Aliados dos EUA na Síria olham com cautela retirada do Afeganistão; leia análise


Forças Democráticas Sírias têm dolorosas memórias de uma situação parecida

Por Louisa Loveluck

Enquanto as forças americanas se retiravam do Afeganistão, precipitando o caótico colapso de seu governo, outro aliado dos EUA observava com cautela e esperava que seu destino fosse diferente.

As dolorosas memórias de uma retirada militar americana anterior ainda estão frescas para as Forças Democráticas Sírias (SDF, na sigla em inglês), lideradas pelos curdos no nordeste da Síria.

Três anos atrás, o presidente Donald Trump surpreendeu seus generais ao anunciar a retirada dos 2 mil soldados americanos aliados das SDF na luta contra o Estado Islâmico. Embora mais tarde tenha sido persuadido a não remover toda a força, ele a reduziu em mais da metade no ano seguinte e, ao fazê-lo, abriu caminho para que o adversário das SDF, a Turquia, invadisse parte do território.

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O movimento americano foi amplamente criticado como uma traição aos curdos, que haviam perdido milhares de combatentes durante a campanha contra o Estado Islâmico.

“O impacto durará para sempre”, disse o general Mazloum Kobane Abdi, principal comandante das SDF e o mais forte aliado de Washington na Síria, em uma rara entrevista.

Combatentes das Forças Democráticas Sírias anunciam vitória sobre o Estado Islâmico na região leste do país, em 2019 Foto: Rodi Said/REUTERS
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Cerca de 900 soldados americanos permanecem estacionados em uma extensão do nordeste da Síria que está fora do controle do governo sírio. Eles fazem parte da luta contínua contra os milicianos islâmicos, que a coalizão militar liderada pelos Estados Unidos estima em algo entre 8 mil e 16 mil homens na Síria e no Iraque.

Nos últimos meses, o governo Biden tem procurado tranquilizar Mazloum e outros membros das SDF, enviando o general Kenneth McKenzie, que chefia o Comando Central dos Estados Unidos, e Joey Hood, secretário de Estado adjunto para Assuntos do Oriente Próximo, à região para conversar com eles, disseram as autoridades. O governo frisou que a parceria com as SDF continua forte e que as tropas americanas não partirão em momento algum, de acordo com as SDF e autoridades americanas.

Mazloum, que é conhecido por seu nome de guerra, adotou um tom cauteloso, mas otimista, sobre o futuro da presença americana na região. Descrevendo uma relação melhorada com Washington nos sete meses desde que o presidente Joe Biden assumiu o cargo, o general disse que espera que uma relativa estabilidade prevaleça no nordeste da Síria, “se os Estados Unidos cumprirem suas promessas”.

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“Sentimos agora que temos um apoio político e militar mais forte, mais do que tínhamos no governo anterior”, disse Mazloum, que vestia um uniforme verde e marrom durante a entrevista em uma base militar no início deste mês. “Depois dessas retiradas, alguns oficiais americanos vieram nos dizer que não haverá mudanças na Síria”.

As autoridades americanas descrevem Mazloum como uma mão firme e um aliado de confiança na luta contra o Estado Islâmico. A coalizão liderada pelos Estados Unidos continua a fornecer inteligência e realizar ataques aéreos para apoiar os esforços das SDF para desentocar células adormecidas e atingir a liderança sobrevivente do grupo. A coalizão também trabalha com as SDF para patrulhar os campos de petróleo locais.

O equilíbrio de poder no conflito multifacetado da Síria depende da presença americana. Onde as tropas dos Estados Unidos recuam, as autoridades americanas veem uma oportunidade para os militares sírios ou as forças da Rússia ou da Turquia avançarem. Alguns oficiais americanos enfatizaram que a operação americana impede que as forças iranianas estabeleçam uma “ponte de terra” que lhes permitiria fornecer armas mais facilmente aos seus aliados do Hezbollah no Líbano. “É uma questão de manter o equilíbrio”, disse um alto funcionário, falando sob condição de anonimato.

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A retirada parcial dos Estados Unidos em 2019 redesenhou o mapa do nordeste da Síria, cedendo parte do território antes patrulhado pelas forças americanas para uma força de milícia síria apoiada pela Turquia e outros lugares para o exército sírio e seus apoiadores russos.

