A vítima mais recente da guerra na Ucrânia? A luta contra as mudanças climáticas


Sanções contra energia russa pareceram oportunidade inesperada para investimentos em energia limpa, mas correria para substituir combustíveis desencadeou exatamente o contrário

Por Katrin Bennhold e Jim Tankersley

BERLIM (THE NEW YORK TIMES) — A invasão russa à Ucrânia pareceu uma oportunidade inesperada para os ambientalistas, que tinham dificuldades em voltar a atenção do mundo para a magnitude da independência energética que as fontes renováveis são capazes de oferecer. Com o Ocidente tentando se livrar do petróleo e do gás natural produzidos pela Rússia, o argumento pelas fontes de energia solar e eólica pareceu mais forte que nunca.

Mas passados quatro meses de guerra, a correria para substituir combustíveis fósseis desencadeou exatamente o contrário. Enquanto os líderes do Grupo dos 7 países industrializados se encontram nos Alpes Bávaros em uma cúpula que deveria cimentar seu compromisso com a luta contra as mudanças climáticas, os combustíveis fósseis testemunham uma ressurgência de tempo de guerra, com governantes mais interessados em baixar os preços do petróleo e do gás do que reduzir imediatamente as emissões de seus países.

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Nações estão revertendo planos de banir queima de carvão. Eles estão buscando mais petróleo e comprometendo bilhões na construção de terminais para gás natural liquefeito (GNL).

Imagem do dia 6 de abril deste ano mostra usina energética da empresa alemã Evonik próxima a Colônia, na Alemanha. Guerra na Ucrânia despertou expectativa de investimentos em energia limpa, mas planos não se concretizaram Foto: Martin Meissner / AP

Empresas de combustíveis fósseis, havia muito na defensiva, estão capitalizando sobre as ansiedades relativas à segurança energética e fazendo lobby pesado para investimentos de longo prazo em infraestrutura, o que arrisca tirar dos trilhos metas climáticas acordadas no ano passado.

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“Esta é a nossa batalha neste momento”, afirmou Jennifer Morgan, embaixadora-itinerante para mudanças climáticas no Ministério de Relações Exteriores da Alemanha e ex-presidente da ONG Greenpeace International. “Estamos em um momento de enorme perturbação por causa da invasão, que pode representar tanto um risco enorme quanto uma abertura enorme para o meio ambiente.”

Os líderes dos países do G7, incluindo Estados Unidos e Alemanha, viram-se encurralados entre suas ambiciosas metas para se livrar dos combustíveis fósseis e as pressões políticas e econômicas ocasionadas pela guerra. As preocupações mais imediatas dominarão grande parte da agenda na Baviera, enquanto os líderes buscam maneiras de aliviar a alta nos custos da energia produzida pela guerra, que contribuiu rapidamente para a inflação global, e de garantir o fornecimento no futuro imediato.

Em uma evidente reviravolta, a Alemanha passou a fazer lobby sobre seus colegas do G7 para cancelar um comprometimento conjunto do grupo em banir investimentos públicos em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior até o fim deste ano. Se os países-membros aceitarem, isso não apenas tornará mais difícil persuadir o restante do mundo a diminuir as emissões e investir em energia renovável, mas também colocará em risco a meta declarada de limitar o aquecimento global a 1,5º Celsius, alertam analistas.

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Outra proposta que ganhou tração nos dias recentes e deverá ser discutida na cúpula é um teto de preço para o petróleo russo, permitindo aos países europeus importar o insumo, mas sob a condição de pagar um preço artificialmente baixo. Isso colaboraria para baixar os preços do petróleo e da gasolina em todo o mundo e reduziria o lucro com exportações que permite ao presidente Vladimir Putin seus esforços de guerra na Ucrânia. E também poderia estimular um aumento na produção de petróleo na Rússia.

Uma das arquitetas da ideia, a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, tem afirmado privadamente a líderes mundiais que impor o chamado teto de preço sobre as exportações de petróleo russo para a Europa seria a melhor coisa que os governantes poderiam fazer neste momento para minimizar as chances de recessão global, de acordo com pessoas familiarizadas com as conversas.

