Conselho de Segurança da ONU se reúne nesta sexta para discutir conflito entre Venezuela e Guiana


O chanceler da Guiana, Hugh Hilton Todd, solicitou a reunião ao órgão para abordar a situação na região

Por Redação
Atualização:

O Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) deve se reunir nesta sexta-feira, 7, as 17h (horário de Brasília) à portas fechadas para abordar o conflito territorial entre Venezuela e Guiana, segundo a agenda oficial, a pedido do governo guianense.

Em carta à qual a AFP teve acesso, o chanceler Hugh Hilton Todd solicita ao Conselho de Segurança “uma reunião urgente” para abordar o conflito em Essequibo, uma região rica em petróleo sob administração guianense, mas reivindicada pela Venezuela.

Na carta, o ministro guianense relata “as ações empreendidas” pela Venezuela “para anexar formalmente e incorporar ao território venezuelano a região que constitui mais de dois terços do território soberano da Guiana” do país.

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As ações adotadas pela Venezuela “não farão mais do que agravar ainda mais a situação. Sua conduta constitui claramente uma ameaça direta para a paz e a segurança da Guiana, e mais amplamente ameaça à paz e à segurança de toda a região”, conclui o chanceler em sua carta ao Conselho de Segurança.

O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, discursa em um comício a favor da anexação da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Matias Delacroix/ AP

Conflito

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As tensões estão altas desde que o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou que faria um plebiscito para a anexação da região de Essequibo, que pertence ao país vizinho. No domingo, 3, os venezuelanos aprovaram a anexação do território de quase 160 mil quilômetros quadrados com 95% dos votos, apesar do baixo quórum no dia da votação. Segundo dados do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, 10,5 milhões de pessoas compareceram de uma população eleitoral de 20,7 milhões.

Apesar de especialistas entrevistados pelo Estadão apontarem que a medida era meramente simbólica, Maduro seguiu com os procedimentos legais para dar um verniz oficial a sua posição. Na terça-feira, 5, o ditador enviou um projeto de lei para a Assembleia Nacional para aprovar uma lei que cria o Estado de Guiana Essequiba. Maduro também nomeou um interventor e ordenou à estatal PDVSA que distribua licenças para exploração de petróleo na região do Essequibo, que corresponde a 70% da Guiana. “A Guiana deve saber que resolveremos isso da maneira mais fácil ou resolveremos...”, disse Maduro, sem concluir a frase.

Além disso, o ditador montará um posto militar avançado na pequena cidade de Tumeremo, dentro do território da Venezuela, perto da fronteira com a Guiana, para supervisionar o novo Estado – embora ele não tenha anunciado nenhuma incursão. Ele designou o general Alexis Rodríguez Cabello como autoridade única do território de 160 mil quilômetros quadrados. O projeto foi aprovado pela Assembleia Nacional na quarta-feira, 6.

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O presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodriguez, mostra um mapa da Venezuela com a inclusão da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Pedro Rances Mattey/AFP

Resposta

Além de ter enviado uma carta ao Conselho de Segurança da ONU, a Guiana também já havia enviado ofícios antes do plebiscito venezuelano para a Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, na Holanda. O tribunal determinou no dia 2 de dezembro que a Venezuela deve evitar qualquer iniciativa que comprometa o status quo com a Guiana.

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O tribunal não fez qualquer referência explícita ao plebiscito, mas apontou que Caracas deve “se abster de qualquer ação que modifique a situação atualmente em vigor no território em disputa”.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, apontou que tem buscado os aliados para assegurar a defesa da região no “pior cenário possível”, referindo-se a um conflito armado entre ambos países. Na quinta-feira, 7, as Forças Militares dos EUA conduziram exercícios militares de rotina com as Forças de Defesa da Guiana (GDF, na sigla em ingles) na região de Essequibo. A embaixada americana em Georgetown apontou que os exercícios são “operações de rotina”, mas analistas sinalizaram uma demonstração de alinhamento dos EUA com a Guiana.

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A aliança com os EUA é vista pela Venezuela como sinal verde da Guiana para a presença militar americana na região. Nos dias 27 e 28 de novembro, vésperas do plebiscito da Venezuela, os militares americanos e guianenses se reuniram para “discutir os próximos compromissos para incluir sessões de planejamento estratégico e processos para melhorar a prontidão militar e as capacidades de ambos os países para responder a ameaças à segurança”, de acordo com nota da embaixada americana no país.

O ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino López, rejeitou nesta quinta-feira, 7, os exercícios militares conjuntos entre os Estados Unidos e a Guiana, anunciados pelo Comando Sul do Exército americano.

“Essa infeliz provocação dos Estados Unidos em favor dos pretorianos da ExxonMobil na Guiana é mais um passo na direção errada. Alertamos que eles não nos desviarão de nossas ações futuras para a recuperação do Essequibo...Não se enganem, Viva Venezuela!”, escreveu Padrino na rede social X.

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O presidente da Guiana, Irfaan Ali, participa de evento em Ottawa, Canadá  Foto: Spencer Colby/AP

Disputa

Após declarar independência da Espanha, em 1811, a Venezuela avançou em direção ao rio. Acontece que, três anos depois, o Reino Unido assumiu o controle do que hoje é Guiana, em um acordo com a Holanda. A definição das fronteiras ficou em aberto e a coroa Britânica abocanhou o território em disputa.

Nas décadas seguintes, a Venezuela passou a disputar a fronteira e recorreu à ajuda dos Estados Unidos, algo que hoje seria impensável. A saída diplomática veio em 1899, quando foi convocado um tribunal composto por dois americanos (indicados pela Venezuela), dois britânicos e um russo para o desempate. Ficou decidido que o território pertencia a então Guiana inglesa.

Cinco décadas mais tarde, a Venezuela voltou a contestar o território alegando que o juiz russo fez parte de um complô com os britânicos. A discussão se arrastou até 1966, quando um acordo firmado em Genebra, meses antes da independência da Guiana, abriu o caminho para uma solução negociada, mas nunca houve consenso.

Em público, Maduro tem dito que quer resolver o conflito pela via diplomática, especificamente através dos termos estabelecidos no Acordo de Genebra de 1966.

Petróleo

As reservas de petróleo no território da Guiana são um fator chave para entender a disputa entre o único país de língua inglesa na América do Sul e a Venezuela. A descoberta de petróleo bruto no país em 2015 pela empresa americana do setor petrolífero ExxonMobil transformou a economia da Guiana. A ex-colônia britânica possui cerca de 11 bilhões de barris de reservas provadas de petróleo bruto, ou cerca de 0,6% do total mundial. A produção começou três anos atrás e agora está aumentando o ritmo.

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o país cresceu 62% no ano passado e deverá somar mais 37% este ano. Essa é a taxa de crescimento mais rápida em qualquer lugar do mundo.

A situação do país vizinho é bem diferente, com o sucateamento da empresa estatal venezuelana de petróleo PDVSA, devido a diversos casos de corrupção e mau gerenciamento. A capacidade de produção de petróleo da Venezuela caiu de 3.4 milhões de barris para apenas 700,000 por dia.

“As recentes descobertas de petróleo em Essequibo levaram Maduro a tentar resgatar uma narrativa de vitimização histórica, segundo a qual a nação foi roubada da riqueza que lhe pertence”, aponta o professor de relações internacionais da FGV, Oliver Stuenkel em sua coluna no Estadão.

A região de Essequibo é rica em recursos naturais e representa dois terços do território da Guiana, além de ser o lar de 125 mil habitantes da ex-colônia britânica. A Guiana possui fronteiras, ao sul, com o Brasil, com a Venezuela no sudoeste e com o Suriname ao leste.

