Projeto de lei no Senado não prevê 'prisão religiosa' por pregação em horas impróprias


Matéria já aprovada na Câmara regulamenta limite de decibéis emitidos por templos de qualquer crença religiosa e define que punições só devem ocorrer em caso de reincidência; texto tramita no Senado desde 2019

Por Clarissa Pacheco

É falso um texto que circula em grupos de WhatsApp com o alerta de que o Senado Federal teria começado a debater um projeto de lei que prevê "prisão religiosa" para quem fizer pregações em horas impróprias. No texto compartilhado no aplicativo de troca de mensagens, um autor desconhecido afirma que o Senado está debatendo uma "lei de proteção doméstica" com o objetivo de punir congregações que têm "um grande volume no momento de celebrar sua adoração". Mas não existe nenhum projeto de lei em tramitação com esse teor. O que existe é uma proposta para fixar um limite de decibéis emitidos em atividades religiosas -- e a pena para descumprimento da regra é uma multa, não a prisão.

Leitores do Estadão Verifica solicitaram a checagem deste conteúdo através do WhatsApp, no número (11) 97683-7490.

 Foto: Estadão
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A corrente afirma que os senadores estariam estudando punir religiosos que abordam pessoas nas ruas e visitam  casas. Além disso, a imposição da leitura da Bíblia seria enquadrada como violação da liberdade de culto. O texto no WhatsApp não cita o número do projeto de lei que estaria sendo debatido, mas o Senado já havia identificado, em junho de 2020, que o PL 5.100/2019 estava sendo alvo de desinformação. Naquela época, o projeto era chamado em correntes de WhatsApp de "Lei da proteção doméstica". Em março deste ano, o boato foi "reciclado" e voltou a circular com mais alegações falsas, como a de que o texto discutido previa prisão religiosa contra quem pregasse em horas impróprias.

A matéria trata, na verdade, de poluição sonora por templos de qualquer crença religiosa. Nenhuma das punições previstas no projeto, que já foi aprovado na Câmara dos Deputados e agora tramita no Senado, fala em prisão, tampouco religiosa.

O que diz o projeto de lei

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O texto original é da autoria do deputado federal Carlos Gomes (Republicanos/RS) e foi enviado à Câmara em 2 de março de 2015, sob o número PL 524/2015. Depois de passar por todas as comissões da Câmara, o texto final foi aprovado em julho de 2019 e seguiu para tramitação no Senado com o número PL 5.100/2019. Ele ainda tramita na Comissão de Meio Ambiente (CMA) e a última atualização foi em 16 de fevereiro de 2022, quando chegou às mãos do relator, o senador Vanderlan Cardoso (PSD/GO),

O PL busca estabelecer um limite de decibéis emitidos a partir da atividade em templos religiosos em zonas industriais, comerciais e residenciais. Em área industrial, o projeto prevê um limite de 85 decibéis durante o dia e 75 à noite, entre 22h e 6h; em área comercial, o limite varia de 80 decibéis durante o dia e 70 à noite; já em áreas comerciais, o limite deve ser de 75 decibéis durante o dia e 65 à noite.

O deputado Carlos Gomes, que é pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, justificou o projeto de lei ao afirmar que não há uma norma sobre limites sonoros na Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que contemple a atividade em templos religiosos. Segundo ele, a falta de uma norma efetiva para atividades religiosas comunitárias "tem levado a uma série de arbitrariedades na aplicação de multas que, por seus valores elevados, não raro tem ocasionado o fechamento de muitas igrejas no Brasil, cerceando o exercício da liberdade religiosa de milhares de pessoas".

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De acordo com o texto aprovado na Câmara, deverão ser feitas três aferições de emissão sonora com intervalo de 15 minutos entre elas antes de se constatar, de fato, que houve excesso, ao passo em que as punições só devem ser aplicadas se os templos religiosos não cumprirem as medidas definidas pelos órgãos de fiscalização. O prazo para adoção das providências é de 90 a 180 dias contados da data da autuação.

