Opinião|Como a ascensão de Kamala Harris pode afetar o futuro das relações EUA – Brasil


A mudança do cenário político norte-americano não aponta de forma muito clara os rumos de uma possível relação dos EUA especificamente com o Brasil

Por Daniel Buarque

A convenção do Partido Democrata oficializou nesta semana a candidatura da vice-presidente Kamala Harris à Presidência dos EUA. A mudança na candidatura democrata durante uma campanha que já havia começado transformou o cenário político americano, ela assume a posição em uma situação mais confortável do que a do atual presidente, Joe Biden, e pesquisas indicam que ela tem chances de vencer Donald Trump em novembro.

Isso pode ser visto com certo alívio para quem se preocupa com as relações entre os EUA e o resto do mundo, dado que Trump é apontado como um político isolacionista e que poderia ter uma tendência de favorecer governos de extrema-direita e enfraquecer a democracia globalmente.

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De forma geral, Harris é apontada como uma democrata que tende a repetir a visão de hegemonia americana de Biden, mas com uma política “menos arrogante e messiânica”, acreditando que os EUA são uma força importante para o mundo sem precisar atuar como uma autoridade global. Trabalhos escritos por alguns dos seus principais assessores de política externa indicam que ela estaria aberta a um mundo mais multipolar, mais perto do que é defendido pela política externa brasileira atual.

Candidata à presidência Kamala Harris discursa na Convenção Nacional do Partido Democrata. Foto: Jacquelyn Martin/Associated Press

Mas a mudança do cenário político norte-americano não aponta de forma muito clara os rumos de uma possível relação dos EUA especificamente com o Brasil – país que está longe de ser uma prioridade para o governo americano.

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Assim como aconteceu durante o início da candidatura de Biden, o país praticamente não aparece em discursos e análises que tratam sobre as perspectivas de uma política externa americana sob Harris. Apesar de veículos de imprensa brasileiros enfatizarem laços do pai da candidata com o Brasil, considerando sua passagem por Brasília nos anos 1990, as evidências apontam que o país não tem destaque no seu programa de política externa.

Embora Harris possa introduzir nuances pessoais à política externa, espera-se que ela mantenha uma linha de continuidade com as políticas do governo Biden e suas prioridades. Como presidente, ela provavelmente assumiria o governo da maior potência global em meio a duas guerras que parecem não terminar, na Ucrânia e na Faixa de Gaza, e teria que se preocupar em como manter a segurança e a hegemonia do país frente a uma crescente polarização com a China.

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Antes de chegar ao poder, entretanto, a candidatura dela se pauta mais por questões domésticas, e poucas delas tocam mais de perto a realidade brasileira.

Como vice-presidente, Harris se envolveu diretamente em questões cruciais para a América Latina, como a migração, o combate ao crime organizado e as mudanças climáticas. Ela apostou em investimentos para resolver as causas estruturais da imigração para os EUA, o que não teve resultados imediatos. Além disso, sua abordagem, que valoriza o diálogo com parceiros regionais e o fortalecimento das instituições democráticas, sugere um governo focado na cooperação multilateral e no desenvolvimento sustentável na região, mas sem grandes gestos.

Na atual campanha, entretanto, a questão da luta contra o aquecimento global tem tido menos atenção. Ao contrário das eleições de 2020, quando Biden colocou o assunto como foco da disputa e chegou a falar em pressão sobre o Brasil (à época sob Bolsonaro) para proteger a Amazônia, Harris tem se beneficiado de ser vista como mais pragmática do que Trump e evitado parecer excessivamente progressista. Dado o papel crítico da Amazônia no combate às mudanças climáticas, o Brasil poderia enfrentar uma crescente demanda dos EUA por ações concretas para proteger a floresta, especialmente em um contexto de crescente desmatamento e incêndios.

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Ascensão da China, uma das maiores preocupações americanas, pode ser ponto de tensão nas relações Brasil EUA.  Foto: Stringer/AFP

Um ponto de tensão potencial é a abordagem de Harris em relação à China. Como parte de uma estratégia mais ampla dos EUA para conter a influência chinesa, especialmente na América Latina, Harris poderia buscar fortalecer alianças na região, incluindo o Brasil. No entanto, a relação comercial significativa entre Brasil e China poderia complicar essas dinâmicas, levando o Brasil a ter que buscar um equilíbrio em suas relações com as duas potências.

Neste contexto, é preciso considerar ainda casos menos centrais da política externa americana, mas importantes e próximos do Brasil, como a crise na Venezuela. Harris se opôs publicamente ao uso de intervenção militar para garantir que a ajuda entre no país. Ainda assim, criticou a repressão do regime de Nicolás Maduro e pediu que o ditador respeitasse as condições dos Acordos de Barbados, um acordo destinado a estabelecer eleições livres e justas em 2024 no país.

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Ainda que não sejam prioridades da campanha atual, a questão da Venezuela e a luta contra o aquecimento global se encaixam entre as formas como o Brasil pode se colocar como um ator relevante na região. Isso pode fazer com que o país tenha mais relevância na política externa da maior potência global no caso de uma vitória de Harris nas eleições de novembro.

