Não é real o texto que circula nas redes sociais como se fosse uma entrevista de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), ao jornal O Globo. O conteúdo, de fato, foi publicado no periódico, mas era uma obra de ficção criada pelo jornalista e cineasta Arnaldo Jabor.
O texto traz o título “Estamos todos no inferno” e foi publicado pelo colunista nos jornais O Globo e Estadão, em maio de 2006. Jabor simula uma conversa com um criminoso não identificado, de modo a fazer uma crítica sobre a falta de assistência social e a miséria nas favelas, além da extensão do crime organizado no Brasil e da falta de perspectivas para solucionar o problema.
Começa com o seguinte trecho, dando a entender que seria uma espécie de entrevista:
Coluna de Arnaldo Jabor “Estamos todos no inferno” publicada em 23/5/2006 no Estadão.
Naquele mês, o PCC havia realizado uma série de ataques contra a polícia de São Paulo. Entre os dias 12 e 20 de maio de 2006, a organização criminosa matou 59 agentes de segurança nas ruas e promoveu 74 rebeliões em presídios no Estado. Os atentatos que paralisaram São Paulo aconteceram em represália ao isolamento, no Dia das Mães, de parte da população carcerária em penitenciária de Presidente Venceslau (SP).
Em comentário na rádio CBN, Arnaldo Jabor realmente associa o seu personagem ao traficante Marcola. O conteúdo não está mais disponível no site da emissora, mas preserva a manchete com o nome do preso (“Marcola, um sinal dos novos tempos”).
Em julho daquele mesmo ano, Jabor relembrou a coluna e deixou claro aos ouvintes que a entrevista nunca ocorreu de fato. “Eu escrevi nos jornais uma coluna em que inventei uma entrevista imaginária com um traficante preso do PCC”, relata ele, segundo transcrição do site e-Farsas. “É legal o texto. E todo mundo gosta, mas não acreditam que fui eu que fiz. Acham que é real a lucidez do bandido.”
Poucos dias após a publicação, o texto passou a circular na internet com a falsa inscrição de que seria uma entrevista “assustadora” de Marcola para o jornal O Globo. Diversos veículos tentaram esclarecer a confusão desde então, incluindo a revista Veja, os blogs de checagem Boatos.org e e-Farsas e o escritor Marcelo Rubens Paiva, em coluna no Estadão. No entanto, a mentira persiste nas redes sociais.
A mensagem contém alguns sinais de alerta que colocam em dúvida a veracidade do conteúdo. Apesar de recomendar a leitura da suposta entrevista de Marcola, não traz links para o conteúdo original nem prints de páginas do jornal O Globo, por exemplo. Também não indica a data de veiculação e não é encontrada facilmente com uma simples pesquisa no Google.
O Estadão Verifica recebeu o texto como sugestão de checagem de diversos leitores pelo WhatsApp. Encaminhe áudios, textos e imagens duvidosas para o nosso número de WhatsApp: (11) 97683-7490.