Biden está calibrando um grande acordo no Oriente Médio; leia a coluna de Thomas Friedman


Um pacto entre EUA e Arábia Saudita pode melhorar o entendimento entre Riad e Israel e a Palestina?

Por Thomas Friedman
Atualização:

Apesar das centenas de milhares de defensores da democracia israelense que tentaram bloquear o golpe desferido na segunda-feira pelo primeiro-ministro Binjamin Netanyahu no Judiciário de Israel, a destituição de competência da Suprema Corte para limitar o poder do Executivo certamente parece uma derrota dolorosa. Eu entendo essa dor, mas não me desespero completamente. O socorro poderá vir de conversas entre Estados Unidos e Arábia Saudita.

Sim, você leu corretamente.

Quando entrevistei o presidente Joe Biden no Salão Oval, na semana passada, minha coluna teve como foco suplicar para Netanyahu não enfiar goela abaixo de Israel a reforma no Judiciário sem alguma tentativa de alcançar um consenso nacional. Mas nós não falamos só disso.

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O presidente dos EUA, Joe Biden, em Washington, DC, em 27 de julho de 2023. Foto: BRENDAN SMIALOWSKI / AFP

O presidente estava em dúvida a respeito de perseguir ou não um pacto de segurança mútuo entre EUA e Arábia Saudita que envolveria a normalização das relações entre Riad e Israel contanto que os israelenses abrissem concessões aos palestinos que mantivessem aberta a possibilidade de uma solução de dois Estados.

Após discussões nas semanas recentes entre Biden, seu conselheiro de segurança nacional, Jake Sullivan; o secretário de Estado, Antony Blinken; e Brett McGurk, a mais alta autoridade da Casa Branca para política externa no Oriente Médio, o presidente despachou Sullivan e McGurk para a Arábia Saudita, onde eles chegaram na manhã da quinta-feira para explorar a possibilidade de algum tipo de entendimento entre americanos, sauditas, israelenses e palestinos.

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O presidente ainda não decidiu como irá proceder, mas deu sinal verde para sua equipe sondar o príncipe-herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, especulando se algum tipo de acordo é possível e a que preço. Estabelecer um pacto multinacional dessa estatura requererá tempo, será difícil e complexo mesmo que Biden decida levar a negociação para um novo patamar imediatamente. Mas as conversas preliminares evoluem neste momento — mais rápido do que pensei — e são importantes por duas razões.

Primeiro, um pacto de segurança que produza a normalização das relações entre a Arábia Saudita e o Estado judeu — ao mesmo tempo que esfria as relações sino-sauditas — seria um divisor de águas no Oriente Médio maior do que o tratado de paz assinado em Camp David por Egito e Israel, porque a paz entre Israel e Arábia Saudita, país que governa as duas cidades mais sagradas do Islã, Meca e Medina, abriria caminho para a paz entre Israel e todo o mundo muçulmano, incluindo gigantes como Indonésia e talvez até o Paquistão. Seria um legado significativo da política externa de Biden.

Segundo, se os EUA forjarem uma aliança de segurança com a Arábia Saudita — sob a condição de que Riad normalize as relações com Israel e os israelenses abram concessões significativas para os palestinos — a coalizão de governo de Netanyahu, constituída por supremacistas judeus e extremistas religiosos, teria de responder à seguinte pergunta: Vocês podem anexar a Cisjordânia ou alcançar a paz com a Arábia Saudita e todo o mundo muçulmano, mas não podem ter as duas coisas; então, qual vai ser?

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Isso não renderia debates interessantes nas reuniões do gabinete de Netanyahu neste momento?

Eu adoraria ver o ministro das Finanças de extrema direita de Israel, Bezalel Smotrich, discursar em rede nacional explicando ao povo israelense por que é de interesse de Israel anexar a Cisjordânia e seus 2,9 milhões de habitantes — para sempre — em vez de normalizar as relações com Arábia Saudita e todo o mundo muçulmano. A paz entre sauditas e israelenses poderia reduzir dramaticamente a antipatia entre judeus e muçulmanos originada mais de um século atrás no início do conflito judaico-palestino.

