Ecos da Guerra Fria


A sucessão de denúncias e escândalos envolvendo o governo de Donald Trump não vão parar por aqui e ajudam a minar a credibilidade das instituições democráticas americanas - tudo o que a KGB, encarnada em Putin, queria

Por Adriana Carranca

Nos trinta anos em que trabalhou como arquivista da agência de inteligência soviética KGB, Vasili Nikitich Mitrokhin, nascido em um pequeno vilarejo da Rússia central e alçado ao círculo mais íntimo do Kremlim a por sua habilidade aparentemente inofensiva de organizar papéis enquanto aprendiz no Instituto de História e Arquivos de Moscou, fez secretamente anotações manuscritas de documentos sobre espionagem e outras operações secretas que passaram por ele e os entregou ao Reino Unido em 1992, quando desertou após a dissolução da URSS.

Os manuscritos originais permanecem classificados como sigilosos, mas parte traduzida para inglês e editada pelo Churchill College, da Universidade de Cambridge, foi liberada para consulta pública em 2014, dois anos após a morte do arquivista. Conhecido como o Arquivo de Mitrokhin, é até hoje o mais extenso acervo de informações sobre as operações da inteligência soviética em todo o mundo.

As anotações revelam, por exemplo, que a KGB grampeou o telefone do secretário de Estado dos EUA no governo Richard Nixon, Henry Kissinger. Mostra também que durante a campanha à presidência em 1984, espiões russos tentaram se infiltrar nos comitês dos partidos Republicano e Democrata e o então chefe da KGB, Yuri Andropov, ordenou a seus subordinados "medidas ativas" (aktivniye meropriyatiya) contra a reeleição do presidente Ronald Reagan.

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Por "medidas ativas" entende-se espalhar a desinformação - informações falsas, fabricadas pelos soviéticos - para desmoralizar o oponente, técnica aprimorada durante a Guerra Fria, segundo a New Yorker desta semana. Os operadores russos teriam disseminado o slogan "Reagan Means War!" (Reagan significa guerra!, em tradução livre) e acusações de que ele seria um marionete da indústria militar. Reagan foi eleito, mas a estratégia voltou a ser usada repetidamente não só em eleições, mas com o objetivo de desmoralizar os EUA e suas instituições. Segundo revelou o ex-chefe da inteligência russa em Nova York, Sergey Tretyakov, ao desertar em 2000, a desinformação como arma para "envergonhar" os EUA continuou sendo usada mesmo após o colapso da União Soviética.

Ao conhecer os arquivos de Mitrokhin, Tretyakov e outros desertores, não causam surpresa os escândalos envolvendo a suposta interferência russa na política americana na era Donald Trump. O mais recente deles, envolvendo o secretário de Justiça de Trump, Jeff Sessions, que teria se encontrado duas vezes com o embaixador russo Serguei Kislyak durante a campanha.

Desde as denúncias de que hackers russos teriam invadido os computadores do Comitê Nacional Democrata e os escândalos que se seguiram, o governo Trump tem negado enfaticamente qualquer relação com funcionários do governo do presidente Vladimir Putin, por quem Trump não esconde sua admiração.

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Michael Flynn, ex-conselheiro de Segurança Nacional, também negou inicialmente acusações, mas acabou obrigado a se demitir após a confirmação de que ele não apenas conversou com o embaixador russo em Washington antes das eleições e durante a transição, como mentiu sobre isso ao vice-presidente, Mike Pence.

O caso de Sessions é ainda mais grave, porque ele estava sob juramento. "Não tive comunicação com os russos e sou incapaz de comentar sobre isso" afirmou em resposta ao senador Al Franken sobre qual seria sua reação se surgissem evidências de contato de integrantes da campanha de Trump com o governo russo. Quando outro senador, Patrick Leahy, perguntou a Sessions especificamente se ele teve contato com "qualquer pessoa ligada a qualquer parte do governo russo sobre a eleição de 2016, antes ou depois do dia da eleição", ele respondeu apenas "não".

Deputados democratas e republicanos convocaram Sessions a se explicar, o que ele não fez. Com uma crise atrás da outra e uma baixa importante nos primeiros dias de governo sob as mesmas acusações, como foi a de Flynn, é provável que os republicanos no domínio do Congresso resistam a mais uma demissão ou a uma investigação à revelia, como pedem os democratas. Mas pelo ritmo das denúncias e considerando a recusa de Session de submeter o governo a qualquer investigação, é certo que os escândalos não vão parar por aqui. Cada vez que acontecem, agravam o caos na Casa Branca, dividem mais os americanos e, com um Congresso partidário no papel de salva-vidas do governo, ajudam a minar a credibilidade das instituições democráticas americanas. Era tudo o que a KGB, encarnada em Putin, queria.

