A aposta de alto risco do FBI na busca e apreensão na mansão de Trump; leia a análise


Para historiadores, eventos representam um teste de resiliência à democracia americana em um momento em que ela está sob ataque

Por Michael D. Shear
Atualização:

THE NEW YORK TIMES - A disputa entre o ex-presidente Donald Trump e os Arquivos Nacionais revelada quando agentes do FBI (polícia federal americana) revistaram a mansão do ex-presidente em Palm Beach, Flórida, não tem precedente na história presidencial dos Estados Unidos.

Foi também uma aposta de alto risco do secretário de Justiça, Merrick Garland, que a operação policial em Mar-a-Lago, a luxuosa mansão do ex-presidente, resista às acusações de que o Departamento de Justiça estaria buscando uma vingança política contra o oponente do presidente Joe Biden em 2020 — e seu provável rival em 2024.

A demonização de Trump em relação ao FBI e o Departamento de Justiça durante seus quatro anos na presidência, projetada para minar a legitimidade das instituições policiais do país mesmo enquanto elas perseguiam acusações contra ele, tornou ainda mais difícil para Garland investigar o republicano sem enfrentar reações negativas dos apoiadores do ex-presidente.

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A mansão do ex-presidente Donald Trump, de Mar-A-Lago, na Flórida, foi alvo de operação do FBI  Foto: Giorgio Viera/AFP - 09/08/2022

A decisão de determinar a operação de busca da segunda-feira coloca em dúvida a credibilidade do Departamento de Justiça meses antes das eleições legislativas de novembro, em um momento em que o país permanece profundamente polarizado. Para Garland, a pressão para justificar as ações do FBI será intensa. E se a busca por documentos sigilosos acabar não produzindo evidência significativa de algum crime, essa operação poderá entrar para a história como mais um exemplo de uma manobra mal sucedida contra Trump.

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Trump enfrenta riscos próprios ao se apressar para criticar Garland e o FBI, como fez durante a operação de busca na segunda-feira, quando qualificou a ação como “um ataque capaz de ocorrer apenas em países falidos do terceiro mundo”. Trump não desfruta mais das proteções da presidência e seria muito mais vulnerável se fosse descoberto que ele extraviou informação altamente sigilosa que ameace a segurança nacional do país.

Vários historiadores afirmaram que a operação de busca, apesar de incomum, parece apropriada para um ex-presidente que violou a lei de maneira flagrante, se recusa a reconhecer que foi derrotado na eleição de 2020 e ajudou a orquestrar um esforço para reverter o resultado daquele processo eleitoral.

“Num ambiente como esse, temos de assumir que o secretário de Justiça não fez isso por casualidade”, afirmou o historiador presidencial veterano Michael Beschloss. “E, portanto, as suspeitas criminais — que não sabemos exatamente quais são — devem ser bastante graves.”

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No caso de Trump, arquivistas dos Arquivos Nacionais descobriram este ano que o ex-presidente tinha retirado documentos sigilosos da Casa Branca depois de sua derrota, o que levou autoridades federais a iniciar uma investigação. E elas solicitaram um mandado judicial para determinar o que permanecia em poder do ex-presidente.

Trabalhadores retiram caixas da Casa Branca antes da partida do então presidente Donald Trump REUTERS/Erin Scott/File Photo Foto: Erin Scott/Reuters - 14/01/2021

Detalhes cruciais continuam em segredo, incluindo o que o FBI procura e por que as autoridades sentiram a necessidade de conduzir uma operação surpresa de busca depois de meses de querela jurídica entre o governo e advogados de Trump.

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A operação de busca ocorreu no mesmo momento em que vozes furiosas da extrema direita radical na política americana falam em outra guerra civil, enquanto cada vez mais políticos do mainstream republicano ameaçam vingança se assumirem o poder no Congresso em novembro. O deputado federal Kevin McCarthy, republicano da Califórnia e líder da minoria na Casa, aconselhou Garland a reunir documentos e limpar sua agenda de compromissos.

“Isso coloca nossa cultura política em um modo de alerta de emergência”, afirmou o historiador presidencial Douglas Brinkley, da Universidade Rice. “É uma subversão da política americana.”

Críticos de Trump afirmaram que não é nenhuma surpresa que um ex-presidente que rasgou regras jurídicas e procedimentais enquanto ocupou o Salão Oval agora se encontre no centro de uma disputa a respeito de documentos sigilosos.

