Mensagens enganosas no Facebook e no WhatsApp espalham uma versão distorcida de um artigo escrito pelo cineasta Arnaldo Jabor, em 2006, com críticas ao PT e ao ex-presidente Lula (PT). Além de alterar trechos do texto original, o conteúdo falso acrescenta referências a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e ao governo da ex-presidente Dilma Rousseff, que só assumiu a presidência da República em 2011.
Leitores pediram a checagem deste boato pelo WhatsApp do Estadão Verifica, (11) 97683-7490.
O artigo de opinião de Jabor foi publicado na edição de 25 de abril de 2006 do jornal O Globo. A coluna, de fato, faz duras críticas ao governo Lula e chega a classificar o petista como "psicopata" e mentiroso. Já a versão adulterada circula nas redes sociais desde pelo menos 2016. Repleto de distorções, o conteúdo enganoso voltou a circular dias após o ministro do STF Edson Fachin anular as sentenças do ex-presidente Lula no âmbito da Lava Jato.
Enquanto o texto original acusa o PT de tentar se perpetuar no poder por 20 anos, a mensagem enganosa eleva o número para 70 anos e inventa uma comparação com a União Soviética. A versão distorcida ainda menciona os nomes de cinco juízes do STF, que não são citados na coluna de Arnaldo Jabor. Repare no exemplo abaixo:
Original:
"[...] o Judiciário paralítico entoca todos os crimes na fortaleza da lentidão e da impunidade. Só daqui a dois anos serão julgados os indiciados - nos comunica o STF. Os delitos são esquecidos, empacotados, prescrevem. A Lei protege os crimes e regulamenta a própria desmoralização".
Falso:
"o Judiciário paralítico entoca a maioria dos crimes, na Fortaleza da lentidão e da impunidade, à exceção do STF, que, só daqui a seis meses, na melhor das hipóteses, serão concluídos os julgamentos iniciais da trupe, diz o STF. Parte dos delitos são esquecidos, empacotados, prescrevem, com a ajuda sempre presente, dos TÓFFOLIS e dos LEVANDOWISKIS. (Some-se a estes dois: Marco Aurélio, Gilmar Mendes e Rosa Weber). A Lei protege os crimes e regulamenta a própria desmoralização"
Em outra passagem, o texto modificado diz que um relatório da CPI dos Correios e o parecer do procurador-geral da República enquadraram "39 quadrilheiros do escândalo do MENSALÃO. Faltou o CHEFÃO". O conteúdo original cita os dois documentos, mas não usa a palavra quadrilheiros nem cita explicitamente o escândalo de corrupção.
Texto não foi censurado
As mensagens que circulam nas redes também erram ao afirmar que o texto de Arnaldo Jabor foi retirado da rádio CBN por uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Na verdade, a corte mandou o veículo suspender um comentário do cineasta que foi ao ar em outubro de 2006 e não tinha conexão com o artigo publicado no O Globo.
O discurso retirado de Jabor oferecia uma análise opinativa do debate presidencial entre Lula e Geraldo Alckmin (PSDB). A decisão do TSE atendeu a uma ação da campanha do petista que acusou o comentarista da CBN de exaltar o tucano e se referir de forma negativa ao então presidente.
Segundo o site Consultor Jurídico, ministros do tribunal argumentaram que o conteúdo feriu a legislação, que proíbe emissoras de rádio e TV de rádio de emitir opinião positiva ou contrária a um candidato durante a campanha eleitoral.
Colunista já foi alvo de desinformação
O tom alarmista do texto adulterado é um fator comum a boatos falsos nas redes sociais. Ao afirmar que o artigo foi censurado, o post sugere que o conteúdo trata de um assunto urgente, exclusivo e importante que merece ser compartilhado.
Vale ressaltar também que o nome de Arnaldo Jabor já foi enganosamente associado a outros textos virais em plataformas digitais. Em setembro de 2018, o Estadão Verifica desmentiu que o cineasta seria autor de um artigo de apoio à candidatura de Jair Bolsonaro à presidência. O próprio Jabor chegou a escrever um artigo na edição do Globo de 03 de novembro de 2009 em que reclama do uso inapropriado de seu nome na internet. /COLABOROU BRENDA ZACHARIAS