Aliança com Brasil, repressão a opositores e petróleo em alta dão sobrevida a Maduro; leia análise


Aliado de peso na região, Brasil ignora, ao menos publicamente, os relatos de abusos de direitos humanos, indícios de fraudes eleitorais e inépcia econômica no país vizinho

Por Luiz Raatz
Atualização:

Entre 2013 e 2020, quem ia regularmente à Venezuela de Nicolás Maduro costumava encontrar uma situação pior do que tinha presenciado na visita anterior. De um ano para outro, as ruas estavam mais violentas e vazias. As pessoas pareciam vez mais magras e com fome. Os preços subiam de maneira vertiginosa. A única constante era o medo - da polícia, do governo, das milícias chavistas ou do crime organizado.

A crise econômica levou 7 milhões de pessoas a fugirem para outros países da América do Sul, Estados Unidos e Europa, segundo a agência da ONU para refugiados,a Acnur. O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas também estima que no auge da repressão do regime de Maduro à oposição, entre 2018 e 2019, mais de 7 mil pessoas foram vítimas de execuções extrajudiciais no país. Até hoje, 245 presos políticos estão no cárcere do temido presídio Helicoide, em Caracas.

A hiperinflação dizimou a economia do país. Se no começo da crise, em 2014, os preços subiam 70% ao ano, em 2016 esse número saltou para 800%. Dois anos depois, ele chegaria a inacreditáveis 1.800.000%, segundo cálculo de economistas privados. Os preços subiam tanto que, em determinado momento, o governo simplesmente parou de medi-los.

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O retorno de Lula e o PT ao poder no Brasil, como visto na visita destes dias a Brasília, com o presidente defendendo a ‘reintegração plena da Venezuela’ deu a Maduro um aliado de peso na região, que ignora, ao menos publicamente, os relatos de abusos de direitos humanos, indícios de fraudes eleitorais e inépcia econômica no país vizinho.

Fraude e repressão

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Os problemas de Maduro se agravaram quando ele ainda não tinha sido declarado persona non grata no Brasil. Em 2015, data de sua última visita, a popularidade do chavismo, alcançada nos anos de Hugo Chávez à base de pesados subsídios à população mais pobre, já tinha evaporado.

A crise econômica sequer tinha atingido o auge, quando o chavismo perdeu o controle da Assembleia Nacional para a oposição. A resposta do governo Nicolás Maduro, que àquela altura já controlava o Judiciário e a Corte Eleitoral, foi impugnar deputados eleitos pela oposição e assim impedir que ela obtivesse a maioria qualificada no Congresso. Nos anos seguintes, os trabalhos do Legislativo foram anulados por decreto, depois que Maduro declarou o órgão “em desacato”. A medida foi interpretada à época pela Organização dos Estados americanos (OEA), como um golpe de Estado.

Membro da FAES patrulha posto de controle em Barquisimeto, Venezuela; na parede, um graffiti diz 'aqui não falamos mal de Chavez' Foto: Ivan Alvarado/Reuters
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No fim de 2018, a oposição foi dividida para a eleição presidencial, na qual Maduro tentou a reeleição, em meio a novas denúncias de fraude. No começo do ano seguinte, o presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, apoiado pelos Estados Unidos e outros países sul-americanos como Brasil, Argentina e Colômbia, à época governados pela direita, declarou-se presidente interino e foi reconhecido por dezenas de países.

A Venezuela se tornou alvo de sanções americanas, ainda no governo Donald Trump. O êxodo de venezuelanos aumentou, assim como a pobreza. Sem comer, venezuelanos chegaram a morrer envenenados por consumir mandioca brava.

Eram anos sombrios. Maduro fechou o regime. Líderes opositores foram presos, e outros fugiram para Miami ou Madri. Esquadrões da morte, conhecidos como Faes, aterrorizavam bairros das cidades venezuelanas, e o herdeiro de Chávez consolidou seu poder, mesmo se tornando um pária perante a comunidade internacional.

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Economia da Venezuela começou a melhorar depois da pandemia Foto: Miguel Gutierrez/Efe

Reabilitação silenciosa

Então veio a pandemia.