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Lei dos Registros

Por quase 35 anos, o cabo de guerra relacionado aos registros presidenciais — e sobre quem os controla — foi principalmente burocrático, disputado internamente nos Arquivos Nacionais e debatido entre advogados em salas de tribunais.

O ex-presidente Richard Nixon passou quase quatro anos depois do escândalo de Watergate lutando pelo controle de milhões de páginas de registros presidenciais e das centenas de horas de gravações de áudio que ajudaram a forçar sua renúncia.

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Beschloss afirmou que, inicialmente, Nixon alcançou um acordo com o ex-presidente Gerald Ford que lhe concederia controle sobre seus registros, assim como a capacidade de destruí-los. Mas uma lei aprovada pelo Congresso depois que Nixon deixou a presidência em agosto de 1974 forçou-o a levar sua querela para a Justiça. Por fim, ele perdeu na Suprema Corte, por 7 votos a 2.

Essa disputa levou à aprovação, em 1978, da Lei dos Registros Presidenciais, que pela primeira vez deixou claro que os registros da Casa Branca são propriedade do governo federal, não do ex-presidente que os produziu. Desde então, ex-presidentes de ambos os partidos negociaram a respeito da maneira e do momento que os Arquivos Nacionais podem tornar públicos esses documentos.

Presidentes e seus assessores também estão sujeitos a outras leis relativas à manipulação de informação sigilosa. Ao longo dos anos, algumas autoridades federais graduadas foram acusadas de manipular ilegalmente informação sigilosa.

David Petraeus, general que atuou como diretor da CIA durante o governo de Barack Obama, admitiu em 2015 que compartilhou registros altamente sigilosos com sua amante, declarando-se culpado por remoção não autorizada e retenção de material sigiloso, o que é considerado contravenção.

General americano David Petraeus, ex-chefe da CIA, declarando-se culpado por remoção não autorizada e retenção de material sigiloso  Foto: Jason Reed/Reuters - 15/03/2011

Sandy Berger, que foi conselheiro de segurança nacional do ex-presidente Bill Clinton, pagou multa de US$ 50 mil depois de se declarar culpado por remover documentos sigilosos dos Arquivos Nacionais, em 2003, para se preparar para o depoimento que concedeu à comissão parlamentar que investigou o 11 de Setembro.

Mas nunca havia ocorrido uma disputa entre um ex-presidente e o governo como a que culminou na operação de busca da segunda-feira, afirmou Lee White, diretor-executivo da Coalizão Nacional pela História.

White, que há anos se reúne com funcionários dos Arquivos Nacionais, afirmou que eles normalmente trabalham duro para resolver desentendimentos a respeito de documentos com ex-presidentes e seus conselheiros.

“Eles tendem a ser subservientes em relação à Casa Branca”, afirmou White a respeito dos advogados dos Arquivos Nacionais. “Sabe, aparecem essas dúvidas a respeito dos registros presidenciais, e eles dizem, ‘Veja, nosso trabalho é aconselhar a Casa Branca’. Eles não são, por natureza, um grupo de advogados agressivos.”

Beschloss e Brinkley afirmaram que a operação de busca na casa de Trump tem o potencial de se tornar um lampejo sobre uma disputa em andamento entre aqueles que investigam as ações do ex-presidente e as forças que apoiaram seus frenéticos esforços para permanecer no cargo.

Mas eles afirmaram que também existem riscos para Trump e seus aliados no Congresso, que na segunda-feira se apressaram em atacar Garland e o FBI nas horas seguintes à operação de busca.

“Temos agora Kevin McCarthy — também algo que jamais havíamos visto na história — fazendo ameaças pesadas a um secretário de Justiça, obviamente tentando intimidá-lo”, afirmou Beschloss.

Os defensores de Trump não esperaram para descobrir que evidências o FBI encontrou ou procurou antes de usar a operação de busca para atiçar os mesmos antigos e persistentes ressentimentos que o ex-presidente atiçou ao longo de todo o seu mandato. O senador Marco Rubio, republicano da Flórida, publicou prontamente um breve vídeo no Twitter acusando o governo Biden de agir como um regime ditatorial de um país em desenvolvimento.

“Isso acontece em lugares como a Nicarágua”, afirmou Rubio no vídeo, “onde, no ano passado, todas as pessoas que disputaram a presidência com Daniel Ortega, todas as pessoas que colocaram seu nome nas cédulas, foram presas e permanecem na cadeia”.

“Vocês podem tentar minimizar, mas foi exatamente isso o que ocorreu nesta noite”, afirmou Rubio.

