Um vídeo de uma operação da Polícia Militar de Goiás, que encontrou ouro escondido em uma peça mecânica, está circulando com a legenda falsa de que o flagrante estaria relacionado com uma suposta atuação irregular de ONGs na Amazônia. Notícias sobre o ocorrido não trazem nenhum indício nesse sentido, e um dos responsáveis pela abordagem negou a versão espalhada em posts nas redes sociais.
O conteúdo checado pelo Estadão Verifica traz um vídeo de um minuto e meio de duração e mostra um policial militar abrindo uma espécie de motor e retirando pedaços de espuma e pacotes com pequenas barras de ouro embrulhadas em papel. O boato então acrescenta a informação falsa de que o material pertenceria a uma ONG e insinua que esse tipo de organização ambientalista pratica crimes na Amazônia.
O blog então pesquisou no Google os termos "Exército apreensão ouro" e chegou a uma reportagem do site Metrópoles que explica a cena. No dia 18 de fevereiro deste ano, o Comando de Operações de Divisas (COD) da Polícia Militar de Goiás (PM-GO) apreendeu 19 barras de ouro em uma abordagem de veículo na cidade de Montes Claros de Goiás, que fica perto da divisa com o Mato Grosso e a cerca de 270 quilômetros de Goiânia.
Juntas, as barras somaram 11,3 quilos, o que resulta em uma estimativa de valor de mercado de R$ 4,2 milhões. O ouro era transportado por dois homens em uma caminhonete, estava escondido dentro de uma peça mecânica e teria sido extraído em um garimpo ilegal no Pará. Não foi divulgado qualquer indício de participação de ONGs no caso.
O momento em que um dos policiais encontra o ouro dentro do equipamento pode ser visto na gravação divulgada pelo Metrópoles em seu canal no YouTube. As imagens também aparecem em um programa da TV Anhanguera, afiliada da TV Globo em Goiás.
O blog ainda consultou outras notícias sobre o assunto (G1, Mais Goiás, Jornal Opção, Jornal do Vale) e o material de divulgação oficial da PM-GO, mas nenhuma dessas fontes cita o nome de qualquer ONG na história.
Segundo relato do subcomandante do COD, capitão Renyson Castanheira, os dois suspeitos se apresentaram como advogado e segurança e admitiram que se tratava de uma carga obtida em garimpo ilegal. Os nomes dos envolvidos não foram divulgados. Um deles tinha antecedentes criminais por porte ilegal de arma.
Ainda segundo o relato de Castanheira, a carga teria sido obtida no Pará, passado pelo Mato Grosso e seria entregue para empresários de Goiânia. Toda a extensão territorial do Pará faz parte da Amazônia Legal, o que indica que a extração pode ter realmente ocorrido nessa área -- que sofre historicamente com esse problema, a exemplo da crise recente das águas turvas no distrito de Alter do Chão.
O Estadão Verifica tentou contato com a Secretaria de Segurança Pública do Estado e com a Polícia Militar de Goiás para esclarecer se existe algum indício de que os homens detidos trabalhavam para alguma ONG, mas não teve resposta até a publicação desta checagem.
Em entrevista para o Aos Fatos, o subcomandante confirmou que o minério era originário de garimpos ilegais do Pará e do Mato Grosso e que o transporte do ouro havia sido acertado com um empresário de Goiás que era proprietário do veículo abordado. O nome dessa pessoa não foi divulgado, mas Castanheira declarou que ela não tem relação com ONGs.
A mesma peça de desinformação foi desmentida por Boatos.org e MonitoR7.
Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.
Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.