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Mas antes de uma escolha entre anexação e normalização poder ser apresentada a este governo extremista, muita gente tem de concordar a respeito de muita coisa.

Dito isto, Jake Sullivan não viajou a Riad a turismo.

Os sauditas querem três coisas principais de Washington: um tratado de segurança mútua do nível da Otan determinando que os EUA acudam em defesa da Arábia Saudita caso o reino seja atacado (mais provavelmente pelo Irã); um programa civil de energia nuclear monitorado pelos americanos; e a capacidade de comprar as armas americanas mais avançadas — como o sistema antimísseis balísticos Defesa Terminal de Área de Alta Altitude — que seriam particularmente úteis para os sauditas se defenderem do crescente arsenal iraniano de mísseis de médio e longo alcance.

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Os EUA querem dos sauditas, entre outras coisas, o fim dos combates no Iêmen, onde o conflito felizmente diminuiu no ano recente, um imenso pacote de ajuda, sem precedentes, às instituições palestinas na Cisjordânia e limitações significativas na crescente relação entre Arábia Saudita e China.

Por exemplo, os EUA não ficaram nada satisfeitos quando emergiram relatos no ano passado de que a Arábia Saudita considerava aceitar yuan em algumas vendas de petróleo para a China em vez de dólar americano. Com o tempo, dado o peso econômico da China e da Arábia Saudita, isso surtiria um impacto muito negativo sobre o dólar americano enquanto moeda internacional mais importante. Esse movimento teria de ser cancelado.

O presidente dos EUA, Joe Biden (então vice-presidente), e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em 9 de março de 2016.  Foto: Debbie Hill / REUTERS
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Os EUA também querem que os sauditas parem de fazer negócio com gigantes da tecnologia chinesas como Huawei, cujos equipamentos de telecomunicações lançados mais recentemente são banidos nos EUA.

Seria a primeira vez que Washington assinaria um pacto de segurança mútua com um governo não democrático desde que o ex-presidente Dwight Eisenhower firmou o acordo com a Coreia do Sul pré-democrática, em 1953, e a manobra requer aprovação do Senado americano.

Tão importante quanto, porém, é o que os sauditas exigiriam de Israel para preservar a perspectiva da solução de dois Estados — da mesma maneira que os Emirados Árabes Unidos exigiram que Netanyahu abrisse mão de qualquer tipo de anexação da Cisjordânia em troca de seus Acordos de Abraão.

A liderança saudita não está particularmente interessada nos palestinos e não está a par das complexidades do processo de paz.

Mas se a equipe de Biden estabelecer um pacto sem um componente palestino significativo, isso desprenderia simultaneamente um golpe mortal contra o movimento democrático israelense — por dar de presente a Netanyahu um enorme prêmio geopolítico sem nenhum esforço da parte do primeiro-ministro e depois dele fazer algo tão antidemocrático — e contra a solução de dois Estados, o pilar da diplomacia americana no Oriente Médio.

Eu não acredito que Biden fará isso. Um acordo nesses termos ocasionaria uma rebelião na base progressista de seu partido e tornaria sua ratificação praticamente impossível.

“Será muito difícil para o presidente Biden vender qualquer acordo assim para o Congresso americano”, disse-me o senador Chris Van Hollen, democrata de Maryland, que integra a Comissão de Relações Exteriores e a Subcomissão de Estado sobre Operações Estrangeiras, que financia o Departamento de Estado.

“Mas eu posso lhe assegurar que haverá uma forte oposição na base democrata a qualquer proposta que não inclua provisões significativas, claramente definidas e aplicáveis no sentido da preservação da possibilidade da solução de dois Estados e que atendam a demanda do próprio presidente Biden de que palestinos e israelenses desfrutem em igual medida de liberdade e dignidade. Esses elementos são essenciais para qualquer paz duradoura no Oriente Médio.”