Punições

O artigo 4º do projeto de lei ainda define que as sanções previstas na lei nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente) só devem ser aplicadas em caso de reincidência. Na prática, o projeto de lei que tramita no Senado desde 2019 mais dificulta do que facilita as punições, diferentemente do que insinua o texto viral que circula no WhatsApp. Além disso, nenhuma das sanções previstas no projeto de lei se aproxima do que diz o texto da corrente.

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As sanções por descumprimento à Política Nacional do Meio Ambiente, no que diz respeito à aos "inconvenientes e danos causados ao meio ambiente e a terceiros", estão previstas no artigo 14 da lei 6.938/1981. Eles vão de multas simples ou diária em caso de reincidência, perda ou restrição de incentivos ou benefícios fiscais, perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento de estabelecimentos oficiais e, em último caso, suspensão da atividade.

Não há nenhuma menção a prisão ou a qualquer medida que impeça pregações em horários específicos, nem que proíba que as pessoas sejam abordadas na rua ou em suas casas. Esse tipo de ação não é proibida, desde que não haja violação do domicílio, ou seja, que ninguém entre ou permaneça em casa alheia contra a vontade expressa de seu dono, como define o artigo 150 do Código Penal.

A imposição da leitura da Bíblia não é mencionada no texto do projeto de lei, mas o Brasil é um Estado laico e todas as religiões, segundo a Constituição Federal de 1988, contam com a proteção estatal. Não é permitido, portanto, que a leitura da Bíblia ou de qualquer outro livro religioso seja imposta aos cidadãos, que têm liberdade de culto. No ano passado, o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucionais leis que obrigassem escolas a terem ao menos um exemplar da Bíblia.

É falso um texto que circula em grupos de WhatsApp com o alerta de que o Senado Federal teria começado a debater um projeto de lei que prevê "prisão religiosa" para quem fizer pregações em horas impróprias. No texto compartilhado no aplicativo de troca de mensagens, um autor desconhecido afirma que o Senado está debatendo uma "lei de proteção doméstica" com o objetivo de punir congregações que têm "um grande volume no momento de celebrar sua adoração". Mas não existe nenhum projeto de lei em tramitação com esse teor. O que existe é uma proposta para fixar um limite de decibéis emitidos em atividades religiosas -- e a pena para descumprimento da regra é uma multa, não a prisão.

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A corrente afirma que os senadores estariam estudando punir religiosos que abordam pessoas nas ruas e visitam  casas. Além disso, a imposição da leitura da Bíblia seria enquadrada como violação da liberdade de culto. O texto no WhatsApp não cita o número do projeto de lei que estaria sendo debatido, mas o Senado já havia identificado, em junho de 2020, que o PL 5.100/2019 estava sendo alvo de desinformação. Naquela época, o projeto era chamado em correntes de WhatsApp de "Lei da proteção doméstica". Em março deste ano, o boato foi "reciclado" e voltou a circular com mais alegações falsas, como a de que o texto discutido previa prisão religiosa contra quem pregasse em horas impróprias.

A matéria trata, na verdade, de poluição sonora por templos de qualquer crença religiosa. Nenhuma das punições previstas no projeto, que já foi aprovado na Câmara dos Deputados e agora tramita no Senado, fala em prisão, tampouco religiosa.

O que diz o projeto de lei

O texto original é da autoria do deputado federal Carlos Gomes (Republicanos/RS) e foi enviado à Câmara em 2 de março de 2015, sob o número PL 524/2015. Depois de passar por todas as comissões da Câmara, o texto final foi aprovado em julho de 2019 e seguiu para tramitação no Senado com o número PL 5.100/2019. Ele ainda tramita na Comissão de Meio Ambiente (CMA) e a última atualização foi em 16 de fevereiro de 2022, quando chegou às mãos do relator, o senador Vanderlan Cardoso (PSD/GO),

O PL busca estabelecer um limite de decibéis emitidos a partir da atividade em templos religiosos em zonas industriais, comerciais e residenciais. Em área industrial, o projeto prevê um limite de 85 decibéis durante o dia e 75 à noite, entre 22h e 6h; em área comercial, o limite varia de 80 decibéis durante o dia e 70 à noite; já em áreas comerciais, o limite deve ser de 75 decibéis durante o dia e 65 à noite.