A convenção do Partido Democrata oficializou nesta semana a candidatura da vice-presidente Kamala Harris à Presidência dos EUA. A mudança na candidatura democrata durante uma campanha que já havia começado transformou o cenário político americano, ela assume a posição em uma situação mais confortável do que a do atual presidente, Joe Biden, e pesquisas indicam que ela tem chances de vencer Donald Trump em novembro.

Isso pode ser visto com certo alívio para quem se preocupa com as relações entre os EUA e o resto do mundo, dado que Trump é apontado como um político isolacionista e que poderia ter uma tendência de favorecer governos de extrema-direita e enfraquecer a democracia globalmente.

De forma geral, Harris é apontada como uma democrata que tende a repetir a visão de hegemonia americana de Biden, mas com uma política “menos arrogante e messiânica”, acreditando que os EUA são uma força importante para o mundo sem precisar atuar como uma autoridade global. Trabalhos escritos por alguns dos seus principais assessores de política externa indicam que ela estaria aberta a um mundo mais multipolar, mais perto do que é defendido pela política externa brasileira atual.

Candidata à presidência Kamala Harris discursa na Convenção Nacional do Partido Democrata. Foto: Jacquelyn Martin/Associated Press

Mas a mudança do cenário político norte-americano não aponta de forma muito clara os rumos de uma possível relação dos EUA especificamente com o Brasil – país que está longe de ser uma prioridade para o governo americano.

Assim como aconteceu durante o início da candidatura de Biden, o país praticamente não aparece em discursos e análises que tratam sobre as perspectivas de uma política externa americana sob Harris. Apesar de veículos de imprensa brasileiros enfatizarem laços do pai da candidata com o Brasil, considerando sua passagem por Brasília nos anos 1990, as evidências apontam que o país não tem destaque no seu programa de política externa.

Embora Harris possa introduzir nuances pessoais à política externa, espera-se que ela mantenha uma linha de continuidade com as políticas do governo Biden e suas prioridades. Como presidente, ela provavelmente assumiria o governo da maior potência global em meio a duas guerras que parecem não terminar, na Ucrânia e na Faixa de Gaza, e teria que se preocupar em como manter a segurança e a hegemonia do país frente a uma crescente polarização com a China.

Antes de chegar ao poder, entretanto, a candidatura dela se pauta mais por questões domésticas, e poucas delas tocam mais de perto a realidade brasileira.

Como vice-presidente, Harris se envolveu diretamente em questões cruciais para a América Latina, como a migração, o combate ao crime organizado e as mudanças climáticas. Ela apostou em investimentos para resolver as causas estruturais da imigração para os EUA, o que não teve resultados imediatos. Além disso, sua abordagem, que valoriza o diálogo com parceiros regionais e o fortalecimento das instituições democráticas, sugere um governo focado na cooperação multilateral e no desenvolvimento sustentável na região, mas sem grandes gestos.

Na atual campanha, entretanto, a questão da luta contra o aquecimento global tem tido menos atenção. Ao contrário das eleições de 2020, quando Biden colocou o assunto como foco da disputa e chegou a falar em pressão sobre o Brasil (à época sob Bolsonaro) para proteger a Amazônia, Harris tem se beneficiado de ser vista como mais pragmática do que Trump e evitado parecer excessivamente progressista. Dado o papel crítico da Amazônia no combate às mudanças climáticas, o Brasil poderia enfrentar uma crescente demanda dos EUA por ações concretas para proteger a floresta, especialmente em um contexto de crescente desmatamento e incêndios.

Ascensão da China, uma das maiores preocupações americanas, pode ser ponto de tensão nas relações Brasil EUA.  Foto: Stringer/AFP

Um ponto de tensão potencial é a abordagem de Harris em relação à China. Como parte de uma estratégia mais ampla dos EUA para conter a influência chinesa, especialmente na América Latina, Harris poderia buscar fortalecer alianças na região, incluindo o Brasil. No entanto, a relação comercial significativa entre Brasil e China poderia complicar essas dinâmicas, levando o Brasil a ter que buscar um equilíbrio em suas relações com as duas potências.

Neste contexto, é preciso considerar ainda casos menos centrais da política externa americana, mas importantes e próximos do Brasil, como a crise na Venezuela. Harris se opôs publicamente ao uso de intervenção militar para garantir que a ajuda entre no país. Ainda assim, criticou a repressão do regime de Nicolás Maduro e pediu que o ditador respeitasse as condições dos Acordos de Barbados, um acordo destinado a estabelecer eleições livres e justas em 2024 no país.

Ainda que não sejam prioridades da campanha atual, a questão da Venezuela e a luta contra o aquecimento global se encaixam entre as formas como o Brasil pode se colocar como um ator relevante na região. Isso pode fazer com que o país tenha mais relevância na política externa da maior potência global no caso de uma vitória de Harris nas eleições de novembro.

