Médico usa argumento enganoso ao fazer campanha contra vacinação de crianças


Neurocirurgião que já espalhou desinformação sobre covid-19 cita baixa letalidade infantil, mas omite que benefícios superam riscos e que imunização também evita hospitalizações

Por Clarissa Pacheco

Um vídeo gravado por um neurocirurgião propaga a tese enganosa de que pais não devem vacinar seus filhos contra a covid-19 porque a taxa de letalidade da doença é mais baixa na faixa pediátrica. Não é apenas para evitar mortes que vacinas são aplicadas, alerta a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Além disso, o perfil de segurança dos imunizantes contra a covid é conhecido, e autoridades sanitárias brasileiras e estrangeiras recomendam a vacinação, já que os benefícios superam eventuais riscos.

 Foto: Estadão

O material, distribuído em um canal do Telegram e repostado no Facebook, acumulava mais de 165 mil interações até a tarde de 2 de fevereiro de 2022. Nele, o neurocirurgião José Augusto Nasser, conhecido por divulgar vídeos contrários à vacinação infantil, diz que os pais "não se perdoarão" caso os filhos tenham complicações graves e desnecessárias por causa da vacina.

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Para o pediatra infectologista Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP, o alerta deveria ser justamente o contrário: "Como ficam os pais que não vacinam seus filhos e deixam uma criança na UTI, sequelada? Quem vai se responsabilizar pelas mortes das crianças que não foram vacinadas?"

Nasser usa um discurso comum em grupos antivacina, ao chamar o imunizante de "experimento", e diz que não dá para saber o que vai acontecer após a vacinação. Renato Kfouri reforça que as vacinas contra a covid-19 são seguras e que os imunizantes para crianças passaram pelas mesmas etapas que as vacinas aplicadas em adultos: estudos de fase 1, 2 e 3 - antes da aplicação em larga escala - e farmacovigilância, para avaliar efeitos após a aplicação. "Até hoje as vacinas (em crianças), aliás, têm um perfil de segurança até melhor, com menos efeitos adversos, do que em adolescentes", disse o especialista. "Por exemplo, o risco de miocardite é menor nas crianças de 5 a 11 anos do que nos adolescentes de 12 a 17."

Taxa de letalidade baixa

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No início do vídeo, o neurocirurgião, que já foi desmentido pelo Projeto Comprova ao deturpar dados para afirmar que vacina foi causa de abortos, afirma que as crianças têm uma taxa de letalidade por covid de 0,00027%, mencionando a Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. O Estadão Verifica procurou o médico e questionou em qual estudo esse percentual foi apontado, mas não obteve resposta até a publicação desta checagem. Para Renato Kfouri, ao citar o percentual, Nasser se refere à taxa de letalidade da covid em crianças, um dado diferente da taxa de mortalidade, e que é, de fato, muito menor do que em adultos. A taxa de letalidade é calculada a partir do número de mortes em relação ao número de casos confirmados naquela faixa etária. Já a mortalidade é encontrada a partir do número de mortes com relação à população. "A letalidade é baixa, a mortalidade é baixa, na faixa etária pediátrica é menor, isso é óbvio", disse Kfouri. "Mas quando se compara com outras mortalidades, hoje a covid-19 é a doença que mais mata as crianças brasileiras entre as doenças imunopreveníveis. O risco de se pegar uma gripe e morrer é muito menor do que por covid. Há uma mortalidade e uma letalidade de febre amarela muito menor. Mas você não coloca uma vacina no calendário só porque tem mortes. Mata pouco e não precisa vacinar? Não se raciocina assim em saúde pública."

Kfouri destacou que não é só para evitar mortes que as vacinas são aplicadas. "Catapora, gripe, meningite, difteria, pólio, coqueluche, todas essas doenças matam muito menos do que covid, e nem por isso você deixa de vacinar as crianças, porque a vacina é também para prevenir dor, hospitalização, visita a serviço de saúde, síndrome inflamatória mutissistêmica, para ter controle."

