Como a guerra na Ucrânia converteu a Rússia em aliada-júnior da China


País comandado por Vladimir Putin passou a depender mais dos chineses após isolamento imposto pelo Ocidente

Por Ishaan Tharoor

Os líderes autocráticos de China e Rússia parecem estar recuando mais ainda para o mesmo corner. A invasão russa à Ucrânia tornou o presidente russo, Vladimir Putin, persona non grata em toda a Europa e isolou o Kremlin das capitais ocidentais, onde os governos desdobraram uma série de abrangentes sanções contra a Rússia.

A China sob o presidente Xi Jinping, enquanto isso, dificilmente é um pária global. Mas sua escalada de exercícios militares em torno da democrática Taiwan, sua expansiva presença naval por todo o Pacífico e suas implacáveis repressões em Hong Kong e Xinjiang estão colocando Pequim em rota de colisão geopolítica com os Estados Unidos e seus aliados.

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Poucas semanas antes da Rússia lançar sua guerra, Putin e Xi fizeram uma reunião de cúpula e declararam uma parceria “sem limites”. Agora, após um semestre em uma espiral ascendente de tensões, seus governos estão abraçados mais firmemente, expressando sua animosidade contra a influência americana que espreita as esferas que eles percebem como suas.

Vídeo mostra míssil sendo disparado durante exercício militar da China no dia 4 deste mês. Ato foi visto como uma resposta à visita da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, a Taiwan Foto: Eastern Theater Command/AFP

Nesta semana, Zhang Hanhui, embaixador chinês em Moscou, atacou os EUA por supostamente atiçar o conflito na Ucrânia. “Enquanto iniciador e principal instigador da crise ucraniana, o governo americano, ao mesmo tempo que impõe sanções amplas e sem precedentes contra a Rússia, continua a fornecer armas e equipamentos militares para a Ucrânia”, disse Zhang à agência russa estatal de notícias Tass. “Seu objetivo final é exaurir e esmagar a Rússia com uma guerra prolongada e o porrete das sanções.”

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Anteriormente, Dmitri Peskov, secretário de imprensa de Putin, havia fustigado Washington em razão da controvertida visita a Taiwan da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi. “Não é uma linha destinada ao apoio da liberdade e da democracia”, afirmou Peskov. “Isso é pura provocação. É necessário chamar essas manobras do que elas realmente são.”

Alguns analistas, porém, estão começando a expressar o que a relação sino-russa realmente se tornou. Putin pode estar possuído por sonhos neoimperiais sobre o lugar da Rússia na Europa, mas preside uma situação que tem concedido a Pequim constantemente cada vez mais influência sobre Moscou. Longe dos dias da Guerra Fria, em que o Kremlin considerava a China sua “prima pobre”, a Rússia – isolada e combalida – está descambando inexoravelmente para o papel de “parceira-júnior” do gigante asiático.

Este é o argumento sustentado, em uma edição recente da revista Foreign Affairs, por um ensaio de Alexander Gabuev, pesquisador-sênior do Fundo Carnegie para Paz Internacional.

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A guerra na Ucrânia tem tornado a Rússia crescentemente dependente da China: as sanções furtaram dos russos o mercado global para suas exportações e limitaram os parceiros dispostos a exportar para a Rússia. Elas entram na China, cujas importações da Rússia aumentaram, saltando em 80% em maio em comparação com o ano passado, principalmente na forma de petróleo e outros recursos minerais. Já o mercado russo, desprovido de muitos produtos europeus, poderá ser ainda mais inundado por mercadorias e tecnologias chinesas nos meses e até anos adiante.

Gabuev sugeriu que as atuais tendências poderão fazer com que a renminbi chinês (moeda oficial do país), cujo desempenho na bolsa de Moscou já superou o do euro, se torne a “moeda de reserva de facto para a Rússia mesmo sem ser completamente conversível”, portanto “aumentando a dependência de Moscou em relação a Pequim”.

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Desequilíbrios já existentes entre ambos os países estão apenas se amplificando. A China está se aproximando da posição que a Rússia mantém enquanto fornecedora de armamentos para países em desenvolvimento. A Rússia foi compelida a oferecer descontos significativos no petróleo que vende à China, enquanto fabricantes chineses de automóveis — reconhecendo a escassez de opções agora diante dos consumidores russos — elevaram em algumas instâncias os preços dos veículos que vendem à Rússia em 50%. Pequim está tentando evitar violar as sanções do Ocidente sobre a Rússia, mas ainda possui um abundante escopo para aprofundar seus vínculos com a economia russa.