A convenção do Partido Democrata oficializou nesta semana a candidatura da vice-presidente Kamala Harris à Presidência dos EUA. A mudança na candidatura democrata durante uma campanha que já havia começado transformou o cenário político americano, ela assume a posição em uma situação mais confortável do que a do atual presidente, Joe Biden, e pesquisas indicam que ela tem chances de vencer Donald Trump em novembro.

Isso pode ser visto com certo alívio para quem se preocupa com as relações entre os EUA e o resto do mundo, dado que Trump é apontado como um político isolacionista e que poderia ter uma tendência de favorecer governos de extrema-direita e enfraquecer a democracia globalmente.

De forma geral, Harris é apontada como uma democrata que tende a repetir a visão de hegemonia americana de Biden, mas com uma política “menos arrogante e messiânica”, acreditando que os EUA são uma força importante para o mundo sem precisar atuar como uma autoridade global. Trabalhos escritos por alguns dos seus principais assessores de política externa indicam que ela estaria aberta a um mundo mais multipolar, mais perto do que é defendido pela política externa brasileira atual.

Candidata à presidência Kamala Harris discursa na Convenção Nacional do Partido Democrata. Foto: Jacquelyn Martin/Associated Press

Mas a mudança do cenário político norte-americano não aponta de forma muito clara os rumos de uma possível relação dos EUA especificamente com o Brasil – país que está longe de ser uma prioridade para o governo americano.

Assim como aconteceu durante o início da candidatura de Biden, o país praticamente não aparece em discursos e análises que tratam sobre as perspectivas de uma política externa americana sob Harris. Apesar de veículos de imprensa brasileiros enfatizarem laços do pai da candidata com o Brasil, considerando sua passagem por Brasília nos anos 1990, as evidências apontam que o país não tem destaque no seu programa de política externa.

Embora Harris possa introduzir nuances pessoais à política externa, espera-se que ela mantenha uma linha de continuidade com as políticas do governo Biden e suas prioridades. Como presidente, ela provavelmente assumiria o governo da maior potência global em meio a duas guerras que parecem não terminar, na Ucrânia e na Faixa de Gaza, e teria que se preocupar em como manter a segurança e a hegemonia do país frente a uma crescente polarização com a China.

Antes de chegar ao poder, entretanto, a candidatura dela se pauta mais por questões domésticas, e poucas delas tocam mais de perto a realidade brasileira.

Como vice-presidente, Harris se envolveu diretamente em questões cruciais para a América Latina, como a migração, o combate ao crime organizado e as mudanças climáticas. Ela apostou em investimentos para resolver as causas estruturais da imigração para os EUA, o que não teve resultados imediatos. Além disso, sua abordagem, que valoriza o diálogo com parceiros regionais e o fortalecimento das instituições democráticas, sugere um governo focado na cooperação multilateral e no desenvolvimento sustentável na região, mas sem grandes gestos.

Na atual campanha, entretanto, a questão da luta contra o aquecimento global tem tido menos atenção. Ao contrário das eleições de 2020, quando Biden colocou o assunto como foco da disputa e chegou a falar em pressão sobre o Brasil (à época sob Bolsonaro) para proteger a Amazônia, Harris tem se beneficiado de ser vista como mais pragmática do que Trump e evitado parecer excessivamente progressista. Dado o papel crítico da Amazônia no combate às mudanças climáticas, o Brasil poderia enfrentar uma crescente demanda dos EUA por ações concretas para proteger a floresta, especialmente em um contexto de crescente desmatamento e incêndios.

Ascensão da China, uma das maiores preocupações americanas, pode ser ponto de tensão nas relações Brasil EUA.  Foto: Stringer/AFP

Um ponto de tensão potencial é a abordagem de Harris em relação à China. Como parte de uma estratégia mais ampla dos EUA para conter a influência chinesa, especialmente na América Latina, Harris poderia buscar fortalecer alianças na região, incluindo o Brasil. No entanto, a relação comercial significativa entre Brasil e China poderia complicar essas dinâmicas, levando o Brasil a ter que buscar um equilíbrio em suas relações com as duas potências.

Neste contexto, é preciso considerar ainda casos menos centrais da política externa americana, mas importantes e próximos do Brasil, como a crise na Venezuela. Harris se opôs publicamente ao uso de intervenção militar para garantir que a ajuda entre no país. Ainda assim, criticou a repressão do regime de Nicolás Maduro e pediu que o ditador respeitasse as condições dos Acordos de Barbados, um acordo destinado a estabelecer eleições livres e justas em 2024 no país.

Ainda que não sejam prioridades da campanha atual, a questão da Venezuela e a luta contra o aquecimento global se encaixam entre as formas como o Brasil pode se colocar como um ator relevante na região. Isso pode fazer com que o país tenha mais relevância na política externa da maior potência global no caso de uma vitória de Harris nas eleições de novembro.

Opinião por Daniel Buarque

Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista, doutor em Relações Internacionais do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power, Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)

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