Os historiadores afirmaram que esses eventos representam um teste de resiliência da democracia americana em um momento em que ela está sob ataque. “Estamos no meio de uma nova guerra civil neste país”, afirmou Brinkley. “Trata-se de um momento sem nenhum precedente na história americana.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES - A disputa entre o ex-presidente Donald Trump e os Arquivos Nacionais revelada quando agentes do FBI (polícia federal americana) revistaram a mansão do ex-presidente em Palm Beach, Flórida, não tem precedente na história presidencial dos Estados Unidos.

Foi também uma aposta de alto risco do secretário de Justiça, Merrick Garland, que a operação policial em Mar-a-Lago, a luxuosa mansão do ex-presidente, resista às acusações de que o Departamento de Justiça estaria buscando uma vingança política contra o oponente do presidente Joe Biden em 2020 — e seu provável rival em 2024.

A demonização de Trump em relação ao FBI e o Departamento de Justiça durante seus quatro anos na presidência, projetada para minar a legitimidade das instituições policiais do país mesmo enquanto elas perseguiam acusações contra ele, tornou ainda mais difícil para Garland investigar o republicano sem enfrentar reações negativas dos apoiadores do ex-presidente.

A mansão do ex-presidente Donald Trump, de Mar-A-Lago, na Flórida, foi alvo de operação do FBI  Foto: Giorgio Viera/AFP - 09/08/2022

A decisão de determinar a operação de busca da segunda-feira coloca em dúvida a credibilidade do Departamento de Justiça meses antes das eleições legislativas de novembro, em um momento em que o país permanece profundamente polarizado. Para Garland, a pressão para justificar as ações do FBI será intensa. E se a busca por documentos sigilosos acabar não produzindo evidência significativa de algum crime, essa operação poderá entrar para a história como mais um exemplo de uma manobra mal sucedida contra Trump.

Trump enfrenta riscos próprios ao se apressar para criticar Garland e o FBI, como fez durante a operação de busca na segunda-feira, quando qualificou a ação como “um ataque capaz de ocorrer apenas em países falidos do terceiro mundo”. Trump não desfruta mais das proteções da presidência e seria muito mais vulnerável se fosse descoberto que ele extraviou informação altamente sigilosa que ameace a segurança nacional do país.

Vários historiadores afirmaram que a operação de busca, apesar de incomum, parece apropriada para um ex-presidente que violou a lei de maneira flagrante, se recusa a reconhecer que foi derrotado na eleição de 2020 e ajudou a orquestrar um esforço para reverter o resultado daquele processo eleitoral.

“Num ambiente como esse, temos de assumir que o secretário de Justiça não fez isso por casualidade”, afirmou o historiador presidencial veterano Michael Beschloss. “E, portanto, as suspeitas criminais — que não sabemos exatamente quais são — devem ser bastante graves.”

No caso de Trump, arquivistas dos Arquivos Nacionais descobriram este ano que o ex-presidente tinha retirado documentos sigilosos da Casa Branca depois de sua derrota, o que levou autoridades federais a iniciar uma investigação. E elas solicitaram um mandado judicial para determinar o que permanecia em poder do ex-presidente.

Trabalhadores retiram caixas da Casa Branca antes da partida do então presidente Donald Trump REUTERS/Erin Scott/File Photo Foto: Erin Scott/Reuters - 14/01/2021

Detalhes cruciais continuam em segredo, incluindo o que o FBI procura e por que as autoridades sentiram a necessidade de conduzir uma operação surpresa de busca depois de meses de querela jurídica entre o governo e advogados de Trump.

A operação de busca ocorreu no mesmo momento em que vozes furiosas da extrema direita radical na política americana falam em outra guerra civil, enquanto cada vez mais políticos do mainstream republicano ameaçam vingança se assumirem o poder no Congresso em novembro. O deputado federal Kevin McCarthy, republicano da Califórnia e líder da minoria na Casa, aconselhou Garland a reunir documentos e limpar sua agenda de compromissos.

“Isso coloca nossa cultura política em um modo de alerta de emergência”, afirmou o historiador presidencial Douglas Brinkley, da Universidade Rice. “É uma subversão da política americana.”

Críticos de Trump afirmaram que não é nenhuma surpresa que um ex-presidente que rasgou regras jurídicas e procedimentais enquanto ocupou o Salão Oval agora se encontre no centro de uma disputa a respeito de documentos sigilosos.

Lei dos Registros

Por quase 35 anos, o cabo de guerra relacionado aos registros presidenciais — e sobre quem os controla — foi principalmente burocrático, disputado internamente nos Arquivos Nacionais e debatido entre advogados em salas de tribunais.

