O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, alterou nesta segunda-feira, 23, as sentenças de quase todos os prisioneiros condenados à morte pela justiça federal, apenas um mês antes de o presidente eleito Donald Trump retornar ao Salão Oval com a promessa de voltar com as execuções federais.
Os afetados pela ação de Biden, todos condenados por assassinato, cumprirão prisão perpétua sem possibilidade de liberdade condicional, em vez de enfrentar a execução. De 40 condenados, apenas três, responsáveis por notórios massacres, permanecem com a condenação de pena de morte.
Em 2020, Biden fez uma campanha prometendo acabar com a pena de morte federal. Embora uma legislação proposta nesse sentido não tenha avançado no Congresso durante seu governo, Biden ordenou ao Departamento de Justiça que emitisse uma moratória sobre execuções federais. Treze prisioneiros no corredor da morte federal foram executados durante o primeiro mandato de Trump.
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“Estou mais convencido do que nunca de que devemos acabar com o uso da pena de morte em nível federal”, disse Biden em um comunicado nesta segunda-feira, 23. “Com a consciência limpa, não posso ficar de braços cruzados e permitir que um novo governo retome as execuções que interrompi.”
Biden afirmou que as alterações estão alinhadas com o padrão que ele impôs para interromper execuções “em casos que não envolvem terrorismo e assassinatos em massa motivados pelo ódio”. “Não se enganem: eu condeno esses assassinos, lamento pelas vítimas de seus atos desprezíveis e sofro por todas as famílias que sofreram perdas inimagináveis e irreparáveis”, disse o presidente.
A Casa Branca divulgou declarações de apoio de líderes religiosos, grupos de direitos civis e autoridades policiais, bem como de amigos e familiares das vítimas dos homens no corredor da morte.
“Matar a pessoa que matou meu parceiro policial e melhor amigo não me traria paz alguma”, disse Donnie Oliverio, um policial aposentado, que fez alusão ao fato de Biden ser católico. “O presidente fez o que é certo aqui e o que é consistente com a fé que ele e eu compartilhamos.” Seu parceiro, Bryan Hurst, foi morto a tiros enquanto estava em serviço por Daryl Lawrence durante uma tentativa de assalto a banco em Columbus, Ohio. Lawrence foi condenado à morte em 2006.
Dos 37 homens cujas sentenças foram alteradas, 15 são brancos, 15 são negros, seis são latinos e um é asiático. Eles foram condenados em 16 Estados, incluindo três que aboliram a pena de morte. Nove estão no corredor da morte porque foram condenados por matar outros prisioneiros federais.
Os três condenados que não foram beneficiados pela medida presidencial são Robert D. Bowers, de 52 anos, condenado por matar 11 pessoas em uma sinagoga de Pittsburgh em 2018, Dzhokhar Tsarnaev, de 31 anos, um dos irmãos responsáveis pelo atentado à Maratona de Boston em 2013, e Dylann Roof, de 30 anos, um supremacista branco que matou nove pessoas negras em uma igreja de Charleston em 2015.
Corrida contra o tempo
Diversos grupos, incluindo membros do Partido Democrata e organizações civis, pediram a Biden que alterasse as sentenças de pena de morte. Na semana passada, o presidente americano teve uma ligação com o Papa Francisco. Em uma notícia sobre a ligação, a agência de notícias do Vaticano relatou que o papa expressou “preocupação com aqueles no corredor da morte”. Bispos católicos nos Estados Unidos também pediram a comutação das sentenças de morte.
Trump apoia a pena de morte e, durante sua campanha presidencial de 2024, propôs uma expansão, sugerindo que “traficantes de drogas, traficantes de pessoas” e abusadores sexuais de crianças deveriam ser executados. Durante seu primeiro mandato, o republicano retomou as execuções federais após uma pausa de quase 20 anos; todas as 13 execuções foram realizadas nos últimos seis meses de seu governo. Ele não deu detalhes de como pretende expandir a pena de morte para novos crimes federais.
Biden não repetiu sua promessa de acabar com a pena de morte federal durante sua última campanha. Mas, como presidente, ordenou que o Departamento de Justiça emitisse uma moratória sobre execuções federais. Promotores federais também foram instruídos a não buscar penas de morte, mas o governo Biden reverteu essa posição em janeiro, quando o Departamento de Justiça anunciou que buscaria, pela primeira vez, a pena de morte em um caso federal contra o atirador que, em 2022, matou 10 pessoas negras em um ataque racista a um supermercado em Buffalo. O homem, Payton Gendron, já foi condenado à prisão perpétua por acusações estaduais.
De acordo com o Death Penalty Information Center, desde 1973 pelo menos 200 pessoas nos Estados Unidos condenadas à morte foram exoneradas. Muitas vezes, apelar ao presidente é a última ação que pode poupar a vida de um prisioneiro. No entanto, os poderes de clemência do presidente são limitados àqueles que cometeram crimes federais, uma pequena fração das pessoas condenadas à morte nos Estados Unidos.
Presidentes geralmente ordenam indultos no final de seus mandatos, e Biden enfrentou pressão dos democratas para usar esses poderes de forma mais ampla enquanto ainda pode. O ato de clemência desta segunda-feira ocorre após Biden, neste mês, conceder 1.500 comutações para pessoas em confinamento domiciliar desde a pandemia de coronavírus, um recorde para um único dia.
Biden já concedeu perdões em massa, incluindo para milhares de pessoas condenadas por posse federal de maconha e veteranos condenados por se envolverem em relações homossexuais enquanto serviam nas forças armadas. Nenhuma dessas pessoas ainda estava presa quando foram perdoadas.
Os democratas ainda pressionam Biden, em seus últimos dias no cargo, a conceder mais atos de perdão para aqueles presos sob leis desatualizadas que contribuíram para disparidades nas sentenças relacionadas às drogas e para o encarceramento em massa de negros americanos. Mais de 60 democratas, incluindo aliados próximos, assinaram uma carta no mês passado pedindo que ele ajudasse milhares de pessoas cujas sentenças seriam reduzidas se algumas disposições do First Step Act de Trump fossem aplicadas retroativamente.
O presidente também enfrentou pressão para ajudar aqueles presos por crimes relacionados ao crack, que estariam livres se a droga fosse cocaína em pó. Como senador, Biden trabalhou na legislação de 1986 que impôs essas disparidades nas sentenças. Desde então, ele expressou arrependimento por seu papel.
A representante Ayanna S. Pressley, democrata de Massachusetts, disse em entrevista neste mês que a decisão de não agir sobre clemência representaria um risco político para os democratas.
“Os democratas, em mais de uma ocasião, tentaram argumentar que somos os adultos na sala, mas o povo americano nem sempre acha que somos os combatentes na sala”, disse Pressley. “E isso acontece frequentemente porque temos o poder, mas não o usamos. Poder com medo não é poder algum. E o presidente Biden tem o poder.”
Neste mês, Biden concedeu um perdão total e incondicional a seu filho Hunter Biden, após insistir repetidamente que não faria isso, uma decisão amplamente criticada tanto pelos adversários políticos do presidente quanto por muitos em seu partido.