WASHINGTON - QuandoRudy Giuliani partiu para tentar coletar informações prejudiciais de rivais do presidenteDonald Trump na Ucrânia, ele recorreu a um nativo da ex-república soviética com quem já tinha um relacionamento comercial lucrativo.
Lev Parnas, um empresário ucraniano-americano com uma série de dívidas e ações judiciais, conhecia Giuliani casualmente há alguns anos dos círculos políticos republicanos. No ano passado, seu relacionamento se aprofundou quando uma empresa que ele ajudou a fundar contratou Giuliani. Segundo o New York Times, sócios de Parnas disseram que ele pagou centenas de milhares de dólares pelo que Giuliani disse se tratar de serviços de consultoria comercial e jurídica.
Enquanto trabalhava com a empresa de Parnas, a Fraud Guarantee, Giuliani confiava cada vez mais no empresário para realizar a busca por evidências na Ucrânia - a pedido de Trump - que minassem a legitimidade da investigação do procurador especialRobert Mueller sobre a interferência da Rússia nas eleições de 2016 e algo para a campanha de reeleição do republicano em 2020.
Giuliani despachou Parnas e um sócio, Igor Fruman, um empresário americano nascido na Bielo-Rússia, para Kiev, a capital ucraniana, onde, segundo o BuzzFeed, eles fizeram grandes incursões em um clube de strip e no Hotel Hilton International. A missão era encontrar pessoas e informações que pudessem ser usadas para minar a investigação sobre a Rússia e também para prejudicar o ex-vice-presidente Joe Biden, hoje um dos pré-candidatos democratas e possível rival de Trump nas eleições.
No ano passado, os dois homens conectaram Giuliani a ucranianos que estavam dispostos a colaborar com os esforços para promover uma narrativa amplamente infundada sobre os Bidens. Eles desempenharam um papel fundamental em uma campanha das forças pró-Trump para pressionar pela remoção da embaixadora dos Estados Unidos na Ucrânia, Marie Yovanovitch, alegando que ela não demonstrou lealdade suficiente ao presidente enquanto cumpria sua agenda lá.
Eles se encontravam regularmente com Giuliani, muitas vezes no hotel Trump International, em Washington. E, durante todo o tempo, eles estavam tentando estabelecer seus próprios esquemas de negócios. Segundo o indiciamento contra eles na quinta-feira, os dois estavam tentando canalizar contribuições ilegais para campanhas nos Estados Unidos de olho em suas próprias atividades políticas e comerciais.
O indiciamento, juntamente com testemunhos e outros documentos, mostra Parnas, Fruman e seus sócios como operadores sem muita sorte, lutando de maneira imprudente para usar suas novas conexões com os mais altos níveis da política americana para obter ganhos financeiros enquanto guiavam Giuliani, o ex-prefeito de Nova York, por uma cultura política ucraniana repleta de alianças autoajustáveis e em constante mutação.
A acusação também forneceu novos detalhes sobre as negociações de Parnas e Fruman, além de dois sócios, incluindo David Correia, que ajudaram Parnas a fundar a Fraud Guarantee, uma empresa de prevenção e mitigação de fraudes que contratou Giuliani. Os quatro homens foram acusados de infringir a lei eleitoral americana ao fazerem financiamento ilegal de campanha, o que estava ligado ao seu plano de alistar funcionários públicos para ajudá-los nos esforços na Ucrânia.
A acusação não cita os nomes de Giuliani ou Trump, mas ajuda a demonstrar como o ex-prefeito, que foi contratado pelo presidente como seu advogado pessoal para atuar no caso da investigação de Mueller, ajudou a direcionar seu cliente para outro caso, envolvendo a Ucrânia, que agora está no centro do inquérito de impeachment que os democratas abriram na Câmara.
As comissões da Câmara que supervisionam o inquérito de impeachment intimaram Giuliani por suas conexões na Ucrânia, incluindo os registros relacionados a Parnas, Fruman e Semyon Kislin, outro empresário nascido naquele país.
Parnas e Fruman foram convidados a comparecer perante os investigadores da Câmara nesta semana, mas se recusaram a fazê-lo. Na quinta-feira, as comissões emitiram intimações pare que eles entreguem seu testemunho por escrito, sem descartar a possibilidade de eles falarem ao Congresso.
Os dois homens conseguiram algo útil de Pete Sessions, então um membro republicano do Congresso do Texas, que não é identificado na acusação. O documento diz que depois de fazer doações substanciais para a campanha do deputado, Parnas pediu ajuda a ele, no ano passado, para pressionar o governo Trump a remover a embaixadora Yovanovitch.
