O que estão compartilhando: postagem no Instagram lista quatro leis “idiotas” que supostamente existem no Brasil. O vídeo afirma ser proibido prender pessoas no dia das eleições e atirar em ladrões a menos que eles atirem antes.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. As duas primeiras leis citadas no post foram distorcidas. O Código Eleitoral estabelece exceções para casos de prisão em período eleitoral, como o flagrante delito. E o Código Penal Brasileiro determina que, em caso de legítima defesa, a pessoa não responde pelo crime.
Saiba mais: Veja abaixo a checagem de cada afirmação feita no vídeo.
É proibido atirar em assaltantes a menos que eles atirem primeiro em você?
Não existe proibição neste sentido na legislação brasileira. Conforme o defensor público do Estado do Pará Allysson Castro, o Código Penal Brasileiro determina causas excludentes de ilicitude, ou seja, casos em que uma pessoa pode praticar uma ação, mas não responder pelo crime. Neste contexto, estão incluídos a legítima defesa e o estado de necessidade.
Entende-se como legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, ou seja, aquela prestes a acontecer. Já o estado de necessidade é a situação em que alguém pratica uma conduta ilícita – como atirar em alguém – para salvar outra pessoa ou a si mesmo de perigo que não causou e nem podia de outro modo evitar.
O defensor destaca que um parágrafo único acrescentado em 2019 ao Código Penal prevê também ser legítima defesa a ação de agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.
É proibido prender pessoas no dia das eleições?
Essa é uma interpretação enganosa do artigo 236 do Código Eleitoral, o que já foi explicado pelo Estadão Verifica. A legislação estabelece que nenhuma autoridade poderá prender qualquer eleitor desde cinco dias antes até 48 horas depois do pleito. Porém, há exceções em três casos: flagrante delito, sentença criminal condenatória por crime inafiançável ou desrespeito a salvo-conduto.
Isso quer dizer que, ao contrário do que afirma o post, quem for flagrado cometendo crimes, por exemplo, pode ser preso no período eleitoral. Isso inclui crimes hediondos, como homicídio. “Caso haja a existência de uma situação de fragrância, qualquer pessoa do povo pode e as autoridades públicas têm o dever de efetuar a prisão em flagrante, sob pena de incorrer em responsabilidade civil, penal e administrativa”, observa o defensor público Allyson Castro.
O post ainda cita de forma enganosa caso divulgado pelo G1 em que um homem se entregou à polícia por matar a esposa em Taboão da Serra (SP), mas acabou liberado devido à lei eleitoral. A situação foi registrada no dia 28 de outubro do ano passado, dois dias antes do segundo turno das eleições presidenciais. O autor da publicação no Instagram omite que naquele momento estavam proibidas prisões que não fossem em flagrante e que o feminicídio havia ocorrido no dia anterior. Conforme o noticiário, a Polícia Civil já possuía um mandado de prisão temporária contra o suspeito, mas não pôde cumpri-lo devido ao período eleitoral.
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As visitas íntimas resultam em mortes e mulheres grávidas que serão sustentadas pelos pagadores de impostos?
O artigo 41 da Lei de Execução Penal estabelece como direito dos presos visitas do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados. De acordo com Allysson Castro, embora não citada especificamente na legislação, a visita íntima é um direito do custodiado. As regras sobre o funcionamento são especificadas por cada Estado, da mesma forma que a visitação geral.
O post cita que as visitas íntimas resultam em mortes, citando o caso de uma mulher assassinada pelo companheiro em um presídio de Jundiaí. Castro destaca, contudo, não haver dados compilados sobre pessoas mortas durante visitas carcerárias. Também não há dados sobre o número de mulheres que engravidam em decorrência de visitas íntimas, outra alegação feita no vídeo.
O post dá a entender que toda criança gerada nessas circunstâncias será mantida pelo Estado, o que não é verdade. Como divulgado pelo Estadão, é previsto o pagamento de auxílio-reclusão, no valor de um salário-mínimo, enquanto benefício previdenciário para os dependentes de um segurado do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que estiver preso em regime fechado.
Desta forma, o pagamento não é para todos, mas para familiares daqueles que contribuíram mensalmente com o INSS nos 24 meses anteriores à prisão. Além disso, a renda média mensal deste preso precisa ter alcançado no máximo R$ 1.754,18 nos 12 meses anteriores. Este valor é referente ao ano de 2023.
Em 2019, a reforma da Previdência trouxe mudanças para o auxílio-reclusão. Pessoas em regime semiaberto que tenham sido presas após 19 junho de 2019, por exemplo, não recebem mais o benefício
Muitos presos aproveitam as saídas temporárias para fugir e cometer crimes?
Não há dados de abrangência nacional atuais sobre as taxas de retorno ou evasão de condenados beneficiados pela saída temporária. Em 2014, o G1 realizou levantamento em todos os Estados e apontou, naquele momento, taxa de evasão de 5,1%. Dos 47.531 presos em regime semiaberto que receberam o benefício nas festas do final de 2012, 2.416 não retornaram às unidades prisionais no início de 2013. O Distrito Federal divulgou o balanço da saída temporária do último final de ano, quando 1.982 custodiados foram beneficiados e 23 apenados não retornaram para os presídios, o que corresponde a 1,16% de evasão. Há notícias de que detentos aproveitam a saída temporária para cometer crimes, mas também não existem estatísticas oficiais sobre a quantidade deles.
A Lei de Execução Penal estabelece as regras para a saída temporária, considerada um benefício para que aqueles que já cumpriram parte da pena e estejam em regime semiaberto possam visitar a família, estudar e participar de atividades que concorram para o retorno ao convívio social.
Caso haja determinação judicial, eles podem ser monitorados por tornozeleira eletrônica e são aplicadas, ainda, algumas condições, como fornecimento do endereço onde reside a família a ser visitada ou onde o condenado poderá ser encontrado durante o benefício. Os presos também devem se recolher à residência visitada no período noturno e não podem frequentar bares e casas noturnas.
Caso o condenado cometa crime ou desobedeça alguma das regras impostas, a saída é cancelada e recuperá-la depende de absolvição no processo penal, de cancelamento de punição disciplinar ou de demonstração do merecimento do condenado.
A saída é de até sete dias. Pode ser renovada por mais quatro vezes durante o ano, ou seja, são aplicadas até cinco saídas anuais. A lei não permite que condenados por crimes hediondos que resultem em morte tenham direito ao benefício.