Eu acredito que, minimamente, os sauditas e os americanos poderiam (e deveriam) exigir quatro coisas de Netanyahu em troca de um prêmio tão colossal quanto a normalização do comércio com um dos mais importantes Estados muçulmanos:

  • Uma promessa oficial de nunca anexar a Cisjordânia — jamais;
  • Nenhum assentamento colonial a mais na Cisjordânia, nem expansões nos limites dos já existentes;
  • Nenhuma legalização de assentamentos judaicos clandestinos;
  • E transformar o status de parte do território povoado por palestinos na Área C da Cisjordânia (hoje completamente sob controle israelense) em Áreas A e B (sob controle da Autoridade Palestina) — conforme previsto no mapa do caminho estabelecido pelos Acordos de Oslo.
O presidente Biden chegando ao Aeroporto Internacional Rei Abdulaziz em Jedda, na Arábia Saudita, para uma visita que incluiu reuniões com o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, em 15 de julho de 2022. Foto: Doug Mills / NYT

Em troca, a Autoridade Palestina teria de endossar o acordo de paz entre Arábia Saudita e Israel.

Que a verdade seja dita: a Autoridade Palestina não tem condições de negociar de paz com Israel neste momento. Ramallah está uma bagunça. Os palestinos precisam refazer seu governo, mas enquanto não o fazem, os ministros de extrema direita no gabinete de Israel tentam absorver o quanto podem da Cisjordânia o mais rapidamente que conseguem.

A necessidade urgente é parar esse movimento imediatamente — mas não com outra dose de sermões do Departamento de Estado a respeito de quão “profundamente consternados” os EUA ficam com os assentamentos israelenses. Em vez disso, a melhor jogada é uma grande iniciativa estratégica que contenha elementos significativos para todos, exceto os fanáticos de todos os lados.

Em repito: qualquer acordo requererá meses de negociações difíceis entre EUA, Arábia Saudita, Israel e a Autoridade Palestina — e seu sucesso, na melhor das hipóteses, é duvidoso.

Mas se Biden decidir tentar e Washington conseguir pôr na mesa um acordo que atenda imensamente ao interesse estratégico dos EUA, imensamente ao interesse estratégico de Israel e imensamente ao interesse estratégico da Arábia Saudita (admitindo o reino no exclusivíssimo clube de países sob o guarda-chuva americano de segurança) e ressuscitar as esperanças palestinas por uma solução de dois Estados, este acordo será muito, mas muito importante — enorme.

E bem, não seria a cereja do bolo se Netanyahu fosse forçado a abandonar os extremistas de seu gabinete e trabalhar por uma causa comum com a centro-esquerda e a centro-direita de Israel? / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Apesar das centenas de milhares de defensores da democracia israelense que tentaram bloquear o golpe desferido na segunda-feira pelo primeiro-ministro Binjamin Netanyahu no Judiciário de Israel, a destituição de competência da Suprema Corte para limitar o poder do Executivo certamente parece uma derrota dolorosa. Eu entendo essa dor, mas não me desespero completamente. O socorro poderá vir de conversas entre Estados Unidos e Arábia Saudita.

Sim, você leu corretamente.

Quando entrevistei o presidente Joe Biden no Salão Oval, na semana passada, minha coluna teve como foco suplicar para Netanyahu não enfiar goela abaixo de Israel a reforma no Judiciário sem alguma tentativa de alcançar um consenso nacional. Mas nós não falamos só disso.

O presidente dos EUA, Joe Biden, em Washington, DC, em 27 de julho de 2023. Foto: BRENDAN SMIALOWSKI / AFP

O presidente estava em dúvida a respeito de perseguir ou não um pacto de segurança mútuo entre EUA e Arábia Saudita que envolveria a normalização das relações entre Riad e Israel contanto que os israelenses abrissem concessões aos palestinos que mantivessem aberta a possibilidade de uma solução de dois Estados.

