Áudios de WhatsApp espalham desinformação sobre vacinas bivalentes contra a covid-19


Mensagens disseminam falsidades sobre composição dos imunizantes e relatos duvidosos sobre efeitos colaterais para desincentivar a procura

Por Samuel Lima e Talita Burbulhan
Atualização:

Uma sequência de áudios que circula no WhatsApp presta informações falsas sobre as vacinas bivalentes contra a covid-19, que recentemente começaram a ser aplicadas como doses de reforço no Brasil. Não é verdade que os produtos causem mais sequelas do que a própria doença ou estejam sendo adicionados aos imunizantes contra a gripe, por exemplo. Os conteúdos também exageram a incidência de possíveis efeitos colaterais raros das vacinas e criticam os imunizantes por situações que geralmente não trazem maiores complicações para a saúde.

O material ganhou impulso entre grupos antivacina e agrega quatro relatos diferentes no aplicativo. Diversos leitores solicitaram essa checagem ao Estadão Verifica pelo número de WhatsApp (11) 97683-7490.

Áudios de WhatsApp espalham desinformação sobre vacinas bivalentes Foto: Reprodução / WhatsApp
continua após a publicidade

Em um dos áudios, uma mulher não identificada alega que todos os funcionários e os pacientes idosos de uma casa de repouso chamada “LAIITE” teriam passado mal depois de receberem a vacina bivalente contra a covid-19. Trata-se do Lar para Idosos Irmã Santa Tereza, localizado na cidade de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais.

A própria instituição divulgou um comunicado em seu site relatando que algumas reações adversas previstas em bula de fato foram percebidas entre funcionários e pacientes, mas que apenas um dos casos precisou de atendimento médico. “Atualmente, todos os profissionais e residentes da instituição estão com quadro de saúde estável e passam bem”, esclareceu a direção em nota.

O caso que precisou ser levado ao pronto socorro era de um idoso que apresentou, nos membros inferiores do corpo, uma condição conhecida como astenia, caracterizada por fraqueza muscular e cansaço intenso. A autora do áudio ainda alega que uma profissional da casa de repouso teria apresentado íngua, ou seja, um inchaço nos linfonodos, que são glândulas do sistema imunológico.

continua após a publicidade

Ambos os sintomas estão previstos na bula da vacina bivalente e se situam em uma taxa de 0,1% a 1% das doses aplicadas. Além de ser baixa a chance de as vacinas causarem qualquer condição do tipo, geralmente os sintomas se resolvem sozinhos em poucas horas.

Em outro áudio que circula no WhatsApp, uma suposta profissional da área da saúde alega que recebeu uma dose da vacina bivalente e, cerca de quatro horas depois, procurou atendimento médico na “emergência do Conceição” com “suspeita de infarto”.

continua após a publicidade

Em contato com o Estadão Verifica, o Grupo Hospitalar Conceição, que administra o Hospital Nossa Senhora da Conceição, em Porto Alegre, disse que não houve nenhum relato conhecido de problema cardiológico pós-vacina. Porém, como a identificação do local é feita de maneira vaga no áudio, não se pode descartar completamente o episódio em uma unidade de saúde que eventualmente tenha o mesmo nome.

Assim como nos dois primeiros casos, o conteúdo alardeia um risco extremamente baixo de as vacinas contra a covid-19 causarem problemas cardiológicos que, na maioria das vezes, sequer apresentam gravidade, muito menos resultam em enfartes. Especialistas destacam que ficar exposto à doença sem vacina é mais arriscado, porque a incidência desses sintomas é mais frequente em quem contrai o vírus, entre outras complicações graves que podem levar à morte.

A miocardite, uma inflamação no músculo do coração, por exemplo, aparece em uma taxa de incidência de 0,031 a cada 100 mil doses, segundo dados do Ministério da Saúde até o final do ano passado. Foram apenas 154 casos no Brasil em meio a 510 milhões de doses de vacina aplicadas, segundo dados do Ministério da Saúde.

continua após a publicidade

Nota técnica divulgada no ano passado aponta que houve desfecho de óbito em dois casos de miocardite, mas em ambos a relação com a vacina não ficou comprovada nas investigações médicas. A taxa de miocardite para quem pega a covid-19 é estimada em 30 casos por milhão.

Vacinação contra a COVID-19 na UBS do Butantã, na zona oeste de São Paulo. Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

Outro áudio checado pelo Estadão Verifica alega que mais de 260 instituições pediátricas não identificadas teriam registrado pelo menos dois óbitos e diversos residentes com trombose após a vacina bivalente começar a ser aplicada nesses locais. A informação é atribuída a conversas em um suposto grupo de WhatsApp.

continua após a publicidade

O Estadão Verifica não encontrou nenhum relato do tipo em notícias e outras fontes confiáveis. Jarbas Roriz, membro da comissão de imunização da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, afirmou ao blog que desconhece qualquer aumento de incidência de problemas de saúde na população idosa desde o começo da vacinação, no final de fevereiro.

“Não tem tido registro de efeito adverso grave, aumento de notificação nesse sentido. As reações mais comuns são leves, como dor no local da aplicação, dor no corpo, febre e sintomas da gripe”, relata o médico. Ele ressalta que as vacinas são seguras para os idosos e que eles são um dos grupos que mais se beneficiam com a vacina, ao reduzir o risco de mortalidade e de formas graves da doença.

Além disso, a trombose não é um efeito colateral previsto na bula das vacinas bivalentes da Pfizer, o que torna o relato ainda mais duvidoso. Foram os imunizantes da Astrazeneca e da Janssen, que usam uma tecnologia conhecida como vetor viral, aqueles que foram associados a casos clínicos raros de síndrome de trombose com trombocitopenia (TTS). As vacinas bivalentes da Pfizer, assim como a da Moderna, que ainda aguarda autorização da Anvisa, utilizam uma tecnologia diferente, chamada RNA mensageiro.

continua após a publicidade

Segundo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, as vacinas da Astrazeneca e da Janssen provavelmente foram responsáveis por 16 óbitos, todos eles por TTS, o que corresponde a 1 caso para cada 20,9 milhões de doses aplicadas. Em contrapartida, o governo estima, com base em estudos do Imperial College London, os imunizantes tenham evitado de 700 a 880 mil mortes no Brasil apenas no primeiro ano da campanha de vacinação.

Estudos indicam ainda que o risco de desenvolver quadros trombóticos é mais alto para quem adoece de covid-19. Por conta disso, a Anvisa e o Ministério da Saúde recomendam a vacinação, sobretudo a grupos de risco, como idosos e pessoas com comorbidades.

O quarto e último áudio alega que as vacinas bivalentes estariam sendo adicionadas ao imunizante contra a gripe. As vacinas bivalentes são chamadas assim porque foram desenvolvidas a partir da cepa original do SARS-Cov-2, o vírus causador da covid-19, e também por linhagens da variante ômicron, que se tornou dominante no planeta, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A vacina contra a gripe, por outro lado, protege o organismo contra diferentes tipos do vírus influenza e são produzidas todos os anos, no Brasil, pelo Instituto Butantan. Os imunizantes disponibilizados pelo SUS este ano protegem contra as cepas H1N1, H3N2 e influenza B/Victoria.

O professor do Instituto de Química da Unicamp Luiz Carlos Dias aponta que essa combinação com as vacinas contra a covid-19 chegou a ser debatida, mas ainda depende de testes e não há previsão para que isso seja feito. As duas vacinas seguem calendário próprio no Programa Nacional de Imunizações (PNI), e a Pfizer sequer possui vacinas contra a gripe em seu portfólio atualmente.

A autora do áudio ainda espalha uma teoria da conspiração de que autoridades teriam como objetivo “exterminar 50% da população do mundo”. Alegações do tipo já foram desmentidas anteriormente pelo Estadão Verifica, como no caso de uma declaração feita pelo presidente da Pfizer, Albert Boula, que foi tirada de contexto.