“A guerra na Ucrânia acelerou essas desigualdades na relação econômica e confirmou a subserviência da Rússia em relação a Pequim”, escreveram Thomas Low e Peter Singer no site Defense One. “A China recusou-se a virar as costas para Moscou, mas também não se absteve de capitalizar sobre a dificuldade de sua aliada.”

Complexo residencial bombardeado pela Rússia em Kiev, capital da Ucrânia, no início da guerra, em 18 de março. Apesar de invasão russa, China permanece aliada ao país Foto: Ivor Prickett / NYT
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Gabuev levantou possíveis desdobramentos geopolíticos da súplica russa aos chineses. “Para manter a China feliz, os líderes russos terão pouca escolha a não ser aceitar termos desfavoráveis em negociações comerciais, apoiar as posições chinesas em fóruns internacionais como as Nações Unidas e até limitar as relações de Moscou com outros países, como Índia e Vietnã”, especulou ele.

Mesmo em um cenário remoto em que o próprio Putin cai, é difícil imaginar que realinhamentos tectônicos mais amplos mudariam muito essa situação. “A Rússia está se tornando um imenso Irã eurasiático: consideravelmente isolada, com uma economia menor e tecnologicamente atrasada graças às suas hostilidades com o Ocidente, mas ainda grande importante demais para ser considerada irrelevante”, escreveu Gabuev.

Com a China como maior parceira externa e maior aliada diplomática da Rússia, concluiu Gabuev, “a envelhecida elite governante do Kremlin, curta de visão e com o olhar fixo em Washington, estará ainda mais ávida para atuar como serva da China na ascensão chinesa para se tornar arquirrival dos EUA”.

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Alguns comentaristas belicosos no Ocidente argumentam que as elites políticas dos EUA e da Europa não acreditaram por tempo demais na ameaça representada por esta suposta aliança iliberal. “Até que a descrença no Ocidente seja substituída por uma determinação em resistir, ditadores da Rússia e da China continuarão pressionando, planejando seus grandes ataques e sonhando com futuras vitórias”, escreveu Andrew Michta na seção de opinião do Wall Street Journal destinada para a direita.

Na reação inicial à invasão russa, alguns especialistas ocidentais aventaram a possibilidade da China também se juntar às medidas acionadas contra o Kremlin — ou pelo menos não fazer muito para apoiar a castigada economia russa. Poucos mantêm essa perspectiva agora. Na quinta-feira, em um sinal do naufrágio da influência chinesa na Europa, Estônia e Letônia se retiraram de um “grupo de cooperação” entre 16 países da Europa Central e Oriental constituído pela China.

“A melhor maneira de o Ocidente lidar com o alinhamento sino-russo é reconhecer que esses vínculos são fortes e melhorar sua própria capacidade de resiliência e dissuasão”, escreveu Justyna Szczudlik, analista especializada em China do Instituto Polonês de Assuntos Internacionais. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Os líderes autocráticos de China e Rússia parecem estar recuando mais ainda para o mesmo corner. A invasão russa à Ucrânia tornou o presidente russo, Vladimir Putin, persona non grata em toda a Europa e isolou o Kremlin das capitais ocidentais, onde os governos desdobraram uma série de abrangentes sanções contra a Rússia.

A China sob o presidente Xi Jinping, enquanto isso, dificilmente é um pária global. Mas sua escalada de exercícios militares em torno da democrática Taiwan, sua expansiva presença naval por todo o Pacífico e suas implacáveis repressões em Hong Kong e Xinjiang estão colocando Pequim em rota de colisão geopolítica com os Estados Unidos e seus aliados.

Poucas semanas antes da Rússia lançar sua guerra, Putin e Xi fizeram uma reunião de cúpula e declararam uma parceria “sem limites”. Agora, após um semestre em uma espiral ascendente de tensões, seus governos estão abraçados mais firmemente, expressando sua animosidade contra a influência americana que espreita as esferas que eles percebem como suas.