A retirada americana veio depois que Trump deu ao presidente turco Recep Tayyip Erdogan sinal verde para enviar seus militares mais adiante na Síria, em uma tentativa de limpar a área das SDF. O governo turco considera que a força liderada pelos curdos é um braço armado do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, um grupo separatista dentro da Turquia que Ancara chama de terroristas. Quase 200 mil civis que viviam em áreas sírias sob o controle das SDF fugiram em busca de segurança.

Embora as linhas de frente entre as SDF e as forças apoiadas pela Turquia por enquanto estejam, pelo menos em parte, tranquilas, a violência transfronteiriça ainda pode explodir. No início deste mês, um bombardeio atribuído à Turquia ou à sua força aliada local atingiu uma casa na cidade de Ain Issa, matando quatro membros de uma família, de acordo com médicos e parentes. Em seu leito de hospital na semana passada, Khitam Hilal, uma das sobreviventes, oscilou entre momentos de confusão pela sedação e clareza dolorosa.

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“Eles mataram meu marido”, disse ela, os olhos fixos no teto e cheios de lágrimas. “O que fizemos contra eles?”.

Recentemente, forças americanas e grupos apoiados pelo Irã entraram em confronto em torno de instalações militares no nordeste da Síria. Biden ordenou ataques aéreos contra grupos de milícias na região no final de junho, desencadeando um novo ciclo de violência recíproca com milicianos atirando em uma instalação que abrigava tropas dos Estados Unidos e forças americanas respondendo com artilharia.

“Não queremos que nossa área se torne uma área de conflito entre as partes. Pedimos aos outros lados que não façam essas coisas e não escalem a violência”, disse Mazloum.

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Ele alertou que o Estado Islâmico também continua sendo uma ameaça. Em particular, levantou preocupações sobre a segurança dos centros de detenção com milicianos capturados. “Temos mais de 11 mil combatentes nessas prisões e as pessoas que os guardam precisam ser melhor treinadas para lidar com eles”, disse o general, inclinando-se para a frente como que para dar ênfase ao argumento.

“Às vezes temos tumultos e as pessoas podem escapar. Precisamos ter certeza de que estão em boas mãos”, disse ele.

Embora o financiamento britânico tenha pago para expandir uma instalação em Hasakah, a maioria das penitenciárias improvisadas da região estão lotadas e as condições são ruins.

“Essas pessoas estão morando em escolas e outros prédios. As instalações são temporárias. Não são seguras”, disse Mazloum.

Especialmente urgente é o destino das crianças que foram capturadas durante as batalhas contra o Estado Islâmico e agora estão nesses centros de detenção. Muitas estão traumatizadas. Algumas foram radicalizadas. Existe apenas um centro de reabilitação no nordeste da Síria. As SDF, Mazloum disse, estão pedindo ajuda estrangeira na construção de pelo menos mais 12.

“Há apoio internacional, mas é muito lento - e precisamos que seja muito rápido”, disse ele. “Estamos enfrentando problemas e precisamos de muito apoio aqui”.

A autoridade curda que administra a região também tem pedido aos governos estrangeiros que repatriem milhares de seus cidadãos - combatentes estrangeiros e suas famílias - que foram capturados durante a guerra e agora estão definhando em prisões e campos de deslocados no nordeste da Síria.

O extenso e frequentemente febril campo de al-Hol, que abriga dezenas de milhares de parentes de combatentes, representa um dos maiores desafios. Os linha-dura do campo assassinaram detidos que tentaram se distanciar do Estado Islâmico. Algumas das mulheres no campo se tornaram o foco dos esforços de arrecadação de fundos online por simpatizantes do Estado Islâmico.

No nordeste da Síria, poucos acreditam que as forças americanas permanecerão indefinidamente. Após dez anos de guerra e milhares de soldados mortos, as SDF e as autoridades locais insistem que a resolução do conflito sírio deve incluir um acordo político que reconheça os direitos da população predominantemente curda da região. Nos últimos anos, essa população ganhou uma autonomia há muito buscada frente ao governo sírio.

Quando questionado sobre como ele vislumbrava o desenrolar dos próximos anos, Mazloum sorriu e escolheu suas palavras com cuidado.

“Sei que os Estados Unidos querem que suas tropas estejam aqui para combater os terroristas, mas eles precisam ficar até que haja uma solução para a crise síria. Se é que poderemos fazer isso acontecer. Então o futuro será positivo, de certa forma”, ele disse.

