A alta no preço dos ovos de galinha tem sido alvo de desinformação nas redes sociais. Postagens no Facebook e Twitter enganam ao alegar que o valor da cartela com 30 unidades ficava entre R$ 10 e R$ 12 no governo de Jair Bolsonaro (PL) e que, devido ao início do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o preço teria subido a R$ 27,85. Na realidade, o custo do ovo subiu 48% nos últimos 36 meses, com altas pontuais no período entre fevereiro e abril, época da quaresma. Para especialistas ouvidos pelo Estadão Verifica, o aumento mais recente do preço não tem motivação política.
As postagens compartilham uma imagem que mostra o preço da cartela com 30 ovos em uma unidade da rede atacadista Grupo Nova Era. Na legenda, os responsáveis pelos posts se referem às gestões de Lula e Bolsonaro como o governo do ‘amor’ e do ‘ódio’, respectivamente. Uma publicação no Twitter, que passa de 49 mil visualizações, traz a seguinte legenda: “Com ódio era R$ 12, com amor agora é R$ 27,85. Não reclama, apenas faz o L”.
Procurada pelo Estadão Verifica, a rede atacadista informou que a cartela com 30 ovos nunca chegou a baixar a R$ 10 em 2022, quando Bolsonaro era presidente. De acordo com a empresa, o preço do ovo segue variação de acordo com o mercado produtor e, no ano passado, houve variações por diversos motivos, incluindo redução da oferta e demanda. “A média de preço do produto, no ano passado, foi de R$ 23 e, em situações de ofertas e promoções pontuais, variou em torno de R$ 19,99″, comunicou o supermercado.
Apesar de o preço do ovo ter apresentado alta em todas as capitais, conforme mostra o levantamento sobre cesta básica feito pela empresa de inteligência Horus, em parceria com o Instituto Brasileiro de Economia (IBRE/FGV), os fatores que provocaram o aumento do valor do alimento estão relacionados à sazonalidade, com a chegada da quaresma, e à baixa oferta do produto, provocada pelo aumento do custo de produção e alimentação das aves.
O economista André Braz, da Fundação Getúlio Vargas (FGV-IBRE), explica que, tradicionalmente, o preço dos ovos sobe durante a quaresma devido à tradição da religião católica. Durante os quarenta dias que antecedem a Páscoa, muitos fiéis abdicam da carne bovina, por isso, a procura pelos ovos como fonte de proteína alternativa à carne provoca o aumento no valor do alimento.
Além da sazonalidade, Braz comenta que há também uma explicação técnica. “Com a chegada do outono, as aves trocam de pena em um processo de preparação para o inverno, e essa troca de penas também diminui a produção de ovos, é uma questão que está associada ao clima”, pontuou. “Há razões para a gente entender que é um momento sazonal, não é durável. O ovo de galinha não mudou permanentemente de patamar”.
Apesar da queda prevista, preço continuará elevado
Um levantamento realizado por Braz com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mostra que, de março de 2020 a fevereiro de 2023, o preço do ovo registra variações pontuais entre os meses de fevereiro e abril, de acordo com a chegada da quaresma.
“No acumulado de 36 meses, o ovo subiu 48%, que é mais do que o dobro da inflação de 22,8% acumulado pelo IBGE neste mesmo período, e ficou um pouco acima até da inflação acumulada para alimentação. A média dos alimentos nesse período subiu 45%, mas só o ovo subiu 48%”, explica André.
Antes de o consumidor sentir a alta do preço dos ovos, quem precisou lidar com os impactos mercadológicos foram os avicultores. De acordo com a analista do mercado de ovos Juliana Ferraz, do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, além de a procura ter aumentado, o mercado de ovos está com baixa oferta do produto devido ao aumento do custo de produção, principalmente os custos relacionados a nutrição animal, que é baseada em milho, farelo e soja.
“O elevado custo de produção levou muitos avicultores a intensificaram os descartes de poedeiras nos últimos meses, o que vem resultando em diminuição na oferta da proteína”, comentou. “A expectativa é de que passado o período religioso, os preços se acomodem em patamares mais baixos, no entanto, espera-se que os valores continuem acima dos praticados no mesmo período do ano passado devido ao custo de produção ainda bastante alto”.
A analista também aponta que, atualmente, o preço do ovo é calculado por um conjunto de fatores que, diferentemente do ano passado, agora têm a influência da demanda e oferta. “Nos anos anteriores, a oferta foi suficiente para suprir todas as demandas sem que os preços subissem de forma tão intensa. As questões que estão pautando o preço dos ovos hoje são questões mercadológicas”, disse.
A reportagem tentou contato com o autor da publicação no Facebook e não obteve respostas. Já no Twitter o perfil que publicou a imagem não permite o envio de mensagens diretas.
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Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.
Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.