BERLIM - A Alemanha divulgou nesta quarta-feira, 14, um documento inédito sobre sua Estratégia de Segurança Nacional, em que apontou a Rússia como a maior ameaça para a paz e citou a China como um rival sistêmico. O documento foi uma promessa de Olaf Scholz ao assumir o governo e ganhou importância adicional desde que a Rússia invadiu a Ucrânia.
Após meses de discussões e tensões dentro de sua coalizão, o governo apresentou o documento de quase 80 páginas que define os problemas de segurança enfrentados pela principal potência econômica da Europa. “Pela primeira vez na história do nosso país, desenvolvemos uma estratégia de segurança nacional”, disse o líder alemão à imprensa, cercado por alguns de seus principais ministros.
Sua publicação coincide com tensões na coalizão de governo entre os Verdes e os liberais em relação ao orçamento e à luta contra o aquecimento global. O maior partido de oposição da Alemanha criticou a posição do governo como “anêmica”.
A estratégia faz parte de um esforço para abordar o que a Alemanha vê como crescentes riscos militares, econômicos e sociais para o país. Entre as questões listadas estão: as relações com Rússia e China, cibersegurança e ameaça climática.
A guerra na Ucrânia aumentou a ansiedade na Alemanha sobre a preparação de suas próprias forças armadas, levando Scholz a anunciar um “ponto de virada” nos gastos militares.
A invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro de 2022 demonstrou “o que muitos de nossos vizinhos na Europa Oriental nos alertaram – que a Europa é vulnerável”, disse a ministra das Relações Exteriores da Alemanha, Annalena Baerbock, a repórteres em uma coletiva de imprensa em Berlim, também com a presença de Scholz e outras autoridades de alto escalão.
“A segurança no século 21 significa obter, de maneira confiável, medicamentos vitais na farmácia. Segurança significa não ser espionado pela China, ao conversar com amigos, ou não ser manipulado por robôs russos, ao navegar nas redes sociais”, disse a ministra alemã.
O documento faz várias referências às ameaças à segurança representadas pelas mudanças climáticas. Que inclui um risco elevado de fome, doenças e conflitos em todo o mundo, bem como eventos climáticos extremos e danos à infraestrutura crítica da Alemanha.
China como rival e parceira
De acordo com o texto, a Rússia é a “maior ameaça para a paz e a segurança na região euroatlântica no futuro previsível”. Já a China aparece na Estratégia de Segurança, ao mesmo tempo, como “parceira, competidora e rival sistêmica”.
“A China está tentando, de várias maneiras, remodelar a ordem internacional existente baseada em regras, reivindica cada vez mais a supremacia regional de maneira ofensiva e atua, constantemente, em contradição com nossos interesses e valores”, declara o governo alemão.
O texto expõe a abordagem geral de Berlim, mas não se aprofunda em detalhes - incluindo as possíveis consequências na política externa da estratégia. As autoridades planejam elaborar mais detalhes no futuro.
O governo alemão também está preparando uma estratégia específica para a China. Porém, Scholz se recusou a dizer quando seria publicado. “Estaremos prontos quando estivermos prontos, mas logo”, disse ele a repórteres.
A Alemanha tradicionalmente hesita em antagonizar Pequim devido à importância da China como mercado para as exportações alemãs e fonte de commodities importantes.
Ainda assim, o documento sublinhou que “elementos de rivalidade e competição aumentaram nos últimos anos; ao mesmo tempo, a China continua sendo um parceiro sem o qual muitos dos desafios globais mais prementes não podem ser resolvidos.”
Questionado sobre quais implicações práticas a nova estratégia teria, Baerbock disse que o governo examinará de perto as áreas onde a Alemanha é mais vulnerável devido à sua dependência da China, o que incluiriam matérias-primas e componentes para os setores de energia, telecomunicações e medicina, para os quais a Alemanha está tentando ativamente diversificar suas fontes.
O governo disse que também produzirá uma estratégia para aumentar a capacidade da Alemanha de combater ameaças híbridas, o que implicaria no fortalecimento das capacidades analíticas de seus serviços de inteligência.
No entanto, a ideia de criar um Conselho de Segurança Nacional, semelhante aos dos Estados Unidos e do Reino Unido, foi arquivada.
O governo também resistiu aos apelos para que os gastos militares da Alemanha fossem acima da meta da Otan de 2% do produto interno bruto.
A Estratégia de Segurança Nacional não convenceu a oposição, em particular o líder do partido conservador CDU, Friedrich Merz, que a qualificou como “vazia em termos de conteúdo, estrategicamente irrelevante e sem consequências em termos de política externa”./AFP a AP