Ele acha que a América vai ficar?

“Espero que sim”, disse. / Tradução de Renato Prelorentzou.

Enquanto as forças americanas se retiravam do Afeganistão, precipitando o caótico colapso de seu governo, outro aliado dos EUA observava com cautela e esperava que seu destino fosse diferente.

As dolorosas memórias de uma retirada militar americana anterior ainda estão frescas para as Forças Democráticas Sírias (SDF, na sigla em inglês), lideradas pelos curdos no nordeste da Síria.

Três anos atrás, o presidente Donald Trump surpreendeu seus generais ao anunciar a retirada dos 2 mil soldados americanos aliados das SDF na luta contra o Estado Islâmico. Embora mais tarde tenha sido persuadido a não remover toda a força, ele a reduziu em mais da metade no ano seguinte e, ao fazê-lo, abriu caminho para que o adversário das SDF, a Turquia, invadisse parte do território.

O movimento americano foi amplamente criticado como uma traição aos curdos, que haviam perdido milhares de combatentes durante a campanha contra o Estado Islâmico.

“O impacto durará para sempre”, disse o general Mazloum Kobane Abdi, principal comandante das SDF e o mais forte aliado de Washington na Síria, em uma rara entrevista.

Combatentes das Forças Democráticas Sírias anunciam vitória sobre o Estado Islâmico na região leste do país, em 2019 Foto: Rodi Said/REUTERS

Cerca de 900 soldados americanos permanecem estacionados em uma extensão do nordeste da Síria que está fora do controle do governo sírio. Eles fazem parte da luta contínua contra os milicianos islâmicos, que a coalizão militar liderada pelos Estados Unidos estima em algo entre 8 mil e 16 mil homens na Síria e no Iraque.

Nos últimos meses, o governo Biden tem procurado tranquilizar Mazloum e outros membros das SDF, enviando o general Kenneth McKenzie, que chefia o Comando Central dos Estados Unidos, e Joey Hood, secretário de Estado adjunto para Assuntos do Oriente Próximo, à região para conversar com eles, disseram as autoridades. O governo frisou que a parceria com as SDF continua forte e que as tropas americanas não partirão em momento algum, de acordo com as SDF e autoridades americanas.

Mazloum, que é conhecido por seu nome de guerra, adotou um tom cauteloso, mas otimista, sobre o futuro da presença americana na região. Descrevendo uma relação melhorada com Washington nos sete meses desde que o presidente Joe Biden assumiu o cargo, o general disse que espera que uma relativa estabilidade prevaleça no nordeste da Síria, “se os Estados Unidos cumprirem suas promessas”.

“Sentimos agora que temos um apoio político e militar mais forte, mais do que tínhamos no governo anterior”, disse Mazloum, que vestia um uniforme verde e marrom durante a entrevista em uma base militar no início deste mês. “Depois dessas retiradas, alguns oficiais americanos vieram nos dizer que não haverá mudanças na Síria”.

As autoridades americanas descrevem Mazloum como uma mão firme e um aliado de confiança na luta contra o Estado Islâmico. A coalizão liderada pelos Estados Unidos continua a fornecer inteligência e realizar ataques aéreos para apoiar os esforços das SDF para desentocar células adormecidas e atingir a liderança sobrevivente do grupo. A coalizão também trabalha com as SDF para patrulhar os campos de petróleo locais.

O equilíbrio de poder no conflito multifacetado da Síria depende da presença americana. Onde as tropas dos Estados Unidos recuam, as autoridades americanas veem uma oportunidade para os militares sírios ou as forças da Rússia ou da Turquia avançarem. Alguns oficiais americanos enfatizaram que a operação americana impede que as forças iranianas estabeleçam uma “ponte de terra” que lhes permitiria fornecer armas mais facilmente aos seus aliados do Hezbollah no Líbano. “É uma questão de manter o equilíbrio”, disse um alto funcionário, falando sob condição de anonimato.

A retirada parcial dos Estados Unidos em 2019 redesenhou o mapa do nordeste da Síria, cedendo parte do território antes patrulhado pelas forças americanas para uma força de milícia síria apoiada pela Turquia e outros lugares para o exército sírio e seus apoiadores russos.

