Como o Brasil e outros países lidam com os segredos sobre óvnis; veja


Transparência em relação aos registros de UFOS na América do Sul, especialmente no Brasil, se destaca em comparação com os EUA, onde a questão é tratada como um segredo governamental

Por Redação
Atualização:

Brasil e Estados Unidos são dois países de proporções continentais, com avistamentos frequentes de óvnis (os objetos voadores não identificados, também conhecidos como UFOs ou UAPs) e comunidades ativas de entusiastas extraterrestres. Mas a forma como cada um responde à maioria das questões fundamentais humanas — como, por exemplo, “nós estamos sozinhos?” — tem sido sido nitidamente diferente.

Nos Estados Unidos, a questão dos fenômenos aéreos não identificados tem sido frequentemente tratada como um segredo governamental bem guardado. Enquanto isso, no Brasil e em grande parte da América do Sul, tem existido uma atitude mais relaxada em relação ao inexplicável, ao direito do público de saber e aos limites da explicação científica. Os relatos de visitas de óvnis no Brasil, por exemplo, podem ser encontradas em um notável arquivo histórico que é registro público, sem necessidade de autorizações de segurança. Qualquer pessoa pode acessar os arquivos.

Os EUA deram um passo nesta direção nos últimos dias, quando o Departamento de Defesa lançou um site que deve servir como um “balcão de informação” sobre casos de avistamentos, à medida em que forem investigados e abertos para o público geral. Em julho, o Congresso realizou uma audiência em que três testemunhas deram seus relatos sobre supostos encontros com fenômenos não identificados.

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Site lançado pelo Pentágono tem vídeos de supostos óvnis. Na imagem, uma filmagem capturada no Sul da Ásia, em que o objeto na direita da imagem foi posteriormente avaliado como uma aeronave comercial. Foto: Reprodução/Defense Visual Information Distribution Service

À medida que os legisladores em Washington pressionam pela mesma transparência que outras partes do mundo desfrutam há anos, as diferenças culturais e nacionalistas entre a forma como os países interpretam os céus e o que é divulgado tornaram-se ainda mais evidentes.

Na América do Sul, pelo menos quatro países — Uruguai, Argentina, Chile e Peru — tem programas públicos de governo que estudam e investigam atividades de óvnis. Argentina e Chile regularmente lançam relatórios sobre registros de identificação de objetos aéreos. A Argentina, desde 2019, possui o Centro de Identificação Aeroespacial, uma reestruturação da antiga Comissão para o Estudo dos Fenômenos Aeroespaciais, criada em 2011.

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No Uruguai, que tem passado detalhes de óvnis aos Estados Unidos desde a década de 1970, os militares dirigem a Comissão de Recepção e Investigação de Denúncias de Objetos Voadores Não Identificados. “Estamos compartilhando as informações com o público desde o início”, disse o coronel Ariel Sánchez, chefe do programa uruguaio. “Acreditamos que as pessoas precisam ser informadas.”

O fato de um país divulgar esse conteúdo, dizem os investigadores, muitas vezes depende de interesses militares. Os Estados Unidos, por exemplo, têm estado frequentemente menos dispostos a divulgar ou a envolver-se publicamente em questões sobre o tema — chegando mesmo a espalhar desinformação na década de 1950 — por medo de ceder uma vantagem estratégica aos adversários e pôr em risco a segurança nacional.

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No Brasil, onde as pesquisas mostram que 33% das pessoas acreditam em vida extraterrestre, os ufólogos não são tratados como malucos. Eles publicam revistas e operam por meio de organizações aparentemente oficiais, como a Comissão Brasileira de Ufólogos. Alguns deles obtiveram audiência perante o Senado no ano passado e se reuniram com alguns dos líderes militares mais importantes do país. Os generais, por sua vez, questionam-se abertamente sobre os extraterrestres, sem medo de escárnio.

Brasil coleciona relatos

Os militares brasileiros começaram a fazer essas perguntas na década de 1950, logo depois que dois jornalistas voltaram de uma viagem no Rio de Janeiro com o que disseram serem fotos extraordinárias. As imagens mostravam um objeto circular voando sobre um morro. Uma delas chegou a ser capa da O Cruzeiro. Mais avistamentos de supostos outros discos voadores surgiram rapidamente. O público estava inquieto por respostas. Os militares lançaram um inquérito e depois realizaram uma conferência pública em 1954 na sua academia nacional no Rio de Janeiro.

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“A questão dos discos voadores”, proclamou diante de um grande público o coronel João Adil Oliveira, um dos oficiais mais respeitados da época, “é séria e merece ser tratada com seriedade”. Os militares não conseguiram refutar as fotos dos jornalistas, nem discernir a proveniência do disco. Anos mais tarde, alguns ufólogos afirmaram que as fotos tinham sido falsificadas, embora a questão segue sendo calorosamente debatida pelos entusiastas.

Na década de 1950, fotos que mostravam um objeto circular voando sobre um morro na Barra da Tijuca foram divulgadas. As imagens foram desmentidas posteriormente. Foto: Arquivo Nacional do Brasil

Nas décadas que se seguiram, a forma como os militares trataram os relatos de avistamentos subsequentes foi, em grande parte, uma função do compromisso nacional com a transparência. Durante a ditadura militar, a maior parte das informações foi restrita. Mas com a volta da democracia e, particularmente após a aprovação da Lei de Acesso à Informação em 2011, os brasileiros fizeram uso do seu novo direito, solicitando de forma prioritária o acesso aos registos de óvnis.

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Em 2013, os militares brasileiros foram inundados de pedidos sobre arquivos envolvendo óvnis. Com o aumento da pressão, o então ministro da Defesa e atual assessor sênior do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Celso Amorim, assinou uma reunião com ufólogos brasileiros e depois ordenou a transferência de um vasto tesouro de registros de para os arquivos nacionais para acesso público.