Nos trinta anos em que trabalhou como arquivista da agência de inteligência soviética KGB, Vasili Nikitich Mitrokhin, nascido em um pequeno vilarejo da Rússia central e alçado ao círculo mais íntimo do Kremlim a por sua habilidade aparentemente inofensiva de organizar papéis enquanto aprendiz no Instituto de História e Arquivos de Moscou, fez secretamente anotações manuscritas de documentos sobre espionagem e outras operações secretas que passaram por ele e os entregou ao Reino Unido em 1992, quando desertou após a dissolução da URSS.

Os manuscritos originais permanecem classificados como sigilosos, mas parte traduzida para inglês e editada pelo Churchill College, da Universidade de Cambridge, foi liberada para consulta pública em 2014, dois anos após a morte do arquivista. Conhecido como o Arquivo de Mitrokhin, é até hoje o mais extenso acervo de informações sobre as operações da inteligência soviética em todo o mundo.

As anotações revelam, por exemplo, que a KGB grampeou o telefone do secretário de Estado dos EUA no governo Richard Nixon, Henry Kissinger. Mostra também que durante a campanha à presidência em 1984, espiões russos tentaram se infiltrar nos comitês dos partidos Republicano e Democrata e o então chefe da KGB, Yuri Andropov, ordenou a seus subordinados "medidas ativas" (aktivniye meropriyatiya) contra a reeleição do presidente Ronald Reagan.

Por "medidas ativas" entende-se espalhar a desinformação - informações falsas, fabricadas pelos soviéticos - para desmoralizar o oponente, técnica aprimorada durante a Guerra Fria, segundo a New Yorker desta semana. Os operadores russos teriam disseminado o slogan "Reagan Means War!" (Reagan significa guerra!, em tradução livre) e acusações de que ele seria um marionete da indústria militar. Reagan foi eleito, mas a estratégia voltou a ser usada repetidamente não só em eleições, mas com o objetivo de desmoralizar os EUA e suas instituições. Segundo revelou o ex-chefe da inteligência russa em Nova York, Sergey Tretyakov, ao desertar em 2000, a desinformação como arma para "envergonhar" os EUA continuou sendo usada mesmo após o colapso da União Soviética.

Ao conhecer os arquivos de Mitrokhin, Tretyakov e outros desertores, não causam surpresa os escândalos envolvendo a suposta interferência russa na política americana na era Donald Trump. O mais recente deles, envolvendo o secretário de Justiça de Trump, Jeff Sessions, que teria se encontrado duas vezes com o embaixador russo Serguei Kislyak durante a campanha.

Desde as denúncias de que hackers russos teriam invadido os computadores do Comitê Nacional Democrata e os escândalos que se seguiram, o governo Trump tem negado enfaticamente qualquer relação com funcionários do governo do presidente Vladimir Putin, por quem Trump não esconde sua admiração.

Michael Flynn, ex-conselheiro de Segurança Nacional, também negou inicialmente acusações, mas acabou obrigado a se demitir após a confirmação de que ele não apenas conversou com o embaixador russo em Washington antes das eleições e durante a transição, como mentiu sobre isso ao vice-presidente, Mike Pence.

O caso de Sessions é ainda mais grave, porque ele estava sob juramento. "Não tive comunicação com os russos e sou incapaz de comentar sobre isso" afirmou em resposta ao senador Al Franken sobre qual seria sua reação se surgissem evidências de contato de integrantes da campanha de Trump com o governo russo. Quando outro senador, Patrick Leahy, perguntou a Sessions especificamente se ele teve contato com "qualquer pessoa ligada a qualquer parte do governo russo sobre a eleição de 2016, antes ou depois do dia da eleição", ele respondeu apenas "não".

Deputados democratas e republicanos convocaram Sessions a se explicar, o que ele não fez. Com uma crise atrás da outra e uma baixa importante nos primeiros dias de governo sob as mesmas acusações, como foi a de Flynn, é provável que os republicanos no domínio do Congresso resistam a mais uma demissão ou a uma investigação à revelia, como pedem os democratas. Mas pelo ritmo das denúncias e considerando a recusa de Session de submeter o governo a qualquer investigação, é certo que os escândalos não vão parar por aqui. Cada vez que acontecem, agravam o caos na Casa Branca, dividem mais os americanos e, com um Congresso partidário no papel de salva-vidas do governo, ajudam a minar a credibilidade das instituições democráticas americanas. Era tudo o que a KGB, encarnada em Putin, queria.