A retirada americana veio depois que Trump deu ao presidente turco Recep Tayyip Erdogan sinal verde para enviar seus militares mais adiante na Síria, em uma tentativa de limpar a área das SDF. O governo turco considera que a força liderada pelos curdos é um braço armado do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, um grupo separatista dentro da Turquia que Ancara chama de terroristas. Quase 200 mil civis que viviam em áreas sírias sob o controle das SDF fugiram em busca de segurança.

Embora as linhas de frente entre as SDF e as forças apoiadas pela Turquia por enquanto estejam, pelo menos em parte, tranquilas, a violência transfronteiriça ainda pode explodir. No início deste mês, um bombardeio atribuído à Turquia ou à sua força aliada local atingiu uma casa na cidade de Ain Issa, matando quatro membros de uma família, de acordo com médicos e parentes. Em seu leito de hospital na semana passada, Khitam Hilal, uma das sobreviventes, oscilou entre momentos de confusão pela sedação e clareza dolorosa.

“Eles mataram meu marido”, disse ela, os olhos fixos no teto e cheios de lágrimas. “O que fizemos contra eles?”.

Recentemente, forças americanas e grupos apoiados pelo Irã entraram em confronto em torno de instalações militares no nordeste da Síria. Biden ordenou ataques aéreos contra grupos de milícias na região no final de junho, desencadeando um novo ciclo de violência recíproca com milicianos atirando em uma instalação que abrigava tropas dos Estados Unidos e forças americanas respondendo com artilharia.

“Não queremos que nossa área se torne uma área de conflito entre as partes. Pedimos aos outros lados que não façam essas coisas e não escalem a violência”, disse Mazloum.

Ele alertou que o Estado Islâmico também continua sendo uma ameaça. Em particular, levantou preocupações sobre a segurança dos centros de detenção com milicianos capturados. “Temos mais de 11 mil combatentes nessas prisões e as pessoas que os guardam precisam ser melhor treinadas para lidar com eles”, disse o general, inclinando-se para a frente como que para dar ênfase ao argumento.

“Às vezes temos tumultos e as pessoas podem escapar. Precisamos ter certeza de que estão em boas mãos”, disse ele.

Embora o financiamento britânico tenha pago para expandir uma instalação em Hasakah, a maioria das penitenciárias improvisadas da região estão lotadas e as condições são ruins.

“Essas pessoas estão morando em escolas e outros prédios. As instalações são temporárias. Não são seguras”, disse Mazloum.

Especialmente urgente é o destino das crianças que foram capturadas durante as batalhas contra o Estado Islâmico e agora estão nesses centros de detenção. Muitas estão traumatizadas. Algumas foram radicalizadas. Existe apenas um centro de reabilitação no nordeste da Síria. As SDF, Mazloum disse, estão pedindo ajuda estrangeira na construção de pelo menos mais 12.

“Há apoio internacional, mas é muito lento - e precisamos que seja muito rápido”, disse ele. “Estamos enfrentando problemas e precisamos de muito apoio aqui”.

A autoridade curda que administra a região também tem pedido aos governos estrangeiros que repatriem milhares de seus cidadãos - combatentes estrangeiros e suas famílias - que foram capturados durante a guerra e agora estão definhando em prisões e campos de deslocados no nordeste da Síria.

O extenso e frequentemente febril campo de al-Hol, que abriga dezenas de milhares de parentes de combatentes, representa um dos maiores desafios. Os linha-dura do campo assassinaram detidos que tentaram se distanciar do Estado Islâmico. Algumas das mulheres no campo se tornaram o foco dos esforços de arrecadação de fundos online por simpatizantes do Estado Islâmico.

No nordeste da Síria, poucos acreditam que as forças americanas permanecerão indefinidamente. Após dez anos de guerra e milhares de soldados mortos, as SDF e as autoridades locais insistem que a resolução do conflito sírio deve incluir um acordo político que reconheça os direitos da população predominantemente curda da região. Nos últimos anos, essa população ganhou uma autonomia há muito buscada frente ao governo sírio.

Quando questionado sobre como ele vislumbrava o desenrolar dos próximos anos, Mazloum sorriu e escolheu suas palavras com cuidado.

“Sei que os Estados Unidos querem que suas tropas estejam aqui para combater os terroristas, mas eles precisam ficar até que haja uma solução para a crise síria. Se é que poderemos fazer isso acontecer. Então o futuro será positivo, de certa forma”, ele disse.