Apoiador venezuelano da anexação da região de Essequibo segura um cartaz favorável ao plebiscito  Foto: Leonardo Fernandez Viloria / REUTERS

Guerra

Apesar do alerta ligado na América do Sul para a possibilidade de um conflito armado entre Caracas e Georgetown, analistas avaliam que o movimento de Maduro foi feito para reforçar o nacionalismo venezuelano, desviando a atenção do público da crise política e econômica do país com a proximidade das eleições.

“O plebiscito é uma manobra clássica para inflamar o nacionalismo antes das eleições em 2024. Cientes do risco de serem rotulados de traidores da pátria se criticassem a estratégia esdrúxula de Maduro de priorizar a retomada de Essequibo, oposicionistas não viram outra opção a não ser apoiar o autocrata venezuelano nesse quesito específico”, apontou Stuenkel em sua coluna.

A crise econômica da Venezuela e as concessões feitas por Maduro para a participação da oposição nas eleições marcadas para o ano que vem fizeram com que o regime buscasse meios para tentar oxigenar o seu movimento, avalia o professor de relações internacionais da ESPM, Leonardo Trevisan. “Este plebiscito teve esse papel, de mobilizar a população. A existência de um inimigo externo é sempre um fator mobilizador”, ressalta o especialista.

Apesar disso, caso Caracas opte de fato por invadir o território de Georgetown, os venezuelanos teriam claras vantagens no quesito militar. . No papel, as Forças Armadas da Venezuela têm uma capacidade militar considerável na região. Segundo o Anuário Militar de 2023 do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, de Londres), são 123 mil militares na ativa, mais 220 mil paramilitares e equipamentos obtidos da Rússia e da China, duas potências militares globais. Não se sabe, no entanto, se a prática reflete a teoria.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, conversa com o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, em Brasília, Brasil  Foto: Ueslei Marcelino/ REUTERS

Já a Guiana, que é um país com apenas 800 mil habitantes, conta com apenas 3,4 mil soldados, dos quais metade estão em funções na segurança pública. Ou seja, são policiais, sem treinamento de combate. Os equipamentos militares também são escassos. São seis blindados brasileiros Cascavel-EE9, fabricados pela extinta Engesa em 1984.

Uma invasão militar venezuelana para a tomada de Essequibo significaria adentrar na selva tropical densa que domina a região. É unanimidade entre analistas que geografias do tipo tornam quase impossível o uso de equipamentos basilares para a tomada de territórios, como veículos blindados. Uma alternativa seria adentrar no território brasileiro e seguir até Georgetown, a capital da Guiana, mas essa é uma possibilidade remota.

O Ministério da Defesa do Brasil afirmou ter intensificado a presença militar no norte e monitora a crise nos países vizinho e prepara o envio de 20 blindados a Pacaraima, em Roraima, próxima a fronteira com a Venezuela. “Os militares deixam bem claro que não será possível a Venezuela adentrar no território brasileiro para contornar a selva”, disse Rudzit.

Diplomacia

O Ministério das Relações Exteriores do Brasil informou a Venezuela e a Guiana que defende uma resolução pacífica na disputa em torno da região do Essequibo. O chanceler Mauro Vieira e o assessor especial da presidência para assuntos internacionais, Celso Amorim, tiveram em contato com autoridades dos dois países nas últimas semanas na tentativa de dissuadir qualquer conflito na região, localizada ao norte do Brasil.

A posição brasileira foi externada após o presidente da Guiana, Mohamed Irfaan Ali, procurar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) há cerca de três semanas, antes do plebiscito da Venezuela. Na conversa, Lula teria garantido a Irfaan Ali que não haveria nenhum “comportamento imprudente da Venezuela” na região, segundo o presidente guianense disse em entrevista à CNN.

Celso Amorim viajou com uma equipe para Caracas, a capital venezuelana, após o diálogo para informar o governo de Nicolás Maduro que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul e que o Brasil não vai apoiar nenhuma incursão militar na região. Na terça-feira, foi a vez do chanceler Mauro Vieira conversar com o presidente Irfaan Ali e externar a posição do Brasil. Segundo o Itamaraty, o ministro informou que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul.

Os ministros das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, e da Guiana, Hugh Todd, anunciaram na quarta-feira, 6, que ambos países irão manter “canais de comunicação” para tentar evitar a escalada do conflito. “A pedido da parte guianense, o ministro Hugh Todd teve uma conversa telefônica com o ministro Yván Gil para tratar do tema da controvérsia territorial”, disse o governo venezuelano em um comunicado./AFP e com informações de Daniel Gateno, Jessica Petrovna, Jorge C. Carrasco e Luiz Henrique Gomes

O Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) deve se reunir nesta sexta-feira, 7, as 17h (horário de Brasília) à portas fechadas para abordar o conflito territorial entre Venezuela e Guiana, segundo a agenda oficial, a pedido do governo guianense.

Em carta à qual a AFP teve acesso, o chanceler Hugh Hilton Todd solicita ao Conselho de Segurança “uma reunião urgente” para abordar o conflito em Essequibo, uma região rica em petróleo sob administração guianense, mas reivindicada pela Venezuela.

Na carta, o ministro guianense relata “as ações empreendidas” pela Venezuela “para anexar formalmente e incorporar ao território venezuelano a região que constitui mais de dois terços do território soberano da Guiana” do país.

As ações adotadas pela Venezuela “não farão mais do que agravar ainda mais a situação. Sua conduta constitui claramente uma ameaça direta para a paz e a segurança da Guiana, e mais amplamente ameaça à paz e à segurança de toda a região”, conclui o chanceler em sua carta ao Conselho de Segurança.

O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, discursa em um comício a favor da anexação da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Matias Delacroix/ AP

Conflito

As tensões estão altas desde que o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou que faria um plebiscito para a anexação da região de Essequibo, que pertence ao país vizinho. No domingo, 3, os venezuelanos aprovaram a anexação do território de quase 160 mil quilômetros quadrados com 95% dos votos, apesar do baixo quórum no dia da votação. Segundo dados do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, 10,5 milhões de pessoas compareceram de uma população eleitoral de 20,7 milhões.

Apesar de especialistas entrevistados pelo Estadão apontarem que a medida era meramente simbólica, Maduro seguiu com os procedimentos legais para dar um verniz oficial a sua posição. Na terça-feira, 5, o ditador enviou um projeto de lei para a Assembleia Nacional para aprovar uma lei que cria o Estado de Guiana Essequiba. Maduro também nomeou um interventor e ordenou à estatal PDVSA que distribua licenças para exploração de petróleo na região do Essequibo, que corresponde a 70% da Guiana. “A Guiana deve saber que resolveremos isso da maneira mais fácil ou resolveremos...”, disse Maduro, sem concluir a frase.

Além disso, o ditador montará um posto militar avançado na pequena cidade de Tumeremo, dentro do território da Venezuela, perto da fronteira com a Guiana, para supervisionar o novo Estado – embora ele não tenha anunciado nenhuma incursão. Ele designou o general Alexis Rodríguez Cabello como autoridade única do território de 160 mil quilômetros quadrados. O projeto foi aprovado pela Assembleia Nacional na quarta-feira, 6.

O presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodriguez, mostra um mapa da Venezuela com a inclusão da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Pedro Rances Mattey/AFP

Resposta

Além de ter enviado uma carta ao Conselho de Segurança da ONU, a Guiana também já havia enviado ofícios antes do plebiscito venezuelano para a Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, na Holanda. O tribunal determinou no dia 2 de dezembro que a Venezuela deve evitar qualquer iniciativa que comprometa o status quo com a Guiana.