Vacinas contra covid são seguras, de acordo com diversos órgãos internacionais de saúde. Foto: Reuters/Amanda Perobelli

Vacinas bivalentes

As vacinas bivalentes são conhecidas como imunizantes de segunda geração, porque foram desenvolvidas com base na cepa original do coronavírus e na variante ômicron.

Os produtos são fabricados pela Pfizer e foram aprovados pela Anvisa como dose de reforço para a população acima de 12 anos. Segundo o órgão de saúde, elas são eficazes e seguras para a população. Em 27 de fevereiro, começaram a ser aplicadas em grupos prioritários como dose de reforço para quem completou o esquema primário (duas doses de Pfizer, Astrazeneca e Coronavac ou uma dose da Janssen).

Os documentos que resultaram na aprovação emergencial do produto pela Anvisa indicam que o perfil de segurança da vacina bivalente da Pfizer é o mesmo da vacina monovalente ou de primeira geração. No entanto, o Ministério da Saúde ainda não publicou boletim sobre eventos adversos específicos dessa vacina na campanha iniciada em 27 de fevereiro.

O Estadão solicitou ao Ministério da Saúde um levantamento específico para as vacinas bivalentes, mas o pedido não havia sido atendido até a publicação desta checagem.

Boletins epidemiológicos anteriores, por outro lado, mostram que as reações adversas das vacinas contra a covid-19 costumam ser de caráter leve a moderado. A alegação presente em um dos áudios de que as vacinas estariam causando mais danos do que a própria doença é facilmente rebatida com base nesses dados disponíveis publicamente.

Até abril de 2023, a covid-19 havia tirado a vida de 700.556 pessoas no Brasil, entre os mais de 37 milhões de infectados pelo novo coronavírus desde o início da pandemia. Pelas estatísticas oficiais, portanto, houve uma morte a cada 53 testes positivos.

Em contrapartida, segundo documento do Ministério da Saúde referente ao período de 17 de janeiro de 2021 a 18 de junho de 2022, foram notificadas 134 mil reações adversas pós-vacinação ao Sistema Único de Saúde (SUS), diante de 335 milhões de doses de vacina contra a covid-19 aplicadas no País.

A grande maioria das reações são de caráter leve a moderado, como cansaço, febre e dor ou inchaço no local de aplicação. Filtrando por eventos considerados graves, foram notificados 19.684 casos, sendo 4.675 óbitos. Porém, há um aspecto importante: nem todo problema de saúde que aparece em uma pessoa imunizada contra a covid-19 deve ser atribuído às vacinas. No caso das mortes, por exemplo, apenas 16 delas tiveram relação causal confirmada pelos órgãos de saúde, o que representa um caso a cada 20,9 milhões de doses aplicadas.

Segundo o MS, mais de 4,1 milhões de pessoas já tomaram o reforço com as vacinas bivalentes.  

O médico Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), destaca que mesmo os eventos adversos classificados como graves aparecem com menos frequência com as vacinas do que ao contrair covid-19. Ele também ressalta que os estudos realizados até o momento demonstram que as vacinas bivalentes não trazem riscos aumentados de efeitos colaterais em comparação com os imunizantes monovalentes, ou de primeira geração.

“O perfil de segurança é exatamente o mesmo. São vacinas bastante seguras e bem toleradas”, afirma o médico. “Tanto os estudos de licenciamento quanto as publicações mais recentes americanas de segurança mostram o mesmo risco de febre, dor local, dor de cabeça, cansaço. São efeitos colaterais esperados, comuns em vacinas, e de curta duração.”

A professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) Cristina Bonorino pontua que mesmo os eventos pós-vacina considerados graves são classificados em uma escala de 1 a 4, e a maioria deles não apresenta grau elevado. Ela reforça a segurança dos imunizantes, lembrando que as vacinas apresentam vasta documentação analisada rigorosamente pela Anvisa e por outras entidades médicas.

Procurada pelo Estadão, a Anvisa, responsável pela aprovação do uso dos imunizantes, declarou que nunca antes uma vacina havia sido objeto de monitoramento tão intenso como no caso dos imunizantes contra a covid-19. “Todos os dados de monitoramento e relatos de eventos adversos recebidos até o momento mantêm a relação de benefício-risco da vacina favorável ao seu uso”, afirmou em nota.

Segundo a bula, as vacinas bivalentes apresentam as seguintes taxas de incidência de efeitos colaterais (elas foram combinadas para facilitar a visualização):

  • Reações muito comuns (mais de 10% dos pacientes): dor de cabeça, diarreia, dor nas articulações, dor muscular, dor no local de injeção, cansaço e calafrios.
  • Reações comuns (entre 1% e 10%): náusea, vômito, febre, inchaço e vermelhidão no local de injeção.
  • Reações incomuns (entre 0,1% e 1%): aumento dos gânglios linfáticos (ou ínguas), reações de hipersensibilidade (erupções cutâneas, coceira, alergia e inchaço dentro da pele e nas mucosas), tontura, suor noturno, mal-estar, diminuição de apetite, insônia, dor nos membros, fraqueza e cansaço físico intenso e prurido no local de injeção.
  • Reações raras (entre 0,01% e 0,1%): paralisia facial aguda.
  • Reações muito raras (menos de 0,01%): miocardite (infecção das fibras do coração) e pericardite (inflamação do revestimento externo do coração).

Uma sequência de áudios que circula no WhatsApp presta informações falsas sobre as vacinas bivalentes contra a covid-19, que recentemente começaram a ser aplicadas como doses de reforço no Brasil. Não é verdade que os produtos causem mais sequelas do que a própria doença ou estejam sendo adicionados aos imunizantes contra a gripe, por exemplo. Os conteúdos também exageram a incidência de possíveis efeitos colaterais raros das vacinas e criticam os imunizantes por situações que geralmente não trazem maiores complicações para a saúde.

O material ganhou impulso entre grupos antivacina e agrega quatro relatos diferentes no aplicativo. Diversos leitores solicitaram essa checagem ao Estadão Verifica pelo número de WhatsApp (11) 97683-7490.

Áudios de WhatsApp espalham desinformação sobre vacinas bivalentes Foto: Reprodução / WhatsApp

Em um dos áudios, uma mulher não identificada alega que todos os funcionários e os pacientes idosos de uma casa de repouso chamada “LAIITE” teriam passado mal depois de receberem a vacina bivalente contra a covid-19. Trata-se do Lar para Idosos Irmã Santa Tereza, localizado na cidade de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais.

A própria instituição divulgou um comunicado em seu site relatando que algumas reações adversas previstas em bula de fato foram percebidas entre funcionários e pacientes, mas que apenas um dos casos precisou de atendimento médico. “Atualmente, todos os profissionais e residentes da instituição estão com quadro de saúde estável e passam bem”, esclareceu a direção em nota.

O caso que precisou ser levado ao pronto socorro era de um idoso que apresentou, nos membros inferiores do corpo, uma condição conhecida como astenia, caracterizada por fraqueza muscular e cansaço intenso. A autora do áudio ainda alega que uma profissional da casa de repouso teria apresentado íngua, ou seja, um inchaço nos linfonodos, que são glândulas do sistema imunológico.

Ambos os sintomas estão previstos na bula da vacina bivalente e se situam em uma taxa de 0,1% a 1% das doses aplicadas. Além de ser baixa a chance de as vacinas causarem qualquer condição do tipo, geralmente os sintomas se resolvem sozinhos em poucas horas.

Em outro áudio que circula no WhatsApp, uma suposta profissional da área da saúde alega que recebeu uma dose da vacina bivalente e, cerca de quatro horas depois, procurou atendimento médico na “emergência do Conceição” com “suspeita de infarto”.

Em contato com o Estadão Verifica, o Grupo Hospitalar Conceição, que administra o Hospital Nossa Senhora da Conceição, em Porto Alegre, disse que não houve nenhum relato conhecido de problema cardiológico pós-vacina. Porém, como a identificação do local é feita de maneira vaga no áudio, não se pode descartar completamente o episódio em uma unidade de saúde que eventualmente tenha o mesmo nome.