Na véspera da cúpula, seu anfitrião, o chanceler alemão, Olaf Scholz, insistiu que enfrentar a crise energética a curto prazo ocasionada pela guerra da Rússia não deve tirar dos trilhos metas climáticas a longo prazo.

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“É importante discutirmos a situação hoje e, ao mesmo tempo, garantir que ponhamos um fim às mudanças climáticas decorrentes da atividade humana”, afirmou ele em um vídeo postado no sábado. “Por que é isso o que temos de fazer, nos afastar dos combustíveis fósseis no longo prazo.”

Líderes do G-7 em Elmau, Alemanha, nesta segunda-feira, 27, onde acontece reunião da cúpula. Encontro deveria cimentar compromisso dos países com a luta contra as mudanças climáticas Foto: Liesa Johannssen-Koppitz / Bloomberg

Ambientalistas, muitos deles nas ruas da Baviera protestando durante a cúpula, não compram essa narrativa.

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“Em vez de uma ressureição massiva das fontes renováveis, estamos testemunhando um retrocesso massivo para os combustíveis fósseis”, afirmou Luisa Neubauer, a ativista mais proeminente do movimento internacional Fridays for Future. “A Alemanha é um dos países que lidera esse retrocesso aos combustíveis fósseis por meio da nossa política doméstica e externa.”

Antes da invasão russa, em fevereiro, os países do G7 tinham estabelecido vários compromissos ambientais: livrar-se do carvão até 2030; descarbonizar a eletricidade que consomem até 2035; aumentar o investimento público em fontes renováveis de energia; e pôr fim a qualquer financiamento público em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior até o fim deste ano.

Mas conforme as brigas evolvendo energia entre Rússia e Europa escalaram, o tom mudou.

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Neste mês, a Rússia cortou em 60% a quantidade de gás que fornece para os europeus por meio do gasoduto Nord Stream 1, que é crucial para o abastecimento da Alemanha e de outros países. Isso fez com que governos europeus ativassem usinas a carvão que haviam sido fechadas ou eram desativadas gradualmente.

A Alemanha está subsidiando os preços da gasolina e prolongando a vida dos geradores de eletricidade movidos a carvão. As usinas holandesas a carvão, que funcionavam a 35% de sua capacidade, foram autorizadas a aumentar a produção para 100% até 2024. A Áustria está reativando uma usina a carvão que não funcionava desde abril de 2020. A Itália está se preparando para permitir que seis usinas de eletricidade movidas a carvão aumentem a produção.

Nos EUA, a ideia do teto de preço para o petróleo russo é vista como uma maneira de reduzir os preços do petróleo e da gasolina e ao mesmo tempo achatar as finanças do Kremlin. Até aqui, a Rússia tem conseguido contornar sanções e embargos do Ocidente vendendo para China e Índia, que estão conseguindo petróleo com desconto, mas os preços ainda são lucrativos para os russos.

A proposta de fato permitiria que a Rússia vendesse mais petróleo para a Europa, mas somente com um acentuado desconto sobre o preço do barril, que hoje ultrapassa os US$ 100. Yellen, assim como graduadas autoridades econômicas na Ucrânia, afirmam que isso serviria a dois propósitos cruciais: aumentar o fornecimento global de petróleo para colocar pressão sobre os preços do petróleo e da gasolina e ao mesmo tempo reduzir os lucros da Rússia com exportação de petróleo.

Os proponentes afirmam que a Rússia deverá continuar a produzir e vender petróleo mesmo com os descontos, porque seria mais fácil e econômico do que fechar poços para diminuir a produção. O economista Simon Johnson, do Instituto Massachusetts de Tecnologia, observa que seria de interesse da Rússia continuar vendendo petróleo mesmo sob um teto de preço de US$ 10 o barril.

Em vez de uma ressureição massiva das fontes renováveis, estamos testemunhando um retrocesso massivo para os combustíveis fósseis

Luisa Neubauer, ativista do Fridays for Future

Alguns proponentes afirmam que seria possível que China e Índia também insistissem em pagar o preço com desconto, o que diminuiria ainda mais os lucros da Rússia.

Mais preocupante, afirmam analistas, é a atual afobação por fontes de gás envolvendo investimentos a longo prazo em infraestrutura, que tornaria quase impossível limitar o aquecimento global a no máximo 1,5º Celsius, segundo a meta estabelecida.