Perfil de segurança

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No vídeo, o neurocirurgião afirma que "não dá para saber o que vai acontecer" após a aplicação das vacinas. Ele diz que há muitos vídeos de crianças "que estão sendo levadas a desenvolver complicações graves, desnecessárias", e que tem visto casos de mães com pré-natal perfeito passando pela dor da "perda fetal". Este também é um discurso enganoso e comumente adotado por ativistas antivacina, que associam quadros de AVC e aborto ao imunizante.

Os efeitos adversos graves pós-vacinação contra a covid-19 são raros, como já explicou o Projeto Comprova. O Ministério da Saúde aponta que 92% das reações registradas desde o início da vacinação foram classificadas como não graves. A chance de uma pessoa morrer por conta da covid-19 é 56 vezes maior do que o risco de ela sofrer um evento adverso da vacina considerado grave.

Para Renato Kfouri, a segurança do produto precisa ser colocada na balança, e o benefício das vacinas supera os riscos. "Até hoje não tem mortes relacionadas às vacinas", disse o pediatra.

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Autoridades sanitárias no Brasil e no exterior concordam que os benefícios da vacinação contra a covid-19 em crianças superam os riscos. É o caso do posicionamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do grupo técnico do Ministério da Saúde.

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

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Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Um vídeo gravado por um neurocirurgião propaga a tese enganosa de que pais não devem vacinar seus filhos contra a covid-19 porque a taxa de letalidade da doença é mais baixa na faixa pediátrica. Não é apenas para evitar mortes que vacinas são aplicadas, alerta a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Além disso, o perfil de segurança dos imunizantes contra a covid é conhecido, e autoridades sanitárias brasileiras e estrangeiras recomendam a vacinação, já que os benefícios superam eventuais riscos.

 Foto: Estadão

O material, distribuído em um canal do Telegram e repostado no Facebook, acumulava mais de 165 mil interações até a tarde de 2 de fevereiro de 2022. Nele, o neurocirurgião José Augusto Nasser, conhecido por divulgar vídeos contrários à vacinação infantil, diz que os pais "não se perdoarão" caso os filhos tenham complicações graves e desnecessárias por causa da vacina.

Para o pediatra infectologista Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP, o alerta deveria ser justamente o contrário: "Como ficam os pais que não vacinam seus filhos e deixam uma criança na UTI, sequelada? Quem vai se responsabilizar pelas mortes das crianças que não foram vacinadas?"

Nasser usa um discurso comum em grupos antivacina, ao chamar o imunizante de "experimento", e diz que não dá para saber o que vai acontecer após a vacinação. Renato Kfouri reforça que as vacinas contra a covid-19 são seguras e que os imunizantes para crianças passaram pelas mesmas etapas que as vacinas aplicadas em adultos: estudos de fase 1, 2 e 3 - antes da aplicação em larga escala - e farmacovigilância, para avaliar efeitos após a aplicação. "Até hoje as vacinas (em crianças), aliás, têm um perfil de segurança até melhor, com menos efeitos adversos, do que em adolescentes", disse o especialista. "Por exemplo, o risco de miocardite é menor nas crianças de 5 a 11 anos do que nos adolescentes de 12 a 17."

Taxa de letalidade baixa

No início do vídeo, o neurocirurgião, que já foi desmentido pelo Projeto Comprova ao deturpar dados para afirmar que vacina foi causa de abortos, afirma que as crianças têm uma taxa de letalidade por covid de 0,00027%, mencionando a Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. O Estadão Verifica procurou o médico e questionou em qual estudo esse percentual foi apontado, mas não obteve resposta até a publicação desta checagem. Para Renato Kfouri, ao citar o percentual, Nasser se refere à taxa de letalidade da covid em crianças, um dado diferente da taxa de mortalidade, e que é, de fato, muito menor do que em adultos. A taxa de letalidade é calculada a partir do número de mortes em relação ao número de casos confirmados naquela faixa etária. Já a mortalidade é encontrada a partir do número de mortes com relação à população. "A letalidade é baixa, a mortalidade é baixa, na faixa etária pediátrica é menor, isso é óbvio", disse Kfouri. "Mas quando se compara com outras mortalidades, hoje a covid-19 é a doença que mais mata as crianças brasileiras entre as doenças imunopreveníveis. O risco de se pegar uma gripe e morrer é muito menor do que por covid. Há uma mortalidade e uma letalidade de febre amarela muito menor. Mas você não coloca uma vacina no calendário só porque tem mortes. Mata pouco e não precisa vacinar? Não se raciocina assim em saúde pública."