Pela primeira vez, pesquisadores e ufólogos do País puderam esmiuçar os incidentes mais curiosos da história recente local. Alguns provaram ser fraudes ou foram facilmente explicados. Mas em outros, as questões persistiam. Um deles envolveu a comunidade amazônica de Colares, no Pará que, em 1977, foi tomada pelo pânico. Moradores diziam que os rios da região haviam sido invadidos por objetos voadores e luminosos. Eles lançaram feixes de luz sobre as pessoas que, segundo registros militares, relataram sintomas de paralisia e tontura.

Uma unidade militar foi enviada para investigar. Ficou quatro meses na região. A equipe fotografou as luzes voadoras, entrevistou dezenas de pessoas e escreveu extensos relatórios que incluíam desenhos da aeronave luminosa que, em notas desclassificadas, pareciam bolas de futebol americano voadoras. Os observadores militares disseram que o que viram desafiava qualquer explicação. “Sentimos que não chegámos a uma conclusão completamente satisfatória”, escreveu João Flavio de Freitas Costa no seu relatório de Novembro de 1977.

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Outros relatos envolveram o que viria a ser conhecido aqui como a “Noite Oficial dos óvnis”. Ocorreu em maio de 1986, quando 21 objetos voadores separados foram relatados em todo o sudeste do Brasil. Centenas de pessoas testemunharam os objetos voadores. Uma piloto, enquanto estava no ar, fez uma chamada para uma torre de controle. “Estou vendo três deles agora”, disse o piloto, segundo a gravação. Questionado se poderia ser uma estrela cadente, ele responde: “Uma estrela cadente que fica parada?” ele disse. “É lindo. Muda de vermelho para amarelo. … Olha para eles. Estou com calafrios”.

Os militares enviaram aviões para interceptar os objetos. “São fenômenos sólidos e refletem uma certa inteligência”, escreveu o comandante José Pessoa Calvalcanti de Albuquerque em um relatório confidencial datado de 2 de junho de 1986, “pela sua capacidade de acompanhar e manter distância dos observadores e por voarem em formação”.

O ET de Varginha

Mas mesmo em um país amplamente aberto à discussão e investigação de fenômenos não identificados, nem todos os assuntos foram totalmente divulgados. Faltam nos arquivos, dizem os ufólogos, fotografias militares e vídeos dos orbes que visitaram a comunidade ribeirinha amazônica, bem como documentos militares relativos ao talvez mais notório suposto encontro, o famoso ET de Varginha.

Varginha, em Minas Gerais, ficou conhecida quando um ET supostamente apareceu na cidade. Uma caixa d'água em formato de nave espacial, que simboliza a fama da cidade, foi inaugurada pela prefeitura. Foto: Ronaldo Carvalho/Futura Press

Em janeiro de 1996, três jovens afirmaram ter visto uma criatura bípede enquanto caminhavam por um terreno baldio na cidade de Varginha, em Minas Gerais. Não era humano nem animal, alegaram. A história deixou a cidade de 140 mil habitantes em estado de agitação e gerou rumores selvagens. As pessoas alegaram que se tratava de um alienígena que, após o avistamento, foi capturado pelos militares e escondido.

Anos depois, Kátia Andrade Xavier, uma das três jovens, disse que foi ridicularizada por sua história. Poucos empregadores queriam contratá-la. As pessoas, ela disse, a chamavam de louca, mentirosa, demoníaca. Mas agora, com mais países fazendo mais perguntas sobre óvnis, ela disse que está sendo recebida de forma diferente. “As pessoas estão vendo minha história de maneira completamente diferente”, disse ela. “Me sinto realizado. Eu estou feliz.”/Washington Post.

Brasil e Estados Unidos são dois países de proporções continentais, com avistamentos frequentes de óvnis (os objetos voadores não identificados, também conhecidos como UFOs ou UAPs) e comunidades ativas de entusiastas extraterrestres. Mas a forma como cada um responde à maioria das questões fundamentais humanas — como, por exemplo, “nós estamos sozinhos?” — tem sido sido nitidamente diferente.

Nos Estados Unidos, a questão dos fenômenos aéreos não identificados tem sido frequentemente tratada como um segredo governamental bem guardado. Enquanto isso, no Brasil e em grande parte da América do Sul, tem existido uma atitude mais relaxada em relação ao inexplicável, ao direito do público de saber e aos limites da explicação científica. Os relatos de visitas de óvnis no Brasil, por exemplo, podem ser encontradas em um notável arquivo histórico que é registro público, sem necessidade de autorizações de segurança. Qualquer pessoa pode acessar os arquivos.

Os EUA deram um passo nesta direção nos últimos dias, quando o Departamento de Defesa lançou um site que deve servir como um “balcão de informação” sobre casos de avistamentos, à medida em que forem investigados e abertos para o público geral. Em julho, o Congresso realizou uma audiência em que três testemunhas deram seus relatos sobre supostos encontros com fenômenos não identificados.

Site lançado pelo Pentágono tem vídeos de supostos óvnis. Na imagem, uma filmagem capturada no Sul da Ásia, em que o objeto na direita da imagem foi posteriormente avaliado como uma aeronave comercial. Foto: Reprodução/Defense Visual Information Distribution Service

À medida que os legisladores em Washington pressionam pela mesma transparência que outras partes do mundo desfrutam há anos, as diferenças culturais e nacionalistas entre a forma como os países interpretam os céus e o que é divulgado tornaram-se ainda mais evidentes.

Na América do Sul, pelo menos quatro países — Uruguai, Argentina, Chile e Peru — tem programas públicos de governo que estudam e investigam atividades de óvnis. Argentina e Chile regularmente lançam relatórios sobre registros de identificação de objetos aéreos. A Argentina, desde 2019, possui o Centro de Identificação Aeroespacial, uma reestruturação da antiga Comissão para o Estudo dos Fenômenos Aeroespaciais, criada em 2011.

