O que estão compartilhando: que as vacinas de mRNA contra a covid-19, como da Pfizer e da Moderna, causam “turbocâncer” e que a ivermectina é útil contra linfomas, leucemias e contra o coronavírus.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. O “turbocâncer” não existe. Trata-se de uma teoria da conspiração disseminada pelo movimento antivacina. Além disso, não existe embasamento científico para associar a ivermectina, um medicamento anti-parasitário, à cura de doenças oncológicas, como afirmaram o Ministério da Saúde, o Instituto Nacional do Câncer (INCA) e a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC). O uso da ivermectina em qualquer contexto relacionado à covid-19 foi amplamente descartado e a substância não está entre os medicamentos listados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para tratamento da doença.
Saiba mais: A postagem usa afirmações do médico canadense William Makis, que já foi desmentido por agências de checagem mundo afora (AFP Checamos, FactCheck.org e Science-Based Medicine).
Ele alega que um artigo científico testou a ivermectina contra 28 tipos de câncer e identificou que a substância é útil contra linfomas e leucemias, mas isso não é verdadeiro. O artigo em questão foi publicado por pesquisadores mexicanos em 2020. O próprio estudo afirma que não é possível tirar as conclusões que Makis divulgou.
O resumo do artigo informa que a ivermectina é um medicamento antiparasitário que exibe efeitos antitumorais em estudos pré-clínicos (ainda não testados em pacientes). O objetivo do trabalho foi determinar se esses efeitos são observáveis em concentrações clinicamente viáveis (ou seja, se é viável para pacientes). Para tal, os estudiosos utilizaram a substância em linhagens de células malignas para avaliar efeitos in vitro (em laboratório) e em camundongos. Os resultados observados foram positivos. Os autores então concluem que os efeitos antitumorais da ivermectina corroboram com testes pré-clínicos.
Isso pode viabilizar o desenvolvimento de novas pesquisas sobre o remédio, mas não garante que a substância seja útil contra linfomas e leucemias e que deva ser usada para essa finalidade. Como explicado pelo Projeto Comprova, coalizão de veículos de imprensa que o Estadão Verifica integra, todo estudo sobre qualquer medicamento passa pelas fases pré-clínica e clínica até que fique comprovado por meio de estudos clínicos randomizados que esse medicamento é eficaz contra uma doença. Os resultados de testes de remédios em animais jamais podem ser extrapolados para seres humanos.
A SBOC informou recentemente ao Comprova que não há embasamento científico para a associação entre a ivermectina e o câncer. A entidade pontuou que atualmente “existem tratamentos eficazes e seguros para a maioria dos tipos de câncer” e destacou que a substituição de terapias comprovadas por alternativas sem evidência científica pode criar riscos para os pacientes. Em julho, o Ministério da Saúde publicou nota em que afirma que a ivermectina não deve ser usada no tratamento contra o câncer. O INCA informou ao Verifica que não há comprovação de qualquer benefício da ivermectina para tratamento da doença.
‘Turbocâncer’ não existe
Outra alegação do médico canadense é de que as vacinas de mRNA contra a covid-19, como a da Pfizer e a da Moderna, causam “turbocânceres” muito resistentes à quimioterapia. Ele acrescentou que a ivermectina poderia superar essa resistência.
O Estadão Verifica já demonstrou que o “turbocâncer” não existe. Trata-se de uma teoria da conspiração criada pelo movimento antivacina para espalhar a mentira de que pessoas vacinadas estariam desenvolvendo câncer de rápido crescimento, principalmente as que receberam doses de mRNA, como da Pfizer e da Moderna.
Leia mais:
No Brasil, o Guia de Imunização do Paciente Oncológico, produzido pela SBOC e pela Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), indica a vacinação contra a covid-19 em pacientes com câncer.
Estudo brasileiro citado no post tem limitações
Na descrição do post, o autor da publicação no Instagram afirma que um estudo feito em Itajaí, em Santa Catarina, comprovou que a ivermectina poderia ter salvado centenas de milhares de pessoas que morreram esperando por medicamentos durante a pandemia de covid-19. Ele acrescenta que a pesquisa demonstrou que aqueles que tomaram doses profiláticas regulares de ivermectina tiveram taxas mais baixas de infecções, hospitalizações e mortes do que aqueles que não tomaram ivermectina regularmente.
Entretanto, o Verifica demonstrou que a pesquisa em questão é uma análise de dados e a metodologia não permite concluir que a ivermectina é eficaz contra o coronavírus. Esse estudo foi publicado na revista Cureus, que, posteriormente, divulgou uma errata ao tomar conhecimento que os autores haviam omitido informações sobre conflitos de interesses.
O uso da ivermectina em qualquer contexto relacionado à covid-19 foi amplamente descartado. A substância não está entre os medicamentos listados pela Anvisa para tratamento da doença.