Kfouri destacou que não é só para evitar mortes que as vacinas são aplicadas. "Catapora, gripe, meningite, difteria, pólio, coqueluche, todas essas doenças matam muito menos do que covid, e nem por isso você deixa de vacinar as crianças, porque a vacina é também para prevenir dor, hospitalização, visita a serviço de saúde, síndrome inflamatória mutissistêmica, para ter controle."

Perfil de segurança

No vídeo, o neurocirurgião afirma que "não dá para saber o que vai acontecer" após a aplicação das vacinas. Ele diz que há muitos vídeos de crianças "que estão sendo levadas a desenvolver complicações graves, desnecessárias", e que tem visto casos de mães com pré-natal perfeito passando pela dor da "perda fetal". Este também é um discurso enganoso e comumente adotado por ativistas antivacina, que associam quadros de AVC e aborto ao imunizante.

Os efeitos adversos graves pós-vacinação contra a covid-19 são raros, como já explicou o Projeto Comprova. O Ministério da Saúde aponta que 92% das reações registradas desde o início da vacinação foram classificadas como não graves. A chance de uma pessoa morrer por conta da covid-19 é 56 vezes maior do que o risco de ela sofrer um evento adverso da vacina considerado grave.

Para Renato Kfouri, a segurança do produto precisa ser colocada na balança, e o benefício das vacinas supera os riscos. "Até hoje não tem mortes relacionadas às vacinas", disse o pediatra.

Autoridades sanitárias no Brasil e no exterior concordam que os benefícios da vacinação contra a covid-19 em crianças superam os riscos. É o caso do posicionamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do grupo técnico do Ministério da Saúde.

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Um vídeo gravado por um neurocirurgião propaga a tese enganosa de que pais não devem vacinar seus filhos contra a covid-19 porque a taxa de letalidade da doença é mais baixa na faixa pediátrica. Não é apenas para evitar mortes que vacinas são aplicadas, alerta a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Além disso, o perfil de segurança dos imunizantes contra a covid é conhecido, e autoridades sanitárias brasileiras e estrangeiras recomendam a vacinação, já que os benefícios superam eventuais riscos.

 Foto: Estadão

O material, distribuído em um canal do Telegram e repostado no Facebook, acumulava mais de 165 mil interações até a tarde de 2 de fevereiro de 2022. Nele, o neurocirurgião José Augusto Nasser, conhecido por divulgar vídeos contrários à vacinação infantil, diz que os pais "não se perdoarão" caso os filhos tenham complicações graves e desnecessárias por causa da vacina.

Para o pediatra infectologista Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP, o alerta deveria ser justamente o contrário: "Como ficam os pais que não vacinam seus filhos e deixam uma criança na UTI, sequelada? Quem vai se responsabilizar pelas mortes das crianças que não foram vacinadas?"

Nasser usa um discurso comum em grupos antivacina, ao chamar o imunizante de "experimento", e diz que não dá para saber o que vai acontecer após a vacinação. Renato Kfouri reforça que as vacinas contra a covid-19 são seguras e que os imunizantes para crianças passaram pelas mesmas etapas que as vacinas aplicadas em adultos: estudos de fase 1, 2 e 3 - antes da aplicação em larga escala - e farmacovigilância, para avaliar efeitos após a aplicação. "Até hoje as vacinas (em crianças), aliás, têm um perfil de segurança até melhor, com menos efeitos adversos, do que em adolescentes", disse o especialista. "Por exemplo, o risco de miocardite é menor nas crianças de 5 a 11 anos do que nos adolescentes de 12 a 17."