O ex-presidente Richard Nixon passou quase quatro anos depois do escândalo de Watergate lutando pelo controle de milhões de páginas de registros presidenciais e das centenas de horas de gravações de áudio que ajudaram a forçar sua renúncia.

Beschloss afirmou que, inicialmente, Nixon alcançou um acordo com o ex-presidente Gerald Ford que lhe concederia controle sobre seus registros, assim como a capacidade de destruí-los. Mas uma lei aprovada pelo Congresso depois que Nixon deixou a presidência em agosto de 1974 forçou-o a levar sua querela para a Justiça. Por fim, ele perdeu na Suprema Corte, por 7 votos a 2.

Essa disputa levou à aprovação, em 1978, da Lei dos Registros Presidenciais, que pela primeira vez deixou claro que os registros da Casa Branca são propriedade do governo federal, não do ex-presidente que os produziu. Desde então, ex-presidentes de ambos os partidos negociaram a respeito da maneira e do momento que os Arquivos Nacionais podem tornar públicos esses documentos.

Presidentes e seus assessores também estão sujeitos a outras leis relativas à manipulação de informação sigilosa. Ao longo dos anos, algumas autoridades federais graduadas foram acusadas de manipular ilegalmente informação sigilosa.

David Petraeus, general que atuou como diretor da CIA durante o governo de Barack Obama, admitiu em 2015 que compartilhou registros altamente sigilosos com sua amante, declarando-se culpado por remoção não autorizada e retenção de material sigiloso, o que é considerado contravenção.

General americano David Petraeus, ex-chefe da CIA, declarando-se culpado por remoção não autorizada e retenção de material sigiloso  Foto: Jason Reed/Reuters - 15/03/2011

Sandy Berger, que foi conselheiro de segurança nacional do ex-presidente Bill Clinton, pagou multa de US$ 50 mil depois de se declarar culpado por remover documentos sigilosos dos Arquivos Nacionais, em 2003, para se preparar para o depoimento que concedeu à comissão parlamentar que investigou o 11 de Setembro.

Mas nunca havia ocorrido uma disputa entre um ex-presidente e o governo como a que culminou na operação de busca da segunda-feira, afirmou Lee White, diretor-executivo da Coalizão Nacional pela História.

White, que há anos se reúne com funcionários dos Arquivos Nacionais, afirmou que eles normalmente trabalham duro para resolver desentendimentos a respeito de documentos com ex-presidentes e seus conselheiros.

“Eles tendem a ser subservientes em relação à Casa Branca”, afirmou White a respeito dos advogados dos Arquivos Nacionais. “Sabe, aparecem essas dúvidas a respeito dos registros presidenciais, e eles dizem, ‘Veja, nosso trabalho é aconselhar a Casa Branca’. Eles não são, por natureza, um grupo de advogados agressivos.”

Beschloss e Brinkley afirmaram que a operação de busca na casa de Trump tem o potencial de se tornar um lampejo sobre uma disputa em andamento entre aqueles que investigam as ações do ex-presidente e as forças que apoiaram seus frenéticos esforços para permanecer no cargo.

Mas eles afirmaram que também existem riscos para Trump e seus aliados no Congresso, que na segunda-feira se apressaram em atacar Garland e o FBI nas horas seguintes à operação de busca.

“Temos agora Kevin McCarthy — também algo que jamais havíamos visto na história — fazendo ameaças pesadas a um secretário de Justiça, obviamente tentando intimidá-lo”, afirmou Beschloss.

Os defensores de Trump não esperaram para descobrir que evidências o FBI encontrou ou procurou antes de usar a operação de busca para atiçar os mesmos antigos e persistentes ressentimentos que o ex-presidente atiçou ao longo de todo o seu mandato. O senador Marco Rubio, republicano da Flórida, publicou prontamente um breve vídeo no Twitter acusando o governo Biden de agir como um regime ditatorial de um país em desenvolvimento.

“Isso acontece em lugares como a Nicarágua”, afirmou Rubio no vídeo, “onde, no ano passado, todas as pessoas que disputaram a presidência com Daniel Ortega, todas as pessoas que colocaram seu nome nas cédulas, foram presas e permanecem na cadeia”.

“Vocês podem tentar minimizar, mas foi exatamente isso o que ocorreu nesta noite”, afirmou Rubio.