Posteriormente, Sessions escreveu uma carta ao secretário de Estado Mike Pompeo criticando Yovanovitch e buscando sua demissão.
Parnas disse a seus associados que ela não estava aberta a suas propostas relacionadas ao lucrativo negócio de gás na Ucrânia, onde Parnas apresentou um acordo de gás natural ao presidente-executivo da Naftogaz, como noticiou o New York Times no mês passado.
Yovanovitch também foi criticada por um promotor ucraniano, Yuriy Lutsenko. Apresentado a Giuliani por Parnas e Fruman, o promotor desempenhou um papel fundamental para promover investigações sobre os rivais de Trump no seu país.
Embora a acusação não tenha identificado nenhum funcionário pelo nome, ele disse que Parnas, em seu esforço para derrubar Yovanovitch, agiu "pelo menos em parte, a pedido de um ou mais funcionários do governo ucraniano".
Giuliani também disse que prestou consultoria jurídica a Parnas e Fruman depois que suas atuações na Ucrânia os colocaram em conflito com um poderoso oligarca, Ihor Kolomoiski.
Kolomoiski disse em entrevistas na mídia ucraniana que Parnas e Fruman viajaram para vê-lo em Israel em abril, ostensivamente para falar sobre seus planos de vender gás para a Ucrânia. No entanto, disse, os dois homens o pressionaram a marcar uma reunião entre Giuliani e o recém-eleito presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski.
Giuliani estava tentando pressionar Zelenski a concordar em investigar o papel de Biden e seu filho Hunter na Ucrânia.
Ao retornar à Ucrânia, Kolomoiski ameaçou, em maio, a expor Parnas e Fruman. Giuliani, por sua vez, postou no Twitter que o oligarca "difamava" os dois empresáiros. "Eu os aconselhei a apresentar queixa", disse. Ele também alertou a Zelenski para não se cercar de aliados de Kolomoiski.
Parnas, Fruman e Giuliani foram frequentemente vistos juntos no ano passado no hotel Trump International em Washington, e foram ouvidos discutindo projetos de política e energia, incluindo uma iniciativa sobre metano no Usbequistão. Giuliani e seus associados deveriam receber pelo menos US$ 100 mil pelo projeto, sobre o qual Parnas ofereceu conselhos. O projeto não deu certo, disse Giuliani.
Parnas disse em uma entrevista no mês passado que ele e Fruman estavam ajudando Giuliani na Ucrânia e isso "não tinha nada a ver" com seus negócios.
Ele acrescentou: "Meu único negócio com Giuliani foi há muito tempo" e envolveu uma companhia de seguros para a qual Giuliani "ofereceu alguns conselhos". Na quinta-feira, Giuliani parecia, a princípio, reconhecer que prestou consultoria a empresa de Parnas em 2018, mas depois recuou.
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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, chamou o processo de impeachment de ‘farsa’ nesta quarta-feira. No centro do furacão, o principal pré-candidato democrata às eleições Joe Biden apoiou publicamente pela primeira vez o impeachment.
No mês passado, Giuliani buscou minimizar os problemas de financiamento de campanha que Parnas e Fruman enfrentavam. "Eu os encaminhei a um especialista em financiamento de campanhas, que praticamenteresolveu o problema", afirmou ele.
Na quinta-feira, Giuliani disse que não se arrependia de trabalhar com Parnas e Fruman na Ucrânia. "Eu tenho que presumir que eles são inocentes", disse ele, acrescentando: "Existem muitos motivos para tentar difamar as pessoas, então eu não diria que me arrependo."
Em abril de 2018, Parnas e Fruman adquiriram a empresa Global Energy Producers que serviu como um veículo para que eles se envolvessem no comércio de gás natural liquefeito - uma mercadoria que as autoridades americanas há muito tempo instam a Ucrânia a comprar dos Estados Unidos.
Em semanas, a empresa atraiu a atenção nos círculos de financiamento republicanos com as grandes doações para comitês que apoiavam Trump e seus aliados. Ela doou US$ 325 mil ao America First Action, um super PAC pró-Trump; US$ 50 mil para um comitê de ação política afiliado ao candidato endossado por Trump para governador da Flórida em 2018, Ron DeSantis, e US$ 15 mil para um super PAC que apoiou a campanha ao Senado, em 2018, do procurador-geral da Virgínia Ocidental, Patrick Morrisey.
A onda de doações levou um ex-parceiro de negócios de Parnas a processá-lo em uma ação que pedia mais de US$ 510 mil do empresário. / NYT