Assim como nos dois primeiros casos, o conteúdo alardeia um risco extremamente baixo de as vacinas contra a covid-19 causarem problemas cardiológicos que, na maioria das vezes, sequer apresentam gravidade, muito menos resultam em enfartes. Especialistas destacam que ficar exposto à doença sem vacina é mais arriscado, porque a incidência desses sintomas é mais frequente em quem contrai o vírus, entre outras complicações graves que podem levar à morte.

A miocardite, uma inflamação no músculo do coração, por exemplo, aparece em uma taxa de incidência de 0,031 a cada 100 mil doses, segundo dados do Ministério da Saúde até o final do ano passado. Foram apenas 154 casos no Brasil em meio a 510 milhões de doses de vacina aplicadas, segundo dados do Ministério da Saúde.

Nota técnica divulgada no ano passado aponta que houve desfecho de óbito em dois casos de miocardite, mas em ambos a relação com a vacina não ficou comprovada nas investigações médicas. A taxa de miocardite para quem pega a covid-19 é estimada em 30 casos por milhão.

Vacinação contra a COVID-19 na UBS do Butantã, na zona oeste de São Paulo. Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

Outro áudio checado pelo Estadão Verifica alega que mais de 260 instituições pediátricas não identificadas teriam registrado pelo menos dois óbitos e diversos residentes com trombose após a vacina bivalente começar a ser aplicada nesses locais. A informação é atribuída a conversas em um suposto grupo de WhatsApp.

O Estadão Verifica não encontrou nenhum relato do tipo em notícias e outras fontes confiáveis. Jarbas Roriz, membro da comissão de imunização da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, afirmou ao blog que desconhece qualquer aumento de incidência de problemas de saúde na população idosa desde o começo da vacinação, no final de fevereiro.

“Não tem tido registro de efeito adverso grave, aumento de notificação nesse sentido. As reações mais comuns são leves, como dor no local da aplicação, dor no corpo, febre e sintomas da gripe”, relata o médico. Ele ressalta que as vacinas são seguras para os idosos e que eles são um dos grupos que mais se beneficiam com a vacina, ao reduzir o risco de mortalidade e de formas graves da doença.

Além disso, a trombose não é um efeito colateral previsto na bula das vacinas bivalentes da Pfizer, o que torna o relato ainda mais duvidoso. Foram os imunizantes da Astrazeneca e da Janssen, que usam uma tecnologia conhecida como vetor viral, aqueles que foram associados a casos clínicos raros de síndrome de trombose com trombocitopenia (TTS). As vacinas bivalentes da Pfizer, assim como a da Moderna, que ainda aguarda autorização da Anvisa, utilizam uma tecnologia diferente, chamada RNA mensageiro.

Segundo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, as vacinas da Astrazeneca e da Janssen provavelmente foram responsáveis por 16 óbitos, todos eles por TTS, o que corresponde a 1 caso para cada 20,9 milhões de doses aplicadas. Em contrapartida, o governo estima, com base em estudos do Imperial College London, os imunizantes tenham evitado de 700 a 880 mil mortes no Brasil apenas no primeiro ano da campanha de vacinação.

Estudos indicam ainda que o risco de desenvolver quadros trombóticos é mais alto para quem adoece de covid-19. Por conta disso, a Anvisa e o Ministério da Saúde recomendam a vacinação, sobretudo a grupos de risco, como idosos e pessoas com comorbidades.

O quarto e último áudio alega que as vacinas bivalentes estariam sendo adicionadas ao imunizante contra a gripe. As vacinas bivalentes são chamadas assim porque foram desenvolvidas a partir da cepa original do SARS-Cov-2, o vírus causador da covid-19, e também por linhagens da variante ômicron, que se tornou dominante no planeta, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A vacina contra a gripe, por outro lado, protege o organismo contra diferentes tipos do vírus influenza e são produzidas todos os anos, no Brasil, pelo Instituto Butantan. Os imunizantes disponibilizados pelo SUS este ano protegem contra as cepas H1N1, H3N2 e influenza B/Victoria.

O professor do Instituto de Química da Unicamp Luiz Carlos Dias aponta que essa combinação com as vacinas contra a covid-19 chegou a ser debatida, mas ainda depende de testes e não há previsão para que isso seja feito. As duas vacinas seguem calendário próprio no Programa Nacional de Imunizações (PNI), e a Pfizer sequer possui vacinas contra a gripe em seu portfólio atualmente.

A autora do áudio ainda espalha uma teoria da conspiração de que autoridades teriam como objetivo “exterminar 50% da população do mundo”. Alegações do tipo já foram desmentidas anteriormente pelo Estadão Verifica, como no caso de uma declaração feita pelo presidente da Pfizer, Albert Boula, que foi tirada de contexto.

Vacinas contra covid são seguras, de acordo com diversos órgãos internacionais de saúde. Foto: Reuters/Amanda Perobelli

Vacinas bivalentes

As vacinas bivalentes são conhecidas como imunizantes de segunda geração, porque foram desenvolvidas com base na cepa original do coronavírus e na variante ômicron.

Os produtos são fabricados pela Pfizer e foram aprovados pela Anvisa como dose de reforço para a população acima de 12 anos. Segundo o órgão de saúde, elas são eficazes e seguras para a população. Em 27 de fevereiro, começaram a ser aplicadas em grupos prioritários como dose de reforço para quem completou o esquema primário (duas doses de Pfizer, Astrazeneca e Coronavac ou uma dose da Janssen).

Os documentos que resultaram na aprovação emergencial do produto pela Anvisa indicam que o perfil de segurança da vacina bivalente da Pfizer é o mesmo da vacina monovalente ou de primeira geração. No entanto, o Ministério da Saúde ainda não publicou boletim sobre eventos adversos específicos dessa vacina na campanha iniciada em 27 de fevereiro.

O Estadão solicitou ao Ministério da Saúde um levantamento específico para as vacinas bivalentes, mas o pedido não havia sido atendido até a publicação desta checagem.

Boletins epidemiológicos anteriores, por outro lado, mostram que as reações adversas das vacinas contra a covid-19 costumam ser de caráter leve a moderado. A alegação presente em um dos áudios de que as vacinas estariam causando mais danos do que a própria doença é facilmente rebatida com base nesses dados disponíveis publicamente.

Até abril de 2023, a covid-19 havia tirado a vida de 700.556 pessoas no Brasil, entre os mais de 37 milhões de infectados pelo novo coronavírus desde o início da pandemia. Pelas estatísticas oficiais, portanto, houve uma morte a cada 53 testes positivos.

Em contrapartida, segundo documento do Ministério da Saúde referente ao período de 17 de janeiro de 2021 a 18 de junho de 2022, foram notificadas 134 mil reações adversas pós-vacinação ao Sistema Único de Saúde (SUS), diante de 335 milhões de doses de vacina contra a covid-19 aplicadas no País.

A grande maioria das reações são de caráter leve a moderado, como cansaço, febre e dor ou inchaço no local de aplicação. Filtrando por eventos considerados graves, foram notificados 19.684 casos, sendo 4.675 óbitos. Porém, há um aspecto importante: nem todo problema de saúde que aparece em uma pessoa imunizada contra a covid-19 deve ser atribuído às vacinas. No caso das mortes, por exemplo, apenas 16 delas tiveram relação causal confirmada pelos órgãos de saúde, o que representa um caso a cada 20,9 milhões de doses aplicadas.

Segundo o MS, mais de 4,1 milhões de pessoas já tomaram o reforço com as vacinas bivalentes.  

O médico Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), destaca que mesmo os eventos adversos classificados como graves aparecem com menos frequência com as vacinas do que ao contrair covid-19. Ele também ressalta que os estudos realizados até o momento demonstram que as vacinas bivalentes não trazem riscos aumentados de efeitos colaterais em comparação com os imunizantes monovalentes, ou de primeira geração.

“O perfil de segurança é exatamente o mesmo. São vacinas bastante seguras e bem toleradas”, afirma o médico. “Tanto os estudos de licenciamento quanto as publicações mais recentes americanas de segurança mostram o mesmo risco de febre, dor local, dor de cabeça, cansaço. São efeitos colaterais esperados, comuns em vacinas, e de curta duração.”

A professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) Cristina Bonorino pontua que mesmo os eventos pós-vacina considerados graves são classificados em uma escala de 1 a 4, e a maioria deles não apresenta grau elevado. Ela reforça a segurança dos imunizantes, lembrando que as vacinas apresentam vasta documentação analisada rigorosamente pela Anvisa e por outras entidades médicas.

Procurada pelo Estadão, a Anvisa, responsável pela aprovação do uso dos imunizantes, declarou que nunca antes uma vacina havia sido objeto de monitoramento tão intenso como no caso dos imunizantes contra a covid-19. “Todos os dados de monitoramento e relatos de eventos adversos recebidos até o momento mantêm a relação de benefício-risco da vacina favorável ao seu uso”, afirmou em nota.

Segundo a bula, as vacinas bivalentes apresentam as seguintes taxas de incidência de efeitos colaterais (elas foram combinadas para facilitar a visualização):

  • Reações muito comuns (mais de 10% dos pacientes): dor de cabeça, diarreia, dor nas articulações, dor muscular, dor no local de injeção, cansaço e calafrios.
  • Reações comuns (entre 1% e 10%): náusea, vômito, febre, inchaço e vermelhidão no local de injeção.
  • Reações incomuns (entre 0,1% e 1%): aumento dos gânglios linfáticos (ou ínguas), reações de hipersensibilidade (erupções cutâneas, coceira, alergia e inchaço dentro da pele e nas mucosas), tontura, suor noturno, mal-estar, diminuição de apetite, insônia, dor nos membros, fraqueza e cansaço físico intenso e prurido no local de injeção.
  • Reações raras (entre 0,01% e 0,1%): paralisia facial aguda.
  • Reações muito raras (menos de 0,01%): miocardite (infecção das fibras do coração) e pericardite (inflamação do revestimento externo do coração).

Uma sequência de áudios que circula no WhatsApp presta informações falsas sobre as vacinas bivalentes contra a covid-19, que recentemente começaram a ser aplicadas como doses de reforço no Brasil. Não é verdade que os produtos causem mais sequelas do que a própria doença ou estejam sendo adicionados aos imunizantes contra a gripe, por exemplo. Os conteúdos também exageram a incidência de possíveis efeitos colaterais raros das vacinas e criticam os imunizantes por situações que geralmente não trazem maiores complicações para a saúde.

O material ganhou impulso entre grupos antivacina e agrega quatro relatos diferentes no aplicativo. Diversos leitores solicitaram essa checagem ao Estadão Verifica pelo número de WhatsApp (11) 97683-7490.

Áudios de WhatsApp espalham desinformação sobre vacinas bivalentes Foto: Reprodução / WhatsApp

Em um dos áudios, uma mulher não identificada alega que todos os funcionários e os pacientes idosos de uma casa de repouso chamada “LAIITE” teriam passado mal depois de receberem a vacina bivalente contra a covid-19. Trata-se do Lar para Idosos Irmã Santa Tereza, localizado na cidade de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais.

A própria instituição divulgou um comunicado em seu site relatando que algumas reações adversas previstas em bula de fato foram percebidas entre funcionários e pacientes, mas que apenas um dos casos precisou de atendimento médico. “Atualmente, todos os profissionais e residentes da instituição estão com quadro de saúde estável e passam bem”, esclareceu a direção em nota.

O caso que precisou ser levado ao pronto socorro era de um idoso que apresentou, nos membros inferiores do corpo, uma condição conhecida como astenia, caracterizada por fraqueza muscular e cansaço intenso. A autora do áudio ainda alega que uma profissional da casa de repouso teria apresentado íngua, ou seja, um inchaço nos linfonodos, que são glândulas do sistema imunológico.

Ambos os sintomas estão previstos na bula da vacina bivalente e se situam em uma taxa de 0,1% a 1% das doses aplicadas. Além de ser baixa a chance de as vacinas causarem qualquer condição do tipo, geralmente os sintomas se resolvem sozinhos em poucas horas.

Em outro áudio que circula no WhatsApp, uma suposta profissional da área da saúde alega que recebeu uma dose da vacina bivalente e, cerca de quatro horas depois, procurou atendimento médico na “emergência do Conceição” com “suspeita de infarto”.

Em contato com o Estadão Verifica, o Grupo Hospitalar Conceição, que administra o Hospital Nossa Senhora da Conceição, em Porto Alegre, disse que não houve nenhum relato conhecido de problema cardiológico pós-vacina. Porém, como a identificação do local é feita de maneira vaga no áudio, não se pode descartar completamente o episódio em uma unidade de saúde que eventualmente tenha o mesmo nome.

Assim como nos dois primeiros casos, o conteúdo alardeia um risco extremamente baixo de as vacinas contra a covid-19 causarem problemas cardiológicos que, na maioria das vezes, sequer apresentam gravidade, muito menos resultam em enfartes. Especialistas destacam que ficar exposto à doença sem vacina é mais arriscado, porque a incidência desses sintomas é mais frequente em quem contrai o vírus, entre outras complicações graves que podem levar à morte.

A miocardite, uma inflamação no músculo do coração, por exemplo, aparece em uma taxa de incidência de 0,031 a cada 100 mil doses, segundo dados do Ministério da Saúde até o final do ano passado. Foram apenas 154 casos no Brasil em meio a 510 milhões de doses de vacina aplicadas, segundo dados do Ministério da Saúde.

Nota técnica divulgada no ano passado aponta que houve desfecho de óbito em dois casos de miocardite, mas em ambos a relação com a vacina não ficou comprovada nas investigações médicas. A taxa de miocardite para quem pega a covid-19 é estimada em 30 casos por milhão.

Vacinação contra a COVID-19 na UBS do Butantã, na zona oeste de São Paulo. Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

Outro áudio checado pelo Estadão Verifica alega que mais de 260 instituições pediátricas não identificadas teriam registrado pelo menos dois óbitos e diversos residentes com trombose após a vacina bivalente começar a ser aplicada nesses locais. A informação é atribuída a conversas em um suposto grupo de WhatsApp.

O Estadão Verifica não encontrou nenhum relato do tipo em notícias e outras fontes confiáveis. Jarbas Roriz, membro da comissão de imunização da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, afirmou ao blog que desconhece qualquer aumento de incidência de problemas de saúde na população idosa desde o começo da vacinação, no final de fevereiro.

“Não tem tido registro de efeito adverso grave, aumento de notificação nesse sentido. As reações mais comuns são leves, como dor no local da aplicação, dor no corpo, febre e sintomas da gripe”, relata o médico. Ele ressalta que as vacinas são seguras para os idosos e que eles são um dos grupos que mais se beneficiam com a vacina, ao reduzir o risco de mortalidade e de formas graves da doença.

Além disso, a trombose não é um efeito colateral previsto na bula das vacinas bivalentes da Pfizer, o que torna o relato ainda mais duvidoso. Foram os imunizantes da Astrazeneca e da Janssen, que usam uma tecnologia conhecida como vetor viral, aqueles que foram associados a casos clínicos raros de síndrome de trombose com trombocitopenia (TTS). As vacinas bivalentes da Pfizer, assim como a da Moderna, que ainda aguarda autorização da Anvisa, utilizam uma tecnologia diferente, chamada RNA mensageiro.

Segundo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, as vacinas da Astrazeneca e da Janssen provavelmente foram responsáveis por 16 óbitos, todos eles por TTS, o que corresponde a 1 caso para cada 20,9 milhões de doses aplicadas. Em contrapartida, o governo estima, com base em estudos do Imperial College London, os imunizantes tenham evitado de 700 a 880 mil mortes no Brasil apenas no primeiro ano da campanha de vacinação.

Estudos indicam ainda que o risco de desenvolver quadros trombóticos é mais alto para quem adoece de covid-19. Por conta disso, a Anvisa e o Ministério da Saúde recomendam a vacinação, sobretudo a grupos de risco, como idosos e pessoas com comorbidades.

