Uma publicação nas redes sociais teoriza que o alerta da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) a respeito do aumento de casos de covid-19 teria o objetivo de desmobilizar os manifestantes contrários ao resultado das eleições para Presidente, devido ao risco provocado pela "aglomeração". A alegação é falsa. O alerta foi feito a partir dos dados de uma nota técnica emitida no dia 3 de novembro pelo Centro de Triagem e Diagnóstico (CTD) do Núcleo de Enfrentamento e Estudos em Doenças Infecciosas (Needier/UFRJ).
O núcleo detectou um aumento substancial e progressivo no número de casos positivos para covid-19 a partir de outubro. De acordo com a diretora da entidade e autora do alerta, Terezinha Marta Castiñeiras, há indícios de uma nova onda de covid no Brasil, provavelmente ocasionada pela entrada da subvariante da Ômicron BQ.1, já identificada em São Paulo e no Rio de Janeiro.
De acordo com Castiñeiras, a curva de casos diagnosticados no CTD-Covid-19 sempre demonstrou correlação com os dados gerados no município do Rio de Janeiro. Recentemente, o CTD detectou um aumento nessa curva. "Após um período de 'calmaria' de meados de agosto ao final de setembro, detectamos um aumento substancial e progressivo da positividade para covid- 19 a partir de outubro e passamos de 40% ao longo das últimas semanas", diz a diretora. Ela ressalta: "No cenário atual, em que a vacinação reverteu o perfil catastrófico, é importante entender que a pandemia foi amenizada, mas não extinta".
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) também registrou aumento nos casos de covid-19 em quatro estados: Amazonas, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo. Os dados constam no boletim InfoGripe desta quinta-feira, 10. Também foi notado aumento no monitoramento do Instituto Todos pela Saúde (ITPS).
A autora do vídeo aqui investigado afirma, sem provas, que o alerta emitido pela UFRJ é falso e tem como objetivo fazer com as manifestações contra o resultado das eleições sejam desmobilizadas. Ela desconsidera, contudo, que já havia uma determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) para desobstrução das vias bloqueadas por manifestantes desde o dia 1º de novembro de 2022. A determinação não menciona risco de contágio, o que enfraquece a tese de que haveria um discurso combinado para desmobilizar os bloqueios nas rodovias.
Segundo a decisão do ministro Alexandre de Moraes, a medida tinha o objetivo de garantir o "resguardo da ordem no entorno e, principalmente, à segurança dos pedestres, motoristas, passageiros e dos próprios participantes do movimento ilegal que porventura venham a se posicionar em locais inapropriados nas rodovias do País".
Pesquisador aponta que uma nova onda de covid19 já começou
O último Monitoramento da Ômicron, divulgado no dia 3 de novembro pelo Instituto Todos pela Saúde (ITPS), alerta que há um forte indício de uma nova onda de contágios pelo coronavírus no Brasil. Segundo a pesquisa, entre 8 e 29 de outubro, houve um aumento de 3% para 17% na positividade de testes para covid-19. A análise teve como base 595.534 testes feitos em laboratórios privados entre 5 de dezembro de 2021 e 29 de outubro deste ano.
De acordo com o pesquisador do ITPS e coordenador na Rede Análise, Marcelo Bragatte, essa nova onda já começou e é esperado um aumento de casos de contágio nas próximas semanas. "Mas é importante salientar que não terá as características nem a dimensão das primeiras ondas", completa. "Não vai ser daquele nível de lotar hospitais, de ter muita gente pegando covid novamente e tendo sintomas graves, porque [hoje] a gente tem vacinação", afirma.
Na Europa, a nova onda já começou em meados de setembro, e em outros países, os casos seguem crescendo. Na China, por exemplo, o número de infecções na útima segunda-feira, 7, foi a maior dos últimos seis meses, enquanto nos Estados Unidos, o número de hospitalizações relacionadas à covid-19 vem aumentando há semanas. No Brasil, na última terça, 8, São Paulo registrou a primeira morte pela subvariante BQ.1 da Ômicron. A vítima era um idoso de 72 anos.
Marcelo Bragatte explica que novas variantes surgem naturalmente, pois o vírus segue circulando entre as pessoas. É também por essa razão que é tão difícil detectar a causa exata de uma nova onda de contágio. "Como vivemos em um mundo globalizado e dinâmico, são maiores as chances de pessoas suscetíveis serem contaminadas e termos outras variantes de interesse que podem ter mais sucesso que as anteriores ao invadir nossos corpos", explica o pesquisador. "Quando uma dessas variantes consegue invadir muitas pessoas, torna-se uma variante de preocupação e pode ser a origem para novos surtos", alerta.
Para prevenir o contágio, Bragatte ressalta a importância de se realizar um teste caso haja dúvida sobre uma possível infecção. Se o resultado for positivo, a pessoa deve evitar circular e utilizar máscara se tiver de se deslocar. "Quando esquecemos de nos vacinar e não nos cuidamos em locais com alta aglomeração, somos alvos para os vírus circulantes e podemos entrar na estatística como sendo um dos novos casos", afirma.
É fundamental manter a vacinação em dia
De acordo com dados do Ministério da Saúde, o Brasil registrou, até o dia 7 de novembro, 34.855.492 casos de covid-19, com 688.395 óbitos confirmados. Até esta quarta-feira, 9, 84,79% da população total tinha tomado a 1ª dose da vacina, 79,9% tinham tomado a 2ª dose - ou dose única - e 49,03% tinham tomado a dose de reforço, podendo ser somente a 3ª ou a 3ª e a 4ª dose.
No entanto, levando em conta a população vacinável, a partir de 3 anos de idade, o percentual reduz: 52,52% tomaram a 1ª dose e 35,8% tomaram a 2ª ou dose única, sendo considerados totalmente vacinados. A dose de reforço, disponível para a população de 18 anos ou mais, tinha sido aplicada em 65,11% da população vacinável, mas o percentual pode estar inflado, já que os estados do Rio de Janeiro, Maranhão, Tocantins e Amapá não distinguem, em seus bancos de dados, os números da 3ª e da 4ª dose.
Os melhores índices de vacinação estão nos estados de São Paulo, que tem 88,56% da população total com a 1ª e a 2ª doses, seguido do Piauí (88,29%), Ceará (85,92%), Paraná (83,19%) e Pernambuco (82,17%). Os estados de Roraima e Amapá têm os piores índices, com apenas 53,3% e 56,34% da população, respectivamente, com a 1ª e a 2ª doses de vacina.
Especialistas alertam para a importância de que a população tome a 3ª e a 4ª doses da vacina, enquanto apontam que a 5ª dose, por agora, não é necessária para todos. Para explicar a importância das doses de reforço para imunização, o pesquisador do ITPS Marcelo Bragatte faz uma analogia entre a resposta do corpo ao vírus e as respostas de um aluno nas provas.
"Como todo estudante, quando não revisamos a matéria, se fizermos uma prova após, digamos, dez meses, nossas respostas não serão as mesmas", observa. "Logo, fica clara a importância das doses de reforço, para conseguirmos, casos expostos, combater o vírus da melhor forma possível", completa. Mais informações sobre como se proteger nesta nova onda de covid-19 podem ser consultadas nesta matéria do Estadão.
O Estadão Verifica tentou contato com a autora do vídeo através do formulário de contato de uma associação presidida por ela, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.