No Uruguai, que tem passado detalhes de óvnis aos Estados Unidos desde a década de 1970, os militares dirigem a Comissão de Recepção e Investigação de Denúncias de Objetos Voadores Não Identificados. “Estamos compartilhando as informações com o público desde o início”, disse o coronel Ariel Sánchez, chefe do programa uruguaio. “Acreditamos que as pessoas precisam ser informadas.”

O fato de um país divulgar esse conteúdo, dizem os investigadores, muitas vezes depende de interesses militares. Os Estados Unidos, por exemplo, têm estado frequentemente menos dispostos a divulgar ou a envolver-se publicamente em questões sobre o tema — chegando mesmo a espalhar desinformação na década de 1950 — por medo de ceder uma vantagem estratégica aos adversários e pôr em risco a segurança nacional.

No Brasil, onde as pesquisas mostram que 33% das pessoas acreditam em vida extraterrestre, os ufólogos não são tratados como malucos. Eles publicam revistas e operam por meio de organizações aparentemente oficiais, como a Comissão Brasileira de Ufólogos. Alguns deles obtiveram audiência perante o Senado no ano passado e se reuniram com alguns dos líderes militares mais importantes do país. Os generais, por sua vez, questionam-se abertamente sobre os extraterrestres, sem medo de escárnio.

Brasil coleciona relatos

Os militares brasileiros começaram a fazer essas perguntas na década de 1950, logo depois que dois jornalistas voltaram de uma viagem no Rio de Janeiro com o que disseram serem fotos extraordinárias. As imagens mostravam um objeto circular voando sobre um morro. Uma delas chegou a ser capa da O Cruzeiro. Mais avistamentos de supostos outros discos voadores surgiram rapidamente. O público estava inquieto por respostas. Os militares lançaram um inquérito e depois realizaram uma conferência pública em 1954 na sua academia nacional no Rio de Janeiro.

“A questão dos discos voadores”, proclamou diante de um grande público o coronel João Adil Oliveira, um dos oficiais mais respeitados da época, “é séria e merece ser tratada com seriedade”. Os militares não conseguiram refutar as fotos dos jornalistas, nem discernir a proveniência do disco. Anos mais tarde, alguns ufólogos afirmaram que as fotos tinham sido falsificadas, embora a questão segue sendo calorosamente debatida pelos entusiastas.

Na década de 1950, fotos que mostravam um objeto circular voando sobre um morro na Barra da Tijuca foram divulgadas. As imagens foram desmentidas posteriormente. Foto: Arquivo Nacional do Brasil

Nas décadas que se seguiram, a forma como os militares trataram os relatos de avistamentos subsequentes foi, em grande parte, uma função do compromisso nacional com a transparência. Durante a ditadura militar, a maior parte das informações foi restrita. Mas com a volta da democracia e, particularmente após a aprovação da Lei de Acesso à Informação em 2011, os brasileiros fizeram uso do seu novo direito, solicitando de forma prioritária o acesso aos registos de óvnis.

Em 2013, os militares brasileiros foram inundados de pedidos sobre arquivos envolvendo óvnis. Com o aumento da pressão, o então ministro da Defesa e atual assessor sênior do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Celso Amorim, assinou uma reunião com ufólogos brasileiros e depois ordenou a transferência de um vasto tesouro de registros de para os arquivos nacionais para acesso público.

Pela primeira vez, pesquisadores e ufólogos do País puderam esmiuçar os incidentes mais curiosos da história recente local. Alguns provaram ser fraudes ou foram facilmente explicados. Mas em outros, as questões persistiam. Um deles envolveu a comunidade amazônica de Colares, no Pará que, em 1977, foi tomada pelo pânico. Moradores diziam que os rios da região haviam sido invadidos por objetos voadores e luminosos. Eles lançaram feixes de luz sobre as pessoas que, segundo registros militares, relataram sintomas de paralisia e tontura.

Uma unidade militar foi enviada para investigar. Ficou quatro meses na região. A equipe fotografou as luzes voadoras, entrevistou dezenas de pessoas e escreveu extensos relatórios que incluíam desenhos da aeronave luminosa que, em notas desclassificadas, pareciam bolas de futebol americano voadoras. Os observadores militares disseram que o que viram desafiava qualquer explicação. “Sentimos que não chegámos a uma conclusão completamente satisfatória”, escreveu João Flavio de Freitas Costa no seu relatório de Novembro de 1977.

Outros relatos envolveram o que viria a ser conhecido aqui como a “Noite Oficial dos óvnis”. Ocorreu em maio de 1986, quando 21 objetos voadores separados foram relatados em todo o sudeste do Brasil. Centenas de pessoas testemunharam os objetos voadores. Uma piloto, enquanto estava no ar, fez uma chamada para uma torre de controle. “Estou vendo três deles agora”, disse o piloto, segundo a gravação. Questionado se poderia ser uma estrela cadente, ele responde: “Uma estrela cadente que fica parada?” ele disse. “É lindo. Muda de vermelho para amarelo. … Olha para eles. Estou com calafrios”.

Os militares enviaram aviões para interceptar os objetos. “São fenômenos sólidos e refletem uma certa inteligência”, escreveu o comandante José Pessoa Calvalcanti de Albuquerque em um relatório confidencial datado de 2 de junho de 1986, “pela sua capacidade de acompanhar e manter distância dos observadores e por voarem em formação”.

O ET de Varginha

Mas mesmo em um país amplamente aberto à discussão e investigação de fenômenos não identificados, nem todos os assuntos foram totalmente divulgados. Faltam nos arquivos, dizem os ufólogos, fotografias militares e vídeos dos orbes que visitaram a comunidade ribeirinha amazônica, bem como documentos militares relativos ao talvez mais notório suposto encontro, o famoso ET de Varginha.