Após discussões nas semanas recentes entre Biden, seu conselheiro de segurança nacional, Jake Sullivan; o secretário de Estado, Antony Blinken; e Brett McGurk, a mais alta autoridade da Casa Branca para política externa no Oriente Médio, o presidente despachou Sullivan e McGurk para a Arábia Saudita, onde eles chegaram na manhã da quinta-feira para explorar a possibilidade de algum tipo de entendimento entre americanos, sauditas, israelenses e palestinos.

O presidente ainda não decidiu como irá proceder, mas deu sinal verde para sua equipe sondar o príncipe-herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, especulando se algum tipo de acordo é possível e a que preço. Estabelecer um pacto multinacional dessa estatura requererá tempo, será difícil e complexo mesmo que Biden decida levar a negociação para um novo patamar imediatamente. Mas as conversas preliminares evoluem neste momento — mais rápido do que pensei — e são importantes por duas razões.

Primeiro, um pacto de segurança que produza a normalização das relações entre a Arábia Saudita e o Estado judeu — ao mesmo tempo que esfria as relações sino-sauditas — seria um divisor de águas no Oriente Médio maior do que o tratado de paz assinado em Camp David por Egito e Israel, porque a paz entre Israel e Arábia Saudita, país que governa as duas cidades mais sagradas do Islã, Meca e Medina, abriria caminho para a paz entre Israel e todo o mundo muçulmano, incluindo gigantes como Indonésia e talvez até o Paquistão. Seria um legado significativo da política externa de Biden.

Segundo, se os EUA forjarem uma aliança de segurança com a Arábia Saudita — sob a condição de que Riad normalize as relações com Israel e os israelenses abram concessões significativas para os palestinos — a coalizão de governo de Netanyahu, constituída por supremacistas judeus e extremistas religiosos, teria de responder à seguinte pergunta: Vocês podem anexar a Cisjordânia ou alcançar a paz com a Arábia Saudita e todo o mundo muçulmano, mas não podem ter as duas coisas; então, qual vai ser?

Isso não renderia debates interessantes nas reuniões do gabinete de Netanyahu neste momento?

Eu adoraria ver o ministro das Finanças de extrema direita de Israel, Bezalel Smotrich, discursar em rede nacional explicando ao povo israelense por que é de interesse de Israel anexar a Cisjordânia e seus 2,9 milhões de habitantes — para sempre — em vez de normalizar as relações com Arábia Saudita e todo o mundo muçulmano. A paz entre sauditas e israelenses poderia reduzir dramaticamente a antipatia entre judeus e muçulmanos originada mais de um século atrás no início do conflito judaico-palestino.

Mas antes de uma escolha entre anexação e normalização poder ser apresentada a este governo extremista, muita gente tem de concordar a respeito de muita coisa.

Dito isto, Jake Sullivan não viajou a Riad a turismo.

Os sauditas querem três coisas principais de Washington: um tratado de segurança mútua do nível da Otan determinando que os EUA acudam em defesa da Arábia Saudita caso o reino seja atacado (mais provavelmente pelo Irã); um programa civil de energia nuclear monitorado pelos americanos; e a capacidade de comprar as armas americanas mais avançadas — como o sistema antimísseis balísticos Defesa Terminal de Área de Alta Altitude — que seriam particularmente úteis para os sauditas se defenderem do crescente arsenal iraniano de mísseis de médio e longo alcance.

Os EUA querem dos sauditas, entre outras coisas, o fim dos combates no Iêmen, onde o conflito felizmente diminuiu no ano recente, um imenso pacote de ajuda, sem precedentes, às instituições palestinas na Cisjordânia e limitações significativas na crescente relação entre Arábia Saudita e China.