Vídeo mostra míssil sendo disparado durante exercício militar da China no dia 4 deste mês. Ato foi visto como uma resposta à visita da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, a Taiwan Foto: Eastern Theater Command/AFP

Nesta semana, Zhang Hanhui, embaixador chinês em Moscou, atacou os EUA por supostamente atiçar o conflito na Ucrânia. “Enquanto iniciador e principal instigador da crise ucraniana, o governo americano, ao mesmo tempo que impõe sanções amplas e sem precedentes contra a Rússia, continua a fornecer armas e equipamentos militares para a Ucrânia”, disse Zhang à agência russa estatal de notícias Tass. “Seu objetivo final é exaurir e esmagar a Rússia com uma guerra prolongada e o porrete das sanções.”

Anteriormente, Dmitri Peskov, secretário de imprensa de Putin, havia fustigado Washington em razão da controvertida visita a Taiwan da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi. “Não é uma linha destinada ao apoio da liberdade e da democracia”, afirmou Peskov. “Isso é pura provocação. É necessário chamar essas manobras do que elas realmente são.”

Alguns analistas, porém, estão começando a expressar o que a relação sino-russa realmente se tornou. Putin pode estar possuído por sonhos neoimperiais sobre o lugar da Rússia na Europa, mas preside uma situação que tem concedido a Pequim constantemente cada vez mais influência sobre Moscou. Longe dos dias da Guerra Fria, em que o Kremlin considerava a China sua “prima pobre”, a Rússia – isolada e combalida – está descambando inexoravelmente para o papel de “parceira-júnior” do gigante asiático.

Este é o argumento sustentado, em uma edição recente da revista Foreign Affairs, por um ensaio de Alexander Gabuev, pesquisador-sênior do Fundo Carnegie para Paz Internacional.

A guerra na Ucrânia tem tornado a Rússia crescentemente dependente da China: as sanções furtaram dos russos o mercado global para suas exportações e limitaram os parceiros dispostos a exportar para a Rússia. Elas entram na China, cujas importações da Rússia aumentaram, saltando em 80% em maio em comparação com o ano passado, principalmente na forma de petróleo e outros recursos minerais. Já o mercado russo, desprovido de muitos produtos europeus, poderá ser ainda mais inundado por mercadorias e tecnologias chinesas nos meses e até anos adiante.

Gabuev sugeriu que as atuais tendências poderão fazer com que a renminbi chinês (moeda oficial do país), cujo desempenho na bolsa de Moscou já superou o do euro, se torne a “moeda de reserva de facto para a Rússia mesmo sem ser completamente conversível”, portanto “aumentando a dependência de Moscou em relação a Pequim”.

Desequilíbrios já existentes entre ambos os países estão apenas se amplificando. A China está se aproximando da posição que a Rússia mantém enquanto fornecedora de armamentos para países em desenvolvimento. A Rússia foi compelida a oferecer descontos significativos no petróleo que vende à China, enquanto fabricantes chineses de automóveis — reconhecendo a escassez de opções agora diante dos consumidores russos — elevaram em algumas instâncias os preços dos veículos que vendem à Rússia em 50%. Pequim está tentando evitar violar as sanções do Ocidente sobre a Rússia, mas ainda possui um abundante escopo para aprofundar seus vínculos com a economia russa.

“A guerra na Ucrânia acelerou essas desigualdades na relação econômica e confirmou a subserviência da Rússia em relação a Pequim”, escreveram Thomas Low e Peter Singer no site Defense One. “A China recusou-se a virar as costas para Moscou, mas também não se absteve de capitalizar sobre a dificuldade de sua aliada.”

Complexo residencial bombardeado pela Rússia em Kiev, capital da Ucrânia, no início da guerra, em 18 de março. Apesar de invasão russa, China permanece aliada ao país Foto: Ivor Prickett / NYT

Gabuev levantou possíveis desdobramentos geopolíticos da súplica russa aos chineses. “Para manter a China feliz, os líderes russos terão pouca escolha a não ser aceitar termos desfavoráveis em negociações comerciais, apoiar as posições chinesas em fóruns internacionais como as Nações Unidas e até limitar as relações de Moscou com outros países, como Índia e Vietnã”, especulou ele.

Mesmo em um cenário remoto em que o próprio Putin cai, é difícil imaginar que realinhamentos tectônicos mais amplos mudariam muito essa situação. “A Rússia está se tornando um imenso Irã eurasiático: consideravelmente isolada, com uma economia menor e tecnologicamente atrasada graças às suas hostilidades com o Ocidente, mas ainda grande importante demais para ser considerada irrelevante”, escreveu Gabuev.