Os historiadores afirmaram que esses eventos representam um teste de resiliência da democracia americana em um momento em que ela está sob ataque. “Estamos no meio de uma nova guerra civil neste país”, afirmou Brinkley. “Trata-se de um momento sem nenhum precedente na história americana.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES - A disputa entre o ex-presidente Donald Trump e os Arquivos Nacionais revelada quando agentes do FBI (polícia federal americana) revistaram a mansão do ex-presidente em Palm Beach, Flórida, não tem precedente na história presidencial dos Estados Unidos.

Foi também uma aposta de alto risco do secretário de Justiça, Merrick Garland, que a operação policial em Mar-a-Lago, a luxuosa mansão do ex-presidente, resista às acusações de que o Departamento de Justiça estaria buscando uma vingança política contra o oponente do presidente Joe Biden em 2020 — e seu provável rival em 2024.

A demonização de Trump em relação ao FBI e o Departamento de Justiça durante seus quatro anos na presidência, projetada para minar a legitimidade das instituições policiais do país mesmo enquanto elas perseguiam acusações contra ele, tornou ainda mais difícil para Garland investigar o republicano sem enfrentar reações negativas dos apoiadores do ex-presidente.

A mansão do ex-presidente Donald Trump, de Mar-A-Lago, na Flórida, foi alvo de operação do FBI  Foto: Giorgio Viera/AFP - 09/08/2022

A decisão de determinar a operação de busca da segunda-feira coloca em dúvida a credibilidade do Departamento de Justiça meses antes das eleições legislativas de novembro, em um momento em que o país permanece profundamente polarizado. Para Garland, a pressão para justificar as ações do FBI será intensa. E se a busca por documentos sigilosos acabar não produzindo evidência significativa de algum crime, essa operação poderá entrar para a história como mais um exemplo de uma manobra mal sucedida contra Trump.

Trump enfrenta riscos próprios ao se apressar para criticar Garland e o FBI, como fez durante a operação de busca na segunda-feira, quando qualificou a ação como “um ataque capaz de ocorrer apenas em países falidos do terceiro mundo”. Trump não desfruta mais das proteções da presidência e seria muito mais vulnerável se fosse descoberto que ele extraviou informação altamente sigilosa que ameace a segurança nacional do país.

Vários historiadores afirmaram que a operação de busca, apesar de incomum, parece apropriada para um ex-presidente que violou a lei de maneira flagrante, se recusa a reconhecer que foi derrotado na eleição de 2020 e ajudou a orquestrar um esforço para reverter o resultado daquele processo eleitoral.

“Num ambiente como esse, temos de assumir que o secretário de Justiça não fez isso por casualidade”, afirmou o historiador presidencial veterano Michael Beschloss. “E, portanto, as suspeitas criminais — que não sabemos exatamente quais são — devem ser bastante graves.”

No caso de Trump, arquivistas dos Arquivos Nacionais descobriram este ano que o ex-presidente tinha retirado documentos sigilosos da Casa Branca depois de sua derrota, o que levou autoridades federais a iniciar uma investigação. E elas solicitaram um mandado judicial para determinar o que permanecia em poder do ex-presidente.

Trabalhadores retiram caixas da Casa Branca antes da partida do então presidente Donald Trump REUTERS/Erin Scott/File Photo Foto: Erin Scott/Reuters - 14/01/2021

Detalhes cruciais continuam em segredo, incluindo o que o FBI procura e por que as autoridades sentiram a necessidade de conduzir uma operação surpresa de busca depois de meses de querela jurídica entre o governo e advogados de Trump.

A operação de busca ocorreu no mesmo momento em que vozes furiosas da extrema direita radical na política americana falam em outra guerra civil, enquanto cada vez mais políticos do mainstream republicano ameaçam vingança se assumirem o poder no Congresso em novembro. O deputado federal Kevin McCarthy, republicano da Califórnia e líder da minoria na Casa, aconselhou Garland a reunir documentos e limpar sua agenda de compromissos.

“Isso coloca nossa cultura política em um modo de alerta de emergência”, afirmou o historiador presidencial Douglas Brinkley, da Universidade Rice. “É uma subversão da política americana.”

Críticos de Trump afirmaram que não é nenhuma surpresa que um ex-presidente que rasgou regras jurídicas e procedimentais enquanto ocupou o Salão Oval agora se encontre no centro de uma disputa a respeito de documentos sigilosos.

Lei dos Registros

Por quase 35 anos, o cabo de guerra relacionado aos registros presidenciais — e sobre quem os controla — foi principalmente burocrático, disputado internamente nos Arquivos Nacionais e debatido entre advogados em salas de tribunais.