A Alemanha aprovou uma legislação autorizando a construção de 12 terminais de GNL e já encomendou quatro terminais flutuantes para recebimento do insumo.

Críticos atacam a medida afirmando que a construção dos 12 terminais produziria um excesso de capacidade. Mas mesmo a construção da metade dos equipamentos produziria três quartos das emissões permitidas à Alemanha segundo os pactos internacionais, de acordo com um relatório recente publicado por uma entidade alemã de monitoramento ambiental. Os terminas permaneceriam em uso até 2043, impossibilitando a meta de descarbonização total da Alemanha prometida para 2045 pelo governo de Scholz.

E os países não estão investindo em infraestrutura apenas domesticamente.

No mês passado, Scholz esteve no Senegal, um dos países em desenvolvimento convidados para a cúpula do G7, para discutir cooperações não apenas em relação a fontes renováveis de energia, mas também em extração de gás e produção de GNL.

Ao promover o projeto de gás no Senegal, afirmam analistas, Berlim viola seu próprio comprometimento no G7 de não oferecer garantias de investimentos de fundos públicos em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior.

Essas contradições têm sido notadas por países mais pobres, que se perguntam por que os países do G7 podem pressionar por comprometimentos com metas ambientais ao mesmo tempo que investem em produção e distribuição de gás.

Uma explicação é um nível de lobby entre empresas de combustíveis fósseis que não é visto há anos, afirmam ativistas.

“Para mim, parece uma tentativa da indústria de petróleo e gás acabar de vez com o Acordo de Paris”, afirmou Bill Hare, da consultoria Climate Analytics, em Berlim, referindo-se ao emblemático tratado de 2015 para o combate às mudanças climáticas. “E estou muito preocupado, porque eles poderão se sair bem-sucedidos.”

Morgan, no Ministério de Relações Exteriores alemão, compartilha de algumas das mesmas preocupações. “Eles estão fazendo tudo o que podem para avançar com isso, também na África”, afirmou ela a respeito da indústria. “Eles querem amarrar isso. Não apenas com gás, mas com petróleo, gás e carvão.”

Mas ela e outros ainda têm esperança de que o G7 possa se tornar uma plataforma para vincular metas climáticas à segurança energética.

Analistas da área ambiental e de política externa argumentam que o G7 poderia dar apoio a investimentos em fontes renováveis de energia ao mesmo tempo que destina fundos para nações mais pobres atingidas por catástrofes climáticas.

Acima de tudo, alertam ativistas, os países ricos precisam resistir à tentação de reagir à escassez de curto prazo de energia apostando novamente em infraestrutura para combustíveis fósseis.

“Todos os argumentos estão sobre a mesa neste momento”, afirmou Neubauer, a ativista da Fridays for Future. “Sabemos exatamente o que os combustíveis fósseis fazem com o clima. Também sabemos muito bem que Putin não é o único autocrata no mundo. E sabemos que nenhuma democracia é capaz de ser verdadeiramente livre e segura enquanto depender de importações de combustíveis fósseis.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

BERLIM (THE NEW YORK TIMES) — A invasão russa à Ucrânia pareceu uma oportunidade inesperada para os ambientalistas, que tinham dificuldades em voltar a atenção do mundo para a magnitude da independência energética que as fontes renováveis são capazes de oferecer. Com o Ocidente tentando se livrar do petróleo e do gás natural produzidos pela Rússia, o argumento pelas fontes de energia solar e eólica pareceu mais forte que nunca.

Mas passados quatro meses de guerra, a correria para substituir combustíveis fósseis desencadeou exatamente o contrário. Enquanto os líderes do Grupo dos 7 países industrializados se encontram nos Alpes Bávaros em uma cúpula que deveria cimentar seu compromisso com a luta contra as mudanças climáticas, os combustíveis fósseis testemunham uma ressurgência de tempo de guerra, com governantes mais interessados em baixar os preços do petróleo e do gás do que reduzir imediatamente as emissões de seus países.

Nações estão revertendo planos de banir queima de carvão. Eles estão buscando mais petróleo e comprometendo bilhões na construção de terminais para gás natural liquefeito (GNL).