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Donald Trump perdeu a reeleição nos EUA. A esquerda voltou ao poder na maioria dos países da América do Sul, como Argentina, Chile, Bolívia, Peru e Colômbia.

Silenciosamente, Maduro adotou tímidas reformas econômicas para dar o mínimo de estabilidade à Venezuela. O país viveu uma espécie de dolarização informal que permitiu que os preços ao menos parassem de subir de maneira descontrolada. Essas medidas, no entanto, agravaram a desigualdade econômica venezuelana.

Com a oposição desmobilizada e um cenário externo mais desfavorável do que quando se declarou presidente interino, Guaidó também perdeu força.

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O retorno de Lula ao poder no Brasil, aliado à necessidade americana e europeia de buscar novas fontes de petróleo, em meio à Guerra na Ucrânia, criaram as bases políticas para a reabilitação de Maduro.

No ano passado, ele se reuniu com Macron, um dos antigos apoiadores de Guaidó. Ao líder francês, disse que o petróleo venezuelano estava disponível para quem quisesse comprá-lo.

Em paralelo, o Departamento de Estado sinalizou uma reaproximação e ofereceu um alívio nas sanções caso Maduro aceite organizar eleições livres e justas no ano que vem.

Com isso, Maduro, o sobrevivente, ganhou mais tempo para sua próxima jogada. Nada indica que ele vá reabilitar a oposição e organizar eleições minimamente justas. Mas, como sempre fez ao longo de sua carreira política, o presidente da Venezuela apenas barganha por mais tempo.

Entre 2013 e 2020, quem ia regularmente à Venezuela de Nicolás Maduro costumava encontrar uma situação pior do que tinha presenciado na visita anterior. De um ano para outro, as ruas estavam mais violentas e vazias. As pessoas pareciam vez mais magras e com fome. Os preços subiam de maneira vertiginosa. A única constante era o medo - da polícia, do governo, das milícias chavistas ou do crime organizado.

A crise econômica levou 7 milhões de pessoas a fugirem para outros países da América do Sul, Estados Unidos e Europa, segundo a agência da ONU para refugiados,a Acnur. O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas também estima que no auge da repressão do regime de Maduro à oposição, entre 2018 e 2019, mais de 7 mil pessoas foram vítimas de execuções extrajudiciais no país. Até hoje, 245 presos políticos estão no cárcere do temido presídio Helicoide, em Caracas.

A hiperinflação dizimou a economia do país. Se no começo da crise, em 2014, os preços subiam 70% ao ano, em 2016 esse número saltou para 800%. Dois anos depois, ele chegaria a inacreditáveis 1.800.000%, segundo cálculo de economistas privados. Os preços subiam tanto que, em determinado momento, o governo simplesmente parou de medi-los.

O retorno de Lula e o PT ao poder no Brasil, como visto na visita destes dias a Brasília, com o presidente defendendo a ‘reintegração plena da Venezuela’ deu a Maduro um aliado de peso na região, que ignora, ao menos publicamente, os relatos de abusos de direitos humanos, indícios de fraudes eleitorais e inépcia econômica no país vizinho.

Fraude e repressão

Os problemas de Maduro se agravaram quando ele ainda não tinha sido declarado persona non grata no Brasil. Em 2015, data de sua última visita, a popularidade do chavismo, alcançada nos anos de Hugo Chávez à base de pesados subsídios à população mais pobre, já tinha evaporado.

A crise econômica sequer tinha atingido o auge, quando o chavismo perdeu o controle da Assembleia Nacional para a oposição. A resposta do governo Nicolás Maduro, que àquela altura já controlava o Judiciário e a Corte Eleitoral, foi impugnar deputados eleitos pela oposição e assim impedir que ela obtivesse a maioria qualificada no Congresso. Nos anos seguintes, os trabalhos do Legislativo foram anulados por decreto, depois que Maduro declarou o órgão “em desacato”. A medida foi interpretada à época pela Organização dos Estados americanos (OEA), como um golpe de Estado.