Por exemplo, os EUA não ficaram nada satisfeitos quando emergiram relatos no ano passado de que a Arábia Saudita considerava aceitar yuan em algumas vendas de petróleo para a China em vez de dólar americano. Com o tempo, dado o peso econômico da China e da Arábia Saudita, isso surtiria um impacto muito negativo sobre o dólar americano enquanto moeda internacional mais importante. Esse movimento teria de ser cancelado.

O presidente dos EUA, Joe Biden (então vice-presidente), e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em 9 de março de 2016.  Foto: Debbie Hill / REUTERS

Os EUA também querem que os sauditas parem de fazer negócio com gigantes da tecnologia chinesas como Huawei, cujos equipamentos de telecomunicações lançados mais recentemente são banidos nos EUA.

Seria a primeira vez que Washington assinaria um pacto de segurança mútua com um governo não democrático desde que o ex-presidente Dwight Eisenhower firmou o acordo com a Coreia do Sul pré-democrática, em 1953, e a manobra requer aprovação do Senado americano.

Tão importante quanto, porém, é o que os sauditas exigiriam de Israel para preservar a perspectiva da solução de dois Estados — da mesma maneira que os Emirados Árabes Unidos exigiram que Netanyahu abrisse mão de qualquer tipo de anexação da Cisjordânia em troca de seus Acordos de Abraão.

A liderança saudita não está particularmente interessada nos palestinos e não está a par das complexidades do processo de paz.

Mas se a equipe de Biden estabelecer um pacto sem um componente palestino significativo, isso desprenderia simultaneamente um golpe mortal contra o movimento democrático israelense — por dar de presente a Netanyahu um enorme prêmio geopolítico sem nenhum esforço da parte do primeiro-ministro e depois dele fazer algo tão antidemocrático — e contra a solução de dois Estados, o pilar da diplomacia americana no Oriente Médio.

Eu não acredito que Biden fará isso. Um acordo nesses termos ocasionaria uma rebelião na base progressista de seu partido e tornaria sua ratificação praticamente impossível.

“Será muito difícil para o presidente Biden vender qualquer acordo assim para o Congresso americano”, disse-me o senador Chris Van Hollen, democrata de Maryland, que integra a Comissão de Relações Exteriores e a Subcomissão de Estado sobre Operações Estrangeiras, que financia o Departamento de Estado.

“Mas eu posso lhe assegurar que haverá uma forte oposição na base democrata a qualquer proposta que não inclua provisões significativas, claramente definidas e aplicáveis no sentido da preservação da possibilidade da solução de dois Estados e que atendam a demanda do próprio presidente Biden de que palestinos e israelenses desfrutem em igual medida de liberdade e dignidade. Esses elementos são essenciais para qualquer paz duradoura no Oriente Médio.”

Eu acredito que, minimamente, os sauditas e os americanos poderiam (e deveriam) exigir quatro coisas de Netanyahu em troca de um prêmio tão colossal quanto a normalização do comércio com um dos mais importantes Estados muçulmanos:

  • Uma promessa oficial de nunca anexar a Cisjordânia — jamais;
  • Nenhum assentamento colonial a mais na Cisjordânia, nem expansões nos limites dos já existentes;
  • Nenhuma legalização de assentamentos judaicos clandestinos;
  • E transformar o status de parte do território povoado por palestinos na Área C da Cisjordânia (hoje completamente sob controle israelense) em Áreas A e B (sob controle da Autoridade Palestina) — conforme previsto no mapa do caminho estabelecido pelos Acordos de Oslo.
O presidente Biden chegando ao Aeroporto Internacional Rei Abdulaziz em Jedda, na Arábia Saudita, para uma visita que incluiu reuniões com o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, em 15 de julho de 2022. Foto: Doug Mills / NYT

Em troca, a Autoridade Palestina teria de endossar o acordo de paz entre Arábia Saudita e Israel.