Imagem do dia 6 de abril deste ano mostra usina energética da empresa alemã Evonik próxima a Colônia, na Alemanha. Guerra na Ucrânia despertou expectativa de investimentos em energia limpa, mas planos não se concretizaram Foto: Martin Meissner / AP

Empresas de combustíveis fósseis, havia muito na defensiva, estão capitalizando sobre as ansiedades relativas à segurança energética e fazendo lobby pesado para investimentos de longo prazo em infraestrutura, o que arrisca tirar dos trilhos metas climáticas acordadas no ano passado.

“Esta é a nossa batalha neste momento”, afirmou Jennifer Morgan, embaixadora-itinerante para mudanças climáticas no Ministério de Relações Exteriores da Alemanha e ex-presidente da ONG Greenpeace International. “Estamos em um momento de enorme perturbação por causa da invasão, que pode representar tanto um risco enorme quanto uma abertura enorme para o meio ambiente.”

Os líderes dos países do G7, incluindo Estados Unidos e Alemanha, viram-se encurralados entre suas ambiciosas metas para se livrar dos combustíveis fósseis e as pressões políticas e econômicas ocasionadas pela guerra. As preocupações mais imediatas dominarão grande parte da agenda na Baviera, enquanto os líderes buscam maneiras de aliviar a alta nos custos da energia produzida pela guerra, que contribuiu rapidamente para a inflação global, e de garantir o fornecimento no futuro imediato.

Em uma evidente reviravolta, a Alemanha passou a fazer lobby sobre seus colegas do G7 para cancelar um comprometimento conjunto do grupo em banir investimentos públicos em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior até o fim deste ano. Se os países-membros aceitarem, isso não apenas tornará mais difícil persuadir o restante do mundo a diminuir as emissões e investir em energia renovável, mas também colocará em risco a meta declarada de limitar o aquecimento global a 1,5º Celsius, alertam analistas.

Outra proposta que ganhou tração nos dias recentes e deverá ser discutida na cúpula é um teto de preço para o petróleo russo, permitindo aos países europeus importar o insumo, mas sob a condição de pagar um preço artificialmente baixo. Isso colaboraria para baixar os preços do petróleo e da gasolina em todo o mundo e reduziria o lucro com exportações que permite ao presidente Vladimir Putin seus esforços de guerra na Ucrânia. E também poderia estimular um aumento na produção de petróleo na Rússia.

Uma das arquitetas da ideia, a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, tem afirmado privadamente a líderes mundiais que impor o chamado teto de preço sobre as exportações de petróleo russo para a Europa seria a melhor coisa que os governantes poderiam fazer neste momento para minimizar as chances de recessão global, de acordo com pessoas familiarizadas com as conversas.

Na véspera da cúpula, seu anfitrião, o chanceler alemão, Olaf Scholz, insistiu que enfrentar a crise energética a curto prazo ocasionada pela guerra da Rússia não deve tirar dos trilhos metas climáticas a longo prazo.

“É importante discutirmos a situação hoje e, ao mesmo tempo, garantir que ponhamos um fim às mudanças climáticas decorrentes da atividade humana”, afirmou ele em um vídeo postado no sábado. “Por que é isso o que temos de fazer, nos afastar dos combustíveis fósseis no longo prazo.”

Líderes do G-7 em Elmau, Alemanha, nesta segunda-feira, 27, onde acontece reunião da cúpula. Encontro deveria cimentar compromisso dos países com a luta contra as mudanças climáticas Foto: Liesa Johannssen-Koppitz / Bloomberg

Ambientalistas, muitos deles nas ruas da Baviera protestando durante a cúpula, não compram essa narrativa.

“Em vez de uma ressureição massiva das fontes renováveis, estamos testemunhando um retrocesso massivo para os combustíveis fósseis”, afirmou Luisa Neubauer, a ativista mais proeminente do movimento internacional Fridays for Future. “A Alemanha é um dos países que lidera esse retrocesso aos combustíveis fósseis por meio da nossa política doméstica e externa.”

Antes da invasão russa, em fevereiro, os países do G7 tinham estabelecido vários compromissos ambientais: livrar-se do carvão até 2030; descarbonizar a eletricidade que consomem até 2035; aumentar o investimento público em fontes renováveis de energia; e pôr fim a qualquer financiamento público em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior até o fim deste ano.