O deputado Carlos Gomes, que é pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, justificou o projeto de lei ao afirmar que não há uma norma sobre limites sonoros na Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que contemple a atividade em templos religiosos. Segundo ele, a falta de uma norma efetiva para atividades religiosas comunitárias "tem levado a uma série de arbitrariedades na aplicação de multas que, por seus valores elevados, não raro tem ocasionado o fechamento de muitas igrejas no Brasil, cerceando o exercício da liberdade religiosa de milhares de pessoas".

De acordo com o texto aprovado na Câmara, deverão ser feitas três aferições de emissão sonora com intervalo de 15 minutos entre elas antes de se constatar, de fato, que houve excesso, ao passo em que as punições só devem ser aplicadas se os templos religiosos não cumprirem as medidas definidas pelos órgãos de fiscalização. O prazo para adoção das providências é de 90 a 180 dias contados da data da autuação.

Punições

O artigo 4º do projeto de lei ainda define que as sanções previstas na lei nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente) só devem ser aplicadas em caso de reincidência. Na prática, o projeto de lei que tramita no Senado desde 2019 mais dificulta do que facilita as punições, diferentemente do que insinua o texto viral que circula no WhatsApp. Além disso, nenhuma das sanções previstas no projeto de lei se aproxima do que diz o texto da corrente.

As sanções por descumprimento à Política Nacional do Meio Ambiente, no que diz respeito à aos "inconvenientes e danos causados ao meio ambiente e a terceiros", estão previstas no artigo 14 da lei 6.938/1981. Eles vão de multas simples ou diária em caso de reincidência, perda ou restrição de incentivos ou benefícios fiscais, perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento de estabelecimentos oficiais e, em último caso, suspensão da atividade.

Não há nenhuma menção a prisão ou a qualquer medida que impeça pregações em horários específicos, nem que proíba que as pessoas sejam abordadas na rua ou em suas casas. Esse tipo de ação não é proibida, desde que não haja violação do domicílio, ou seja, que ninguém entre ou permaneça em casa alheia contra a vontade expressa de seu dono, como define o artigo 150 do Código Penal.

A imposição da leitura da Bíblia não é mencionada no texto do projeto de lei, mas o Brasil é um Estado laico e todas as religiões, segundo a Constituição Federal de 1988, contam com a proteção estatal. Não é permitido, portanto, que a leitura da Bíblia ou de qualquer outro livro religioso seja imposta aos cidadãos, que têm liberdade de culto. No ano passado, o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucionais leis que obrigassem escolas a terem ao menos um exemplar da Bíblia.

É falso um texto que circula em grupos de WhatsApp com o alerta de que o Senado Federal teria começado a debater um projeto de lei que prevê "prisão religiosa" para quem fizer pregações em horas impróprias. No texto compartilhado no aplicativo de troca de mensagens, um autor desconhecido afirma que o Senado está debatendo uma "lei de proteção doméstica" com o objetivo de punir congregações que têm "um grande volume no momento de celebrar sua adoração". Mas não existe nenhum projeto de lei em tramitação com esse teor. O que existe é uma proposta para fixar um limite de decibéis emitidos em atividades religiosas -- e a pena para descumprimento da regra é uma multa, não a prisão.

Leitores do Estadão Verifica solicitaram a checagem deste conteúdo através do WhatsApp, no número (11) 97683-7490.

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A corrente afirma que os senadores estariam estudando punir religiosos que abordam pessoas nas ruas e visitam  casas. Além disso, a imposição da leitura da Bíblia seria enquadrada como violação da liberdade de culto. O texto no WhatsApp não cita o número do projeto de lei que estaria sendo debatido, mas o Senado já havia identificado, em junho de 2020, que o PL 5.100/2019 estava sendo alvo de desinformação. Naquela época, o projeto era chamado em correntes de WhatsApp de "Lei da proteção doméstica". Em março deste ano, o boato foi "reciclado" e voltou a circular com mais alegações falsas, como a de que o texto discutido previa prisão religiosa contra quem pregasse em horas impróprias.