Membro da FAES patrulha posto de controle em Barquisimeto, Venezuela; na parede, um graffiti diz 'aqui não falamos mal de Chavez' Foto: Ivan Alvarado/Reuters

No fim de 2018, a oposição foi dividida para a eleição presidencial, na qual Maduro tentou a reeleição, em meio a novas denúncias de fraude. No começo do ano seguinte, o presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, apoiado pelos Estados Unidos e outros países sul-americanos como Brasil, Argentina e Colômbia, à época governados pela direita, declarou-se presidente interino e foi reconhecido por dezenas de países.

A Venezuela se tornou alvo de sanções americanas, ainda no governo Donald Trump. O êxodo de venezuelanos aumentou, assim como a pobreza. Sem comer, venezuelanos chegaram a morrer envenenados por consumir mandioca brava.

Eram anos sombrios. Maduro fechou o regime. Líderes opositores foram presos, e outros fugiram para Miami ou Madri. Esquadrões da morte, conhecidos como Faes, aterrorizavam bairros das cidades venezuelanas, e o herdeiro de Chávez consolidou seu poder, mesmo se tornando um pária perante a comunidade internacional.

Economia da Venezuela começou a melhorar depois da pandemia Foto: Miguel Gutierrez/Efe

Reabilitação silenciosa

Então veio a pandemia.

Donald Trump perdeu a reeleição nos EUA. A esquerda voltou ao poder na maioria dos países da América do Sul, como Argentina, Chile, Bolívia, Peru e Colômbia.

Silenciosamente, Maduro adotou tímidas reformas econômicas para dar o mínimo de estabilidade à Venezuela. O país viveu uma espécie de dolarização informal que permitiu que os preços ao menos parassem de subir de maneira descontrolada. Essas medidas, no entanto, agravaram a desigualdade econômica venezuelana.

Com a oposição desmobilizada e um cenário externo mais desfavorável do que quando se declarou presidente interino, Guaidó também perdeu força.

O retorno de Lula ao poder no Brasil, aliado à necessidade americana e europeia de buscar novas fontes de petróleo, em meio à Guerra na Ucrânia, criaram as bases políticas para a reabilitação de Maduro.

No ano passado, ele se reuniu com Macron, um dos antigos apoiadores de Guaidó. Ao líder francês, disse que o petróleo venezuelano estava disponível para quem quisesse comprá-lo.

Em paralelo, o Departamento de Estado sinalizou uma reaproximação e ofereceu um alívio nas sanções caso Maduro aceite organizar eleições livres e justas no ano que vem.

Com isso, Maduro, o sobrevivente, ganhou mais tempo para sua próxima jogada. Nada indica que ele vá reabilitar a oposição e organizar eleições minimamente justas. Mas, como sempre fez ao longo de sua carreira política, o presidente da Venezuela apenas barganha por mais tempo.

Entre 2013 e 2020, quem ia regularmente à Venezuela de Nicolás Maduro costumava encontrar uma situação pior do que tinha presenciado na visita anterior. De um ano para outro, as ruas estavam mais violentas e vazias. As pessoas pareciam vez mais magras e com fome. Os preços subiam de maneira vertiginosa. A única constante era o medo - da polícia, do governo, das milícias chavistas ou do crime organizado.

A crise econômica levou 7 milhões de pessoas a fugirem para outros países da América do Sul, Estados Unidos e Europa, segundo a agência da ONU para refugiados,a Acnur. O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas também estima que no auge da repressão do regime de Maduro à oposição, entre 2018 e 2019, mais de 7 mil pessoas foram vítimas de execuções extrajudiciais no país. Até hoje, 245 presos políticos estão no cárcere do temido presídio Helicoide, em Caracas.

A hiperinflação dizimou a economia do país. Se no começo da crise, em 2014, os preços subiam 70% ao ano, em 2016 esse número saltou para 800%. Dois anos depois, ele chegaria a inacreditáveis 1.800.000%, segundo cálculo de economistas privados. Os preços subiam tanto que, em determinado momento, o governo simplesmente parou de medi-los.

