e corpo ao passar por diferentes procedimentos estéticos nos últimos anos, como rinoplastia e harmonização facial. “Os procedimentos eu não escondo de ninguém, eu estou ótima, estou maravilhosa, fiz minhas escolhas e fiquei maravilhosamente feliz com tudo isso”, salienta, alegre com os resultados estéticos.
“O bom é que as pessoas acharam que eu fiquei linda, que melhorou, que era esse o meu objetivo. E quem não acha também, paciência, não faça, mas a vida é minha, o meu corpo é meu e faço o que me faz feliz. Tanto que recentemente retoquei o meu nariz e falei para todo mundo. Sou muito bem resolvida com tudo isso e muito satisfeita com tudo que decidi fazer”.
Frustração e alegria sem o ouro, mas com o bronze
Thaisa dedicou pouco mais de 20 dos seus 37 anos ao vôlei do Brasil - da base ao profissional - até decidir se retirar da seleção após a campanha que terminou com o bronze nos Jogos Olímpicos de Paris. Os jogos finais de sua trajetória provocaram frustração e alegria na atleta. O primeiro sentimento tem relação com a derrota na semifinal para os Estados Unidos. O segundo, pela vitória sobre a Turquia que garantiu o Brasil no pódio.
“Estou feliz porque a gente conseguiu colocar o Brasil entre os três melhores do mundo no pódio, onde qualquer outro que não chegou gostaria de estar com certeza, de ter uma medalha olímpica. Mas fica essa frustração de a gente saber que perdemos por um detalhe”, define, citando o duelo com as americanas. “Foi meio set que foi perdido, porque até o quarto set estava empatado, estava tudo igual, mas o tie-break foi decisivo, foi o meio set que definiu a nossa trajetória”.
Thaisa defende desde 2019 o Minas, clube no qual terá mais tempo para se dedicar sem a seleção. Sua trajetória no esporte seguirá e haverá forças para ela bloquear e atacar enquanto seu corpo e sua mente estiverem saudáveis. Dentre os títulos por clubes, destacam-se as oito troféus da Superliga, por Rio de Janeiro, Osasco e Minas. Na última edição, foi eleita a melhor central.
“Independentemente de eu ter ganhado muitos títulos brasileiros, acho que isso não muda a situação de querer mais e querer estar sempre levando o meu time ao pódio. Não é aquela coisa assim de: ‘ah, quero esse título porque eu nunca tive’, mas porque quero me manter lá no topo, entende?”, reflete. “Penso que enquanto estiver em alta performance, estiver bem, enquanto minha mente estiver satisfeita, feliz e fazendo com felicidade, eu quero continuar”.
Aos 37 anos, a central de 1,96m ainda tem gás. Mas não pensa em esticar muito a sua carreira a ponto de terminá-la quando seu nível de atuação “chegar lá embaixo”, como define.
“No momento em que eu sentir que eu estou cansada, que a rotina já está me pegando ou de dores, porque eu tenho muitas dores diariamente, se estiver me atrapalhando demais, aí eu acho que é o momento que eu vou avisar a minha saída. Não quero deixar chegar em um rendimento ruim”, acrescenta.
Thaisa, ex-central da seleção brasileira
Thaisa está entre as maiores atletas olímpicas do País. Além do bronze em Paris, tem dois ouros, conquistados em Pequim-2008 e Londres-2012. Também ostenta uma prata e um bronze em Mundiais.
No vôlei, ela está empatada em número de medalhas com Hélia de Souza, a Fofão, Bruninho, Dante, Giba e Rodrigão. Apenas o ex-líbero Serginho, dono de quatro medalhas - dois ouros e duas pratas - supera esse grupo.
Nova geração
Na seleção, Thaisa era uma das líderes, não a única. Sem ela, o time treinado por José Roberto Guimarães tem como mais importante referência a ponteira Gabi Guimarães, capitã da equipe, para quem passa definitivamente o bastão. “Ela tem esse perfil de liderança, de exemplo dentro do grupo. É muito bem vista e respeitada, e ela construiu isso, ela conquistou”, diz a central sobre sua ex-companheira.
Thaisa diz ainda não sentir saudade de defender o Brasil porque sua aposentadoria é recente. E a seleção sentirá sua falta, mas não tanto, ela opina, porque a geração atual é competente e há jovens jogadoras sendo preparadas para dar conta do recado no futuro.
“Tem muitas meninas chegando, a gente está muito bem suprido de talentos”, diz. “São meninas que precisam apenas de rodagem mesmo, de experiência. Eu passei por isso e vejo que tem grandes nomes chegando, se fortalecendo e se firmando. Pouco a pouco vão criando essa maturidade, essa força mental, que é muito necessária porque é uma pressão muito grande estar ali, mas isso vem com o trabalho fora da quadra e também a vivência mesmo dos momentos difíceis. É questão de rodar mesmo, aprender, jogar, bater cabeça, perder e ganhar, isso que vai construir esse grupo”.