Ele acha que a América vai ficar?

“Espero que sim”, disse. / Tradução de Renato Prelorentzou.

Enquanto as forças americanas se retiravam do Afeganistão, precipitando o caótico colapso de seu governo, outro aliado dos EUA observava com cautela e esperava que seu destino fosse diferente.

As dolorosas memórias de uma retirada militar americana anterior ainda estão frescas para as Forças Democráticas Sírias (SDF, na sigla em inglês), lideradas pelos curdos no nordeste da Síria.

Três anos atrás, o presidente Donald Trump surpreendeu seus generais ao anunciar a retirada dos 2 mil soldados americanos aliados das SDF na luta contra o Estado Islâmico. Embora mais tarde tenha sido persuadido a não remover toda a força, ele a reduziu em mais da metade no ano seguinte e, ao fazê-lo, abriu caminho para que o adversário das SDF, a Turquia, invadisse parte do território.

O movimento americano foi amplamente criticado como uma traição aos curdos, que haviam perdido milhares de combatentes durante a campanha contra o Estado Islâmico.

“O impacto durará para sempre”, disse o general Mazloum Kobane Abdi, principal comandante das SDF e o mais forte aliado de Washington na Síria, em uma rara entrevista.

Combatentes das Forças Democráticas Sírias anunciam vitória sobre o Estado Islâmico na região leste do país, em 2019 Foto: Rodi Said/REUTERS

Cerca de 900 soldados americanos permanecem estacionados em uma extensão do nordeste da Síria que está fora do controle do governo sírio. Eles fazem parte da luta contínua contra os milicianos islâmicos, que a coalizão militar liderada pelos Estados Unidos estima em algo entre 8 mil e 16 mil homens na Síria e no Iraque.

Nos últimos meses, o governo Biden tem procurado tranquilizar Mazloum e outros membros das SDF, enviando o general Kenneth McKenzie, que chefia o Comando Central dos Estados Unidos, e Joey Hood, secretário de Estado adjunto para Assuntos do Oriente Próximo, à região para conversar com eles, disseram as autoridades. O governo frisou que a parceria com as SDF continua forte e que as tropas americanas não partirão em momento algum, de acordo com as SDF e autoridades americanas.

Mazloum, que é conhecido por seu nome de guerra, adotou um tom cauteloso, mas otimista, sobre o futuro da presença americana na região. Descrevendo uma relação melhorada com Washington nos sete meses desde que o presidente Joe Biden assumiu o cargo, o general disse que espera que uma relativa estabilidade prevaleça no nordeste da Síria, “se os Estados Unidos cumprirem suas promessas”.

“Sentimos agora que temos um apoio político e militar mais forte, mais do que tínhamos no governo anterior”, disse Mazloum, que vestia um uniforme verde e marrom durante a entrevista em uma base militar no início deste mês. “Depois dessas retiradas, alguns oficiais americanos vieram nos dizer que não haverá mudanças na Síria”.

As autoridades americanas descrevem Mazloum como uma mão firme e um aliado de confiança na luta contra o Estado Islâmico. A coalizão liderada pelos Estados Unidos continua a fornecer inteligência e realizar ataques aéreos para apoiar os esforços das SDF para desentocar células adormecidas e atingir a liderança sobrevivente do grupo. A coalizão também trabalha com as SDF para patrulhar os campos de petróleo locais.

O equilíbrio de poder no conflito multifacetado da Síria depende da presença americana. Onde as tropas dos Estados Unidos recuam, as autoridades americanas veem uma oportunidade para os militares sírios ou as forças da Rússia ou da Turquia avançarem. Alguns oficiais americanos enfatizaram que a operação americana impede que as forças iranianas estabeleçam uma “ponte de terra” que lhes permitiria fornecer armas mais facilmente aos seus aliados do Hezbollah no Líbano. “É uma questão de manter o equilíbrio”, disse um alto funcionário, falando sob condição de anonimato.

A retirada parcial dos Estados Unidos em 2019 redesenhou o mapa do nordeste da Síria, cedendo parte do território antes patrulhado pelas forças americanas para uma força de milícia síria apoiada pela Turquia e outros lugares para o exército sírio e seus apoiadores russos.