Mas conforme as brigas evolvendo energia entre Rússia e Europa escalaram, o tom mudou.

Neste mês, a Rússia cortou em 60% a quantidade de gás que fornece para os europeus por meio do gasoduto Nord Stream 1, que é crucial para o abastecimento da Alemanha e de outros países. Isso fez com que governos europeus ativassem usinas a carvão que haviam sido fechadas ou eram desativadas gradualmente.

A Alemanha está subsidiando os preços da gasolina e prolongando a vida dos geradores de eletricidade movidos a carvão. As usinas holandesas a carvão, que funcionavam a 35% de sua capacidade, foram autorizadas a aumentar a produção para 100% até 2024. A Áustria está reativando uma usina a carvão que não funcionava desde abril de 2020. A Itália está se preparando para permitir que seis usinas de eletricidade movidas a carvão aumentem a produção.

Nos EUA, a ideia do teto de preço para o petróleo russo é vista como uma maneira de reduzir os preços do petróleo e da gasolina e ao mesmo tempo achatar as finanças do Kremlin. Até aqui, a Rússia tem conseguido contornar sanções e embargos do Ocidente vendendo para China e Índia, que estão conseguindo petróleo com desconto, mas os preços ainda são lucrativos para os russos.

A proposta de fato permitiria que a Rússia vendesse mais petróleo para a Europa, mas somente com um acentuado desconto sobre o preço do barril, que hoje ultrapassa os US$ 100. Yellen, assim como graduadas autoridades econômicas na Ucrânia, afirmam que isso serviria a dois propósitos cruciais: aumentar o fornecimento global de petróleo para colocar pressão sobre os preços do petróleo e da gasolina e ao mesmo tempo reduzir os lucros da Rússia com exportação de petróleo.

Os proponentes afirmam que a Rússia deverá continuar a produzir e vender petróleo mesmo com os descontos, porque seria mais fácil e econômico do que fechar poços para diminuir a produção. O economista Simon Johnson, do Instituto Massachusetts de Tecnologia, observa que seria de interesse da Rússia continuar vendendo petróleo mesmo sob um teto de preço de US$ 10 o barril.

Em vez de uma ressureição massiva das fontes renováveis, estamos testemunhando um retrocesso massivo para os combustíveis fósseis

Luisa Neubauer, ativista do Fridays for Future

Alguns proponentes afirmam que seria possível que China e Índia também insistissem em pagar o preço com desconto, o que diminuiria ainda mais os lucros da Rússia.

Mais preocupante, afirmam analistas, é a atual afobação por fontes de gás envolvendo investimentos a longo prazo em infraestrutura, que tornaria quase impossível limitar o aquecimento global a no máximo 1,5º Celsius, segundo a meta estabelecida.

A Alemanha aprovou uma legislação autorizando a construção de 12 terminais de GNL e já encomendou quatro terminais flutuantes para recebimento do insumo.

Críticos atacam a medida afirmando que a construção dos 12 terminais produziria um excesso de capacidade. Mas mesmo a construção da metade dos equipamentos produziria três quartos das emissões permitidas à Alemanha segundo os pactos internacionais, de acordo com um relatório recente publicado por uma entidade alemã de monitoramento ambiental. Os terminas permaneceriam em uso até 2043, impossibilitando a meta de descarbonização total da Alemanha prometida para 2045 pelo governo de Scholz.

E os países não estão investindo em infraestrutura apenas domesticamente.

No mês passado, Scholz esteve no Senegal, um dos países em desenvolvimento convidados para a cúpula do G7, para discutir cooperações não apenas em relação a fontes renováveis de energia, mas também em extração de gás e produção de GNL.

Ao promover o projeto de gás no Senegal, afirmam analistas, Berlim viola seu próprio comprometimento no G7 de não oferecer garantias de investimentos de fundos públicos em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior.

Essas contradições têm sido notadas por países mais pobres, que se perguntam por que os países do G7 podem pressionar por comprometimentos com metas ambientais ao mesmo tempo que investem em produção e distribuição de gás.

Uma explicação é um nível de lobby entre empresas de combustíveis fósseis que não é visto há anos, afirmam ativistas.