Varginha, em Minas Gerais, ficou conhecida quando um ET supostamente apareceu na cidade. Uma caixa d'água em formato de nave espacial, que simboliza a fama da cidade, foi inaugurada pela prefeitura. Foto: Ronaldo Carvalho/Futura Press

Em janeiro de 1996, três jovens afirmaram ter visto uma criatura bípede enquanto caminhavam por um terreno baldio na cidade de Varginha, em Minas Gerais. Não era humano nem animal, alegaram. A história deixou a cidade de 140 mil habitantes em estado de agitação e gerou rumores selvagens. As pessoas alegaram que se tratava de um alienígena que, após o avistamento, foi capturado pelos militares e escondido.

Anos depois, Kátia Andrade Xavier, uma das três jovens, disse que foi ridicularizada por sua história. Poucos empregadores queriam contratá-la. As pessoas, ela disse, a chamavam de louca, mentirosa, demoníaca. Mas agora, com mais países fazendo mais perguntas sobre óvnis, ela disse que está sendo recebida de forma diferente. “As pessoas estão vendo minha história de maneira completamente diferente”, disse ela. “Me sinto realizado. Eu estou feliz.”/Washington Post.

Brasil e Estados Unidos são dois países de proporções continentais, com avistamentos frequentes de óvnis (os objetos voadores não identificados, também conhecidos como UFOs ou UAPs) e comunidades ativas de entusiastas extraterrestres. Mas a forma como cada um responde à maioria das questões fundamentais humanas — como, por exemplo, “nós estamos sozinhos?” — tem sido sido nitidamente diferente.

Nos Estados Unidos, a questão dos fenômenos aéreos não identificados tem sido frequentemente tratada como um segredo governamental bem guardado. Enquanto isso, no Brasil e em grande parte da América do Sul, tem existido uma atitude mais relaxada em relação ao inexplicável, ao direito do público de saber e aos limites da explicação científica. Os relatos de visitas de óvnis no Brasil, por exemplo, podem ser encontradas em um notável arquivo histórico que é registro público, sem necessidade de autorizações de segurança. Qualquer pessoa pode acessar os arquivos.

Os EUA deram um passo nesta direção nos últimos dias, quando o Departamento de Defesa lançou um site que deve servir como um “balcão de informação” sobre casos de avistamentos, à medida em que forem investigados e abertos para o público geral. Em julho, o Congresso realizou uma audiência em que três testemunhas deram seus relatos sobre supostos encontros com fenômenos não identificados.

Site lançado pelo Pentágono tem vídeos de supostos óvnis. Na imagem, uma filmagem capturada no Sul da Ásia, em que o objeto na direita da imagem foi posteriormente avaliado como uma aeronave comercial. Foto: Reprodução/Defense Visual Information Distribution Service

À medida que os legisladores em Washington pressionam pela mesma transparência que outras partes do mundo desfrutam há anos, as diferenças culturais e nacionalistas entre a forma como os países interpretam os céus e o que é divulgado tornaram-se ainda mais evidentes.

Na América do Sul, pelo menos quatro países — Uruguai, Argentina, Chile e Peru — tem programas públicos de governo que estudam e investigam atividades de óvnis. Argentina e Chile regularmente lançam relatórios sobre registros de identificação de objetos aéreos. A Argentina, desde 2019, possui o Centro de Identificação Aeroespacial, uma reestruturação da antiga Comissão para o Estudo dos Fenômenos Aeroespaciais, criada em 2011.

No Uruguai, que tem passado detalhes de óvnis aos Estados Unidos desde a década de 1970, os militares dirigem a Comissão de Recepção e Investigação de Denúncias de Objetos Voadores Não Identificados. “Estamos compartilhando as informações com o público desde o início”, disse o coronel Ariel Sánchez, chefe do programa uruguaio. “Acreditamos que as pessoas precisam ser informadas.”

O fato de um país divulgar esse conteúdo, dizem os investigadores, muitas vezes depende de interesses militares. Os Estados Unidos, por exemplo, têm estado frequentemente menos dispostos a divulgar ou a envolver-se publicamente em questões sobre o tema — chegando mesmo a espalhar desinformação na década de 1950 — por medo de ceder uma vantagem estratégica aos adversários e pôr em risco a segurança nacional.

No Brasil, onde as pesquisas mostram que 33% das pessoas acreditam em vida extraterrestre, os ufólogos não são tratados como malucos. Eles publicam revistas e operam por meio de organizações aparentemente oficiais, como a Comissão Brasileira de Ufólogos. Alguns deles obtiveram audiência perante o Senado no ano passado e se reuniram com alguns dos líderes militares mais importantes do país. Os generais, por sua vez, questionam-se abertamente sobre os extraterrestres, sem medo de escárnio.

Brasil coleciona relatos

Os militares brasileiros começaram a fazer essas perguntas na década de 1950, logo depois que dois jornalistas voltaram de uma viagem no Rio de Janeiro com o que disseram serem fotos extraordinárias. As imagens mostravam um objeto circular voando sobre um morro. Uma delas chegou a ser capa da O Cruzeiro. Mais avistamentos de supostos outros discos voadores surgiram rapidamente. O público estava inquieto por respostas. Os militares lançaram um inquérito e depois realizaram uma conferência pública em 1954 na sua academia nacional no Rio de Janeiro.

“A questão dos discos voadores”, proclamou diante de um grande público o coronel João Adil Oliveira, um dos oficiais mais respeitados da época, “é séria e merece ser tratada com seriedade”. Os militares não conseguiram refutar as fotos dos jornalistas, nem discernir a proveniência do disco. Anos mais tarde, alguns ufólogos afirmaram que as fotos tinham sido falsificadas, embora a questão segue sendo calorosamente debatida pelos entusiastas.