A retirada americana veio depois que Trump deu ao presidente turco Recep Tayyip Erdogan sinal verde para enviar seus militares mais adiante na Síria, em uma tentativa de limpar a área das SDF. O governo turco considera que a força liderada pelos curdos é um braço armado do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, um grupo separatista dentro da Turquia que Ancara chama de terroristas. Quase 200 mil civis que viviam em áreas sírias sob o controle das SDF fugiram em busca de segurança.

Embora as linhas de frente entre as SDF e as forças apoiadas pela Turquia por enquanto estejam, pelo menos em parte, tranquilas, a violência transfronteiriça ainda pode explodir. No início deste mês, um bombardeio atribuído à Turquia ou à sua força aliada local atingiu uma casa na cidade de Ain Issa, matando quatro membros de uma família, de acordo com médicos e parentes. Em seu leito de hospital na semana passada, Khitam Hilal, uma das sobreviventes, oscilou entre momentos de confusão pela sedação e clareza dolorosa.

“Eles mataram meu marido”, disse ela, os olhos fixos no teto e cheios de lágrimas. “O que fizemos contra eles?”.

Recentemente, forças americanas e grupos apoiados pelo Irã entraram em confronto em torno de instalações militares no nordeste da Síria. Biden ordenou ataques aéreos contra grupos de milícias na região no final de junho, desencadeando um novo ciclo de violência recíproca com milicianos atirando em uma instalação que abrigava tropas dos Estados Unidos e forças americanas respondendo com artilharia.

“Não queremos que nossa área se torne uma área de conflito entre as partes. Pedimos aos outros lados que não façam essas coisas e não escalem a violência”, disse Mazloum.

Ele alertou que o Estado Islâmico também continua sendo uma ameaça. Em particular, levantou preocupações sobre a segurança dos centros de detenção com milicianos capturados. “Temos mais de 11 mil combatentes nessas prisões e as pessoas que os guardam precisam ser melhor treinadas para lidar com eles”, disse o general, inclinando-se para a frente como que para dar ênfase ao argumento.

“Às vezes temos tumultos e as pessoas podem escapar. Precisamos ter certeza de que estão em boas mãos”, disse ele.

Embora o financiamento britânico tenha pago para expandir uma instalação em Hasakah, a maioria das penitenciárias improvisadas da região estão lotadas e as condições são ruins.

“Essas pessoas estão morando em escolas e outros prédios. As instalações são temporárias. Não são seguras”, disse Mazloum.

Especialmente urgente é o destino das crianças que foram capturadas durante as batalhas contra o Estado Islâmico e agora estão nesses centros de detenção. Muitas estão traumatizadas. Algumas foram radicalizadas. Existe apenas um centro de reabilitação no nordeste da Síria. As SDF, Mazloum disse, estão pedindo ajuda estrangeira na construção de pelo menos mais 12.

“Há apoio internacional, mas é muito lento - e precisamos que seja muito rápido”, disse ele. “Estamos enfrentando problemas e precisamos de muito apoio aqui”.

A autoridade curda que administra a região também tem pedido aos governos estrangeiros que repatriem milhares de seus cidadãos - combatentes estrangeiros e suas famílias - que foram capturados durante a guerra e agora estão definhando em prisões e campos de deslocados no nordeste da Síria.

O extenso e frequentemente febril campo de al-Hol, que abriga dezenas de milhares de parentes de combatentes, representa um dos maiores desafios. Os linha-dura do campo assassinaram detidos que tentaram se distanciar do Estado Islâmico. Algumas das mulheres no campo se tornaram o foco dos esforços de arrecadação de fundos online por simpatizantes do Estado Islâmico.

No nordeste da Síria, poucos acreditam que as forças americanas permanecerão indefinidamente. Após dez anos de guerra e milhares de soldados mortos, as SDF e as autoridades locais insistem que a resolução do conflito sírio deve incluir um acordo político que reconheça os direitos da população predominantemente curda da região. Nos últimos anos, essa população ganhou uma autonomia há muito buscada frente ao governo sírio.

Quando questionado sobre como ele vislumbrava o desenrolar dos próximos anos, Mazloum sorriu e escolheu suas palavras com cuidado.

“Sei que os Estados Unidos querem que suas tropas estejam aqui para combater os terroristas, mas eles precisam ficar até que haja uma solução para a crise síria. Se é que poderemos fazer isso acontecer. Então o futuro será positivo, de certa forma”, ele disse.