O quarto e último áudio alega que as vacinas bivalentes estariam sendo adicionadas ao imunizante contra a gripe. As vacinas bivalentes são chamadas assim porque foram desenvolvidas a partir da cepa original do SARS-Cov-2, o vírus causador da covid-19, e também por linhagens da variante ômicron, que se tornou dominante no planeta, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A vacina contra a gripe, por outro lado, protege o organismo contra diferentes tipos do vírus influenza e são produzidas todos os anos, no Brasil, pelo Instituto Butantan. Os imunizantes disponibilizados pelo SUS este ano protegem contra as cepas H1N1, H3N2 e influenza B/Victoria.

O professor do Instituto de Química da Unicamp Luiz Carlos Dias aponta que essa combinação com as vacinas contra a covid-19 chegou a ser debatida, mas ainda depende de testes e não há previsão para que isso seja feito. As duas vacinas seguem calendário próprio no Programa Nacional de Imunizações (PNI), e a Pfizer sequer possui vacinas contra a gripe em seu portfólio atualmente.

A autora do áudio ainda espalha uma teoria da conspiração de que autoridades teriam como objetivo “exterminar 50% da população do mundo”. Alegações do tipo já foram desmentidas anteriormente pelo Estadão Verifica, como no caso de uma declaração feita pelo presidente da Pfizer, Albert Boula, que foi tirada de contexto.

Vacinas contra covid são seguras, de acordo com diversos órgãos internacionais de saúde. Foto: Reuters/Amanda Perobelli

Vacinas bivalentes

As vacinas bivalentes são conhecidas como imunizantes de segunda geração, porque foram desenvolvidas com base na cepa original do coronavírus e na variante ômicron.

Os produtos são fabricados pela Pfizer e foram aprovados pela Anvisa como dose de reforço para a população acima de 12 anos. Segundo o órgão de saúde, elas são eficazes e seguras para a população. Em 27 de fevereiro, começaram a ser aplicadas em grupos prioritários como dose de reforço para quem completou o esquema primário (duas doses de Pfizer, Astrazeneca e Coronavac ou uma dose da Janssen).

Os documentos que resultaram na aprovação emergencial do produto pela Anvisa indicam que o perfil de segurança da vacina bivalente da Pfizer é o mesmo da vacina monovalente ou de primeira geração. No entanto, o Ministério da Saúde ainda não publicou boletim sobre eventos adversos específicos dessa vacina na campanha iniciada em 27 de fevereiro.

O Estadão solicitou ao Ministério da Saúde um levantamento específico para as vacinas bivalentes, mas o pedido não havia sido atendido até a publicação desta checagem.

Boletins epidemiológicos anteriores, por outro lado, mostram que as reações adversas das vacinas contra a covid-19 costumam ser de caráter leve a moderado. A alegação presente em um dos áudios de que as vacinas estariam causando mais danos do que a própria doença é facilmente rebatida com base nesses dados disponíveis publicamente.

Até abril de 2023, a covid-19 havia tirado a vida de 700.556 pessoas no Brasil, entre os mais de 37 milhões de infectados pelo novo coronavírus desde o início da pandemia. Pelas estatísticas oficiais, portanto, houve uma morte a cada 53 testes positivos.

Em contrapartida, segundo documento do Ministério da Saúde referente ao período de 17 de janeiro de 2021 a 18 de junho de 2022, foram notificadas 134 mil reações adversas pós-vacinação ao Sistema Único de Saúde (SUS), diante de 335 milhões de doses de vacina contra a covid-19 aplicadas no País.

A grande maioria das reações são de caráter leve a moderado, como cansaço, febre e dor ou inchaço no local de aplicação. Filtrando por eventos considerados graves, foram notificados 19.684 casos, sendo 4.675 óbitos. Porém, há um aspecto importante: nem todo problema de saúde que aparece em uma pessoa imunizada contra a covid-19 deve ser atribuído às vacinas. No caso das mortes, por exemplo, apenas 16 delas tiveram relação causal confirmada pelos órgãos de saúde, o que representa um caso a cada 20,9 milhões de doses aplicadas.

Segundo o MS, mais de 4,1 milhões de pessoas já tomaram o reforço com as vacinas bivalentes.  

O médico Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), destaca que mesmo os eventos adversos classificados como graves aparecem com menos frequência com as vacinas do que ao contrair covid-19. Ele também ressalta que os estudos realizados até o momento demonstram que as vacinas bivalentes não trazem riscos aumentados de efeitos colaterais em comparação com os imunizantes monovalentes, ou de primeira geração.

“O perfil de segurança é exatamente o mesmo. São vacinas bastante seguras e bem toleradas”, afirma o médico. “Tanto os estudos de licenciamento quanto as publicações mais recentes americanas de segurança mostram o mesmo risco de febre, dor local, dor de cabeça, cansaço. São efeitos colaterais esperados, comuns em vacinas, e de curta duração.”

A professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) Cristina Bonorino pontua que mesmo os eventos pós-vacina considerados graves são classificados em uma escala de 1 a 4, e a maioria deles não apresenta grau elevado. Ela reforça a segurança dos imunizantes, lembrando que as vacinas apresentam vasta documentação analisada rigorosamente pela Anvisa e por outras entidades médicas.

Procurada pelo Estadão, a Anvisa, responsável pela aprovação do uso dos imunizantes, declarou que nunca antes uma vacina havia sido objeto de monitoramento tão intenso como no caso dos imunizantes contra a covid-19. “Todos os dados de monitoramento e relatos de eventos adversos recebidos até o momento mantêm a relação de benefício-risco da vacina favorável ao seu uso”, afirmou em nota.

Segundo a bula, as vacinas bivalentes apresentam as seguintes taxas de incidência de efeitos colaterais (elas foram combinadas para facilitar a visualização):

  • Reações muito comuns (mais de 10% dos pacientes): dor de cabeça, diarreia, dor nas articulações, dor muscular, dor no local de injeção, cansaço e calafrios.
  • Reações comuns (entre 1% e 10%): náusea, vômito, febre, inchaço e vermelhidão no local de injeção.
  • Reações incomuns (entre 0,1% e 1%): aumento dos gânglios linfáticos (ou ínguas), reações de hipersensibilidade (erupções cutâneas, coceira, alergia e inchaço dentro da pele e nas mucosas), tontura, suor noturno, mal-estar, diminuição de apetite, insônia, dor nos membros, fraqueza e cansaço físico intenso e prurido no local de injeção.
  • Reações raras (entre 0,01% e 0,1%): paralisia facial aguda.
  • Reações muito raras (menos de 0,01%): miocardite (infecção das fibras do coração) e pericardite (inflamação do revestimento externo do coração).

Uma sequência de áudios que circula no WhatsApp presta informações falsas sobre as vacinas bivalentes contra a covid-19, que recentemente começaram a ser aplicadas como doses de reforço no Brasil. Não é verdade que os produtos causem mais sequelas do que a própria doença ou estejam sendo adicionados aos imunizantes contra a gripe, por exemplo. Os conteúdos também exageram a incidência de possíveis efeitos colaterais raros das vacinas e criticam os imunizantes por situações que geralmente não trazem maiores complicações para a saúde.

O material ganhou impulso entre grupos antivacina e agrega quatro relatos diferentes no aplicativo. Diversos leitores solicitaram essa checagem ao Estadão Verifica pelo número de WhatsApp (11) 97683-7490.

Áudios de WhatsApp espalham desinformação sobre vacinas bivalentes Foto: Reprodução / WhatsApp

Em um dos áudios, uma mulher não identificada alega que todos os funcionários e os pacientes idosos de uma casa de repouso chamada “LAIITE” teriam passado mal depois de receberem a vacina bivalente contra a covid-19. Trata-se do Lar para Idosos Irmã Santa Tereza, localizado na cidade de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais.

A própria instituição divulgou um comunicado em seu site relatando que algumas reações adversas previstas em bula de fato foram percebidas entre funcionários e pacientes, mas que apenas um dos casos precisou de atendimento médico. “Atualmente, todos os profissionais e residentes da instituição estão com quadro de saúde estável e passam bem”, esclareceu a direção em nota.