Na década de 1950, fotos que mostravam um objeto circular voando sobre um morro na Barra da Tijuca foram divulgadas. As imagens foram desmentidas posteriormente. Foto: Arquivo Nacional do Brasil

Nas décadas que se seguiram, a forma como os militares trataram os relatos de avistamentos subsequentes foi, em grande parte, uma função do compromisso nacional com a transparência. Durante a ditadura militar, a maior parte das informações foi restrita. Mas com a volta da democracia e, particularmente após a aprovação da Lei de Acesso à Informação em 2011, os brasileiros fizeram uso do seu novo direito, solicitando de forma prioritária o acesso aos registos de óvnis.

Em 2013, os militares brasileiros foram inundados de pedidos sobre arquivos envolvendo óvnis. Com o aumento da pressão, o então ministro da Defesa e atual assessor sênior do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Celso Amorim, assinou uma reunião com ufólogos brasileiros e depois ordenou a transferência de um vasto tesouro de registros de para os arquivos nacionais para acesso público.

Pela primeira vez, pesquisadores e ufólogos do País puderam esmiuçar os incidentes mais curiosos da história recente local. Alguns provaram ser fraudes ou foram facilmente explicados. Mas em outros, as questões persistiam. Um deles envolveu a comunidade amazônica de Colares, no Pará que, em 1977, foi tomada pelo pânico. Moradores diziam que os rios da região haviam sido invadidos por objetos voadores e luminosos. Eles lançaram feixes de luz sobre as pessoas que, segundo registros militares, relataram sintomas de paralisia e tontura.

Uma unidade militar foi enviada para investigar. Ficou quatro meses na região. A equipe fotografou as luzes voadoras, entrevistou dezenas de pessoas e escreveu extensos relatórios que incluíam desenhos da aeronave luminosa que, em notas desclassificadas, pareciam bolas de futebol americano voadoras. Os observadores militares disseram que o que viram desafiava qualquer explicação. “Sentimos que não chegámos a uma conclusão completamente satisfatória”, escreveu João Flavio de Freitas Costa no seu relatório de Novembro de 1977.

Outros relatos envolveram o que viria a ser conhecido aqui como a “Noite Oficial dos óvnis”. Ocorreu em maio de 1986, quando 21 objetos voadores separados foram relatados em todo o sudeste do Brasil. Centenas de pessoas testemunharam os objetos voadores. Uma piloto, enquanto estava no ar, fez uma chamada para uma torre de controle. “Estou vendo três deles agora”, disse o piloto, segundo a gravação. Questionado se poderia ser uma estrela cadente, ele responde: “Uma estrela cadente que fica parada?” ele disse. “É lindo. Muda de vermelho para amarelo. … Olha para eles. Estou com calafrios”.

Os militares enviaram aviões para interceptar os objetos. “São fenômenos sólidos e refletem uma certa inteligência”, escreveu o comandante José Pessoa Calvalcanti de Albuquerque em um relatório confidencial datado de 2 de junho de 1986, “pela sua capacidade de acompanhar e manter distância dos observadores e por voarem em formação”.

O ET de Varginha

Mas mesmo em um país amplamente aberto à discussão e investigação de fenômenos não identificados, nem todos os assuntos foram totalmente divulgados. Faltam nos arquivos, dizem os ufólogos, fotografias militares e vídeos dos orbes que visitaram a comunidade ribeirinha amazônica, bem como documentos militares relativos ao talvez mais notório suposto encontro, o famoso ET de Varginha.

Varginha, em Minas Gerais, ficou conhecida quando um ET supostamente apareceu na cidade. Uma caixa d'água em formato de nave espacial, que simboliza a fama da cidade, foi inaugurada pela prefeitura. Foto: Ronaldo Carvalho/Futura Press

Em janeiro de 1996, três jovens afirmaram ter visto uma criatura bípede enquanto caminhavam por um terreno baldio na cidade de Varginha, em Minas Gerais. Não era humano nem animal, alegaram. A história deixou a cidade de 140 mil habitantes em estado de agitação e gerou rumores selvagens. As pessoas alegaram que se tratava de um alienígena que, após o avistamento, foi capturado pelos militares e escondido.

Anos depois, Kátia Andrade Xavier, uma das três jovens, disse que foi ridicularizada por sua história. Poucos empregadores queriam contratá-la. As pessoas, ela disse, a chamavam de louca, mentirosa, demoníaca. Mas agora, com mais países fazendo mais perguntas sobre óvnis, ela disse que está sendo recebida de forma diferente. “As pessoas estão vendo minha história de maneira completamente diferente”, disse ela. “Me sinto realizado. Eu estou feliz.”/Washington Post.

Brasil e Estados Unidos são dois países de proporções continentais, com avistamentos frequentes de óvnis (os objetos voadores não identificados, também conhecidos como UFOs ou UAPs) e comunidades ativas de entusiastas extraterrestres. Mas a forma como cada um responde à maioria das questões fundamentais humanas — como, por exemplo, “nós estamos sozinhos?” — tem sido sido nitidamente diferente.

Nos Estados Unidos, a questão dos fenômenos aéreos não identificados tem sido frequentemente tratada como um segredo governamental bem guardado. Enquanto isso, no Brasil e em grande parte da América do Sul, tem existido uma atitude mais relaxada em relação ao inexplicável, ao direito do público de saber e aos limites da explicação científica. Os relatos de visitas de óvnis no Brasil, por exemplo, podem ser encontradas em um notável arquivo histórico que é registro público, sem necessidade de autorizações de segurança. Qualquer pessoa pode acessar os arquivos.

