Quase um mês depois da eleição de Donald Trump, os europeus foram às urnas e os resultados foram ambivalentes. Os italianos votaram contra tudo: seu establishment, a União Europeia e, por extensão, seu primeiro-ministro, político de centro focado nas reformas, Matteo Renzi. Os eleitores austríacos, ao contrário, rejeitaram o candidato de extrema direita, Norbert Hofer.
Mas, mesmo assim, o que espanta é que o Partido da Liberdade, de Hofer, cujo primeiro líder foi um ministro nazista e membro da SS, recebeu 46% dos votos. Nos últimos anos praticamente em toda a Europa, da França à Holanda e à Alemanha, populistas de direita vêm ganhando terreno.
Ao que parece, em todo o continente, os populistas ainda não estão em situação de assumir o poder porque não conseguem repetir o sucesso de Trump de controlar um partido político com muita influência. Os partidos europeus são internamente fortes e têm mecanismos para impedir qualquer tipo de tomada de controle agressiva.
Os americanos, por sua vez, desde o advento das primárias, se tornaram nada mais do que agentes de políticos populares. Quando ficou claro que Trump venceria a indicação republicana, a estrutura do partido se dobrou e se transformou no seu braço executivo.
Os partidários de Trump e de outros movimentos populistas sempre apontam para a economia como a chave do sucesso – a recuperação lenta, a estagnação dos salários, a corrosão dos empregos no setor de manufatura e a desigualdade. Esses são realmente fatores de peso que contribuíram para a vitória de Trump.
Mas é surpreendente ver a ascensão do populismo na Suécia, país que tem prosperado economicamente; na Alemanha, onde a manufatura continua robusta; e na França, onde os trabalhadores desfrutam de muitas proteções. Nos EUA, pesquisas de boca de urna mostraram que a maioria dos eleitores mais preocupados com a economia votaram em Hillary Clinton.
O único fator comum presente em todas as situações é a imigração. De fato, uma análise estatística dos países da União Europeia concluiu que mais imigrantes invariavelmente resulta em mais populistas. Segundo o estudo, “à medida que a porcentagem de imigrantes se aproxima dos 22%, o porcentual de eleitores de direita supera 50%. “A hostilidade com relação à imigração está na base de cada um desses partidos populistas.”
Um modo de testar esta teoria é observar que países sem uma imigração em grande escala, como o Japão, não registram uma ascensão do populismo de direita. Outro caso interessante é a Espanha, país que tem recebido muitos imigrantes, mas na maioria são latinos de língua espanhola, mais fáceis de assimilar. Embora se observe um populismo econômico de esquerda na Espanha, já tradicional, não existem movimentos nacionalistas de direita no país.
A reação contra a imigração se baseia em fatos. Como sublinhei em um ensaio para a revista Foreign Affairs (escrito em setembro, antes da vitória de Trump), vivemos em uma era de migração em massa. Nas últimas três ou quatro décadas, as sociedades ocidentais receberam um grande fluxo de pessoas vindas de diferentes regiões e culturas. Em 1970, o número de estrangeiros nos Estados Unidos correspondia a menos de 5% da população total. Hoje, são 14%.
Esse aumento é ainda maior em Países europeus, que abrigam 76 milhões de imigrantes vindos na maior parte da África e, recentemente, do Oriente Médio. A Áustria, por exemplo, recebeu 100 mil imigrantes no ano passado – o que representou um acréscimo de 1% da sua população só em 2015.
O que é perturbador. Durante grande parte da história da humanidade, as pessoas viveram, trabalharam e morreram a pouca distância do lugar onde nasceram. Mas, nas últimas décadas, centenas de milhões de pessoas de países mais pobres se transferiram para países mais ricos. Reflexo de uma realidade econômica.
Os índices de natalidade nos países ricos vêm caindo e a mão de obra é necessária. Os países pobres têm milhões de pessoas que buscam uma vida melhor, mas essa situação produz ansiedade, intranquilidade e a reação cultural negativa que estamos presenciando em todo o mundo ocidental.
Quais são as implicações disso tudo no futuro? As sociedades ocidentais terão de administrar melhor a questão da imigração. Terão de colocar mais ênfase na assimilação. O Canadá pode ser o modelo. O país adotou políticas inteligentes em ambas as frentes, com uma alta porcentagem de imigrantes (qualificados), uma forte assimilação e nenhum rechaço importante da população nativa.
As sociedades ocidentais acabarão por se adaptar a esta nova característica da globalização. Basta ver os jovens na Europa e nos Estados Unidos, onde sua vasta maioria valoriza extremamente os benefícios da diversidade e desejam viver num mundo aberto e conectado. Este é o futuro. Temos apenas de cuidar para não destroçar o mundo antes de atingir esse futuro. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
*É COLUNISTA