“Para mim, parece uma tentativa da indústria de petróleo e gás acabar de vez com o Acordo de Paris”, afirmou Bill Hare, da consultoria Climate Analytics, em Berlim, referindo-se ao emblemático tratado de 2015 para o combate às mudanças climáticas. “E estou muito preocupado, porque eles poderão se sair bem-sucedidos.”

Morgan, no Ministério de Relações Exteriores alemão, compartilha de algumas das mesmas preocupações. “Eles estão fazendo tudo o que podem para avançar com isso, também na África”, afirmou ela a respeito da indústria. “Eles querem amarrar isso. Não apenas com gás, mas com petróleo, gás e carvão.”

Mas ela e outros ainda têm esperança de que o G7 possa se tornar uma plataforma para vincular metas climáticas à segurança energética.

Analistas da área ambiental e de política externa argumentam que o G7 poderia dar apoio a investimentos em fontes renováveis de energia ao mesmo tempo que destina fundos para nações mais pobres atingidas por catástrofes climáticas.

Acima de tudo, alertam ativistas, os países ricos precisam resistir à tentação de reagir à escassez de curto prazo de energia apostando novamente em infraestrutura para combustíveis fósseis.

“Todos os argumentos estão sobre a mesa neste momento”, afirmou Neubauer, a ativista da Fridays for Future. “Sabemos exatamente o que os combustíveis fósseis fazem com o clima. Também sabemos muito bem que Putin não é o único autocrata no mundo. E sabemos que nenhuma democracia é capaz de ser verdadeiramente livre e segura enquanto depender de importações de combustíveis fósseis.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

BERLIM (THE NEW YORK TIMES) — A invasão russa à Ucrânia pareceu uma oportunidade inesperada para os ambientalistas, que tinham dificuldades em voltar a atenção do mundo para a magnitude da independência energética que as fontes renováveis são capazes de oferecer. Com o Ocidente tentando se livrar do petróleo e do gás natural produzidos pela Rússia, o argumento pelas fontes de energia solar e eólica pareceu mais forte que nunca.

Mas passados quatro meses de guerra, a correria para substituir combustíveis fósseis desencadeou exatamente o contrário. Enquanto os líderes do Grupo dos 7 países industrializados se encontram nos Alpes Bávaros em uma cúpula que deveria cimentar seu compromisso com a luta contra as mudanças climáticas, os combustíveis fósseis testemunham uma ressurgência de tempo de guerra, com governantes mais interessados em baixar os preços do petróleo e do gás do que reduzir imediatamente as emissões de seus países.

Nações estão revertendo planos de banir queima de carvão. Eles estão buscando mais petróleo e comprometendo bilhões na construção de terminais para gás natural liquefeito (GNL).

Imagem do dia 6 de abril deste ano mostra usina energética da empresa alemã Evonik próxima a Colônia, na Alemanha. Guerra na Ucrânia despertou expectativa de investimentos em energia limpa, mas planos não se concretizaram Foto: Martin Meissner / AP

Empresas de combustíveis fósseis, havia muito na defensiva, estão capitalizando sobre as ansiedades relativas à segurança energética e fazendo lobby pesado para investimentos de longo prazo em infraestrutura, o que arrisca tirar dos trilhos metas climáticas acordadas no ano passado.

“Esta é a nossa batalha neste momento”, afirmou Jennifer Morgan, embaixadora-itinerante para mudanças climáticas no Ministério de Relações Exteriores da Alemanha e ex-presidente da ONG Greenpeace International. “Estamos em um momento de enorme perturbação por causa da invasão, que pode representar tanto um risco enorme quanto uma abertura enorme para o meio ambiente.”

Os líderes dos países do G7, incluindo Estados Unidos e Alemanha, viram-se encurralados entre suas ambiciosas metas para se livrar dos combustíveis fósseis e as pressões políticas e econômicas ocasionadas pela guerra. As preocupações mais imediatas dominarão grande parte da agenda na Baviera, enquanto os líderes buscam maneiras de aliviar a alta nos custos da energia produzida pela guerra, que contribuiu rapidamente para a inflação global, e de garantir o fornecimento no futuro imediato.