Que a verdade seja dita: a Autoridade Palestina não tem condições de negociar de paz com Israel neste momento. Ramallah está uma bagunça. Os palestinos precisam refazer seu governo, mas enquanto não o fazem, os ministros de extrema direita no gabinete de Israel tentam absorver o quanto podem da Cisjordânia o mais rapidamente que conseguem.

A necessidade urgente é parar esse movimento imediatamente — mas não com outra dose de sermões do Departamento de Estado a respeito de quão “profundamente consternados” os EUA ficam com os assentamentos israelenses. Em vez disso, a melhor jogada é uma grande iniciativa estratégica que contenha elementos significativos para todos, exceto os fanáticos de todos os lados.

Em repito: qualquer acordo requererá meses de negociações difíceis entre EUA, Arábia Saudita, Israel e a Autoridade Palestina — e seu sucesso, na melhor das hipóteses, é duvidoso.

Mas se Biden decidir tentar e Washington conseguir pôr na mesa um acordo que atenda imensamente ao interesse estratégico dos EUA, imensamente ao interesse estratégico de Israel e imensamente ao interesse estratégico da Arábia Saudita (admitindo o reino no exclusivíssimo clube de países sob o guarda-chuva americano de segurança) e ressuscitar as esperanças palestinas por uma solução de dois Estados, este acordo será muito, mas muito importante — enorme.

E bem, não seria a cereja do bolo se Netanyahu fosse forçado a abandonar os extremistas de seu gabinete e trabalhar por uma causa comum com a centro-esquerda e a centro-direita de Israel? / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Apesar das centenas de milhares de defensores da democracia israelense que tentaram bloquear o golpe desferido na segunda-feira pelo primeiro-ministro Binjamin Netanyahu no Judiciário de Israel, a destituição de competência da Suprema Corte para limitar o poder do Executivo certamente parece uma derrota dolorosa. Eu entendo essa dor, mas não me desespero completamente. O socorro poderá vir de conversas entre Estados Unidos e Arábia Saudita.

Sim, você leu corretamente.

Quando entrevistei o presidente Joe Biden no Salão Oval, na semana passada, minha coluna teve como foco suplicar para Netanyahu não enfiar goela abaixo de Israel a reforma no Judiciário sem alguma tentativa de alcançar um consenso nacional. Mas nós não falamos só disso.

O presidente dos EUA, Joe Biden, em Washington, DC, em 27 de julho de 2023. Foto: BRENDAN SMIALOWSKI / AFP

O presidente estava em dúvida a respeito de perseguir ou não um pacto de segurança mútuo entre EUA e Arábia Saudita que envolveria a normalização das relações entre Riad e Israel contanto que os israelenses abrissem concessões aos palestinos que mantivessem aberta a possibilidade de uma solução de dois Estados.

Após discussões nas semanas recentes entre Biden, seu conselheiro de segurança nacional, Jake Sullivan; o secretário de Estado, Antony Blinken; e Brett McGurk, a mais alta autoridade da Casa Branca para política externa no Oriente Médio, o presidente despachou Sullivan e McGurk para a Arábia Saudita, onde eles chegaram na manhã da quinta-feira para explorar a possibilidade de algum tipo de entendimento entre americanos, sauditas, israelenses e palestinos.

O presidente ainda não decidiu como irá proceder, mas deu sinal verde para sua equipe sondar o príncipe-herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, especulando se algum tipo de acordo é possível e a que preço. Estabelecer um pacto multinacional dessa estatura requererá tempo, será difícil e complexo mesmo que Biden decida levar a negociação para um novo patamar imediatamente. Mas as conversas preliminares evoluem neste momento — mais rápido do que pensei — e são importantes por duas razões.

Primeiro, um pacto de segurança que produza a normalização das relações entre a Arábia Saudita e o Estado judeu — ao mesmo tempo que esfria as relações sino-sauditas — seria um divisor de águas no Oriente Médio maior do que o tratado de paz assinado em Camp David por Egito e Israel, porque a paz entre Israel e Arábia Saudita, país que governa as duas cidades mais sagradas do Islã, Meca e Medina, abriria caminho para a paz entre Israel e todo o mundo muçulmano, incluindo gigantes como Indonésia e talvez até o Paquistão. Seria um legado significativo da política externa de Biden.