Taxa de letalidade baixa

No início do vídeo, o neurocirurgião, que já foi desmentido pelo Projeto Comprova ao deturpar dados para afirmar que vacina foi causa de abortos, afirma que as crianças têm uma taxa de letalidade por covid de 0,00027%, mencionando a Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. O Estadão Verifica procurou o médico e questionou em qual estudo esse percentual foi apontado, mas não obteve resposta até a publicação desta checagem. Para Renato Kfouri, ao citar o percentual, Nasser se refere à taxa de letalidade da covid em crianças, um dado diferente da taxa de mortalidade, e que é, de fato, muito menor do que em adultos. A taxa de letalidade é calculada a partir do número de mortes em relação ao número de casos confirmados naquela faixa etária. Já a mortalidade é encontrada a partir do número de mortes com relação à população. "A letalidade é baixa, a mortalidade é baixa, na faixa etária pediátrica é menor, isso é óbvio", disse Kfouri. "Mas quando se compara com outras mortalidades, hoje a covid-19 é a doença que mais mata as crianças brasileiras entre as doenças imunopreveníveis. O risco de se pegar uma gripe e morrer é muito menor do que por covid. Há uma mortalidade e uma letalidade de febre amarela muito menor. Mas você não coloca uma vacina no calendário só porque tem mortes. Mata pouco e não precisa vacinar? Não se raciocina assim em saúde pública."

Kfouri destacou que não é só para evitar mortes que as vacinas são aplicadas. "Catapora, gripe, meningite, difteria, pólio, coqueluche, todas essas doenças matam muito menos do que covid, e nem por isso você deixa de vacinar as crianças, porque a vacina é também para prevenir dor, hospitalização, visita a serviço de saúde, síndrome inflamatória mutissistêmica, para ter controle."

Perfil de segurança

No vídeo, o neurocirurgião afirma que "não dá para saber o que vai acontecer" após a aplicação das vacinas. Ele diz que há muitos vídeos de crianças "que estão sendo levadas a desenvolver complicações graves, desnecessárias", e que tem visto casos de mães com pré-natal perfeito passando pela dor da "perda fetal". Este também é um discurso enganoso e comumente adotado por ativistas antivacina, que associam quadros de AVC e aborto ao imunizante.

Os efeitos adversos graves pós-vacinação contra a covid-19 são raros, como já explicou o Projeto Comprova. O Ministério da Saúde aponta que 92% das reações registradas desde o início da vacinação foram classificadas como não graves. A chance de uma pessoa morrer por conta da covid-19 é 56 vezes maior do que o risco de ela sofrer um evento adverso da vacina considerado grave.

Para Renato Kfouri, a segurança do produto precisa ser colocada na balança, e o benefício das vacinas supera os riscos. "Até hoje não tem mortes relacionadas às vacinas", disse o pediatra.

Autoridades sanitárias no Brasil e no exterior concordam que os benefícios da vacinação contra a covid-19 em crianças superam os riscos. É o caso do posicionamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do grupo técnico do Ministério da Saúde.

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Um vídeo gravado por um neurocirurgião propaga a tese enganosa de que pais não devem vacinar seus filhos contra a covid-19 porque a taxa de letalidade da doença é mais baixa na faixa pediátrica. Não é apenas para evitar mortes que vacinas são aplicadas, alerta a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Além disso, o perfil de segurança dos imunizantes contra a covid é conhecido, e autoridades sanitárias brasileiras e estrangeiras recomendam a vacinação, já que os benefícios superam eventuais riscos.

 Foto: Estadão

O material, distribuído em um canal do Telegram e repostado no Facebook, acumulava mais de 165 mil interações até a tarde de 2 de fevereiro de 2022. Nele, o neurocirurgião José Augusto Nasser, conhecido por divulgar vídeos contrários à vacinação infantil, diz que os pais "não se perdoarão" caso os filhos tenham complicações graves e desnecessárias por causa da vacina.