Em uma evidente reviravolta, a Alemanha passou a fazer lobby sobre seus colegas do G7 para cancelar um comprometimento conjunto do grupo em banir investimentos públicos em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior até o fim deste ano. Se os países-membros aceitarem, isso não apenas tornará mais difícil persuadir o restante do mundo a diminuir as emissões e investir em energia renovável, mas também colocará em risco a meta declarada de limitar o aquecimento global a 1,5º Celsius, alertam analistas.

Outra proposta que ganhou tração nos dias recentes e deverá ser discutida na cúpula é um teto de preço para o petróleo russo, permitindo aos países europeus importar o insumo, mas sob a condição de pagar um preço artificialmente baixo. Isso colaboraria para baixar os preços do petróleo e da gasolina em todo o mundo e reduziria o lucro com exportações que permite ao presidente Vladimir Putin seus esforços de guerra na Ucrânia. E também poderia estimular um aumento na produção de petróleo na Rússia.

Uma das arquitetas da ideia, a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, tem afirmado privadamente a líderes mundiais que impor o chamado teto de preço sobre as exportações de petróleo russo para a Europa seria a melhor coisa que os governantes poderiam fazer neste momento para minimizar as chances de recessão global, de acordo com pessoas familiarizadas com as conversas.

Na véspera da cúpula, seu anfitrião, o chanceler alemão, Olaf Scholz, insistiu que enfrentar a crise energética a curto prazo ocasionada pela guerra da Rússia não deve tirar dos trilhos metas climáticas a longo prazo.

“É importante discutirmos a situação hoje e, ao mesmo tempo, garantir que ponhamos um fim às mudanças climáticas decorrentes da atividade humana”, afirmou ele em um vídeo postado no sábado. “Por que é isso o que temos de fazer, nos afastar dos combustíveis fósseis no longo prazo.”

Líderes do G-7 em Elmau, Alemanha, nesta segunda-feira, 27, onde acontece reunião da cúpula. Encontro deveria cimentar compromisso dos países com a luta contra as mudanças climáticas Foto: Liesa Johannssen-Koppitz / Bloomberg

Ambientalistas, muitos deles nas ruas da Baviera protestando durante a cúpula, não compram essa narrativa.

“Em vez de uma ressureição massiva das fontes renováveis, estamos testemunhando um retrocesso massivo para os combustíveis fósseis”, afirmou Luisa Neubauer, a ativista mais proeminente do movimento internacional Fridays for Future. “A Alemanha é um dos países que lidera esse retrocesso aos combustíveis fósseis por meio da nossa política doméstica e externa.”

Antes da invasão russa, em fevereiro, os países do G7 tinham estabelecido vários compromissos ambientais: livrar-se do carvão até 2030; descarbonizar a eletricidade que consomem até 2035; aumentar o investimento público em fontes renováveis de energia; e pôr fim a qualquer financiamento público em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior até o fim deste ano.

Mas conforme as brigas evolvendo energia entre Rússia e Europa escalaram, o tom mudou.

Neste mês, a Rússia cortou em 60% a quantidade de gás que fornece para os europeus por meio do gasoduto Nord Stream 1, que é crucial para o abastecimento da Alemanha e de outros países. Isso fez com que governos europeus ativassem usinas a carvão que haviam sido fechadas ou eram desativadas gradualmente.

A Alemanha está subsidiando os preços da gasolina e prolongando a vida dos geradores de eletricidade movidos a carvão. As usinas holandesas a carvão, que funcionavam a 35% de sua capacidade, foram autorizadas a aumentar a produção para 100% até 2024. A Áustria está reativando uma usina a carvão que não funcionava desde abril de 2020. A Itália está se preparando para permitir que seis usinas de eletricidade movidas a carvão aumentem a produção.

Nos EUA, a ideia do teto de preço para o petróleo russo é vista como uma maneira de reduzir os preços do petróleo e da gasolina e ao mesmo tempo achatar as finanças do Kremlin. Até aqui, a Rússia tem conseguido contornar sanções e embargos do Ocidente vendendo para China e Índia, que estão conseguindo petróleo com desconto, mas os preços ainda são lucrativos para os russos.

A proposta de fato permitiria que a Rússia vendesse mais petróleo para a Europa, mas somente com um acentuado desconto sobre o preço do barril, que hoje ultrapassa os US$ 100. Yellen, assim como graduadas autoridades econômicas na Ucrânia, afirmam que isso serviria a dois propósitos cruciais: aumentar o fornecimento global de petróleo para colocar pressão sobre os preços do petróleo e da gasolina e ao mesmo tempo reduzir os lucros da Rússia com exportação de petróleo.