O ex-presidente Richard Nixon passou quase quatro anos depois do escândalo de Watergate lutando pelo controle de milhões de páginas de registros presidenciais e das centenas de horas de gravações de áudio que ajudaram a forçar sua renúncia.

Beschloss afirmou que, inicialmente, Nixon alcançou um acordo com o ex-presidente Gerald Ford que lhe concederia controle sobre seus registros, assim como a capacidade de destruí-los. Mas uma lei aprovada pelo Congresso depois que Nixon deixou a presidência em agosto de 1974 forçou-o a levar sua querela para a Justiça. Por fim, ele perdeu na Suprema Corte, por 7 votos a 2.

Essa disputa levou à aprovação, em 1978, da Lei dos Registros Presidenciais, que pela primeira vez deixou claro que os registros da Casa Branca são propriedade do governo federal, não do ex-presidente que os produziu. Desde então, ex-presidentes de ambos os partidos negociaram a respeito da maneira e do momento que os Arquivos Nacionais podem tornar públicos esses documentos.

Presidentes e seus assessores também estão sujeitos a outras leis relativas à manipulação de informação sigilosa. Ao longo dos anos, algumas autoridades federais graduadas foram acusadas de manipular ilegalmente informação sigilosa.

David Petraeus, general que atuou como diretor da CIA durante o governo de Barack Obama, admitiu em 2015 que compartilhou registros altamente sigilosos com sua amante, declarando-se culpado por remoção não autorizada e retenção de material sigiloso, o que é considerado contravenção.

General americano David Petraeus, ex-chefe da CIA, declarando-se culpado por remoção não autorizada e retenção de material sigiloso  Foto: Jason Reed/Reuters - 15/03/2011

Sandy Berger, que foi conselheiro de segurança nacional do ex-presidente Bill Clinton, pagou multa de US$ 50 mil depois de se declarar culpado por remover documentos sigilosos dos Arquivos Nacionais, em 2003, para se preparar para o depoimento que concedeu à comissão parlamentar que investigou o 11 de Setembro.

Mas nunca havia ocorrido uma disputa entre um ex-presidente e o governo como a que culminou na operação de busca da segunda-feira, afirmou Lee White, diretor-executivo da Coalizão Nacional pela História.

White, que há anos se reúne com funcionários dos Arquivos Nacionais, afirmou que eles normalmente trabalham duro para resolver desentendimentos a respeito de documentos com ex-presidentes e seus conselheiros.

“Eles tendem a ser subservientes em relação à Casa Branca”, afirmou White a respeito dos advogados dos Arquivos Nacionais. “Sabe, aparecem essas dúvidas a respeito dos registros presidenciais, e eles dizem, ‘Veja, nosso trabalho é aconselhar a Casa Branca’. Eles não são, por natureza, um grupo de advogados agressivos.”

Beschloss e Brinkley afirmaram que a operação de busca na casa de Trump tem o potencial de se tornar um lampejo sobre uma disputa em andamento entre aqueles que investigam as ações do ex-presidente e as forças que apoiaram seus frenéticos esforços para permanecer no cargo.

Mas eles afirmaram que também existem riscos para Trump e seus aliados no Congresso, que na segunda-feira se apressaram em atacar Garland e o FBI nas horas seguintes à operação de busca.

“Temos agora Kevin McCarthy — também algo que jamais havíamos visto na história — fazendo ameaças pesadas a um secretário de Justiça, obviamente tentando intimidá-lo”, afirmou Beschloss.

Os defensores de Trump não esperaram para descobrir que evidências o FBI encontrou ou procurou antes de usar a operação de busca para atiçar os mesmos antigos e persistentes ressentimentos que o ex-presidente atiçou ao longo de todo o seu mandato. O senador Marco Rubio, republicano da Flórida, publicou prontamente um breve vídeo no Twitter acusando o governo Biden de agir como um regime ditatorial de um país em desenvolvimento.

“Isso acontece em lugares como a Nicarágua”, afirmou Rubio no vídeo, “onde, no ano passado, todas as pessoas que disputaram a presidência com Daniel Ortega, todas as pessoas que colocaram seu nome nas cédulas, foram presas e permanecem na cadeia”.

“Vocês podem tentar minimizar, mas foi exatamente isso o que ocorreu nesta noite”, afirmou Rubio.