O tribunal não fez qualquer referência explícita ao plebiscito, mas apontou que Caracas deve “se abster de qualquer ação que modifique a situação atualmente em vigor no território em disputa”.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, apontou que tem buscado os aliados para assegurar a defesa da região no “pior cenário possível”, referindo-se a um conflito armado entre ambos países. Na quinta-feira, 7, as Forças Militares dos EUA conduziram exercícios militares de rotina com as Forças de Defesa da Guiana (GDF, na sigla em ingles) na região de Essequibo. A embaixada americana em Georgetown apontou que os exercícios são “operações de rotina”, mas analistas sinalizaram uma demonstração de alinhamento dos EUA com a Guiana.

A aliança com os EUA é vista pela Venezuela como sinal verde da Guiana para a presença militar americana na região. Nos dias 27 e 28 de novembro, vésperas do plebiscito da Venezuela, os militares americanos e guianenses se reuniram para “discutir os próximos compromissos para incluir sessões de planejamento estratégico e processos para melhorar a prontidão militar e as capacidades de ambos os países para responder a ameaças à segurança”, de acordo com nota da embaixada americana no país.

O ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino López, rejeitou nesta quinta-feira, 7, os exercícios militares conjuntos entre os Estados Unidos e a Guiana, anunciados pelo Comando Sul do Exército americano.

“Essa infeliz provocação dos Estados Unidos em favor dos pretorianos da ExxonMobil na Guiana é mais um passo na direção errada. Alertamos que eles não nos desviarão de nossas ações futuras para a recuperação do Essequibo...Não se enganem, Viva Venezuela!”, escreveu Padrino na rede social X.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, participa de evento em Ottawa, Canadá  Foto: Spencer Colby/AP

Disputa

Após declarar independência da Espanha, em 1811, a Venezuela avançou em direção ao rio. Acontece que, três anos depois, o Reino Unido assumiu o controle do que hoje é Guiana, em um acordo com a Holanda. A definição das fronteiras ficou em aberto e a coroa Britânica abocanhou o território em disputa.

Nas décadas seguintes, a Venezuela passou a disputar a fronteira e recorreu à ajuda dos Estados Unidos, algo que hoje seria impensável. A saída diplomática veio em 1899, quando foi convocado um tribunal composto por dois americanos (indicados pela Venezuela), dois britânicos e um russo para o desempate. Ficou decidido que o território pertencia a então Guiana inglesa.

Cinco décadas mais tarde, a Venezuela voltou a contestar o território alegando que o juiz russo fez parte de um complô com os britânicos. A discussão se arrastou até 1966, quando um acordo firmado em Genebra, meses antes da independência da Guiana, abriu o caminho para uma solução negociada, mas nunca houve consenso.

Em público, Maduro tem dito que quer resolver o conflito pela via diplomática, especificamente através dos termos estabelecidos no Acordo de Genebra de 1966.

Petróleo

As reservas de petróleo no território da Guiana são um fator chave para entender a disputa entre o único país de língua inglesa na América do Sul e a Venezuela. A descoberta de petróleo bruto no país em 2015 pela empresa americana do setor petrolífero ExxonMobil transformou a economia da Guiana. A ex-colônia britânica possui cerca de 11 bilhões de barris de reservas provadas de petróleo bruto, ou cerca de 0,6% do total mundial. A produção começou três anos atrás e agora está aumentando o ritmo.

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o país cresceu 62% no ano passado e deverá somar mais 37% este ano. Essa é a taxa de crescimento mais rápida em qualquer lugar do mundo.

A situação do país vizinho é bem diferente, com o sucateamento da empresa estatal venezuelana de petróleo PDVSA, devido a diversos casos de corrupção e mau gerenciamento. A capacidade de produção de petróleo da Venezuela caiu de 3.4 milhões de barris para apenas 700,000 por dia.

“As recentes descobertas de petróleo em Essequibo levaram Maduro a tentar resgatar uma narrativa de vitimização histórica, segundo a qual a nação foi roubada da riqueza que lhe pertence”, aponta o professor de relações internacionais da FGV, Oliver Stuenkel em sua coluna no Estadão.

A região de Essequibo é rica em recursos naturais e representa dois terços do território da Guiana, além de ser o lar de 125 mil habitantes da ex-colônia britânica. A Guiana possui fronteiras, ao sul, com o Brasil, com a Venezuela no sudoeste e com o Suriname ao leste.

Apoiador venezuelano da anexação da região de Essequibo segura um cartaz favorável ao plebiscito  Foto: Leonardo Fernandez Viloria / REUTERS

Guerra

Apesar do alerta ligado na América do Sul para a possibilidade de um conflito armado entre Caracas e Georgetown, analistas avaliam que o movimento de Maduro foi feito para reforçar o nacionalismo venezuelano, desviando a atenção do público da crise política e econômica do país com a proximidade das eleições.

“O plebiscito é uma manobra clássica para inflamar o nacionalismo antes das eleições em 2024. Cientes do risco de serem rotulados de traidores da pátria se criticassem a estratégia esdrúxula de Maduro de priorizar a retomada de Essequibo, oposicionistas não viram outra opção a não ser apoiar o autocrata venezuelano nesse quesito específico”, apontou Stuenkel em sua coluna.

A crise econômica da Venezuela e as concessões feitas por Maduro para a participação da oposição nas eleições marcadas para o ano que vem fizeram com que o regime buscasse meios para tentar oxigenar o seu movimento, avalia o professor de relações internacionais da ESPM, Leonardo Trevisan. “Este plebiscito teve esse papel, de mobilizar a população. A existência de um inimigo externo é sempre um fator mobilizador”, ressalta o especialista.

Apesar disso, caso Caracas opte de fato por invadir o território de Georgetown, os venezuelanos teriam claras vantagens no quesito militar. . No papel, as Forças Armadas da Venezuela têm uma capacidade militar considerável na região. Segundo o Anuário Militar de 2023 do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, de Londres), são 123 mil militares na ativa, mais 220 mil paramilitares e equipamentos obtidos da Rússia e da China, duas potências militares globais. Não se sabe, no entanto, se a prática reflete a teoria.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, conversa com o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, em Brasília, Brasil  Foto: Ueslei Marcelino/ REUTERS

Já a Guiana, que é um país com apenas 800 mil habitantes, conta com apenas 3,4 mil soldados, dos quais metade estão em funções na segurança pública. Ou seja, são policiais, sem treinamento de combate. Os equipamentos militares também são escassos. São seis blindados brasileiros Cascavel-EE9, fabricados pela extinta Engesa em 1984.

Uma invasão militar venezuelana para a tomada de Essequibo significaria adentrar na selva tropical densa que domina a região. É unanimidade entre analistas que geografias do tipo tornam quase impossível o uso de equipamentos basilares para a tomada de territórios, como veículos blindados. Uma alternativa seria adentrar no território brasileiro e seguir até Georgetown, a capital da Guiana, mas essa é uma possibilidade remota.

O Ministério da Defesa do Brasil afirmou ter intensificado a presença militar no norte e monitora a crise nos países vizinho e prepara o envio de 20 blindados a Pacaraima, em Roraima, próxima a fronteira com a Venezuela. “Os militares deixam bem claro que não será possível a Venezuela adentrar no território brasileiro para contornar a selva”, disse Rudzit.