A matéria trata, na verdade, de poluição sonora por templos de qualquer crença religiosa. Nenhuma das punições previstas no projeto, que já foi aprovado na Câmara dos Deputados e agora tramita no Senado, fala em prisão, tampouco religiosa.

O que diz o projeto de lei

O texto original é da autoria do deputado federal Carlos Gomes (Republicanos/RS) e foi enviado à Câmara em 2 de março de 2015, sob o número PL 524/2015. Depois de passar por todas as comissões da Câmara, o texto final foi aprovado em julho de 2019 e seguiu para tramitação no Senado com o número PL 5.100/2019. Ele ainda tramita na Comissão de Meio Ambiente (CMA) e a última atualização foi em 16 de fevereiro de 2022, quando chegou às mãos do relator, o senador Vanderlan Cardoso (PSD/GO),

O PL busca estabelecer um limite de decibéis emitidos a partir da atividade em templos religiosos em zonas industriais, comerciais e residenciais. Em área industrial, o projeto prevê um limite de 85 decibéis durante o dia e 75 à noite, entre 22h e 6h; em área comercial, o limite varia de 80 decibéis durante o dia e 70 à noite; já em áreas comerciais, o limite deve ser de 75 decibéis durante o dia e 65 à noite.

O deputado Carlos Gomes, que é pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, justificou o projeto de lei ao afirmar que não há uma norma sobre limites sonoros na Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que contemple a atividade em templos religiosos. Segundo ele, a falta de uma norma efetiva para atividades religiosas comunitárias "tem levado a uma série de arbitrariedades na aplicação de multas que, por seus valores elevados, não raro tem ocasionado o fechamento de muitas igrejas no Brasil, cerceando o exercício da liberdade religiosa de milhares de pessoas".

De acordo com o texto aprovado na Câmara, deverão ser feitas três aferições de emissão sonora com intervalo de 15 minutos entre elas antes de se constatar, de fato, que houve excesso, ao passo em que as punições só devem ser aplicadas se os templos religiosos não cumprirem as medidas definidas pelos órgãos de fiscalização. O prazo para adoção das providências é de 90 a 180 dias contados da data da autuação.

Punições

O artigo 4º do projeto de lei ainda define que as sanções previstas na lei nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente) só devem ser aplicadas em caso de reincidência. Na prática, o projeto de lei que tramita no Senado desde 2019 mais dificulta do que facilita as punições, diferentemente do que insinua o texto viral que circula no WhatsApp. Além disso, nenhuma das sanções previstas no projeto de lei se aproxima do que diz o texto da corrente.

As sanções por descumprimento à Política Nacional do Meio Ambiente, no que diz respeito à aos "inconvenientes e danos causados ao meio ambiente e a terceiros", estão previstas no artigo 14 da lei 6.938/1981. Eles vão de multas simples ou diária em caso de reincidência, perda ou restrição de incentivos ou benefícios fiscais, perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento de estabelecimentos oficiais e, em último caso, suspensão da atividade.

Não há nenhuma menção a prisão ou a qualquer medida que impeça pregações em horários específicos, nem que proíba que as pessoas sejam abordadas na rua ou em suas casas. Esse tipo de ação não é proibida, desde que não haja violação do domicílio, ou seja, que ninguém entre ou permaneça em casa alheia contra a vontade expressa de seu dono, como define o artigo 150 do Código Penal.

A imposição da leitura da Bíblia não é mencionada no texto do projeto de lei, mas o Brasil é um Estado laico e todas as religiões, segundo a Constituição Federal de 1988, contam com a proteção estatal. Não é permitido, portanto, que a leitura da Bíblia ou de qualquer outro livro religioso seja imposta aos cidadãos, que têm liberdade de culto. No ano passado, o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucionais leis que obrigassem escolas a terem ao menos um exemplar da Bíblia.

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