Os EUA deram um passo nesta direção nos últimos dias, quando o Departamento de Defesa lançou um site que deve servir como um “balcão de informação” sobre casos de avistamentos, à medida em que forem investigados e abertos para o público geral. Em julho, o Congresso realizou uma audiência em que três testemunhas deram seus relatos sobre supostos encontros com fenômenos não identificados.

Site lançado pelo Pentágono tem vídeos de supostos óvnis. Na imagem, uma filmagem capturada no Sul da Ásia, em que o objeto na direita da imagem foi posteriormente avaliado como uma aeronave comercial. Foto: Reprodução/Defense Visual Information Distribution Service

À medida que os legisladores em Washington pressionam pela mesma transparência que outras partes do mundo desfrutam há anos, as diferenças culturais e nacionalistas entre a forma como os países interpretam os céus e o que é divulgado tornaram-se ainda mais evidentes.

Na América do Sul, pelo menos quatro países — Uruguai, Argentina, Chile e Peru — tem programas públicos de governo que estudam e investigam atividades de óvnis. Argentina e Chile regularmente lançam relatórios sobre registros de identificação de objetos aéreos. A Argentina, desde 2019, possui o Centro de Identificação Aeroespacial, uma reestruturação da antiga Comissão para o Estudo dos Fenômenos Aeroespaciais, criada em 2011.

No Uruguai, que tem passado detalhes de óvnis aos Estados Unidos desde a década de 1970, os militares dirigem a Comissão de Recepção e Investigação de Denúncias de Objetos Voadores Não Identificados. “Estamos compartilhando as informações com o público desde o início”, disse o coronel Ariel Sánchez, chefe do programa uruguaio. “Acreditamos que as pessoas precisam ser informadas.”

O fato de um país divulgar esse conteúdo, dizem os investigadores, muitas vezes depende de interesses militares. Os Estados Unidos, por exemplo, têm estado frequentemente menos dispostos a divulgar ou a envolver-se publicamente em questões sobre o tema — chegando mesmo a espalhar desinformação na década de 1950 — por medo de ceder uma vantagem estratégica aos adversários e pôr em risco a segurança nacional.

No Brasil, onde as pesquisas mostram que 33% das pessoas acreditam em vida extraterrestre, os ufólogos não são tratados como malucos. Eles publicam revistas e operam por meio de organizações aparentemente oficiais, como a Comissão Brasileira de Ufólogos. Alguns deles obtiveram audiência perante o Senado no ano passado e se reuniram com alguns dos líderes militares mais importantes do país. Os generais, por sua vez, questionam-se abertamente sobre os extraterrestres, sem medo de escárnio.

Brasil coleciona relatos

Os militares brasileiros começaram a fazer essas perguntas na década de 1950, logo depois que dois jornalistas voltaram de uma viagem no Rio de Janeiro com o que disseram serem fotos extraordinárias. As imagens mostravam um objeto circular voando sobre um morro. Uma delas chegou a ser capa da O Cruzeiro. Mais avistamentos de supostos outros discos voadores surgiram rapidamente. O público estava inquieto por respostas. Os militares lançaram um inquérito e depois realizaram uma conferência pública em 1954 na sua academia nacional no Rio de Janeiro.

“A questão dos discos voadores”, proclamou diante de um grande público o coronel João Adil Oliveira, um dos oficiais mais respeitados da época, “é séria e merece ser tratada com seriedade”. Os militares não conseguiram refutar as fotos dos jornalistas, nem discernir a proveniência do disco. Anos mais tarde, alguns ufólogos afirmaram que as fotos tinham sido falsificadas, embora a questão segue sendo calorosamente debatida pelos entusiastas.

Na década de 1950, fotos que mostravam um objeto circular voando sobre um morro na Barra da Tijuca foram divulgadas. As imagens foram desmentidas posteriormente. Foto: Arquivo Nacional do Brasil

Nas décadas que se seguiram, a forma como os militares trataram os relatos de avistamentos subsequentes foi, em grande parte, uma função do compromisso nacional com a transparência. Durante a ditadura militar, a maior parte das informações foi restrita. Mas com a volta da democracia e, particularmente após a aprovação da Lei de Acesso à Informação em 2011, os brasileiros fizeram uso do seu novo direito, solicitando de forma prioritária o acesso aos registos de óvnis.

Em 2013, os militares brasileiros foram inundados de pedidos sobre arquivos envolvendo óvnis. Com o aumento da pressão, o então ministro da Defesa e atual assessor sênior do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Celso Amorim, assinou uma reunião com ufólogos brasileiros e depois ordenou a transferência de um vasto tesouro de registros de para os arquivos nacionais para acesso público.

Pela primeira vez, pesquisadores e ufólogos do País puderam esmiuçar os incidentes mais curiosos da história recente local. Alguns provaram ser fraudes ou foram facilmente explicados. Mas em outros, as questões persistiam. Um deles envolveu a comunidade amazônica de Colares, no Pará que, em 1977, foi tomada pelo pânico. Moradores diziam que os rios da região haviam sido invadidos por objetos voadores e luminosos. Eles lançaram feixes de luz sobre as pessoas que, segundo registros militares, relataram sintomas de paralisia e tontura.

Uma unidade militar foi enviada para investigar. Ficou quatro meses na região. A equipe fotografou as luzes voadoras, entrevistou dezenas de pessoas e escreveu extensos relatórios que incluíam desenhos da aeronave luminosa que, em notas desclassificadas, pareciam bolas de futebol americano voadoras. Os observadores militares disseram que o que viram desafiava qualquer explicação. “Sentimos que não chegámos a uma conclusão completamente satisfatória”, escreveu João Flavio de Freitas Costa no seu relatório de Novembro de 1977.