Com a China como maior parceira externa e maior aliada diplomática da Rússia, concluiu Gabuev, “a envelhecida elite governante do Kremlin, curta de visão e com o olhar fixo em Washington, estará ainda mais ávida para atuar como serva da China na ascensão chinesa para se tornar arquirrival dos EUA”.

Alguns comentaristas belicosos no Ocidente argumentam que as elites políticas dos EUA e da Europa não acreditaram por tempo demais na ameaça representada por esta suposta aliança iliberal. “Até que a descrença no Ocidente seja substituída por uma determinação em resistir, ditadores da Rússia e da China continuarão pressionando, planejando seus grandes ataques e sonhando com futuras vitórias”, escreveu Andrew Michta na seção de opinião do Wall Street Journal destinada para a direita.

Na reação inicial à invasão russa, alguns especialistas ocidentais aventaram a possibilidade da China também se juntar às medidas acionadas contra o Kremlin — ou pelo menos não fazer muito para apoiar a castigada economia russa. Poucos mantêm essa perspectiva agora. Na quinta-feira, em um sinal do naufrágio da influência chinesa na Europa, Estônia e Letônia se retiraram de um “grupo de cooperação” entre 16 países da Europa Central e Oriental constituído pela China.

“A melhor maneira de o Ocidente lidar com o alinhamento sino-russo é reconhecer que esses vínculos são fortes e melhorar sua própria capacidade de resiliência e dissuasão”, escreveu Justyna Szczudlik, analista especializada em China do Instituto Polonês de Assuntos Internacionais. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Os líderes autocráticos de China e Rússia parecem estar recuando mais ainda para o mesmo corner. A invasão russa à Ucrânia tornou o presidente russo, Vladimir Putin, persona non grata em toda a Europa e isolou o Kremlin das capitais ocidentais, onde os governos desdobraram uma série de abrangentes sanções contra a Rússia.

A China sob o presidente Xi Jinping, enquanto isso, dificilmente é um pária global. Mas sua escalada de exercícios militares em torno da democrática Taiwan, sua expansiva presença naval por todo o Pacífico e suas implacáveis repressões em Hong Kong e Xinjiang estão colocando Pequim em rota de colisão geopolítica com os Estados Unidos e seus aliados.

Poucas semanas antes da Rússia lançar sua guerra, Putin e Xi fizeram uma reunião de cúpula e declararam uma parceria “sem limites”. Agora, após um semestre em uma espiral ascendente de tensões, seus governos estão abraçados mais firmemente, expressando sua animosidade contra a influência americana que espreita as esferas que eles percebem como suas.

Vídeo mostra míssil sendo disparado durante exercício militar da China no dia 4 deste mês. Ato foi visto como uma resposta à visita da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, a Taiwan Foto: Eastern Theater Command/AFP

Nesta semana, Zhang Hanhui, embaixador chinês em Moscou, atacou os EUA por supostamente atiçar o conflito na Ucrânia. “Enquanto iniciador e principal instigador da crise ucraniana, o governo americano, ao mesmo tempo que impõe sanções amplas e sem precedentes contra a Rússia, continua a fornecer armas e equipamentos militares para a Ucrânia”, disse Zhang à agência russa estatal de notícias Tass. “Seu objetivo final é exaurir e esmagar a Rússia com uma guerra prolongada e o porrete das sanções.”

Anteriormente, Dmitri Peskov, secretário de imprensa de Putin, havia fustigado Washington em razão da controvertida visita a Taiwan da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi. “Não é uma linha destinada ao apoio da liberdade e da democracia”, afirmou Peskov. “Isso é pura provocação. É necessário chamar essas manobras do que elas realmente são.”

Alguns analistas, porém, estão começando a expressar o que a relação sino-russa realmente se tornou. Putin pode estar possuído por sonhos neoimperiais sobre o lugar da Rússia na Europa, mas preside uma situação que tem concedido a Pequim constantemente cada vez mais influência sobre Moscou. Longe dos dias da Guerra Fria, em que o Kremlin considerava a China sua “prima pobre”, a Rússia – isolada e combalida – está descambando inexoravelmente para o papel de “parceira-júnior” do gigante asiático.

Este é o argumento sustentado, em uma edição recente da revista Foreign Affairs, por um ensaio de Alexander Gabuev, pesquisador-sênior do Fundo Carnegie para Paz Internacional.