Para o pediatra infectologista Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP, o alerta deveria ser justamente o contrário: "Como ficam os pais que não vacinam seus filhos e deixam uma criança na UTI, sequelada? Quem vai se responsabilizar pelas mortes das crianças que não foram vacinadas?"

Nasser usa um discurso comum em grupos antivacina, ao chamar o imunizante de "experimento", e diz que não dá para saber o que vai acontecer após a vacinação. Renato Kfouri reforça que as vacinas contra a covid-19 são seguras e que os imunizantes para crianças passaram pelas mesmas etapas que as vacinas aplicadas em adultos: estudos de fase 1, 2 e 3 - antes da aplicação em larga escala - e farmacovigilância, para avaliar efeitos após a aplicação. "Até hoje as vacinas (em crianças), aliás, têm um perfil de segurança até melhor, com menos efeitos adversos, do que em adolescentes", disse o especialista. "Por exemplo, o risco de miocardite é menor nas crianças de 5 a 11 anos do que nos adolescentes de 12 a 17."

Taxa de letalidade baixa

No início do vídeo, o neurocirurgião, que já foi desmentido pelo Projeto Comprova ao deturpar dados para afirmar que vacina foi causa de abortos, afirma que as crianças têm uma taxa de letalidade por covid de 0,00027%, mencionando a Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. O Estadão Verifica procurou o médico e questionou em qual estudo esse percentual foi apontado, mas não obteve resposta até a publicação desta checagem. Para Renato Kfouri, ao citar o percentual, Nasser se refere à taxa de letalidade da covid em crianças, um dado diferente da taxa de mortalidade, e que é, de fato, muito menor do que em adultos. A taxa de letalidade é calculada a partir do número de mortes em relação ao número de casos confirmados naquela faixa etária. Já a mortalidade é encontrada a partir do número de mortes com relação à população. "A letalidade é baixa, a mortalidade é baixa, na faixa etária pediátrica é menor, isso é óbvio", disse Kfouri. "Mas quando se compara com outras mortalidades, hoje a covid-19 é a doença que mais mata as crianças brasileiras entre as doenças imunopreveníveis. O risco de se pegar uma gripe e morrer é muito menor do que por covid. Há uma mortalidade e uma letalidade de febre amarela muito menor. Mas você não coloca uma vacina no calendário só porque tem mortes. Mata pouco e não precisa vacinar? Não se raciocina assim em saúde pública."

Kfouri destacou que não é só para evitar mortes que as vacinas são aplicadas. "Catapora, gripe, meningite, difteria, pólio, coqueluche, todas essas doenças matam muito menos do que covid, e nem por isso você deixa de vacinar as crianças, porque a vacina é também para prevenir dor, hospitalização, visita a serviço de saúde, síndrome inflamatória mutissistêmica, para ter controle."

Perfil de segurança

No vídeo, o neurocirurgião afirma que "não dá para saber o que vai acontecer" após a aplicação das vacinas. Ele diz que há muitos vídeos de crianças "que estão sendo levadas a desenvolver complicações graves, desnecessárias", e que tem visto casos de mães com pré-natal perfeito passando pela dor da "perda fetal". Este também é um discurso enganoso e comumente adotado por ativistas antivacina, que associam quadros de AVC e aborto ao imunizante.

Os efeitos adversos graves pós-vacinação contra a covid-19 são raros, como já explicou o Projeto Comprova. O Ministério da Saúde aponta que 92% das reações registradas desde o início da vacinação foram classificadas como não graves. A chance de uma pessoa morrer por conta da covid-19 é 56 vezes maior do que o risco de ela sofrer um evento adverso da vacina considerado grave.

Para Renato Kfouri, a segurança do produto precisa ser colocada na balança, e o benefício das vacinas supera os riscos. "Até hoje não tem mortes relacionadas às vacinas", disse o pediatra.

Autoridades sanitárias no Brasil e no exterior concordam que os benefícios da vacinação contra a covid-19 em crianças superam os riscos. É o caso do posicionamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do grupo técnico do Ministério da Saúde.

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

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