Os historiadores afirmaram que esses eventos representam um teste de resiliência da democracia americana em um momento em que ela está sob ataque. “Estamos no meio de uma nova guerra civil neste país”, afirmou Brinkley. “Trata-se de um momento sem nenhum precedente na história americana.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES - A disputa entre o ex-presidente Donald Trump e os Arquivos Nacionais revelada quando agentes do FBI (polícia federal americana) revistaram a mansão do ex-presidente em Palm Beach, Flórida, não tem precedente na história presidencial dos Estados Unidos.

Foi também uma aposta de alto risco do secretário de Justiça, Merrick Garland, que a operação policial em Mar-a-Lago, a luxuosa mansão do ex-presidente, resista às acusações de que o Departamento de Justiça estaria buscando uma vingança política contra o oponente do presidente Joe Biden em 2020 — e seu provável rival em 2024.

A demonização de Trump em relação ao FBI e o Departamento de Justiça durante seus quatro anos na presidência, projetada para minar a legitimidade das instituições policiais do país mesmo enquanto elas perseguiam acusações contra ele, tornou ainda mais difícil para Garland investigar o republicano sem enfrentar reações negativas dos apoiadores do ex-presidente.

A mansão do ex-presidente Donald Trump, de Mar-A-Lago, na Flórida, foi alvo de operação do FBI  Foto: Giorgio Viera/AFP - 09/08/2022

A decisão de determinar a operação de busca da segunda-feira coloca em dúvida a credibilidade do Departamento de Justiça meses antes das eleições legislativas de novembro, em um momento em que o país permanece profundamente polarizado. Para Garland, a pressão para justificar as ações do FBI será intensa. E se a busca por documentos sigilosos acabar não produzindo evidência significativa de algum crime, essa operação poderá entrar para a história como mais um exemplo de uma manobra mal sucedida contra Trump.

Trump enfrenta riscos próprios ao se apressar para criticar Garland e o FBI, como fez durante a operação de busca na segunda-feira, quando qualificou a ação como “um ataque capaz de ocorrer apenas em países falidos do terceiro mundo”. Trump não desfruta mais das proteções da presidência e seria muito mais vulnerável se fosse descoberto que ele extraviou informação altamente sigilosa que ameace a segurança nacional do país.

Vários historiadores afirmaram que a operação de busca, apesar de incomum, parece apropriada para um ex-presidente que violou a lei de maneira flagrante, se recusa a reconhecer que foi derrotado na eleição de 2020 e ajudou a orquestrar um esforço para reverter o resultado daquele processo eleitoral.

“Num ambiente como esse, temos de assumir que o secretário de Justiça não fez isso por casualidade”, afirmou o historiador presidencial veterano Michael Beschloss. “E, portanto, as suspeitas criminais — que não sabemos exatamente quais são — devem ser bastante graves.”

No caso de Trump, arquivistas dos Arquivos Nacionais descobriram este ano que o ex-presidente tinha retirado documentos sigilosos da Casa Branca depois de sua derrota, o que levou autoridades federais a iniciar uma investigação. E elas solicitaram um mandado judicial para determinar o que permanecia em poder do ex-presidente.

Trabalhadores retiram caixas da Casa Branca antes da partida do então presidente Donald Trump REUTERS/Erin Scott/File Photo Foto: Erin Scott/Reuters - 14/01/2021

Detalhes cruciais continuam em segredo, incluindo o que o FBI procura e por que as autoridades sentiram a necessidade de conduzir uma operação surpresa de busca depois de meses de querela jurídica entre o governo e advogados de Trump.

A operação de busca ocorreu no mesmo momento em que vozes furiosas da extrema direita radical na política americana falam em outra guerra civil, enquanto cada vez mais políticos do mainstream republicano ameaçam vingança se assumirem o poder no Congresso em novembro. O deputado federal Kevin McCarthy, republicano da Califórnia e líder da minoria na Casa, aconselhou Garland a reunir documentos e limpar sua agenda de compromissos.

“Isso coloca nossa cultura política em um modo de alerta de emergência”, afirmou o historiador presidencial Douglas Brinkley, da Universidade Rice. “É uma subversão da política americana.”

Críticos de Trump afirmaram que não é nenhuma surpresa que um ex-presidente que rasgou regras jurídicas e procedimentais enquanto ocupou o Salão Oval agora se encontre no centro de uma disputa a respeito de documentos sigilosos.

Lei dos Registros

Por quase 35 anos, o cabo de guerra relacionado aos registros presidenciais — e sobre quem os controla — foi principalmente burocrático, disputado internamente nos Arquivos Nacionais e debatido entre advogados em salas de tribunais.