Diplomacia

O Ministério das Relações Exteriores do Brasil informou a Venezuela e a Guiana que defende uma resolução pacífica na disputa em torno da região do Essequibo. O chanceler Mauro Vieira e o assessor especial da presidência para assuntos internacionais, Celso Amorim, tiveram em contato com autoridades dos dois países nas últimas semanas na tentativa de dissuadir qualquer conflito na região, localizada ao norte do Brasil.

A posição brasileira foi externada após o presidente da Guiana, Mohamed Irfaan Ali, procurar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) há cerca de três semanas, antes do plebiscito da Venezuela. Na conversa, Lula teria garantido a Irfaan Ali que não haveria nenhum “comportamento imprudente da Venezuela” na região, segundo o presidente guianense disse em entrevista à CNN.

Celso Amorim viajou com uma equipe para Caracas, a capital venezuelana, após o diálogo para informar o governo de Nicolás Maduro que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul e que o Brasil não vai apoiar nenhuma incursão militar na região. Na terça-feira, foi a vez do chanceler Mauro Vieira conversar com o presidente Irfaan Ali e externar a posição do Brasil. Segundo o Itamaraty, o ministro informou que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul.

Os ministros das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, e da Guiana, Hugh Todd, anunciaram na quarta-feira, 6, que ambos países irão manter “canais de comunicação” para tentar evitar a escalada do conflito. “A pedido da parte guianense, o ministro Hugh Todd teve uma conversa telefônica com o ministro Yván Gil para tratar do tema da controvérsia territorial”, disse o governo venezuelano em um comunicado./AFP e com informações de Daniel Gateno, Jessica Petrovna, Jorge C. Carrasco e Luiz Henrique Gomes

O Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) deve se reunir nesta sexta-feira, 7, as 17h (horário de Brasília) à portas fechadas para abordar o conflito territorial entre Venezuela e Guiana, segundo a agenda oficial, a pedido do governo guianense.

Em carta à qual a AFP teve acesso, o chanceler Hugh Hilton Todd solicita ao Conselho de Segurança “uma reunião urgente” para abordar o conflito em Essequibo, uma região rica em petróleo sob administração guianense, mas reivindicada pela Venezuela.

Na carta, o ministro guianense relata “as ações empreendidas” pela Venezuela “para anexar formalmente e incorporar ao território venezuelano a região que constitui mais de dois terços do território soberano da Guiana” do país.

As ações adotadas pela Venezuela “não farão mais do que agravar ainda mais a situação. Sua conduta constitui claramente uma ameaça direta para a paz e a segurança da Guiana, e mais amplamente ameaça à paz e à segurança de toda a região”, conclui o chanceler em sua carta ao Conselho de Segurança.

O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, discursa em um comício a favor da anexação da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Matias Delacroix/ AP

Conflito

As tensões estão altas desde que o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou que faria um plebiscito para a anexação da região de Essequibo, que pertence ao país vizinho. No domingo, 3, os venezuelanos aprovaram a anexação do território de quase 160 mil quilômetros quadrados com 95% dos votos, apesar do baixo quórum no dia da votação. Segundo dados do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, 10,5 milhões de pessoas compareceram de uma população eleitoral de 20,7 milhões.

Apesar de especialistas entrevistados pelo Estadão apontarem que a medida era meramente simbólica, Maduro seguiu com os procedimentos legais para dar um verniz oficial a sua posição. Na terça-feira, 5, o ditador enviou um projeto de lei para a Assembleia Nacional para aprovar uma lei que cria o Estado de Guiana Essequiba. Maduro também nomeou um interventor e ordenou à estatal PDVSA que distribua licenças para exploração de petróleo na região do Essequibo, que corresponde a 70% da Guiana. “A Guiana deve saber que resolveremos isso da maneira mais fácil ou resolveremos...”, disse Maduro, sem concluir a frase.

Além disso, o ditador montará um posto militar avançado na pequena cidade de Tumeremo, dentro do território da Venezuela, perto da fronteira com a Guiana, para supervisionar o novo Estado – embora ele não tenha anunciado nenhuma incursão. Ele designou o general Alexis Rodríguez Cabello como autoridade única do território de 160 mil quilômetros quadrados. O projeto foi aprovado pela Assembleia Nacional na quarta-feira, 6.

O presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodriguez, mostra um mapa da Venezuela com a inclusão da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Pedro Rances Mattey/AFP

Resposta

Além de ter enviado uma carta ao Conselho de Segurança da ONU, a Guiana também já havia enviado ofícios antes do plebiscito venezuelano para a Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, na Holanda. O tribunal determinou no dia 2 de dezembro que a Venezuela deve evitar qualquer iniciativa que comprometa o status quo com a Guiana.

O tribunal não fez qualquer referência explícita ao plebiscito, mas apontou que Caracas deve “se abster de qualquer ação que modifique a situação atualmente em vigor no território em disputa”.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, apontou que tem buscado os aliados para assegurar a defesa da região no “pior cenário possível”, referindo-se a um conflito armado entre ambos países. Na quinta-feira, 7, as Forças Militares dos EUA conduziram exercícios militares de rotina com as Forças de Defesa da Guiana (GDF, na sigla em ingles) na região de Essequibo. A embaixada americana em Georgetown apontou que os exercícios são “operações de rotina”, mas analistas sinalizaram uma demonstração de alinhamento dos EUA com a Guiana.

A aliança com os EUA é vista pela Venezuela como sinal verde da Guiana para a presença militar americana na região. Nos dias 27 e 28 de novembro, vésperas do plebiscito da Venezuela, os militares americanos e guianenses se reuniram para “discutir os próximos compromissos para incluir sessões de planejamento estratégico e processos para melhorar a prontidão militar e as capacidades de ambos os países para responder a ameaças à segurança”, de acordo com nota da embaixada americana no país.

O ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino López, rejeitou nesta quinta-feira, 7, os exercícios militares conjuntos entre os Estados Unidos e a Guiana, anunciados pelo Comando Sul do Exército americano.

“Essa infeliz provocação dos Estados Unidos em favor dos pretorianos da ExxonMobil na Guiana é mais um passo na direção errada. Alertamos que eles não nos desviarão de nossas ações futuras para a recuperação do Essequibo...Não se enganem, Viva Venezuela!”, escreveu Padrino na rede social X.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, participa de evento em Ottawa, Canadá  Foto: Spencer Colby/AP

Disputa

Após declarar independência da Espanha, em 1811, a Venezuela avançou em direção ao rio. Acontece que, três anos depois, o Reino Unido assumiu o controle do que hoje é Guiana, em um acordo com a Holanda. A definição das fronteiras ficou em aberto e a coroa Britânica abocanhou o território em disputa.

Nas décadas seguintes, a Venezuela passou a disputar a fronteira e recorreu à ajuda dos Estados Unidos, algo que hoje seria impensável. A saída diplomática veio em 1899, quando foi convocado um tribunal composto por dois americanos (indicados pela Venezuela), dois britânicos e um russo para o desempate. Ficou decidido que o território pertencia a então Guiana inglesa.

Cinco décadas mais tarde, a Venezuela voltou a contestar o território alegando que o juiz russo fez parte de um complô com os britânicos. A discussão se arrastou até 1966, quando um acordo firmado em Genebra, meses antes da independência da Guiana, abriu o caminho para uma solução negociada, mas nunca houve consenso.

Em público, Maduro tem dito que quer resolver o conflito pela via diplomática, especificamente através dos termos estabelecidos no Acordo de Genebra de 1966.