Nos trinta anos em que trabalhou como arquivista da agência de inteligência soviética KGB, Vasili Nikitich Mitrokhin, nascido em um pequeno vilarejo da Rússia central e alçado ao círculo mais íntimo do Kremlim a por sua habilidade aparentemente inofensiva de organizar papéis enquanto aprendiz no Instituto de História e Arquivos de Moscou, fez secretamente anotações manuscritas de documentos sobre espionagem e outras operações secretas que passaram por ele e os entregou ao Reino Unido em 1992, quando desertou após a dissolução da URSS.

Os manuscritos originais permanecem classificados como sigilosos, mas parte traduzida para inglês e editada pelo Churchill College, da Universidade de Cambridge, foi liberada para consulta pública em 2014, dois anos após a morte do arquivista. Conhecido como o Arquivo de Mitrokhin, é até hoje o mais extenso acervo de informações sobre as operações da inteligência soviética em todo o mundo.

As anotações revelam, por exemplo, que a KGB grampeou o telefone do secretário de Estado dos EUA no governo Richard Nixon, Henry Kissinger. Mostra também que durante a campanha à presidência em 1984, espiões russos tentaram se infiltrar nos comitês dos partidos Republicano e Democrata e o então chefe da KGB, Yuri Andropov, ordenou a seus subordinados "medidas ativas" (aktivniye meropriyatiya) contra a reeleição do presidente Ronald Reagan.

Por "medidas ativas" entende-se espalhar a desinformação - informações falsas, fabricadas pelos soviéticos - para desmoralizar o oponente, técnica aprimorada durante a Guerra Fria, segundo a New Yorker desta semana. Os operadores russos teriam disseminado o slogan "Reagan Means War!" (Reagan significa guerra!, em tradução livre) e acusações de que ele seria um marionete da indústria militar. Reagan foi eleito, mas a estratégia voltou a ser usada repetidamente não só em eleições, mas com o objetivo de desmoralizar os EUA e suas instituições. Segundo revelou o ex-chefe da inteligência russa em Nova York, Sergey Tretyakov, ao desertar em 2000, a desinformação como arma para "envergonhar" os EUA continuou sendo usada mesmo após o colapso da União Soviética.

Ao conhecer os arquivos de Mitrokhin, Tretyakov e outros desertores, não causam surpresa os escândalos envolvendo a suposta interferência russa na política americana na era Donald Trump. O mais recente deles, envolvendo o secretário de Justiça de Trump, Jeff Sessions, que teria se encontrado duas vezes com o embaixador russo Serguei Kislyak durante a campanha.

Desde as denúncias de que hackers russos teriam invadido os computadores do Comitê Nacional Democrata e os escândalos que se seguiram, o governo Trump tem negado enfaticamente qualquer relação com funcionários do governo do presidente Vladimir Putin, por quem Trump não esconde sua admiração.

Michael Flynn, ex-conselheiro de Segurança Nacional, também negou inicialmente acusações, mas acabou obrigado a se demitir após a confirmação de que ele não apenas conversou com o embaixador russo em Washington antes das eleições e durante a transição, como mentiu sobre isso ao vice-presidente, Mike Pence.

O caso de Sessions é ainda mais grave, porque ele estava sob juramento. "Não tive comunicação com os russos e sou incapaz de comentar sobre isso" afirmou em resposta ao senador Al Franken sobre qual seria sua reação se surgissem evidências de contato de integrantes da campanha de Trump com o governo russo. Quando outro senador, Patrick Leahy, perguntou a Sessions especificamente se ele teve contato com "qualquer pessoa ligada a qualquer parte do governo russo sobre a eleição de 2016, antes ou depois do dia da eleição", ele respondeu apenas "não".

Deputados democratas e republicanos convocaram Sessions a se explicar, o que ele não fez. Com uma crise atrás da outra e uma baixa importante nos primeiros dias de governo sob as mesmas acusações, como foi a de Flynn, é provável que os republicanos no domínio do Congresso resistam a mais uma demissão ou a uma investigação à revelia, como pedem os democratas. Mas pelo ritmo das denúncias e considerando a recusa de Session de submeter o governo a qualquer investigação, é certo que os escândalos não vão parar por aqui. Cada vez que acontecem, agravam o caos na Casa Branca, dividem mais os americanos e, com um Congresso partidário no papel de salva-vidas do governo, ajudam a minar a credibilidade das instituições democráticas americanas. Era tudo o que a KGB, encarnada em Putin, queria.

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