Segundo, se os EUA forjarem uma aliança de segurança com a Arábia Saudita — sob a condição de que Riad normalize as relações com Israel e os israelenses abram concessões significativas para os palestinos — a coalizão de governo de Netanyahu, constituída por supremacistas judeus e extremistas religiosos, teria de responder à seguinte pergunta: Vocês podem anexar a Cisjordânia ou alcançar a paz com a Arábia Saudita e todo o mundo muçulmano, mas não podem ter as duas coisas; então, qual vai ser?

Isso não renderia debates interessantes nas reuniões do gabinete de Netanyahu neste momento?

Eu adoraria ver o ministro das Finanças de extrema direita de Israel, Bezalel Smotrich, discursar em rede nacional explicando ao povo israelense por que é de interesse de Israel anexar a Cisjordânia e seus 2,9 milhões de habitantes — para sempre — em vez de normalizar as relações com Arábia Saudita e todo o mundo muçulmano. A paz entre sauditas e israelenses poderia reduzir dramaticamente a antipatia entre judeus e muçulmanos originada mais de um século atrás no início do conflito judaico-palestino.

Mas antes de uma escolha entre anexação e normalização poder ser apresentada a este governo extremista, muita gente tem de concordar a respeito de muita coisa.

Dito isto, Jake Sullivan não viajou a Riad a turismo.

Os sauditas querem três coisas principais de Washington: um tratado de segurança mútua do nível da Otan determinando que os EUA acudam em defesa da Arábia Saudita caso o reino seja atacado (mais provavelmente pelo Irã); um programa civil de energia nuclear monitorado pelos americanos; e a capacidade de comprar as armas americanas mais avançadas — como o sistema antimísseis balísticos Defesa Terminal de Área de Alta Altitude — que seriam particularmente úteis para os sauditas se defenderem do crescente arsenal iraniano de mísseis de médio e longo alcance.

Os EUA querem dos sauditas, entre outras coisas, o fim dos combates no Iêmen, onde o conflito felizmente diminuiu no ano recente, um imenso pacote de ajuda, sem precedentes, às instituições palestinas na Cisjordânia e limitações significativas na crescente relação entre Arábia Saudita e China.

Por exemplo, os EUA não ficaram nada satisfeitos quando emergiram relatos no ano passado de que a Arábia Saudita considerava aceitar yuan em algumas vendas de petróleo para a China em vez de dólar americano. Com o tempo, dado o peso econômico da China e da Arábia Saudita, isso surtiria um impacto muito negativo sobre o dólar americano enquanto moeda internacional mais importante. Esse movimento teria de ser cancelado.

O presidente dos EUA, Joe Biden (então vice-presidente), e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em 9 de março de 2016.  Foto: Debbie Hill / REUTERS

Os EUA também querem que os sauditas parem de fazer negócio com gigantes da tecnologia chinesas como Huawei, cujos equipamentos de telecomunicações lançados mais recentemente são banidos nos EUA.

Seria a primeira vez que Washington assinaria um pacto de segurança mútua com um governo não democrático desde que o ex-presidente Dwight Eisenhower firmou o acordo com a Coreia do Sul pré-democrática, em 1953, e a manobra requer aprovação do Senado americano.

Tão importante quanto, porém, é o que os sauditas exigiriam de Israel para preservar a perspectiva da solução de dois Estados — da mesma maneira que os Emirados Árabes Unidos exigiram que Netanyahu abrisse mão de qualquer tipo de anexação da Cisjordânia em troca de seus Acordos de Abraão.

A liderança saudita não está particularmente interessada nos palestinos e não está a par das complexidades do processo de paz.