Outros relatos envolveram o que viria a ser conhecido aqui como a “Noite Oficial dos óvnis”. Ocorreu em maio de 1986, quando 21 objetos voadores separados foram relatados em todo o sudeste do Brasil. Centenas de pessoas testemunharam os objetos voadores. Uma piloto, enquanto estava no ar, fez uma chamada para uma torre de controle. “Estou vendo três deles agora”, disse o piloto, segundo a gravação. Questionado se poderia ser uma estrela cadente, ele responde: “Uma estrela cadente que fica parada?” ele disse. “É lindo. Muda de vermelho para amarelo. … Olha para eles. Estou com calafrios”.

Os militares enviaram aviões para interceptar os objetos. “São fenômenos sólidos e refletem uma certa inteligência”, escreveu o comandante José Pessoa Calvalcanti de Albuquerque em um relatório confidencial datado de 2 de junho de 1986, “pela sua capacidade de acompanhar e manter distância dos observadores e por voarem em formação”.

O ET de Varginha

Mas mesmo em um país amplamente aberto à discussão e investigação de fenômenos não identificados, nem todos os assuntos foram totalmente divulgados. Faltam nos arquivos, dizem os ufólogos, fotografias militares e vídeos dos orbes que visitaram a comunidade ribeirinha amazônica, bem como documentos militares relativos ao talvez mais notório suposto encontro, o famoso ET de Varginha.

Varginha, em Minas Gerais, ficou conhecida quando um ET supostamente apareceu na cidade. Uma caixa d'água em formato de nave espacial, que simboliza a fama da cidade, foi inaugurada pela prefeitura. Foto: Ronaldo Carvalho/Futura Press

Em janeiro de 1996, três jovens afirmaram ter visto uma criatura bípede enquanto caminhavam por um terreno baldio na cidade de Varginha, em Minas Gerais. Não era humano nem animal, alegaram. A história deixou a cidade de 140 mil habitantes em estado de agitação e gerou rumores selvagens. As pessoas alegaram que se tratava de um alienígena que, após o avistamento, foi capturado pelos militares e escondido.

Anos depois, Kátia Andrade Xavier, uma das três jovens, disse que foi ridicularizada por sua história. Poucos empregadores queriam contratá-la. As pessoas, ela disse, a chamavam de louca, mentirosa, demoníaca. Mas agora, com mais países fazendo mais perguntas sobre óvnis, ela disse que está sendo recebida de forma diferente. “As pessoas estão vendo minha história de maneira completamente diferente”, disse ela. “Me sinto realizado. Eu estou feliz.”/Washington Post.

Brasil e Estados Unidos são dois países de proporções continentais, com avistamentos frequentes de óvnis (os objetos voadores não identificados, também conhecidos como UFOs ou UAPs) e comunidades ativas de entusiastas extraterrestres. Mas a forma como cada um responde à maioria das questões fundamentais humanas — como, por exemplo, “nós estamos sozinhos?” — tem sido sido nitidamente diferente.

Nos Estados Unidos, a questão dos fenômenos aéreos não identificados tem sido frequentemente tratada como um segredo governamental bem guardado. Enquanto isso, no Brasil e em grande parte da América do Sul, tem existido uma atitude mais relaxada em relação ao inexplicável, ao direito do público de saber e aos limites da explicação científica. Os relatos de visitas de óvnis no Brasil, por exemplo, podem ser encontradas em um notável arquivo histórico que é registro público, sem necessidade de autorizações de segurança. Qualquer pessoa pode acessar os arquivos.

Os EUA deram um passo nesta direção nos últimos dias, quando o Departamento de Defesa lançou um site que deve servir como um “balcão de informação” sobre casos de avistamentos, à medida em que forem investigados e abertos para o público geral. Em julho, o Congresso realizou uma audiência em que três testemunhas deram seus relatos sobre supostos encontros com fenômenos não identificados.

Site lançado pelo Pentágono tem vídeos de supostos óvnis. Na imagem, uma filmagem capturada no Sul da Ásia, em que o objeto na direita da imagem foi posteriormente avaliado como uma aeronave comercial. Foto: Reprodução/Defense Visual Information Distribution Service

À medida que os legisladores em Washington pressionam pela mesma transparência que outras partes do mundo desfrutam há anos, as diferenças culturais e nacionalistas entre a forma como os países interpretam os céus e o que é divulgado tornaram-se ainda mais evidentes.

Na América do Sul, pelo menos quatro países — Uruguai, Argentina, Chile e Peru — tem programas públicos de governo que estudam e investigam atividades de óvnis. Argentina e Chile regularmente lançam relatórios sobre registros de identificação de objetos aéreos. A Argentina, desde 2019, possui o Centro de Identificação Aeroespacial, uma reestruturação da antiga Comissão para o Estudo dos Fenômenos Aeroespaciais, criada em 2011.

No Uruguai, que tem passado detalhes de óvnis aos Estados Unidos desde a década de 1970, os militares dirigem a Comissão de Recepção e Investigação de Denúncias de Objetos Voadores Não Identificados. “Estamos compartilhando as informações com o público desde o início”, disse o coronel Ariel Sánchez, chefe do programa uruguaio. “Acreditamos que as pessoas precisam ser informadas.”

O fato de um país divulgar esse conteúdo, dizem os investigadores, muitas vezes depende de interesses militares. Os Estados Unidos, por exemplo, têm estado frequentemente menos dispostos a divulgar ou a envolver-se publicamente em questões sobre o tema — chegando mesmo a espalhar desinformação na década de 1950 — por medo de ceder uma vantagem estratégica aos adversários e pôr em risco a segurança nacional.

No Brasil, onde as pesquisas mostram que 33% das pessoas acreditam em vida extraterrestre, os ufólogos não são tratados como malucos. Eles publicam revistas e operam por meio de organizações aparentemente oficiais, como a Comissão Brasileira de Ufólogos. Alguns deles obtiveram audiência perante o Senado no ano passado e se reuniram com alguns dos líderes militares mais importantes do país. Os generais, por sua vez, questionam-se abertamente sobre os extraterrestres, sem medo de escárnio.