Ele acha que a América vai ficar?

“Espero que sim”, disse. / Tradução de Renato Prelorentzou.

Enquanto as forças americanas se retiravam do Afeganistão, precipitando o caótico colapso de seu governo, outro aliado dos EUA observava com cautela e esperava que seu destino fosse diferente.

As dolorosas memórias de uma retirada militar americana anterior ainda estão frescas para as Forças Democráticas Sírias (SDF, na sigla em inglês), lideradas pelos curdos no nordeste da Síria.

Três anos atrás, o presidente Donald Trump surpreendeu seus generais ao anunciar a retirada dos 2 mil soldados americanos aliados das SDF na luta contra o Estado Islâmico. Embora mais tarde tenha sido persuadido a não remover toda a força, ele a reduziu em mais da metade no ano seguinte e, ao fazê-lo, abriu caminho para que o adversário das SDF, a Turquia, invadisse parte do território.

O movimento americano foi amplamente criticado como uma traição aos curdos, que haviam perdido milhares de combatentes durante a campanha contra o Estado Islâmico.

“O impacto durará para sempre”, disse o general Mazloum Kobane Abdi, principal comandante das SDF e o mais forte aliado de Washington na Síria, em uma rara entrevista.

Combatentes das Forças Democráticas Sírias anunciam vitória sobre o Estado Islâmico na região leste do país, em 2019 Foto: Rodi Said/REUTERS

Cerca de 900 soldados americanos permanecem estacionados em uma extensão do nordeste da Síria que está fora do controle do governo sírio. Eles fazem parte da luta contínua contra os milicianos islâmicos, que a coalizão militar liderada pelos Estados Unidos estima em algo entre 8 mil e 16 mil homens na Síria e no Iraque.

Nos últimos meses, o governo Biden tem procurado tranquilizar Mazloum e outros membros das SDF, enviando o general Kenneth McKenzie, que chefia o Comando Central dos Estados Unidos, e Joey Hood, secretário de Estado adjunto para Assuntos do Oriente Próximo, à região para conversar com eles, disseram as autoridades. O governo frisou que a parceria com as SDF continua forte e que as tropas americanas não partirão em momento algum, de acordo com as SDF e autoridades americanas.

Mazloum, que é conhecido por seu nome de guerra, adotou um tom cauteloso, mas otimista, sobre o futuro da presença americana na região. Descrevendo uma relação melhorada com Washington nos sete meses desde que o presidente Joe Biden assumiu o cargo, o general disse que espera que uma relativa estabilidade prevaleça no nordeste da Síria, “se os Estados Unidos cumprirem suas promessas”.

“Sentimos agora que temos um apoio político e militar mais forte, mais do que tínhamos no governo anterior”, disse Mazloum, que vestia um uniforme verde e marrom durante a entrevista em uma base militar no início deste mês. “Depois dessas retiradas, alguns oficiais americanos vieram nos dizer que não haverá mudanças na Síria”.

As autoridades americanas descrevem Mazloum como uma mão firme e um aliado de confiança na luta contra o Estado Islâmico. A coalizão liderada pelos Estados Unidos continua a fornecer inteligência e realizar ataques aéreos para apoiar os esforços das SDF para desentocar células adormecidas e atingir a liderança sobrevivente do grupo. A coalizão também trabalha com as SDF para patrulhar os campos de petróleo locais.

O equilíbrio de poder no conflito multifacetado da Síria depende da presença americana. Onde as tropas dos Estados Unidos recuam, as autoridades americanas veem uma oportunidade para os militares sírios ou as forças da Rússia ou da Turquia avançarem. Alguns oficiais americanos enfatizaram que a operação americana impede que as forças iranianas estabeleçam uma “ponte de terra” que lhes permitiria fornecer armas mais facilmente aos seus aliados do Hezbollah no Líbano. “É uma questão de manter o equilíbrio”, disse um alto funcionário, falando sob condição de anonimato.

A retirada parcial dos Estados Unidos em 2019 redesenhou o mapa do nordeste da Síria, cedendo parte do território antes patrulhado pelas forças americanas para uma força de milícia síria apoiada pela Turquia e outros lugares para o exército sírio e seus apoiadores russos.

