O que estão compartilhando: que a suramina “cura” o autismo.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. A Bayer, responsável pela fabricação do remédio suramin, afirmou que não há indicação em bula para uso do medicamento para tratamento do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Especialistas consultados pelo Verifica afirmam que não há eficácia comprovada de benefício da suramina para sintomas de pessoas autistas.
Leia também
Saiba mais: postagens no X e Telegram alegam que o autismo é uma “doença” causada por vacinas. No entanto, a relação com a vacina já foi desmentida diversas vezes e, como mostrou o Verifica, há consenso científico de que imunizantes não estão associados ao TEA. Além disso, o autismo não é uma doença, e sim um transtorno (leia mais abaixo).
Ainda de acordo com as peças verificadas, a “cura” para o autismo seria o suramin, fármaco antiparasitário desenvolvido pelo laboratório alemão Bayer. À reportagem, a farmacêutica afirmou que não há indicação em bula do suramin para uso relacionado ao autismo.
Suramina não tem eficácia comprovada para autismo
Como mostrou o Estadão Verifica em outra checagem, o suramin é um composto criado em 1916 pela Bayer. Foi o primeiro medicamento eficaz para tratar a Tripanossomíase Humana Africana, conhecida como doença do sono, que ocorre na África equatorial.
De acordo com a Bayer, o suramin é reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como medicamento essencial para tratar doenças tropicais como a doença do sono, a doença de Chagas, a teníase e a oncocercose.
A farmacêutica alemã informou que o medicamento não é comercializado no Brasil, fato confirmado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). De acordo com a agência reguladora, não há registro para medicamentos com a substância suramina no Brasil. Consequentemente, não existem indicações aprovadas pela Anvisa para o produto.
Segundo as postagens verificadas, apenas uma dose de suramina teria sido eficaz para fazer com que crianças autistas não verbais começassem a falar. O efeito do medicamento teria levado nove horas. No entanto, não há indícios de que isso seja verdade.
O psiquiatra da Infância e Adolescência Mauro Victor de Medeiros Filho, chefe da Enfermaria Infantil do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Hcfmusp), alerta que não existe, na literatura médica, nenhum remédio que “cure” os sintomas de autismo, principalmente na área de socialização, comunicação e fala.
Autismo não é doença, nem é causado por vacinas
De acordo com a OMS, o autismo é caracterizado por algum grau de dificuldade de interação social e comunicação. Conforme a organização, avaliações estimam que uma criança em cada 100 é autista no mundo todo.
O neurologista infantil Alexandre Fernandes, professor associado da Universidade Federal Fluminense (UFF) e presidente do Departamento Científico de Neurologia Infantil da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), explica que o autismo não é uma doença, e sim um transtorno.
Leia mais
As peças verificadas afirmam que o autismo seria causado pelas vacinas – alegação já desmentida em outras ocasiões. Não há evidências que provem ligação entre vacinas e autismo, segundo a OMS. De acordo com a organização, evidências científicas sugerem que fatores genéticos e ambientais podem contribuir para o aparecimento do autismo.
“O autismo é um transtorno caracterizado por dificuldade de socialização, transtornos de linguagem e comportamentos específicos. Nós não sabemos a causa do autismo, ele é multifatorial”, explicou o neurologista.
De acordo com Mauro Victor, o autismo é um “conjunto de sintomas e sinais que estão presentes em crianças”, sem uma causa bem definida. O psiquiatra explica que uma doença apresenta um caminho para a causa, enquanto transtornos são influenciados por diversos fatores, mas a ciência ainda não tem certeza qual é o causador.
“O que a gente tem na literatura são fatores de risco. Por exemplo, o uso de alguns remédios durante a gestação ou uma gestação acima de 35 anos e 40 anos para mulheres e homens, respectivamente. Mas isso não quer dizer que esses riscos causem diretamente autismo”, exemplificou Mauro Victor.
Como lidar com postagens do tipo: é comum que conteúdos virais nas redes sociais recomendem “curas milagrosas”, sem comprovação científica, para o autismo. Com base em recomendações da Academia Americana de Pediatria, o Verifica listou algumas dicas para identificar falsos tratamentos para o TEA. Leia aqui.