O retorno de Lula e o PT ao poder no Brasil, como visto na visita destes dias a Brasília, com o presidente defendendo a ‘reintegração plena da Venezuela’ deu a Maduro um aliado de peso na região, que ignora, ao menos publicamente, os relatos de abusos de direitos humanos, indícios de fraudes eleitorais e inépcia econômica no país vizinho.

Fraude e repressão

Os problemas de Maduro se agravaram quando ele ainda não tinha sido declarado persona non grata no Brasil. Em 2015, data de sua última visita, a popularidade do chavismo, alcançada nos anos de Hugo Chávez à base de pesados subsídios à população mais pobre, já tinha evaporado.

A crise econômica sequer tinha atingido o auge, quando o chavismo perdeu o controle da Assembleia Nacional para a oposição. A resposta do governo Nicolás Maduro, que àquela altura já controlava o Judiciário e a Corte Eleitoral, foi impugnar deputados eleitos pela oposição e assim impedir que ela obtivesse a maioria qualificada no Congresso. Nos anos seguintes, os trabalhos do Legislativo foram anulados por decreto, depois que Maduro declarou o órgão “em desacato”. A medida foi interpretada à época pela Organização dos Estados americanos (OEA), como um golpe de Estado.

Membro da FAES patrulha posto de controle em Barquisimeto, Venezuela; na parede, um graffiti diz 'aqui não falamos mal de Chavez' Foto: Ivan Alvarado/Reuters

No fim de 2018, a oposição foi dividida para a eleição presidencial, na qual Maduro tentou a reeleição, em meio a novas denúncias de fraude. No começo do ano seguinte, o presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, apoiado pelos Estados Unidos e outros países sul-americanos como Brasil, Argentina e Colômbia, à época governados pela direita, declarou-se presidente interino e foi reconhecido por dezenas de países.

A Venezuela se tornou alvo de sanções americanas, ainda no governo Donald Trump. O êxodo de venezuelanos aumentou, assim como a pobreza. Sem comer, venezuelanos chegaram a morrer envenenados por consumir mandioca brava.

Eram anos sombrios. Maduro fechou o regime. Líderes opositores foram presos, e outros fugiram para Miami ou Madri. Esquadrões da morte, conhecidos como Faes, aterrorizavam bairros das cidades venezuelanas, e o herdeiro de Chávez consolidou seu poder, mesmo se tornando um pária perante a comunidade internacional.

Economia da Venezuela começou a melhorar depois da pandemia Foto: Miguel Gutierrez/Efe

Reabilitação silenciosa

Então veio a pandemia.

Donald Trump perdeu a reeleição nos EUA. A esquerda voltou ao poder na maioria dos países da América do Sul, como Argentina, Chile, Bolívia, Peru e Colômbia.

Silenciosamente, Maduro adotou tímidas reformas econômicas para dar o mínimo de estabilidade à Venezuela. O país viveu uma espécie de dolarização informal que permitiu que os preços ao menos parassem de subir de maneira descontrolada. Essas medidas, no entanto, agravaram a desigualdade econômica venezuelana.

Com a oposição desmobilizada e um cenário externo mais desfavorável do que quando se declarou presidente interino, Guaidó também perdeu força.

O retorno de Lula ao poder no Brasil, aliado à necessidade americana e europeia de buscar novas fontes de petróleo, em meio à Guerra na Ucrânia, criaram as bases políticas para a reabilitação de Maduro.

No ano passado, ele se reuniu com Macron, um dos antigos apoiadores de Guaidó. Ao líder francês, disse que o petróleo venezuelano estava disponível para quem quisesse comprá-lo.

Em paralelo, o Departamento de Estado sinalizou uma reaproximação e ofereceu um alívio nas sanções caso Maduro aceite organizar eleições livres e justas no ano que vem.

Com isso, Maduro, o sobrevivente, ganhou mais tempo para sua próxima jogada. Nada indica que ele vá reabilitar a oposição e organizar eleições minimamente justas. Mas, como sempre fez ao longo de sua carreira política, o presidente da Venezuela apenas barganha por mais tempo.

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