O que estão compartilhando: que em vídeo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) reconheceu que as vacinas contra a covid-19 são um risco para crianças e causam miocardite e pericardite.
O Estadão checou e concluiu que: é falso. A Anvisa e o Ministério da Saúde garantem que a vacinação contra a covid-19 se mantém segura para todos os públicos, que reações adversas são raras e que a imunização evita complicações graves da doença.
O conteúdo analisado faz uma edição de trechos do comunicado público feito pela agência em 2021 sobre a aprovação da vacina Comirnaty, da Pfizer, para crianças de 5 a 11 anos de idade. No vídeo original, Meiruze Sousa Freitas, diretora da Segunda Diretoria da Anvisa, faz recomendações ao Programa Nacional de Imunizações (PNI) caso a Saúde decidisse pela vacinação da faixa etária. O post omite trechos em que a especialista cita a importância da vacinação para redução da circulação do vírus e de formas graves da doença. A postagem ainda desconsidera que os órgãos de saúde esclarecem que a ocorrência de miocardite e pericardite associado às vacinas contra a covid-19 é baixa.
Saiba mais: Postagem usa trechos recortados de vídeo da Anvisa de 2021 sobre a aprovação do uso da vacina Comirnaty, da Pfizer, para crianças de 5 a 11 anos de idade. O conteúdo retira de contexto partes da fala original de Meiruze Sousa Freitas, diretora da Segunda Diretoria da agência, em que ela dá instruções sobre a administração da vacina. A legenda da publicação incentiva que pais não imunizem seus filhos, com a indicação de que há problemas no imunizante e que ele causa miocardite e pericardite.
É falso que a Anvisa reconheça que “a vacina é um risco para crianças”. A aprovação da Comirnaty foi feita com a intenção de prevenir doenças graves, potencialmente fatais ou condições que podem ser causadas pela covid-19. O imunizante da Pfizer foi avaliado a partir de critérios rigorosos e com a participação de especialistas em pediatria e imunologia, como evidencia o comunicado da agência de saúde.
Em nota técnica divulgada ontem, 22, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mostra que a efetividade das vacinas contra covid-19 usadas em crianças e adolescentes é de quase 90%, e os efeitos adversos graves são raramente relatados. No texto, a fundação evidenciou que o coronavírus foi a principal causa de morte por doença prevenível por vacina, em menores de 19 anos, entre agosto de 2021 e julho de 2022.
Apesar da taxa de mortalidade pela covid-19 ser de 4,3 mortes por 100 mil para menores de 1 ano e 0,6 por 100 mil para crianças de 1 a 4 anos, a Fiocruz afirmou que a vacinação contra a doença no Brasil continua abaixo do esperado. Na faixa etária de 3 a 4 anos de idade, menos de 25% têm as duas doses.
Publicação retira de contexto e distorce falas de diretora da Anvisa
No comunicado público feito em 16 de dezembro de 2021 no canal do YouTube da Anvisa, o órgão sanitário divulga que a vacina foi aprovada para a faixa etária e faz recomendações de condições que devem ser observadas pelo Ministério da Saúde. O imunizante da Pfizer também havia sido aprovado pela agência de saúde dos Estados Unidos, Canadá, União Europeia e outros 60 países.
Em sua fala completa, Meiruze Freitas detalha o processo para a aprovação da vacina e quais métodos devem ser garantidos pelos profissionais de saúde para a aplicação. Ela ainda defende a criação de um plano específico de imunização para o público infantil e evidencia a necessidade de monitoramento contínuo de dados. A especialista deixa claro que a vacinação coletiva diminui a transmissão da covid na faixa etária e reduz o impacto na educação das crianças – que ficaram sem aulas presenciais.
Entre as principais recomendações da diretora, estão a necessidade de salas específicas para a vacinação de crianças, o que é distorcido na publicação analisada com a alegação de que os pequenos podiam passar mal e por isso deveriam permanecer nos postos de saúde. Meiruze reitera que a medida visa “evitar erros de administração do imunizante”, já que a imunização de crianças é diferente das doses dos adultos. A observação da Anvisa foi adicionada na Nota Técnica nº 2/2022 do Ministério da Saúde.
O conteúdo também apresenta o momento em que a especialista diz não saber quanto tempo dura a prevenção da vacina como um ponto negativo contra a vacinação. Contudo, no vídeo original, a fala de Meiruze é no sentido de contextualizar a importância, naquele momento, de continuar com outras medidas de prevenção, como o uso de máscaras e distanciamento social.