O caso que precisou ser levado ao pronto socorro era de um idoso que apresentou, nos membros inferiores do corpo, uma condição conhecida como astenia, caracterizada por fraqueza muscular e cansaço intenso. A autora do áudio ainda alega que uma profissional da casa de repouso teria apresentado íngua, ou seja, um inchaço nos linfonodos, que são glândulas do sistema imunológico.

Ambos os sintomas estão previstos na bula da vacina bivalente e se situam em uma taxa de 0,1% a 1% das doses aplicadas. Além de ser baixa a chance de as vacinas causarem qualquer condição do tipo, geralmente os sintomas se resolvem sozinhos em poucas horas.

Em outro áudio que circula no WhatsApp, uma suposta profissional da área da saúde alega que recebeu uma dose da vacina bivalente e, cerca de quatro horas depois, procurou atendimento médico na “emergência do Conceição” com “suspeita de infarto”.

Em contato com o Estadão Verifica, o Grupo Hospitalar Conceição, que administra o Hospital Nossa Senhora da Conceição, em Porto Alegre, disse que não houve nenhum relato conhecido de problema cardiológico pós-vacina. Porém, como a identificação do local é feita de maneira vaga no áudio, não se pode descartar completamente o episódio em uma unidade de saúde que eventualmente tenha o mesmo nome.

Assim como nos dois primeiros casos, o conteúdo alardeia um risco extremamente baixo de as vacinas contra a covid-19 causarem problemas cardiológicos que, na maioria das vezes, sequer apresentam gravidade, muito menos resultam em enfartes. Especialistas destacam que ficar exposto à doença sem vacina é mais arriscado, porque a incidência desses sintomas é mais frequente em quem contrai o vírus, entre outras complicações graves que podem levar à morte.

A miocardite, uma inflamação no músculo do coração, por exemplo, aparece em uma taxa de incidência de 0,031 a cada 100 mil doses, segundo dados do Ministério da Saúde até o final do ano passado. Foram apenas 154 casos no Brasil em meio a 510 milhões de doses de vacina aplicadas, segundo dados do Ministério da Saúde.

Nota técnica divulgada no ano passado aponta que houve desfecho de óbito em dois casos de miocardite, mas em ambos a relação com a vacina não ficou comprovada nas investigações médicas. A taxa de miocardite para quem pega a covid-19 é estimada em 30 casos por milhão.

Vacinação contra a COVID-19 na UBS do Butantã, na zona oeste de São Paulo. Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

Outro áudio checado pelo Estadão Verifica alega que mais de 260 instituições pediátricas não identificadas teriam registrado pelo menos dois óbitos e diversos residentes com trombose após a vacina bivalente começar a ser aplicada nesses locais. A informação é atribuída a conversas em um suposto grupo de WhatsApp.

O Estadão Verifica não encontrou nenhum relato do tipo em notícias e outras fontes confiáveis. Jarbas Roriz, membro da comissão de imunização da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, afirmou ao blog que desconhece qualquer aumento de incidência de problemas de saúde na população idosa desde o começo da vacinação, no final de fevereiro.

“Não tem tido registro de efeito adverso grave, aumento de notificação nesse sentido. As reações mais comuns são leves, como dor no local da aplicação, dor no corpo, febre e sintomas da gripe”, relata o médico. Ele ressalta que as vacinas são seguras para os idosos e que eles são um dos grupos que mais se beneficiam com a vacina, ao reduzir o risco de mortalidade e de formas graves da doença.

Além disso, a trombose não é um efeito colateral previsto na bula das vacinas bivalentes da Pfizer, o que torna o relato ainda mais duvidoso. Foram os imunizantes da Astrazeneca e da Janssen, que usam uma tecnologia conhecida como vetor viral, aqueles que foram associados a casos clínicos raros de síndrome de trombose com trombocitopenia (TTS). As vacinas bivalentes da Pfizer, assim como a da Moderna, que ainda aguarda autorização da Anvisa, utilizam uma tecnologia diferente, chamada RNA mensageiro.

Segundo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, as vacinas da Astrazeneca e da Janssen provavelmente foram responsáveis por 16 óbitos, todos eles por TTS, o que corresponde a 1 caso para cada 20,9 milhões de doses aplicadas. Em contrapartida, o governo estima, com base em estudos do Imperial College London, os imunizantes tenham evitado de 700 a 880 mil mortes no Brasil apenas no primeiro ano da campanha de vacinação.

Estudos indicam ainda que o risco de desenvolver quadros trombóticos é mais alto para quem adoece de covid-19. Por conta disso, a Anvisa e o Ministério da Saúde recomendam a vacinação, sobretudo a grupos de risco, como idosos e pessoas com comorbidades.

O quarto e último áudio alega que as vacinas bivalentes estariam sendo adicionadas ao imunizante contra a gripe. As vacinas bivalentes são chamadas assim porque foram desenvolvidas a partir da cepa original do SARS-Cov-2, o vírus causador da covid-19, e também por linhagens da variante ômicron, que se tornou dominante no planeta, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A vacina contra a gripe, por outro lado, protege o organismo contra diferentes tipos do vírus influenza e são produzidas todos os anos, no Brasil, pelo Instituto Butantan. Os imunizantes disponibilizados pelo SUS este ano protegem contra as cepas H1N1, H3N2 e influenza B/Victoria.

O professor do Instituto de Química da Unicamp Luiz Carlos Dias aponta que essa combinação com as vacinas contra a covid-19 chegou a ser debatida, mas ainda depende de testes e não há previsão para que isso seja feito. As duas vacinas seguem calendário próprio no Programa Nacional de Imunizações (PNI), e a Pfizer sequer possui vacinas contra a gripe em seu portfólio atualmente.

A autora do áudio ainda espalha uma teoria da conspiração de que autoridades teriam como objetivo “exterminar 50% da população do mundo”. Alegações do tipo já foram desmentidas anteriormente pelo Estadão Verifica, como no caso de uma declaração feita pelo presidente da Pfizer, Albert Boula, que foi tirada de contexto.

Vacinas contra covid são seguras, de acordo com diversos órgãos internacionais de saúde. Foto: Reuters/Amanda Perobelli

Vacinas bivalentes

As vacinas bivalentes são conhecidas como imunizantes de segunda geração, porque foram desenvolvidas com base na cepa original do coronavírus e na variante ômicron.

Os produtos são fabricados pela Pfizer e foram aprovados pela Anvisa como dose de reforço para a população acima de 12 anos. Segundo o órgão de saúde, elas são eficazes e seguras para a população. Em 27 de fevereiro, começaram a ser aplicadas em grupos prioritários como dose de reforço para quem completou o esquema primário (duas doses de Pfizer, Astrazeneca e Coronavac ou uma dose da Janssen).

Os documentos que resultaram na aprovação emergencial do produto pela Anvisa indicam que o perfil de segurança da vacina bivalente da Pfizer é o mesmo da vacina monovalente ou de primeira geração. No entanto, o Ministério da Saúde ainda não publicou boletim sobre eventos adversos específicos dessa vacina na campanha iniciada em 27 de fevereiro.

O Estadão solicitou ao Ministério da Saúde um levantamento específico para as vacinas bivalentes, mas o pedido não havia sido atendido até a publicação desta checagem.

Boletins epidemiológicos anteriores, por outro lado, mostram que as reações adversas das vacinas contra a covid-19 costumam ser de caráter leve a moderado. A alegação presente em um dos áudios de que as vacinas estariam causando mais danos do que a própria doença é facilmente rebatida com base nesses dados disponíveis publicamente.

Até abril de 2023, a covid-19 havia tirado a vida de 700.556 pessoas no Brasil, entre os mais de 37 milhões de infectados pelo novo coronavírus desde o início da pandemia. Pelas estatísticas oficiais, portanto, houve uma morte a cada 53 testes positivos.

Em contrapartida, segundo documento do Ministério da Saúde referente ao período de 17 de janeiro de 2021 a 18 de junho de 2022, foram notificadas 134 mil reações adversas pós-vacinação ao Sistema Único de Saúde (SUS), diante de 335 milhões de doses de vacina contra a covid-19 aplicadas no País.

