Uma vitória de Donald Trump em 2024 traz um contexto radicalmente diferente de sua primeira passagem pela Casa Branca. Em 2016, Trump era um outsider que chocou o sistema, mas ainda estava cercado por figuras do establishment republicano que moderaram algumas de suas iniciativas.
Em 2024, porém, ele retorna ao poder com um controle quase absoluto sobre o Partido Republicano e, sem a necessidade de buscar reeleição, está livre para avançar com uma agenda mais personalista e de impacto imediato, moldada exclusivamente para agradar sua base.
Eleições nos EUA
No cenário doméstico, esse retorno de Trump marca uma guinada drástica rumo ao nacionalismo econômico e ao conservadorismo cultural, consolidando um Partido Republicano remodelado em torno de sua liderança. Políticos tradicionais, como Mitch McConnell, foram progressivamente marginalizados, e figuras de destaque do partido hoje são aquelas que demonstram lealdade incondicional a Trump, como seu novo candidato a vice, J.D. Vance.
Ao contrário de Mike Pence, que em 2016 foi escolhido para apaziguar setores conservadores e evangélicos, Vance é um produto do trumpismo, simbolizando a nova elite republicana que responde diretamente a Trump. Com um Congresso mais alinhado e uma Suprema Corte favorável, Trump terá poucos obstáculos institucionais, o que reforça seu poder e limita a capacidade de oposição de influenciar suas decisões.
Na política externa, Trump terá ainda mais liberdade para implementar sua visão transacional e isolacionista, que coloca os interesses imediatos dos EUA acima dos compromissos tradicionais. Durante seu primeiro mandato, Trump demonstrou ceticismo em relação a alianças históricas, como a Otan, e frequentemente questionou o valor de manter compromissos multilaterais. Um novo mandato enfraquece a coesão da Otan e incentivar países europeus a buscarem maior autonomia militar, abrindo espaço para uma fragmentação das políticas de segurança na Europa.
A postura em relação a potências rivais também se tornará mais imprevisível. Com a China, Trump provavelmente intensificará a guerra comercial, impondo tarifas adicionais e favorecendo políticas protecionistas para fortalecer a economia americana.
Esse movimento, no entanto, poderá amplificar as tensões comerciais globais e afetar as cadeias produtivas de parceiros estratégicos. Em relação à Rússia, a relação ambígua de Trump com Vladimir Putin gera preocupações entre os aliados europeus, especialmente entre os países do leste europeu, que podem ver uma retração americana como uma oportunidade para a Rússia expandir sua influência regional.
A presidência de Trump, sem as restrições domesticas que teve no seu primeiro mandato, também terá implicações profundas para o comércio global e as instituições multilaterais. Em seu primeiro mandato, ele já mostrou desprezo por instituições como a Organização Mundial do Comércio (OMC) e adotou uma postura protecionista.
Agora, ele terá liberdade para implementar uma política econômica mais agressiva, incentivando uma guerra comercial global e enfraquecendo instituições que dependem da cooperação americana. Esse cenário força economias como a União Europeia e os países asiáticos a buscarem alternativas, promovendo alianças regionais e redesenhando o comércio global em torno de novos blocos, menos dependentes dos Estados Unidos.
Para o restante do mundo, a reeleição de Trump será uma confirmação de que o trumpismo deixou de ser um fenômeno temporário e se consolidou como uma força duradoura na política americana. A ascensão de Trump e o afastamento dos EUA de compromissos históricos enviariam uma mensagem clara: a liderança americana, que antes era vista como um fator de estabilidade das relações internacionais, agora se tornou volátil e sujeita a oscilações de acordo com os interesses de uma base eleitoral.
Aliados dos EUA, especialmente na Europa e na Ásia, podem intensificar esforços para fortalecer alianças regionais e adotar uma postura de maior independência estratégica, reduzindo a dependência da proteção e do apoio americano.
Em última análise, a vitória de Trump em 2024 representa mais do que um segundo mandato: ela consolidaria uma nova era na política americana, marcada por uma liderança mais personalista e menos comprometida com as normas internacionais.
Para os Estados Unidos, isso significa uma política externa focada em ganhos imediatos e pautada pela unilateralidade. Para o mundo, fica a lição de que as garantias tradicionais de estabilidade americana não são mais certas e que o equilíbrio global terá de se adaptar a um cenário onde o engajamento americano pode desaparecer tão rapidamente quanto emerge.