Risco de miocardite é mais comum após infecção pelo covid-19 do que pela vacinação, segundo a Anvisa
A publicação analisada exibe apenas o trecho em que a especialista Meiruze Freitas pede que “pais ou responsáveis sejam orientados a procurar um médico se a criança apresentar dores repentinas no peito, falta de ar ou palpitações após a aplicação da vacina”, em 59 minutos e 30 segundos do vídeo no YouTube. A legenda inserida na publicação alega que isso mostra o risco de miocardite e pericardite (inflamação no coração) nas crianças por conta da vacina, o que é distorcido.
Por nota, a Anvisa informou que “a miocardite é mais comum após a infecção pela covid- 19 que após a vacinação” e “o risco da vacina causar miocardite ou pericardite é extremamente baixo”. Segundo a agência, os casos raros ocorreram, em maior número, em meninos na fase mais tardia da adolescência e houve evolução favorável, sem sequelas.
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Outro estudo mostra que o risco de desenvolver miocardite pós-vacina é 20 vezes maior ao contrair o coronavírus do que ao se imunizar, segundo nota conjunta da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). Em entrevista ao Estadão Verifica, especialistas apontaram que a miocardite é um efeito raríssimo em crianças. O Projeto Comprova também esclareceu que vacinas não causam infarto e morte súbita na faixa etária.
Na bula da Pfizer/Comirnaty os casos de miocardite (infecção das fibras do coração) e pericardite (inflamação do revestimento externo do coração) são descritos como “reações muito raras”. Os dados clínicos de monitoramento mostram que ocorrem em menos de 0,01% dos pacientes que utilizam o imunizante.
Efeitos adversos da vacinação são raros
Outra fala da diretora da Anvisa também é distorcida no post analisado para alegar que há risco na vacinação. Em 1 hora, 1 min e 20 segundos da transmissão ela diz que “os centros, os postos de saúde e os hospitais infantis estejam atentos e treinados para atender e captar reações adversas em crianças de 5 a 11 anos em crianças”, como uma instrução ao Ministério da Saúde.
Segundo a Anvisa, “as reações adversas são raras e os benefícios da vacinação continuam superando os riscos conhecidos da covid-19, bem como as possíveis complicações graves da doença”. Na nota técnica da Fiocruz, a instituição também evidenciou que “os eventos adversos graves [em pessoas até 19 anos] relacionados a Pfizer foram raramente relatos”.
Na bula da Pfizer/Comirnaty, os estudos clínicos e experiência pós-autorização da vacina no público com mais de 5 anos de idade mostram que:
- Reações muito comuns (ocorrem em 10% dos pacientes que utilizam este medicamento): dor de cabeça, diarréia, dor nas articulações, dor muscular, dor e inchaço no local de injeção, cansaço, calafrios e febre.
- Reações comuns (ocorrem entre 1% e 10% dos pacientes que utilizam este medicamento): aumento dos gânglios linfáticos (ou ínguas), náusea, vômito e vermelhidão no local de injeção.
- Reações incomuns (ocorrem entre 0,1% e 1% dos pacientes que utilizam este medicamento): reações de hipersensibilidade [por exemplo, erupção cutânea (lesão na pele), prurido (coceira), urticária (alergia da pele com forte coceira), angioedema (inchaço das partes mais profundas da pele ou da mucosa)], diminuição de apetite, insônia, tontura, letargia (cansaço e lentidão de reações e reflexos), hiperidrose (suor excessivo), suor noturno, dor nos membros (braço), astenia (fraqueza, cansaço físico intenso), sensação de mal-estar e prurido no local de injeção.
- Reações raras (ocorrem entre 0,01% e 0,1% dos pacientes que utilizam este medicamento): paralisia facial aguda.
- Reações muito raras (ocorrem em menos de 0,01% dos pacientes que utilizam este medicamento): miocardite (infecção das fibras do coração) e pericardite (inflamação do revestimento externo do coração).
- Desconhecidas (não pode ser estimada a partir dos dados disponíveis): reação alérgica grave (anafilaxia) e outros.
Como lidar com postagens do tipo: A postagem se utiliza de um vídeo verdadeiro para omitir trechos importantes e desinformar sobre as vacinas. Neste caso, é importante pesquisar por comunicados de autoridades de saúde confiáveis, como o Ministério da Saúde e a Anvisa, para entender quais as recomendações e análises feitas para a aprovação dos imunizantes. A partir do nome da diretora da agência ou da busca reversa, também conseguiríamos encontrar o anúncio original na internet. Uma dica é desconfiar de publicações que questionam a eficácia das vacinas, pois a segurança é garantido por órgãos de saúde do Brasil e do mundo.