A grande maioria das reações são de caráter leve a moderado, como cansaço, febre e dor ou inchaço no local de aplicação. Filtrando por eventos considerados graves, foram notificados 19.684 casos, sendo 4.675 óbitos. Porém, há um aspecto importante: nem todo problema de saúde que aparece em uma pessoa imunizada contra a covid-19 deve ser atribuído às vacinas. No caso das mortes, por exemplo, apenas 16 delas tiveram relação causal confirmada pelos órgãos de saúde, o que representa um caso a cada 20,9 milhões de doses aplicadas.

Segundo o MS, mais de 4,1 milhões de pessoas já tomaram o reforço com as vacinas bivalentes.  

O médico Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), destaca que mesmo os eventos adversos classificados como graves aparecem com menos frequência com as vacinas do que ao contrair covid-19. Ele também ressalta que os estudos realizados até o momento demonstram que as vacinas bivalentes não trazem riscos aumentados de efeitos colaterais em comparação com os imunizantes monovalentes, ou de primeira geração.

“O perfil de segurança é exatamente o mesmo. São vacinas bastante seguras e bem toleradas”, afirma o médico. “Tanto os estudos de licenciamento quanto as publicações mais recentes americanas de segurança mostram o mesmo risco de febre, dor local, dor de cabeça, cansaço. São efeitos colaterais esperados, comuns em vacinas, e de curta duração.”

A professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) Cristina Bonorino pontua que mesmo os eventos pós-vacina considerados graves são classificados em uma escala de 1 a 4, e a maioria deles não apresenta grau elevado. Ela reforça a segurança dos imunizantes, lembrando que as vacinas apresentam vasta documentação analisada rigorosamente pela Anvisa e por outras entidades médicas.

Procurada pelo Estadão, a Anvisa, responsável pela aprovação do uso dos imunizantes, declarou que nunca antes uma vacina havia sido objeto de monitoramento tão intenso como no caso dos imunizantes contra a covid-19. “Todos os dados de monitoramento e relatos de eventos adversos recebidos até o momento mantêm a relação de benefício-risco da vacina favorável ao seu uso”, afirmou em nota.

Segundo a bula, as vacinas bivalentes apresentam as seguintes taxas de incidência de efeitos colaterais (elas foram combinadas para facilitar a visualização):

  • Reações muito comuns (mais de 10% dos pacientes): dor de cabeça, diarreia, dor nas articulações, dor muscular, dor no local de injeção, cansaço e calafrios.
  • Reações comuns (entre 1% e 10%): náusea, vômito, febre, inchaço e vermelhidão no local de injeção.
  • Reações incomuns (entre 0,1% e 1%): aumento dos gânglios linfáticos (ou ínguas), reações de hipersensibilidade (erupções cutâneas, coceira, alergia e inchaço dentro da pele e nas mucosas), tontura, suor noturno, mal-estar, diminuição de apetite, insônia, dor nos membros, fraqueza e cansaço físico intenso e prurido no local de injeção.
  • Reações raras (entre 0,01% e 0,1%): paralisia facial aguda.
  • Reações muito raras (menos de 0,01%): miocardite (infecção das fibras do coração) e pericardite (inflamação do revestimento externo do coração).

Uma sequência de áudios que circula no WhatsApp presta informações falsas sobre as vacinas bivalentes contra a covid-19, que recentemente começaram a ser aplicadas como doses de reforço no Brasil. Não é verdade que os produtos causem mais sequelas do que a própria doença ou estejam sendo adicionados aos imunizantes contra a gripe, por exemplo. Os conteúdos também exageram a incidência de possíveis efeitos colaterais raros das vacinas e criticam os imunizantes por situações que geralmente não trazem maiores complicações para a saúde.

O material ganhou impulso entre grupos antivacina e agrega quatro relatos diferentes no aplicativo. Diversos leitores solicitaram essa checagem ao Estadão Verifica pelo número de WhatsApp (11) 97683-7490.

Áudios de WhatsApp espalham desinformação sobre vacinas bivalentes Foto: Reprodução / WhatsApp

Em um dos áudios, uma mulher não identificada alega que todos os funcionários e os pacientes idosos de uma casa de repouso chamada “LAIITE” teriam passado mal depois de receberem a vacina bivalente contra a covid-19. Trata-se do Lar para Idosos Irmã Santa Tereza, localizado na cidade de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais.

A própria instituição divulgou um comunicado em seu site relatando que algumas reações adversas previstas em bula de fato foram percebidas entre funcionários e pacientes, mas que apenas um dos casos precisou de atendimento médico. “Atualmente, todos os profissionais e residentes da instituição estão com quadro de saúde estável e passam bem”, esclareceu a direção em nota.

O caso que precisou ser levado ao pronto socorro era de um idoso que apresentou, nos membros inferiores do corpo, uma condição conhecida como astenia, caracterizada por fraqueza muscular e cansaço intenso. A autora do áudio ainda alega que uma profissional da casa de repouso teria apresentado íngua, ou seja, um inchaço nos linfonodos, que são glândulas do sistema imunológico.

Ambos os sintomas estão previstos na bula da vacina bivalente e se situam em uma taxa de 0,1% a 1% das doses aplicadas. Além de ser baixa a chance de as vacinas causarem qualquer condição do tipo, geralmente os sintomas se resolvem sozinhos em poucas horas.

Em outro áudio que circula no WhatsApp, uma suposta profissional da área da saúde alega que recebeu uma dose da vacina bivalente e, cerca de quatro horas depois, procurou atendimento médico na “emergência do Conceição” com “suspeita de infarto”.

Em contato com o Estadão Verifica, o Grupo Hospitalar Conceição, que administra o Hospital Nossa Senhora da Conceição, em Porto Alegre, disse que não houve nenhum relato conhecido de problema cardiológico pós-vacina. Porém, como a identificação do local é feita de maneira vaga no áudio, não se pode descartar completamente o episódio em uma unidade de saúde que eventualmente tenha o mesmo nome.

Assim como nos dois primeiros casos, o conteúdo alardeia um risco extremamente baixo de as vacinas contra a covid-19 causarem problemas cardiológicos que, na maioria das vezes, sequer apresentam gravidade, muito menos resultam em enfartes. Especialistas destacam que ficar exposto à doença sem vacina é mais arriscado, porque a incidência desses sintomas é mais frequente em quem contrai o vírus, entre outras complicações graves que podem levar à morte.

A miocardite, uma inflamação no músculo do coração, por exemplo, aparece em uma taxa de incidência de 0,031 a cada 100 mil doses, segundo dados do Ministério da Saúde até o final do ano passado. Foram apenas 154 casos no Brasil em meio a 510 milhões de doses de vacina aplicadas, segundo dados do Ministério da Saúde.

Nota técnica divulgada no ano passado aponta que houve desfecho de óbito em dois casos de miocardite, mas em ambos a relação com a vacina não ficou comprovada nas investigações médicas. A taxa de miocardite para quem pega a covid-19 é estimada em 30 casos por milhão.

Vacinação contra a COVID-19 na UBS do Butantã, na zona oeste de São Paulo. Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

Outro áudio checado pelo Estadão Verifica alega que mais de 260 instituições pediátricas não identificadas teriam registrado pelo menos dois óbitos e diversos residentes com trombose após a vacina bivalente começar a ser aplicada nesses locais. A informação é atribuída a conversas em um suposto grupo de WhatsApp.

O Estadão Verifica não encontrou nenhum relato do tipo em notícias e outras fontes confiáveis. Jarbas Roriz, membro da comissão de imunização da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, afirmou ao blog que desconhece qualquer aumento de incidência de problemas de saúde na população idosa desde o começo da vacinação, no final de fevereiro.

“Não tem tido registro de efeito adverso grave, aumento de notificação nesse sentido. As reações mais comuns são leves, como dor no local da aplicação, dor no corpo, febre e sintomas da gripe”, relata o médico. Ele ressalta que as vacinas são seguras para os idosos e que eles são um dos grupos que mais se beneficiam com a vacina, ao reduzir o risco de mortalidade e de formas graves da doença.