Petróleo

As reservas de petróleo no território da Guiana são um fator chave para entender a disputa entre o único país de língua inglesa na América do Sul e a Venezuela. A descoberta de petróleo bruto no país em 2015 pela empresa americana do setor petrolífero ExxonMobil transformou a economia da Guiana. A ex-colônia britânica possui cerca de 11 bilhões de barris de reservas provadas de petróleo bruto, ou cerca de 0,6% do total mundial. A produção começou três anos atrás e agora está aumentando o ritmo.

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o país cresceu 62% no ano passado e deverá somar mais 37% este ano. Essa é a taxa de crescimento mais rápida em qualquer lugar do mundo.

A situação do país vizinho é bem diferente, com o sucateamento da empresa estatal venezuelana de petróleo PDVSA, devido a diversos casos de corrupção e mau gerenciamento. A capacidade de produção de petróleo da Venezuela caiu de 3.4 milhões de barris para apenas 700,000 por dia.

“As recentes descobertas de petróleo em Essequibo levaram Maduro a tentar resgatar uma narrativa de vitimização histórica, segundo a qual a nação foi roubada da riqueza que lhe pertence”, aponta o professor de relações internacionais da FGV, Oliver Stuenkel em sua coluna no Estadão.

A região de Essequibo é rica em recursos naturais e representa dois terços do território da Guiana, além de ser o lar de 125 mil habitantes da ex-colônia britânica. A Guiana possui fronteiras, ao sul, com o Brasil, com a Venezuela no sudoeste e com o Suriname ao leste.

Apoiador venezuelano da anexação da região de Essequibo segura um cartaz favorável ao plebiscito  Foto: Leonardo Fernandez Viloria / REUTERS

Guerra

Apesar do alerta ligado na América do Sul para a possibilidade de um conflito armado entre Caracas e Georgetown, analistas avaliam que o movimento de Maduro foi feito para reforçar o nacionalismo venezuelano, desviando a atenção do público da crise política e econômica do país com a proximidade das eleições.

“O plebiscito é uma manobra clássica para inflamar o nacionalismo antes das eleições em 2024. Cientes do risco de serem rotulados de traidores da pátria se criticassem a estratégia esdrúxula de Maduro de priorizar a retomada de Essequibo, oposicionistas não viram outra opção a não ser apoiar o autocrata venezuelano nesse quesito específico”, apontou Stuenkel em sua coluna.

A crise econômica da Venezuela e as concessões feitas por Maduro para a participação da oposição nas eleições marcadas para o ano que vem fizeram com que o regime buscasse meios para tentar oxigenar o seu movimento, avalia o professor de relações internacionais da ESPM, Leonardo Trevisan. “Este plebiscito teve esse papel, de mobilizar a população. A existência de um inimigo externo é sempre um fator mobilizador”, ressalta o especialista.

Apesar disso, caso Caracas opte de fato por invadir o território de Georgetown, os venezuelanos teriam claras vantagens no quesito militar. . No papel, as Forças Armadas da Venezuela têm uma capacidade militar considerável na região. Segundo o Anuário Militar de 2023 do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, de Londres), são 123 mil militares na ativa, mais 220 mil paramilitares e equipamentos obtidos da Rússia e da China, duas potências militares globais. Não se sabe, no entanto, se a prática reflete a teoria.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, conversa com o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, em Brasília, Brasil  Foto: Ueslei Marcelino/ REUTERS

Já a Guiana, que é um país com apenas 800 mil habitantes, conta com apenas 3,4 mil soldados, dos quais metade estão em funções na segurança pública. Ou seja, são policiais, sem treinamento de combate. Os equipamentos militares também são escassos. São seis blindados brasileiros Cascavel-EE9, fabricados pela extinta Engesa em 1984.

Uma invasão militar venezuelana para a tomada de Essequibo significaria adentrar na selva tropical densa que domina a região. É unanimidade entre analistas que geografias do tipo tornam quase impossível o uso de equipamentos basilares para a tomada de territórios, como veículos blindados. Uma alternativa seria adentrar no território brasileiro e seguir até Georgetown, a capital da Guiana, mas essa é uma possibilidade remota.

O Ministério da Defesa do Brasil afirmou ter intensificado a presença militar no norte e monitora a crise nos países vizinho e prepara o envio de 20 blindados a Pacaraima, em Roraima, próxima a fronteira com a Venezuela. “Os militares deixam bem claro que não será possível a Venezuela adentrar no território brasileiro para contornar a selva”, disse Rudzit.

Diplomacia

O Ministério das Relações Exteriores do Brasil informou a Venezuela e a Guiana que defende uma resolução pacífica na disputa em torno da região do Essequibo. O chanceler Mauro Vieira e o assessor especial da presidência para assuntos internacionais, Celso Amorim, tiveram em contato com autoridades dos dois países nas últimas semanas na tentativa de dissuadir qualquer conflito na região, localizada ao norte do Brasil.

A posição brasileira foi externada após o presidente da Guiana, Mohamed Irfaan Ali, procurar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) há cerca de três semanas, antes do plebiscito da Venezuela. Na conversa, Lula teria garantido a Irfaan Ali que não haveria nenhum “comportamento imprudente da Venezuela” na região, segundo o presidente guianense disse em entrevista à CNN.

Celso Amorim viajou com uma equipe para Caracas, a capital venezuelana, após o diálogo para informar o governo de Nicolás Maduro que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul e que o Brasil não vai apoiar nenhuma incursão militar na região. Na terça-feira, foi a vez do chanceler Mauro Vieira conversar com o presidente Irfaan Ali e externar a posição do Brasil. Segundo o Itamaraty, o ministro informou que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul.

Os ministros das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, e da Guiana, Hugh Todd, anunciaram na quarta-feira, 6, que ambos países irão manter “canais de comunicação” para tentar evitar a escalada do conflito. “A pedido da parte guianense, o ministro Hugh Todd teve uma conversa telefônica com o ministro Yván Gil para tratar do tema da controvérsia territorial”, disse o governo venezuelano em um comunicado./AFP e com informações de Daniel Gateno, Jessica Petrovna, Jorge C. Carrasco e Luiz Henrique Gomes

O Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) deve se reunir nesta sexta-feira, 7, as 17h (horário de Brasília) à portas fechadas para abordar o conflito territorial entre Venezuela e Guiana, segundo a agenda oficial, a pedido do governo guianense.

Em carta à qual a AFP teve acesso, o chanceler Hugh Hilton Todd solicita ao Conselho de Segurança “uma reunião urgente” para abordar o conflito em Essequibo, uma região rica em petróleo sob administração guianense, mas reivindicada pela Venezuela.

Na carta, o ministro guianense relata “as ações empreendidas” pela Venezuela “para anexar formalmente e incorporar ao território venezuelano a região que constitui mais de dois terços do território soberano da Guiana” do país.

As ações adotadas pela Venezuela “não farão mais do que agravar ainda mais a situação. Sua conduta constitui claramente uma ameaça direta para a paz e a segurança da Guiana, e mais amplamente ameaça à paz e à segurança de toda a região”, conclui o chanceler em sua carta ao Conselho de Segurança.

O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, discursa em um comício a favor da anexação da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Matias Delacroix/ AP

Conflito

As tensões estão altas desde que o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou que faria um plebiscito para a anexação da região de Essequibo, que pertence ao país vizinho. No domingo, 3, os venezuelanos aprovaram a anexação do território de quase 160 mil quilômetros quadrados com 95% dos votos, apesar do baixo quórum no dia da votação. Segundo dados do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, 10,5 milhões de pessoas compareceram de uma população eleitoral de 20,7 milhões.