A retirada americana veio depois que Trump deu ao presidente turco Recep Tayyip Erdogan sinal verde para enviar seus militares mais adiante na Síria, em uma tentativa de limpar a área das SDF. O governo turco considera que a força liderada pelos curdos é um braço armado do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, um grupo separatista dentro da Turquia que Ancara chama de terroristas. Quase 200 mil civis que viviam em áreas sírias sob o controle das SDF fugiram em busca de segurança.

Embora as linhas de frente entre as SDF e as forças apoiadas pela Turquia por enquanto estejam, pelo menos em parte, tranquilas, a violência transfronteiriça ainda pode explodir. No início deste mês, um bombardeio atribuído à Turquia ou à sua força aliada local atingiu uma casa na cidade de Ain Issa, matando quatro membros de uma família, de acordo com médicos e parentes. Em seu leito de hospital na semana passada, Khitam Hilal, uma das sobreviventes, oscilou entre momentos de confusão pela sedação e clareza dolorosa.

“Eles mataram meu marido”, disse ela, os olhos fixos no teto e cheios de lágrimas. “O que fizemos contra eles?”.

Recentemente, forças americanas e grupos apoiados pelo Irã entraram em confronto em torno de instalações militares no nordeste da Síria. Biden ordenou ataques aéreos contra grupos de milícias na região no final de junho, desencadeando um novo ciclo de violência recíproca com milicianos atirando em uma instalação que abrigava tropas dos Estados Unidos e forças americanas respondendo com artilharia.

“Não queremos que nossa área se torne uma área de conflito entre as partes. Pedimos aos outros lados que não façam essas coisas e não escalem a violência”, disse Mazloum.

Ele alertou que o Estado Islâmico também continua sendo uma ameaça. Em particular, levantou preocupações sobre a segurança dos centros de detenção com milicianos capturados. “Temos mais de 11 mil combatentes nessas prisões e as pessoas que os guardam precisam ser melhor treinadas para lidar com eles”, disse o general, inclinando-se para a frente como que para dar ênfase ao argumento.

“Às vezes temos tumultos e as pessoas podem escapar. Precisamos ter certeza de que estão em boas mãos”, disse ele.

Embora o financiamento britânico tenha pago para expandir uma instalação em Hasakah, a maioria das penitenciárias improvisadas da região estão lotadas e as condições são ruins.

“Essas pessoas estão morando em escolas e outros prédios. As instalações são temporárias. Não são seguras”, disse Mazloum.

Especialmente urgente é o destino das crianças que foram capturadas durante as batalhas contra o Estado Islâmico e agora estão nesses centros de detenção. Muitas estão traumatizadas. Algumas foram radicalizadas. Existe apenas um centro de reabilitação no nordeste da Síria. As SDF, Mazloum disse, estão pedindo ajuda estrangeira na construção de pelo menos mais 12.

“Há apoio internacional, mas é muito lento - e precisamos que seja muito rápido”, disse ele. “Estamos enfrentando problemas e precisamos de muito apoio aqui”.

A autoridade curda que administra a região também tem pedido aos governos estrangeiros que repatriem milhares de seus cidadãos - combatentes estrangeiros e suas famílias - que foram capturados durante a guerra e agora estão definhando em prisões e campos de deslocados no nordeste da Síria.

O extenso e frequentemente febril campo de al-Hol, que abriga dezenas de milhares de parentes de combatentes, representa um dos maiores desafios. Os linha-dura do campo assassinaram detidos que tentaram se distanciar do Estado Islâmico. Algumas das mulheres no campo se tornaram o foco dos esforços de arrecadação de fundos online por simpatizantes do Estado Islâmico.

No nordeste da Síria, poucos acreditam que as forças americanas permanecerão indefinidamente. Após dez anos de guerra e milhares de soldados mortos, as SDF e as autoridades locais insistem que a resolução do conflito sírio deve incluir um acordo político que reconheça os direitos da população predominantemente curda da região. Nos últimos anos, essa população ganhou uma autonomia há muito buscada frente ao governo sírio.

Quando questionado sobre como ele vislumbrava o desenrolar dos próximos anos, Mazloum sorriu e escolheu suas palavras com cuidado.

“Sei que os Estados Unidos querem que suas tropas estejam aqui para combater os terroristas, mas eles precisam ficar até que haja uma solução para a crise síria. Se é que poderemos fazer isso acontecer. Então o futuro será positivo, de certa forma”, ele disse.

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