A guerra na Ucrânia tem tornado a Rússia crescentemente dependente da China: as sanções furtaram dos russos o mercado global para suas exportações e limitaram os parceiros dispostos a exportar para a Rússia. Elas entram na China, cujas importações da Rússia aumentaram, saltando em 80% em maio em comparação com o ano passado, principalmente na forma de petróleo e outros recursos minerais. Já o mercado russo, desprovido de muitos produtos europeus, poderá ser ainda mais inundado por mercadorias e tecnologias chinesas nos meses e até anos adiante.

Gabuev sugeriu que as atuais tendências poderão fazer com que a renminbi chinês (moeda oficial do país), cujo desempenho na bolsa de Moscou já superou o do euro, se torne a “moeda de reserva de facto para a Rússia mesmo sem ser completamente conversível”, portanto “aumentando a dependência de Moscou em relação a Pequim”.

Desequilíbrios já existentes entre ambos os países estão apenas se amplificando. A China está se aproximando da posição que a Rússia mantém enquanto fornecedora de armamentos para países em desenvolvimento. A Rússia foi compelida a oferecer descontos significativos no petróleo que vende à China, enquanto fabricantes chineses de automóveis — reconhecendo a escassez de opções agora diante dos consumidores russos — elevaram em algumas instâncias os preços dos veículos que vendem à Rússia em 50%. Pequim está tentando evitar violar as sanções do Ocidente sobre a Rússia, mas ainda possui um abundante escopo para aprofundar seus vínculos com a economia russa.

“A guerra na Ucrânia acelerou essas desigualdades na relação econômica e confirmou a subserviência da Rússia em relação a Pequim”, escreveram Thomas Low e Peter Singer no site Defense One. “A China recusou-se a virar as costas para Moscou, mas também não se absteve de capitalizar sobre a dificuldade de sua aliada.”

Complexo residencial bombardeado pela Rússia em Kiev, capital da Ucrânia, no início da guerra, em 18 de março. Apesar de invasão russa, China permanece aliada ao país Foto: Ivor Prickett / NYT

Gabuev levantou possíveis desdobramentos geopolíticos da súplica russa aos chineses. “Para manter a China feliz, os líderes russos terão pouca escolha a não ser aceitar termos desfavoráveis em negociações comerciais, apoiar as posições chinesas em fóruns internacionais como as Nações Unidas e até limitar as relações de Moscou com outros países, como Índia e Vietnã”, especulou ele.

Mesmo em um cenário remoto em que o próprio Putin cai, é difícil imaginar que realinhamentos tectônicos mais amplos mudariam muito essa situação. “A Rússia está se tornando um imenso Irã eurasiático: consideravelmente isolada, com uma economia menor e tecnologicamente atrasada graças às suas hostilidades com o Ocidente, mas ainda grande importante demais para ser considerada irrelevante”, escreveu Gabuev.

Com a China como maior parceira externa e maior aliada diplomática da Rússia, concluiu Gabuev, “a envelhecida elite governante do Kremlin, curta de visão e com o olhar fixo em Washington, estará ainda mais ávida para atuar como serva da China na ascensão chinesa para se tornar arquirrival dos EUA”.

Alguns comentaristas belicosos no Ocidente argumentam que as elites políticas dos EUA e da Europa não acreditaram por tempo demais na ameaça representada por esta suposta aliança iliberal. “Até que a descrença no Ocidente seja substituída por uma determinação em resistir, ditadores da Rússia e da China continuarão pressionando, planejando seus grandes ataques e sonhando com futuras vitórias”, escreveu Andrew Michta na seção de opinião do Wall Street Journal destinada para a direita.

Na reação inicial à invasão russa, alguns especialistas ocidentais aventaram a possibilidade da China também se juntar às medidas acionadas contra o Kremlin — ou pelo menos não fazer muito para apoiar a castigada economia russa. Poucos mantêm essa perspectiva agora. Na quinta-feira, em um sinal do naufrágio da influência chinesa na Europa, Estônia e Letônia se retiraram de um “grupo de cooperação” entre 16 países da Europa Central e Oriental constituído pela China.

“A melhor maneira de o Ocidente lidar com o alinhamento sino-russo é reconhecer que esses vínculos são fortes e melhorar sua própria capacidade de resiliência e dissuasão”, escreveu Justyna Szczudlik, analista especializada em China do Instituto Polonês de Assuntos Internacionais. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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