Apesar de especialistas entrevistados pelo Estadão apontarem que a medida era meramente simbólica, Maduro seguiu com os procedimentos legais para dar um verniz oficial a sua posição. Na terça-feira, 5, o ditador enviou um projeto de lei para a Assembleia Nacional para aprovar uma lei que cria o Estado de Guiana Essequiba. Maduro também nomeou um interventor e ordenou à estatal PDVSA que distribua licenças para exploração de petróleo na região do Essequibo, que corresponde a 70% da Guiana. “A Guiana deve saber que resolveremos isso da maneira mais fácil ou resolveremos...”, disse Maduro, sem concluir a frase.

Além disso, o ditador montará um posto militar avançado na pequena cidade de Tumeremo, dentro do território da Venezuela, perto da fronteira com a Guiana, para supervisionar o novo Estado – embora ele não tenha anunciado nenhuma incursão. Ele designou o general Alexis Rodríguez Cabello como autoridade única do território de 160 mil quilômetros quadrados. O projeto foi aprovado pela Assembleia Nacional na quarta-feira, 6.

O presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodriguez, mostra um mapa da Venezuela com a inclusão da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Pedro Rances Mattey/AFP

Resposta

Além de ter enviado uma carta ao Conselho de Segurança da ONU, a Guiana também já havia enviado ofícios antes do plebiscito venezuelano para a Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, na Holanda. O tribunal determinou no dia 2 de dezembro que a Venezuela deve evitar qualquer iniciativa que comprometa o status quo com a Guiana.

O tribunal não fez qualquer referência explícita ao plebiscito, mas apontou que Caracas deve “se abster de qualquer ação que modifique a situação atualmente em vigor no território em disputa”.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, apontou que tem buscado os aliados para assegurar a defesa da região no “pior cenário possível”, referindo-se a um conflito armado entre ambos países. Na quinta-feira, 7, as Forças Militares dos EUA conduziram exercícios militares de rotina com as Forças de Defesa da Guiana (GDF, na sigla em ingles) na região de Essequibo. A embaixada americana em Georgetown apontou que os exercícios são “operações de rotina”, mas analistas sinalizaram uma demonstração de alinhamento dos EUA com a Guiana.

A aliança com os EUA é vista pela Venezuela como sinal verde da Guiana para a presença militar americana na região. Nos dias 27 e 28 de novembro, vésperas do plebiscito da Venezuela, os militares americanos e guianenses se reuniram para “discutir os próximos compromissos para incluir sessões de planejamento estratégico e processos para melhorar a prontidão militar e as capacidades de ambos os países para responder a ameaças à segurança”, de acordo com nota da embaixada americana no país.

O ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino López, rejeitou nesta quinta-feira, 7, os exercícios militares conjuntos entre os Estados Unidos e a Guiana, anunciados pelo Comando Sul do Exército americano.

“Essa infeliz provocação dos Estados Unidos em favor dos pretorianos da ExxonMobil na Guiana é mais um passo na direção errada. Alertamos que eles não nos desviarão de nossas ações futuras para a recuperação do Essequibo...Não se enganem, Viva Venezuela!”, escreveu Padrino na rede social X.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, participa de evento em Ottawa, Canadá  Foto: Spencer Colby/AP

Disputa

Após declarar independência da Espanha, em 1811, a Venezuela avançou em direção ao rio. Acontece que, três anos depois, o Reino Unido assumiu o controle do que hoje é Guiana, em um acordo com a Holanda. A definição das fronteiras ficou em aberto e a coroa Britânica abocanhou o território em disputa.

Nas décadas seguintes, a Venezuela passou a disputar a fronteira e recorreu à ajuda dos Estados Unidos, algo que hoje seria impensável. A saída diplomática veio em 1899, quando foi convocado um tribunal composto por dois americanos (indicados pela Venezuela), dois britânicos e um russo para o desempate. Ficou decidido que o território pertencia a então Guiana inglesa.

Cinco décadas mais tarde, a Venezuela voltou a contestar o território alegando que o juiz russo fez parte de um complô com os britânicos. A discussão se arrastou até 1966, quando um acordo firmado em Genebra, meses antes da independência da Guiana, abriu o caminho para uma solução negociada, mas nunca houve consenso.

Em público, Maduro tem dito que quer resolver o conflito pela via diplomática, especificamente através dos termos estabelecidos no Acordo de Genebra de 1966.

Petróleo

As reservas de petróleo no território da Guiana são um fator chave para entender a disputa entre o único país de língua inglesa na América do Sul e a Venezuela. A descoberta de petróleo bruto no país em 2015 pela empresa americana do setor petrolífero ExxonMobil transformou a economia da Guiana. A ex-colônia britânica possui cerca de 11 bilhões de barris de reservas provadas de petróleo bruto, ou cerca de 0,6% do total mundial. A produção começou três anos atrás e agora está aumentando o ritmo.

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o país cresceu 62% no ano passado e deverá somar mais 37% este ano. Essa é a taxa de crescimento mais rápida em qualquer lugar do mundo.

A situação do país vizinho é bem diferente, com o sucateamento da empresa estatal venezuelana de petróleo PDVSA, devido a diversos casos de corrupção e mau gerenciamento. A capacidade de produção de petróleo da Venezuela caiu de 3.4 milhões de barris para apenas 700,000 por dia.

“As recentes descobertas de petróleo em Essequibo levaram Maduro a tentar resgatar uma narrativa de vitimização histórica, segundo a qual a nação foi roubada da riqueza que lhe pertence”, aponta o professor de relações internacionais da FGV, Oliver Stuenkel em sua coluna no Estadão.

A região de Essequibo é rica em recursos naturais e representa dois terços do território da Guiana, além de ser o lar de 125 mil habitantes da ex-colônia britânica. A Guiana possui fronteiras, ao sul, com o Brasil, com a Venezuela no sudoeste e com o Suriname ao leste.

Apoiador venezuelano da anexação da região de Essequibo segura um cartaz favorável ao plebiscito  Foto: Leonardo Fernandez Viloria / REUTERS

Guerra

Apesar do alerta ligado na América do Sul para a possibilidade de um conflito armado entre Caracas e Georgetown, analistas avaliam que o movimento de Maduro foi feito para reforçar o nacionalismo venezuelano, desviando a atenção do público da crise política e econômica do país com a proximidade das eleições.

“O plebiscito é uma manobra clássica para inflamar o nacionalismo antes das eleições em 2024. Cientes do risco de serem rotulados de traidores da pátria se criticassem a estratégia esdrúxula de Maduro de priorizar a retomada de Essequibo, oposicionistas não viram outra opção a não ser apoiar o autocrata venezuelano nesse quesito específico”, apontou Stuenkel em sua coluna.

A crise econômica da Venezuela e as concessões feitas por Maduro para a participação da oposição nas eleições marcadas para o ano que vem fizeram com que o regime buscasse meios para tentar oxigenar o seu movimento, avalia o professor de relações internacionais da ESPM, Leonardo Trevisan. “Este plebiscito teve esse papel, de mobilizar a população. A existência de um inimigo externo é sempre um fator mobilizador”, ressalta o especialista.

