IZIUM - A descoberta de centenas de corpos não identificados em uma área próxima à cidade de Izium, retomada pela Ucrânia, acirrou as acusações de Kiev sobre crimes de guerra cometidos pela Rússia, revivendo uma batalha de versões similar a outro momento do conflito, quando corpos com sinais de execução foram encontrados na cidade de Bucha, nos arredores da capital, ocupada pelos russos nos primeiros dias da invasão.
Autoridades ucranianas anunciaram na quinta-feira, 15, ter encontrado o que calcula serem 440 corpos enterrados em uma mesma área. Cerca de 200 cruzes de madeira improvisadas foram colocadas no local, arrodeado por árvores. Funcionários locais começaram a desenterrá-los, e o governo regional afirma que 99% estavam com sinais de tortura. Alguns cadáveres estavam com as mãos enterradas.
Cavando na chuva, trabalhadores ucranianos retiraram corpos inteiros e restos mortais do solo arenoso da floresta de pinheiros. Protegidos por trajes de corpo inteiro e luvas de borracha, eles tatearam suavemente as roupas em decomposição, aparentemente procurando por algo que pudesse identificar os mortos.
Não está claro quem exatamente foi enterrado no local ou como morreram. Testemunhas e um investigador ucraniano disseram que alguns foram baleados e outros foram mortos por explosões de artilharia, minas ou em ataques aéreos. De acordo com o promotor ucraniano Oleksandr Filchakov, alguns dos corpos estavam com as mãos amarradas nas costas e cordas no pescoço. O escritório de direitos humanos da ONU anunciou que vai investigar o caso.
Um repórter da agência de notícias France-Presse presente no local relatou ter visto ao menos um corpo que estaria amarrado, mas não foi possível identificar se tratava-se de um civil ou um militar pelo estágio de decomposição. A agência de notícias Reuters, publicou uma reportagem nesta sexta-feira, 16, descrevendo que alguns corpos tinham cordas ao redor do pescoço. Posteriormente, o texto foi retirado do ar, porque seus repórteres não haviam visto eles próprios, a cena.
Acredita-se que a maioria das pessoas enterradas sejam civis, de acordo com autoridades ucranianas. Mas havia pelo menos uma vala comum, com uma placa dizendo que continha os corpos de 17 soldados ucranianos.
Em seu pronunciamento diário em vídeo, o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, afirmou que a descoberta mostra ao mundo o saldo da ocupação russa. “Bucha, Mariupol, e agora, infelizmente, Izium. A Rússia deixa morte em todos os lugares e deve ser responsabilizada por isso”, afirmou o ucraniano.
Em Bucha, cidade nos arredores de Kiev e um dos alvos da comparação de Zelenski, centenas de corpos foram encontrados em abril e provocaram manifestações da comunidade internacional. Na época, o presidente chegou a chamar as mortes de civis de genocídio, e lideranças ao redor do mundo também se manifestaram.
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Russos deixaram a cidade de Bucha, mas corpos são encontrados largados nas ruas. Ucranianos voltam à procura de seus entes, muitos não têm o reencontro esperado
A Rússia nega, reiteradamente, que suas forças cometam crimes de guerra. O chefe pró-Moscou do governo de Izium, Vitali Gantchev, que liderava a cidade antes do recuo russo, acusou forças ucranianas de serem responsáveis pelos assassinatos, numa tentativa de culpas a Rússia por isso, escreveu a agência de notícias Tass.
Em uma rede social, Mikhailo Podoliak, assessor da Presidência da Ucrânia, usou o episódio para criticar setores que defendem o fim da guerra. “Alguém mais quer ‘congelar a guerra’ em vez de nos enviar mais tanques?”, questionou. “Não temos o direito de deixar as pessoas sozinhas com o mal”, seguiu, referindo-se aos russos.
Forças de Moscou assumiram o controle da cidade no final de março, após um cerco de três semanas, e a transformaram em um importante centro de abastecimento militar. Segundo o vereador Maksym Strelnikov, de Izium, centenas de pessoas morreram durante a ocupação russa e muitos não conseguiram um enterro adequado. As alegações não puderam ser verificadas imediatamente, mas cenas semelhantes ocorreram em outras cidades capturadas pelas forças russas, incluindo Mariupol.
Strelnikov disse que um número incontável de pessoas também morreu por falta de cuidados de saúde adequados desde que a “infraestrutura médica da cidade foi destruída”. A maior parte da população pré-guerra da cidade, de 47 mil habitantes, fugiu para territórios controlados pela Ucrânia. Strelnikov disse que 10 mil moradores permanecem na cidade em ruínas – se preparando para mais dificuldades com a chegada do inverno e a maior parte da infraestrutura destruída. / AFP e AP