Brasil coleciona relatos

Os militares brasileiros começaram a fazer essas perguntas na década de 1950, logo depois que dois jornalistas voltaram de uma viagem no Rio de Janeiro com o que disseram serem fotos extraordinárias. As imagens mostravam um objeto circular voando sobre um morro. Uma delas chegou a ser capa da O Cruzeiro. Mais avistamentos de supostos outros discos voadores surgiram rapidamente. O público estava inquieto por respostas. Os militares lançaram um inquérito e depois realizaram uma conferência pública em 1954 na sua academia nacional no Rio de Janeiro.

“A questão dos discos voadores”, proclamou diante de um grande público o coronel João Adil Oliveira, um dos oficiais mais respeitados da época, “é séria e merece ser tratada com seriedade”. Os militares não conseguiram refutar as fotos dos jornalistas, nem discernir a proveniência do disco. Anos mais tarde, alguns ufólogos afirmaram que as fotos tinham sido falsificadas, embora a questão segue sendo calorosamente debatida pelos entusiastas.

Na década de 1950, fotos que mostravam um objeto circular voando sobre um morro na Barra da Tijuca foram divulgadas. As imagens foram desmentidas posteriormente. Foto: Arquivo Nacional do Brasil

Nas décadas que se seguiram, a forma como os militares trataram os relatos de avistamentos subsequentes foi, em grande parte, uma função do compromisso nacional com a transparência. Durante a ditadura militar, a maior parte das informações foi restrita. Mas com a volta da democracia e, particularmente após a aprovação da Lei de Acesso à Informação em 2011, os brasileiros fizeram uso do seu novo direito, solicitando de forma prioritária o acesso aos registos de óvnis.

Em 2013, os militares brasileiros foram inundados de pedidos sobre arquivos envolvendo óvnis. Com o aumento da pressão, o então ministro da Defesa e atual assessor sênior do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Celso Amorim, assinou uma reunião com ufólogos brasileiros e depois ordenou a transferência de um vasto tesouro de registros de para os arquivos nacionais para acesso público.

Pela primeira vez, pesquisadores e ufólogos do País puderam esmiuçar os incidentes mais curiosos da história recente local. Alguns provaram ser fraudes ou foram facilmente explicados. Mas em outros, as questões persistiam. Um deles envolveu a comunidade amazônica de Colares, no Pará que, em 1977, foi tomada pelo pânico. Moradores diziam que os rios da região haviam sido invadidos por objetos voadores e luminosos. Eles lançaram feixes de luz sobre as pessoas que, segundo registros militares, relataram sintomas de paralisia e tontura.

Uma unidade militar foi enviada para investigar. Ficou quatro meses na região. A equipe fotografou as luzes voadoras, entrevistou dezenas de pessoas e escreveu extensos relatórios que incluíam desenhos da aeronave luminosa que, em notas desclassificadas, pareciam bolas de futebol americano voadoras. Os observadores militares disseram que o que viram desafiava qualquer explicação. “Sentimos que não chegámos a uma conclusão completamente satisfatória”, escreveu João Flavio de Freitas Costa no seu relatório de Novembro de 1977.

Outros relatos envolveram o que viria a ser conhecido aqui como a “Noite Oficial dos óvnis”. Ocorreu em maio de 1986, quando 21 objetos voadores separados foram relatados em todo o sudeste do Brasil. Centenas de pessoas testemunharam os objetos voadores. Uma piloto, enquanto estava no ar, fez uma chamada para uma torre de controle. “Estou vendo três deles agora”, disse o piloto, segundo a gravação. Questionado se poderia ser uma estrela cadente, ele responde: “Uma estrela cadente que fica parada?” ele disse. “É lindo. Muda de vermelho para amarelo. … Olha para eles. Estou com calafrios”.

Os militares enviaram aviões para interceptar os objetos. “São fenômenos sólidos e refletem uma certa inteligência”, escreveu o comandante José Pessoa Calvalcanti de Albuquerque em um relatório confidencial datado de 2 de junho de 1986, “pela sua capacidade de acompanhar e manter distância dos observadores e por voarem em formação”.

O ET de Varginha

Mas mesmo em um país amplamente aberto à discussão e investigação de fenômenos não identificados, nem todos os assuntos foram totalmente divulgados. Faltam nos arquivos, dizem os ufólogos, fotografias militares e vídeos dos orbes que visitaram a comunidade ribeirinha amazônica, bem como documentos militares relativos ao talvez mais notório suposto encontro, o famoso ET de Varginha.

Varginha, em Minas Gerais, ficou conhecida quando um ET supostamente apareceu na cidade. Uma caixa d'água em formato de nave espacial, que simboliza a fama da cidade, foi inaugurada pela prefeitura. Foto: Ronaldo Carvalho/Futura Press

Em janeiro de 1996, três jovens afirmaram ter visto uma criatura bípede enquanto caminhavam por um terreno baldio na cidade de Varginha, em Minas Gerais. Não era humano nem animal, alegaram. A história deixou a cidade de 140 mil habitantes em estado de agitação e gerou rumores selvagens. As pessoas alegaram que se tratava de um alienígena que, após o avistamento, foi capturado pelos militares e escondido.

Anos depois, Kátia Andrade Xavier, uma das três jovens, disse que foi ridicularizada por sua história. Poucos empregadores queriam contratá-la. As pessoas, ela disse, a chamavam de louca, mentirosa, demoníaca. Mas agora, com mais países fazendo mais perguntas sobre óvnis, ela disse que está sendo recebida de forma diferente. “As pessoas estão vendo minha história de maneira completamente diferente”, disse ela. “Me sinto realizado. Eu estou feliz.”/Washington Post.

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