Apesar disso, caso Caracas opte de fato por invadir o território de Georgetown, os venezuelanos teriam claras vantagens no quesito militar. . No papel, as Forças Armadas da Venezuela têm uma capacidade militar considerável na região. Segundo o Anuário Militar de 2023 do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, de Londres), são 123 mil militares na ativa, mais 220 mil paramilitares e equipamentos obtidos da Rússia e da China, duas potências militares globais. Não se sabe, no entanto, se a prática reflete a teoria.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, conversa com o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, em Brasília, Brasil  Foto: Ueslei Marcelino/ REUTERS

Já a Guiana, que é um país com apenas 800 mil habitantes, conta com apenas 3,4 mil soldados, dos quais metade estão em funções na segurança pública. Ou seja, são policiais, sem treinamento de combate. Os equipamentos militares também são escassos. São seis blindados brasileiros Cascavel-EE9, fabricados pela extinta Engesa em 1984.

Uma invasão militar venezuelana para a tomada de Essequibo significaria adentrar na selva tropical densa que domina a região. É unanimidade entre analistas que geografias do tipo tornam quase impossível o uso de equipamentos basilares para a tomada de territórios, como veículos blindados. Uma alternativa seria adentrar no território brasileiro e seguir até Georgetown, a capital da Guiana, mas essa é uma possibilidade remota.

O Ministério da Defesa do Brasil afirmou ter intensificado a presença militar no norte e monitora a crise nos países vizinho e prepara o envio de 20 blindados a Pacaraima, em Roraima, próxima a fronteira com a Venezuela. “Os militares deixam bem claro que não será possível a Venezuela adentrar no território brasileiro para contornar a selva”, disse Rudzit.

Diplomacia

O Ministério das Relações Exteriores do Brasil informou a Venezuela e a Guiana que defende uma resolução pacífica na disputa em torno da região do Essequibo. O chanceler Mauro Vieira e o assessor especial da presidência para assuntos internacionais, Celso Amorim, tiveram em contato com autoridades dos dois países nas últimas semanas na tentativa de dissuadir qualquer conflito na região, localizada ao norte do Brasil.

A posição brasileira foi externada após o presidente da Guiana, Mohamed Irfaan Ali, procurar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) há cerca de três semanas, antes do plebiscito da Venezuela. Na conversa, Lula teria garantido a Irfaan Ali que não haveria nenhum “comportamento imprudente da Venezuela” na região, segundo o presidente guianense disse em entrevista à CNN.

Celso Amorim viajou com uma equipe para Caracas, a capital venezuelana, após o diálogo para informar o governo de Nicolás Maduro que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul e que o Brasil não vai apoiar nenhuma incursão militar na região. Na terça-feira, foi a vez do chanceler Mauro Vieira conversar com o presidente Irfaan Ali e externar a posição do Brasil. Segundo o Itamaraty, o ministro informou que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul.

Os ministros das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, e da Guiana, Hugh Todd, anunciaram na quarta-feira, 6, que ambos países irão manter “canais de comunicação” para tentar evitar a escalada do conflito. “A pedido da parte guianense, o ministro Hugh Todd teve uma conversa telefônica com o ministro Yván Gil para tratar do tema da controvérsia territorial”, disse o governo venezuelano em um comunicado./AFP e com informações de Daniel Gateno, Jessica Petrovna, Jorge C. Carrasco e Luiz Henrique Gomes

O Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) deve se reunir nesta sexta-feira, 7, as 17h (horário de Brasília) à portas fechadas para abordar o conflito territorial entre Venezuela e Guiana, segundo a agenda oficial, a pedido do governo guianense.

Em carta à qual a AFP teve acesso, o chanceler Hugh Hilton Todd solicita ao Conselho de Segurança “uma reunião urgente” para abordar o conflito em Essequibo, uma região rica em petróleo sob administração guianense, mas reivindicada pela Venezuela.

Na carta, o ministro guianense relata “as ações empreendidas” pela Venezuela “para anexar formalmente e incorporar ao território venezuelano a região que constitui mais de dois terços do território soberano da Guiana” do país.

As ações adotadas pela Venezuela “não farão mais do que agravar ainda mais a situação. Sua conduta constitui claramente uma ameaça direta para a paz e a segurança da Guiana, e mais amplamente ameaça à paz e à segurança de toda a região”, conclui o chanceler em sua carta ao Conselho de Segurança.

O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, discursa em um comício a favor da anexação da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Matias Delacroix/ AP

Conflito

As tensões estão altas desde que o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou que faria um plebiscito para a anexação da região de Essequibo, que pertence ao país vizinho. No domingo, 3, os venezuelanos aprovaram a anexação do território de quase 160 mil quilômetros quadrados com 95% dos votos, apesar do baixo quórum no dia da votação. Segundo dados do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, 10,5 milhões de pessoas compareceram de uma população eleitoral de 20,7 milhões.

Apesar de especialistas entrevistados pelo Estadão apontarem que a medida era meramente simbólica, Maduro seguiu com os procedimentos legais para dar um verniz oficial a sua posição. Na terça-feira, 5, o ditador enviou um projeto de lei para a Assembleia Nacional para aprovar uma lei que cria o Estado de Guiana Essequiba. Maduro também nomeou um interventor e ordenou à estatal PDVSA que distribua licenças para exploração de petróleo na região do Essequibo, que corresponde a 70% da Guiana. “A Guiana deve saber que resolveremos isso da maneira mais fácil ou resolveremos...”, disse Maduro, sem concluir a frase.

Além disso, o ditador montará um posto militar avançado na pequena cidade de Tumeremo, dentro do território da Venezuela, perto da fronteira com a Guiana, para supervisionar o novo Estado – embora ele não tenha anunciado nenhuma incursão. Ele designou o general Alexis Rodríguez Cabello como autoridade única do território de 160 mil quilômetros quadrados. O projeto foi aprovado pela Assembleia Nacional na quarta-feira, 6.

O presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodriguez, mostra um mapa da Venezuela com a inclusão da região de Essequibo, que pertence a Guiana  Foto: Pedro Rances Mattey/AFP

Resposta

Além de ter enviado uma carta ao Conselho de Segurança da ONU, a Guiana também já havia enviado ofícios antes do plebiscito venezuelano para a Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, na Holanda. O tribunal determinou no dia 2 de dezembro que a Venezuela deve evitar qualquer iniciativa que comprometa o status quo com a Guiana.

O tribunal não fez qualquer referência explícita ao plebiscito, mas apontou que Caracas deve “se abster de qualquer ação que modifique a situação atualmente em vigor no território em disputa”.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, apontou que tem buscado os aliados para assegurar a defesa da região no “pior cenário possível”, referindo-se a um conflito armado entre ambos países. Na quinta-feira, 7, as Forças Militares dos EUA conduziram exercícios militares de rotina com as Forças de Defesa da Guiana (GDF, na sigla em ingles) na região de Essequibo. A embaixada americana em Georgetown apontou que os exercícios são “operações de rotina”, mas analistas sinalizaram uma demonstração de alinhamento dos EUA com a Guiana.

A aliança com os EUA é vista pela Venezuela como sinal verde da Guiana para a presença militar americana na região. Nos dias 27 e 28 de novembro, vésperas do plebiscito da Venezuela, os militares americanos e guianenses se reuniram para “discutir os próximos compromissos para incluir sessões de planejamento estratégico e processos para melhorar a prontidão militar e as capacidades de ambos os países para responder a ameaças à segurança”, de acordo com nota da embaixada americana no país.

O ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino López, rejeitou nesta quinta-feira, 7, os exercícios militares conjuntos entre os Estados Unidos e a Guiana, anunciados pelo Comando Sul do Exército americano.

“Essa infeliz provocação dos Estados Unidos em favor dos pretorianos da ExxonMobil na Guiana é mais um passo na direção errada. Alertamos que eles não nos desviarão de nossas ações futuras para a recuperação do Essequibo...Não se enganem, Viva Venezuela!”, escreveu Padrino na rede social X.

