Um vídeo sobre o resgate do cavalo Caramelo, que ficou ilhado no telhado de uma casa em Canoas, no Rio Grande do Sul, teve grande repercussão nas redes sociais ao afirmar que um grupo tentou impedir o socorro porque a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, havia mandado um helicóptero para a remoção do animal. A alegação é que Janja queria ganhar crédito pelo salvamento de Caramelo, que foi resgatado por bombeiros gaúchos e paulistas.
No entanto, pessoas que participaram do resgate relataram ao Estadão Verifica que a afirmação feita na gravação está descontextualizada e que não houve tentativa de impedir o trabalho de salvamento. O mesmo foi informado pelo Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul.
O vídeo que alega interferência de Janja foi gravado pelo humorista Nego Di e pelo veterinário Bruno Schmitz. O Verifica tentou contato com os dois, mas nenhum respondeu.
O que diz o vídeo
A gravação foi feita no campus da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), onde o animal está sendo tratado. Nas imagens estão o cavalo Caramelo, o veterinário Bruno Schmitz, que participou do resgate, e o humorista Nego Di, responsável por publicar o vídeo em sua conta no X (antigo Twitter). O conteúdo teve 1,7 milhão de visualizações até esta sexta, 17.
Nas imagens, o veterinário explica ter atuado no resgate junto de homens do Corpo de Bombeiros e de voluntários da RTA Brazil, um grupo de resgate técnico de animais sediado em Sorocaba (SP). Ele então é interrompido pelo humorista, que pergunta: “mas não foi a Janja que mandou? Pensei que tinha sido a Janja, não foi ela?”.
Bruno então responde negativamente e afirma que algumas pessoas tentaram impedir o resgate citando Janja. “Tinha um pessoal lá, quando a gente chegou, eles não queriam que a gente chegasse perto do cavalo porque a primeira-dama tinha mandado um helicóptero pra salvar”, afirma.
A alegação é seguida por uma fala de Nego Di sugerindo que Janja queria o protagonismo do caso, que repercutiu após imagens do animal ilhado circularem na mídia: “Tipo assim, ó, deixa ele sofrer mais um pouquinho pra ser a primeira-dama. Só mais meia horinha. Já aguentou cinco”, diz o humorista.
O que outras pessoas que estavam no local relatam
Ao Verifica, o médico veterinário Leonardo Castro, coordenador do grupo RTA Brazil que também esteve na operação, negou ter havido qualquer impedimento do trabalho. Ele relatou como ocorreu a aproximação entre a equipe de resgate e as pessoas que já estavam em um ponto próximo ao cavalo.
Segundo ele, a equipe fazia incursões de barco para localizar o animal quando avistou algumas pessoas em uma laje. Quando os resgatistas se aproximaram desse grupo, as pessoas na laje pediram que a equipe que estava em barcos não se aproximasse, para que o barulho dos motores não assustasse o cavalo, que poderia cair na água. “Eles não queriam que nós nos aproximássemos, mas não foi por impedimento. Eles tinham achado o cavalo e nós não estávamos vendo o cavalo, só eles, então eles falaram ‘não venham aqui porque o cavalo pode se assustar, a primeira-dama já vai enviar um helicóptero’”, relatou Leonardo.
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Em seguida, segundo Leonardo, o Corpo de Bombeiros se identificou e apresentou a equipe como um grupo especializado em resgate de animais de grande porte, o que permitiu uma aproximação tranquila. “Quando a gente se identificou eles super nos trataram bem, nos receberam na laje, foi coordenada uma operação, inclusive com eles, e a partir desse momento foi executada a operação que foi vista por todo mundo”, contou.
Uma das pessoas que estava na laje antes da aproximação da equipe era o vereador Cris Moraes (PV), de Canoas, que trabalha com proteção animal. O contexto relatado por ele à reportagem se assemelha ao do veterinário Leonardo.
Segundo o vereador, ele foi procurado pela primeira-dama, que o colocou em contato com o general Marcelo Zucco, do Exército Brasileiro. Janja informou que poderia ser disponibilizado um helicóptero caso fosse necessário. Quando o vereador e as pessoas que o acompanhavam localizaram o animal, não conseguiram falar com o oficial, porque não havia sinal de celular. Pouco depois, segundo Cris, avistaram os capacetes dos bombeiros e solicitaram que eles se aproximassem devagar para não assustarem o cavalo.
De acordo com Cris Moraes, o grupo subiu na mesma marquise onde ele estava com sua equipe e se apresentou. O vereador então informou que havia um helicóptero que estava a caminho, mas que não estava conseguindo contato via telefone com o Exército. Em seguida, o veterinário explicou ao vereador como poderia ser feito o procedimento sem precisar da aeronave, o que foi avaliado por ele como uma boa opção.
“Não fui eu que dei a autorização, porque eles são autoridades tanto quanto eu neste momento, mas concordei em fazermos”, explicou Cris. “Nós atravessamos, fomos para o outro lado, e eles com todo o cuidado chegaram perto do cavalo”, contou, negando que tenha tentado impedir a operação. “Em momento algum eu disse ‘vocês não podem levar porque o helicóptero está vindo’”.
Cris afirma que foi discutida qual sedação fazer no cavalo, que precisaria ser diferente caso ele fosse resgatado de bote ou caso fosse de helicóptero. “Eu disse: vamos fazer com o que a gente já tem aqui, não vamos esperar porque o helicóptero pode vir em 15 minutos ou pode demorar horas”, afirmou.
O Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul, que também participou da operação, informou que não houve impedimento ao resgate do animal e que não há evidências de solicitação da primeira-dama para aguardar o helicóptero.
Janja nega ter impedido resgate
A assessoria de imprensa de Janja afirmou que não houve tentativa de impedimento do resgate do cavalo Caramelo a mando da primeira-dama.
Em nota, a primeira-dama afirma que se preocupou em articular várias frentes para que o animal fosse resgatado. Janja afirmou ter entrado em contato com voluntários que estavam resgatando outros animais desde o início das enchentes e com o general Hertz Pires, comandante das operações no RS. Ela pediu para que fosse disponibilizado um helicóptero do Exército, visto que aeronaves particulares ou menores não teriam condições de resgatar um animal tão pesado.
Segundo a nota, o Exército estava se movimentando para o resgate quando Janja ligou para o general. “A primeira-dama reforça que sua preocupação sempre foi a de que o animal fosse resgatado e ficasse bem, independente de quem o resgatasse”.
A Ulbra, onde o cavalo está e onde o vídeo foi gravado, informou que o animal segue recebendo tratamento e cuidados dos profissionais do Hospital Veterinário, onde permanecerá por tempo indeterminado.