O ex-presidente Richard Nixon passou quase quatro anos depois do escândalo de Watergate lutando pelo controle de milhões de páginas de registros presidenciais e das centenas de horas de gravações de áudio que ajudaram a forçar sua renúncia.

Beschloss afirmou que, inicialmente, Nixon alcançou um acordo com o ex-presidente Gerald Ford que lhe concederia controle sobre seus registros, assim como a capacidade de destruí-los. Mas uma lei aprovada pelo Congresso depois que Nixon deixou a presidência em agosto de 1974 forçou-o a levar sua querela para a Justiça. Por fim, ele perdeu na Suprema Corte, por 7 votos a 2.

Essa disputa levou à aprovação, em 1978, da Lei dos Registros Presidenciais, que pela primeira vez deixou claro que os registros da Casa Branca são propriedade do governo federal, não do ex-presidente que os produziu. Desde então, ex-presidentes de ambos os partidos negociaram a respeito da maneira e do momento que os Arquivos Nacionais podem tornar públicos esses documentos.

Presidentes e seus assessores também estão sujeitos a outras leis relativas à manipulação de informação sigilosa. Ao longo dos anos, algumas autoridades federais graduadas foram acusadas de manipular ilegalmente informação sigilosa.

David Petraeus, general que atuou como diretor da CIA durante o governo de Barack Obama, admitiu em 2015 que compartilhou registros altamente sigilosos com sua amante, declarando-se culpado por remoção não autorizada e retenção de material sigiloso, o que é considerado contravenção.

General americano David Petraeus, ex-chefe da CIA, declarando-se culpado por remoção não autorizada e retenção de material sigiloso  Foto: Jason Reed/Reuters - 15/03/2011

Sandy Berger, que foi conselheiro de segurança nacional do ex-presidente Bill Clinton, pagou multa de US$ 50 mil depois de se declarar culpado por remover documentos sigilosos dos Arquivos Nacionais, em 2003, para se preparar para o depoimento que concedeu à comissão parlamentar que investigou o 11 de Setembro.

Mas nunca havia ocorrido uma disputa entre um ex-presidente e o governo como a que culminou na operação de busca da segunda-feira, afirmou Lee White, diretor-executivo da Coalizão Nacional pela História.

White, que há anos se reúne com funcionários dos Arquivos Nacionais, afirmou que eles normalmente trabalham duro para resolver desentendimentos a respeito de documentos com ex-presidentes e seus conselheiros.

“Eles tendem a ser subservientes em relação à Casa Branca”, afirmou White a respeito dos advogados dos Arquivos Nacionais. “Sabe, aparecem essas dúvidas a respeito dos registros presidenciais, e eles dizem, ‘Veja, nosso trabalho é aconselhar a Casa Branca’. Eles não são, por natureza, um grupo de advogados agressivos.”

Beschloss e Brinkley afirmaram que a operação de busca na casa de Trump tem o potencial de se tornar um lampejo sobre uma disputa em andamento entre aqueles que investigam as ações do ex-presidente e as forças que apoiaram seus frenéticos esforços para permanecer no cargo.

Mas eles afirmaram que também existem riscos para Trump e seus aliados no Congresso, que na segunda-feira se apressaram em atacar Garland e o FBI nas horas seguintes à operação de busca.

“Temos agora Kevin McCarthy — também algo que jamais havíamos visto na história — fazendo ameaças pesadas a um secretário de Justiça, obviamente tentando intimidá-lo”, afirmou Beschloss.

Os defensores de Trump não esperaram para descobrir que evidências o FBI encontrou ou procurou antes de usar a operação de busca para atiçar os mesmos antigos e persistentes ressentimentos que o ex-presidente atiçou ao longo de todo o seu mandato. O senador Marco Rubio, republicano da Flórida, publicou prontamente um breve vídeo no Twitter acusando o governo Biden de agir como um regime ditatorial de um país em desenvolvimento.

“Isso acontece em lugares como a Nicarágua”, afirmou Rubio no vídeo, “onde, no ano passado, todas as pessoas que disputaram a presidência com Daniel Ortega, todas as pessoas que colocaram seu nome nas cédulas, foram presas e permanecem na cadeia”.

“Vocês podem tentar minimizar, mas foi exatamente isso o que ocorreu nesta noite”, afirmou Rubio.

Os historiadores afirmaram que esses eventos representam um teste de resiliência da democracia americana em um momento em que ela está sob ataque. “Estamos no meio de uma nova guerra civil neste país”, afirmou Brinkley. “Trata-se de um momento sem nenhum precedente na história americana.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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