O presidente da Guiana, Irfaan Ali, participa de evento em Ottawa, Canadá  Foto: Spencer Colby/AP

Disputa

Após declarar independência da Espanha, em 1811, a Venezuela avançou em direção ao rio. Acontece que, três anos depois, o Reino Unido assumiu o controle do que hoje é Guiana, em um acordo com a Holanda. A definição das fronteiras ficou em aberto e a coroa Britânica abocanhou o território em disputa.

Nas décadas seguintes, a Venezuela passou a disputar a fronteira e recorreu à ajuda dos Estados Unidos, algo que hoje seria impensável. A saída diplomática veio em 1899, quando foi convocado um tribunal composto por dois americanos (indicados pela Venezuela), dois britânicos e um russo para o desempate. Ficou decidido que o território pertencia a então Guiana inglesa.

Cinco décadas mais tarde, a Venezuela voltou a contestar o território alegando que o juiz russo fez parte de um complô com os britânicos. A discussão se arrastou até 1966, quando um acordo firmado em Genebra, meses antes da independência da Guiana, abriu o caminho para uma solução negociada, mas nunca houve consenso.

Em público, Maduro tem dito que quer resolver o conflito pela via diplomática, especificamente através dos termos estabelecidos no Acordo de Genebra de 1966.

Petróleo

As reservas de petróleo no território da Guiana são um fator chave para entender a disputa entre o único país de língua inglesa na América do Sul e a Venezuela. A descoberta de petróleo bruto no país em 2015 pela empresa americana do setor petrolífero ExxonMobil transformou a economia da Guiana. A ex-colônia britânica possui cerca de 11 bilhões de barris de reservas provadas de petróleo bruto, ou cerca de 0,6% do total mundial. A produção começou três anos atrás e agora está aumentando o ritmo.

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o país cresceu 62% no ano passado e deverá somar mais 37% este ano. Essa é a taxa de crescimento mais rápida em qualquer lugar do mundo.

A situação do país vizinho é bem diferente, com o sucateamento da empresa estatal venezuelana de petróleo PDVSA, devido a diversos casos de corrupção e mau gerenciamento. A capacidade de produção de petróleo da Venezuela caiu de 3.4 milhões de barris para apenas 700,000 por dia.

“As recentes descobertas de petróleo em Essequibo levaram Maduro a tentar resgatar uma narrativa de vitimização histórica, segundo a qual a nação foi roubada da riqueza que lhe pertence”, aponta o professor de relações internacionais da FGV, Oliver Stuenkel em sua coluna no Estadão.

A região de Essequibo é rica em recursos naturais e representa dois terços do território da Guiana, além de ser o lar de 125 mil habitantes da ex-colônia britânica. A Guiana possui fronteiras, ao sul, com o Brasil, com a Venezuela no sudoeste e com o Suriname ao leste.

Apoiador venezuelano da anexação da região de Essequibo segura um cartaz favorável ao plebiscito  Foto: Leonardo Fernandez Viloria / REUTERS

Guerra

Apesar do alerta ligado na América do Sul para a possibilidade de um conflito armado entre Caracas e Georgetown, analistas avaliam que o movimento de Maduro foi feito para reforçar o nacionalismo venezuelano, desviando a atenção do público da crise política e econômica do país com a proximidade das eleições.

“O plebiscito é uma manobra clássica para inflamar o nacionalismo antes das eleições em 2024. Cientes do risco de serem rotulados de traidores da pátria se criticassem a estratégia esdrúxula de Maduro de priorizar a retomada de Essequibo, oposicionistas não viram outra opção a não ser apoiar o autocrata venezuelano nesse quesito específico”, apontou Stuenkel em sua coluna.

A crise econômica da Venezuela e as concessões feitas por Maduro para a participação da oposição nas eleições marcadas para o ano que vem fizeram com que o regime buscasse meios para tentar oxigenar o seu movimento, avalia o professor de relações internacionais da ESPM, Leonardo Trevisan. “Este plebiscito teve esse papel, de mobilizar a população. A existência de um inimigo externo é sempre um fator mobilizador”, ressalta o especialista.

Apesar disso, caso Caracas opte de fato por invadir o território de Georgetown, os venezuelanos teriam claras vantagens no quesito militar. . No papel, as Forças Armadas da Venezuela têm uma capacidade militar considerável na região. Segundo o Anuário Militar de 2023 do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, de Londres), são 123 mil militares na ativa, mais 220 mil paramilitares e equipamentos obtidos da Rússia e da China, duas potências militares globais. Não se sabe, no entanto, se a prática reflete a teoria.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, conversa com o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, em Brasília, Brasil  Foto: Ueslei Marcelino/ REUTERS

Já a Guiana, que é um país com apenas 800 mil habitantes, conta com apenas 3,4 mil soldados, dos quais metade estão em funções na segurança pública. Ou seja, são policiais, sem treinamento de combate. Os equipamentos militares também são escassos. São seis blindados brasileiros Cascavel-EE9, fabricados pela extinta Engesa em 1984.

Uma invasão militar venezuelana para a tomada de Essequibo significaria adentrar na selva tropical densa que domina a região. É unanimidade entre analistas que geografias do tipo tornam quase impossível o uso de equipamentos basilares para a tomada de territórios, como veículos blindados. Uma alternativa seria adentrar no território brasileiro e seguir até Georgetown, a capital da Guiana, mas essa é uma possibilidade remota.

O Ministério da Defesa do Brasil afirmou ter intensificado a presença militar no norte e monitora a crise nos países vizinho e prepara o envio de 20 blindados a Pacaraima, em Roraima, próxima a fronteira com a Venezuela. “Os militares deixam bem claro que não será possível a Venezuela adentrar no território brasileiro para contornar a selva”, disse Rudzit.

Diplomacia

O Ministério das Relações Exteriores do Brasil informou a Venezuela e a Guiana que defende uma resolução pacífica na disputa em torno da região do Essequibo. O chanceler Mauro Vieira e o assessor especial da presidência para assuntos internacionais, Celso Amorim, tiveram em contato com autoridades dos dois países nas últimas semanas na tentativa de dissuadir qualquer conflito na região, localizada ao norte do Brasil.

A posição brasileira foi externada após o presidente da Guiana, Mohamed Irfaan Ali, procurar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) há cerca de três semanas, antes do plebiscito da Venezuela. Na conversa, Lula teria garantido a Irfaan Ali que não haveria nenhum “comportamento imprudente da Venezuela” na região, segundo o presidente guianense disse em entrevista à CNN.

Celso Amorim viajou com uma equipe para Caracas, a capital venezuelana, após o diálogo para informar o governo de Nicolás Maduro que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul e que o Brasil não vai apoiar nenhuma incursão militar na região. Na terça-feira, foi a vez do chanceler Mauro Vieira conversar com o presidente Irfaan Ali e externar a posição do Brasil. Segundo o Itamaraty, o ministro informou que a posição brasileira é pela resolução pacífica de qualquer controvérsia na América do Sul.

Os ministros das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, e da Guiana, Hugh Todd, anunciaram na quarta-feira, 6, que ambos países irão manter “canais de comunicação” para tentar evitar a escalada do conflito. “A pedido da parte guianense, o ministro Hugh Todd teve uma conversa telefônica com o ministro Yván Gil para tratar do tema da controvérsia territorial”, disse o governo venezuelano em um comunicado./AFP e com informações de Daniel Gateno, Jessica Petrovna, Jorge C. Carrasco e Luiz Henrique Gomes

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