Além disso, a trombose não é um efeito colateral previsto na bula das vacinas bivalentes da Pfizer, o que torna o relato ainda mais duvidoso. Foram os imunizantes da Astrazeneca e da Janssen, que usam uma tecnologia conhecida como vetor viral, aqueles que foram associados a casos clínicos raros de síndrome de trombose com trombocitopenia (TTS). As vacinas bivalentes da Pfizer, assim como a da Moderna, que ainda aguarda autorização da Anvisa, utilizam uma tecnologia diferente, chamada RNA mensageiro.

Segundo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, as vacinas da Astrazeneca e da Janssen provavelmente foram responsáveis por 16 óbitos, todos eles por TTS, o que corresponde a 1 caso para cada 20,9 milhões de doses aplicadas. Em contrapartida, o governo estima, com base em estudos do Imperial College London, os imunizantes tenham evitado de 700 a 880 mil mortes no Brasil apenas no primeiro ano da campanha de vacinação.

Estudos indicam ainda que o risco de desenvolver quadros trombóticos é mais alto para quem adoece de covid-19. Por conta disso, a Anvisa e o Ministério da Saúde recomendam a vacinação, sobretudo a grupos de risco, como idosos e pessoas com comorbidades.

O quarto e último áudio alega que as vacinas bivalentes estariam sendo adicionadas ao imunizante contra a gripe. As vacinas bivalentes são chamadas assim porque foram desenvolvidas a partir da cepa original do SARS-Cov-2, o vírus causador da covid-19, e também por linhagens da variante ômicron, que se tornou dominante no planeta, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A vacina contra a gripe, por outro lado, protege o organismo contra diferentes tipos do vírus influenza e são produzidas todos os anos, no Brasil, pelo Instituto Butantan. Os imunizantes disponibilizados pelo SUS este ano protegem contra as cepas H1N1, H3N2 e influenza B/Victoria.

O professor do Instituto de Química da Unicamp Luiz Carlos Dias aponta que essa combinação com as vacinas contra a covid-19 chegou a ser debatida, mas ainda depende de testes e não há previsão para que isso seja feito. As duas vacinas seguem calendário próprio no Programa Nacional de Imunizações (PNI), e a Pfizer sequer possui vacinas contra a gripe em seu portfólio atualmente.

A autora do áudio ainda espalha uma teoria da conspiração de que autoridades teriam como objetivo “exterminar 50% da população do mundo”. Alegações do tipo já foram desmentidas anteriormente pelo Estadão Verifica, como no caso de uma declaração feita pelo presidente da Pfizer, Albert Boula, que foi tirada de contexto.

Vacinas contra covid são seguras, de acordo com diversos órgãos internacionais de saúde. Foto: Reuters/Amanda Perobelli

Vacinas bivalentes

As vacinas bivalentes são conhecidas como imunizantes de segunda geração, porque foram desenvolvidas com base na cepa original do coronavírus e na variante ômicron.

Os produtos são fabricados pela Pfizer e foram aprovados pela Anvisa como dose de reforço para a população acima de 12 anos. Segundo o órgão de saúde, elas são eficazes e seguras para a população. Em 27 de fevereiro, começaram a ser aplicadas em grupos prioritários como dose de reforço para quem completou o esquema primário (duas doses de Pfizer, Astrazeneca e Coronavac ou uma dose da Janssen).

Os documentos que resultaram na aprovação emergencial do produto pela Anvisa indicam que o perfil de segurança da vacina bivalente da Pfizer é o mesmo da vacina monovalente ou de primeira geração. No entanto, o Ministério da Saúde ainda não publicou boletim sobre eventos adversos específicos dessa vacina na campanha iniciada em 27 de fevereiro.

O Estadão solicitou ao Ministério da Saúde um levantamento específico para as vacinas bivalentes, mas o pedido não havia sido atendido até a publicação desta checagem.

Boletins epidemiológicos anteriores, por outro lado, mostram que as reações adversas das vacinas contra a covid-19 costumam ser de caráter leve a moderado. A alegação presente em um dos áudios de que as vacinas estariam causando mais danos do que a própria doença é facilmente rebatida com base nesses dados disponíveis publicamente.

Até abril de 2023, a covid-19 havia tirado a vida de 700.556 pessoas no Brasil, entre os mais de 37 milhões de infectados pelo novo coronavírus desde o início da pandemia. Pelas estatísticas oficiais, portanto, houve uma morte a cada 53 testes positivos.

Em contrapartida, segundo documento do Ministério da Saúde referente ao período de 17 de janeiro de 2021 a 18 de junho de 2022, foram notificadas 134 mil reações adversas pós-vacinação ao Sistema Único de Saúde (SUS), diante de 335 milhões de doses de vacina contra a covid-19 aplicadas no País.

A grande maioria das reações são de caráter leve a moderado, como cansaço, febre e dor ou inchaço no local de aplicação. Filtrando por eventos considerados graves, foram notificados 19.684 casos, sendo 4.675 óbitos. Porém, há um aspecto importante: nem todo problema de saúde que aparece em uma pessoa imunizada contra a covid-19 deve ser atribuído às vacinas. No caso das mortes, por exemplo, apenas 16 delas tiveram relação causal confirmada pelos órgãos de saúde, o que representa um caso a cada 20,9 milhões de doses aplicadas.

Segundo o MS, mais de 4,1 milhões de pessoas já tomaram o reforço com as vacinas bivalentes.  

O médico Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), destaca que mesmo os eventos adversos classificados como graves aparecem com menos frequência com as vacinas do que ao contrair covid-19. Ele também ressalta que os estudos realizados até o momento demonstram que as vacinas bivalentes não trazem riscos aumentados de efeitos colaterais em comparação com os imunizantes monovalentes, ou de primeira geração.

“O perfil de segurança é exatamente o mesmo. São vacinas bastante seguras e bem toleradas”, afirma o médico. “Tanto os estudos de licenciamento quanto as publicações mais recentes americanas de segurança mostram o mesmo risco de febre, dor local, dor de cabeça, cansaço. São efeitos colaterais esperados, comuns em vacinas, e de curta duração.”

A professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) Cristina Bonorino pontua que mesmo os eventos pós-vacina considerados graves são classificados em uma escala de 1 a 4, e a maioria deles não apresenta grau elevado. Ela reforça a segurança dos imunizantes, lembrando que as vacinas apresentam vasta documentação analisada rigorosamente pela Anvisa e por outras entidades médicas.

Procurada pelo Estadão, a Anvisa, responsável pela aprovação do uso dos imunizantes, declarou que nunca antes uma vacina havia sido objeto de monitoramento tão intenso como no caso dos imunizantes contra a covid-19. “Todos os dados de monitoramento e relatos de eventos adversos recebidos até o momento mantêm a relação de benefício-risco da vacina favorável ao seu uso”, afirmou em nota.

Segundo a bula, as vacinas bivalentes apresentam as seguintes taxas de incidência de efeitos colaterais (elas foram combinadas para facilitar a visualização):

  • Reações muito comuns (mais de 10% dos pacientes): dor de cabeça, diarreia, dor nas articulações, dor muscular, dor no local de injeção, cansaço e calafrios.
  • Reações comuns (entre 1% e 10%): náusea, vômito, febre, inchaço e vermelhidão no local de injeção.
  • Reações incomuns (entre 0,1% e 1%): aumento dos gânglios linfáticos (ou ínguas), reações de hipersensibilidade (erupções cutâneas, coceira, alergia e inchaço dentro da pele e nas mucosas), tontura, suor noturno, mal-estar, diminuição de apetite, insônia, dor nos membros, fraqueza e cansaço físico intenso e prurido no local de injeção.
  • Reações raras (entre 0,01% e 0,1%): paralisia facial aguda.
  • Reações muito raras (menos de 0,01%): miocardite (infecção das fibras do coração) e pericardite (inflamação do revestimento externo do coração).

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.