Os proponentes afirmam que a Rússia deverá continuar a produzir e vender petróleo mesmo com os descontos, porque seria mais fácil e econômico do que fechar poços para diminuir a produção. O economista Simon Johnson, do Instituto Massachusetts de Tecnologia, observa que seria de interesse da Rússia continuar vendendo petróleo mesmo sob um teto de preço de US$ 10 o barril.

Em vez de uma ressureição massiva das fontes renováveis, estamos testemunhando um retrocesso massivo para os combustíveis fósseis

Luisa Neubauer, ativista do Fridays for Future

Alguns proponentes afirmam que seria possível que China e Índia também insistissem em pagar o preço com desconto, o que diminuiria ainda mais os lucros da Rússia.

Mais preocupante, afirmam analistas, é a atual afobação por fontes de gás envolvendo investimentos a longo prazo em infraestrutura, que tornaria quase impossível limitar o aquecimento global a no máximo 1,5º Celsius, segundo a meta estabelecida.

A Alemanha aprovou uma legislação autorizando a construção de 12 terminais de GNL e já encomendou quatro terminais flutuantes para recebimento do insumo.

Críticos atacam a medida afirmando que a construção dos 12 terminais produziria um excesso de capacidade. Mas mesmo a construção da metade dos equipamentos produziria três quartos das emissões permitidas à Alemanha segundo os pactos internacionais, de acordo com um relatório recente publicado por uma entidade alemã de monitoramento ambiental. Os terminas permaneceriam em uso até 2043, impossibilitando a meta de descarbonização total da Alemanha prometida para 2045 pelo governo de Scholz.

E os países não estão investindo em infraestrutura apenas domesticamente.

No mês passado, Scholz esteve no Senegal, um dos países em desenvolvimento convidados para a cúpula do G7, para discutir cooperações não apenas em relação a fontes renováveis de energia, mas também em extração de gás e produção de GNL.

Ao promover o projeto de gás no Senegal, afirmam analistas, Berlim viola seu próprio comprometimento no G7 de não oferecer garantias de investimentos de fundos públicos em projetos de produção de combustíveis fósseis no exterior.

Essas contradições têm sido notadas por países mais pobres, que se perguntam por que os países do G7 podem pressionar por comprometimentos com metas ambientais ao mesmo tempo que investem em produção e distribuição de gás.

Uma explicação é um nível de lobby entre empresas de combustíveis fósseis que não é visto há anos, afirmam ativistas.

“Para mim, parece uma tentativa da indústria de petróleo e gás acabar de vez com o Acordo de Paris”, afirmou Bill Hare, da consultoria Climate Analytics, em Berlim, referindo-se ao emblemático tratado de 2015 para o combate às mudanças climáticas. “E estou muito preocupado, porque eles poderão se sair bem-sucedidos.”

Morgan, no Ministério de Relações Exteriores alemão, compartilha de algumas das mesmas preocupações. “Eles estão fazendo tudo o que podem para avançar com isso, também na África”, afirmou ela a respeito da indústria. “Eles querem amarrar isso. Não apenas com gás, mas com petróleo, gás e carvão.”

Mas ela e outros ainda têm esperança de que o G7 possa se tornar uma plataforma para vincular metas climáticas à segurança energética.

Analistas da área ambiental e de política externa argumentam que o G7 poderia dar apoio a investimentos em fontes renováveis de energia ao mesmo tempo que destina fundos para nações mais pobres atingidas por catástrofes climáticas.

Acima de tudo, alertam ativistas, os países ricos precisam resistir à tentação de reagir à escassez de curto prazo de energia apostando novamente em infraestrutura para combustíveis fósseis.

“Todos os argumentos estão sobre a mesa neste momento”, afirmou Neubauer, a ativista da Fridays for Future. “Sabemos exatamente o que os combustíveis fósseis fazem com o clima. Também sabemos muito bem que Putin não é o único autocrata no mundo. E sabemos que nenhuma democracia é capaz de ser verdadeiramente livre e segura enquanto depender de importações de combustíveis fósseis.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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