Mas se a equipe de Biden estabelecer um pacto sem um componente palestino significativo, isso desprenderia simultaneamente um golpe mortal contra o movimento democrático israelense — por dar de presente a Netanyahu um enorme prêmio geopolítico sem nenhum esforço da parte do primeiro-ministro e depois dele fazer algo tão antidemocrático — e contra a solução de dois Estados, o pilar da diplomacia americana no Oriente Médio.

Eu não acredito que Biden fará isso. Um acordo nesses termos ocasionaria uma rebelião na base progressista de seu partido e tornaria sua ratificação praticamente impossível.

“Será muito difícil para o presidente Biden vender qualquer acordo assim para o Congresso americano”, disse-me o senador Chris Van Hollen, democrata de Maryland, que integra a Comissão de Relações Exteriores e a Subcomissão de Estado sobre Operações Estrangeiras, que financia o Departamento de Estado.

“Mas eu posso lhe assegurar que haverá uma forte oposição na base democrata a qualquer proposta que não inclua provisões significativas, claramente definidas e aplicáveis no sentido da preservação da possibilidade da solução de dois Estados e que atendam a demanda do próprio presidente Biden de que palestinos e israelenses desfrutem em igual medida de liberdade e dignidade. Esses elementos são essenciais para qualquer paz duradoura no Oriente Médio.”

Eu acredito que, minimamente, os sauditas e os americanos poderiam (e deveriam) exigir quatro coisas de Netanyahu em troca de um prêmio tão colossal quanto a normalização do comércio com um dos mais importantes Estados muçulmanos:

  • Uma promessa oficial de nunca anexar a Cisjordânia — jamais;
  • Nenhum assentamento colonial a mais na Cisjordânia, nem expansões nos limites dos já existentes;
  • Nenhuma legalização de assentamentos judaicos clandestinos;
  • E transformar o status de parte do território povoado por palestinos na Área C da Cisjordânia (hoje completamente sob controle israelense) em Áreas A e B (sob controle da Autoridade Palestina) — conforme previsto no mapa do caminho estabelecido pelos Acordos de Oslo.
O presidente Biden chegando ao Aeroporto Internacional Rei Abdulaziz em Jedda, na Arábia Saudita, para uma visita que incluiu reuniões com o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, em 15 de julho de 2022. Foto: Doug Mills / NYT

Em troca, a Autoridade Palestina teria de endossar o acordo de paz entre Arábia Saudita e Israel.

Que a verdade seja dita: a Autoridade Palestina não tem condições de negociar de paz com Israel neste momento. Ramallah está uma bagunça. Os palestinos precisam refazer seu governo, mas enquanto não o fazem, os ministros de extrema direita no gabinete de Israel tentam absorver o quanto podem da Cisjordânia o mais rapidamente que conseguem.

A necessidade urgente é parar esse movimento imediatamente — mas não com outra dose de sermões do Departamento de Estado a respeito de quão “profundamente consternados” os EUA ficam com os assentamentos israelenses. Em vez disso, a melhor jogada é uma grande iniciativa estratégica que contenha elementos significativos para todos, exceto os fanáticos de todos os lados.

Em repito: qualquer acordo requererá meses de negociações difíceis entre EUA, Arábia Saudita, Israel e a Autoridade Palestina — e seu sucesso, na melhor das hipóteses, é duvidoso.

Mas se Biden decidir tentar e Washington conseguir pôr na mesa um acordo que atenda imensamente ao interesse estratégico dos EUA, imensamente ao interesse estratégico de Israel e imensamente ao interesse estratégico da Arábia Saudita (admitindo o reino no exclusivíssimo clube de países sob o guarda-chuva americano de segurança) e ressuscitar as esperanças palestinas por uma solução de dois Estados, este acordo será muito, mas muito importante — enorme.

E bem, não seria a cereja do bolo se Netanyahu fosse forçado a abandonar os extremistas de seu gabinete e trabalhar por uma causa comum com a centro-esquerda e a centro-direita de Israel? / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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