Corrupção na Venezuela: sumiço de R$ 112 bi expõe luta interna pelo poder no regime Maduro


De um lado, estariam os ‘reformistas’, que defendem uma liberalização da economia, e do outro a linha-dura que considera mudanças uma traição ao legado de Hugo Chávez

Por Luiz Raatz
Atualização:

Perto de completar dez anos no poder, o presidente Nicolás Maduro lançou nesta semana uma operação dentro do próprio governo da Venezuela para afastar suspeitos de um desvio de US$ 21,2 bilhões (R$ 112 bilhoes) de corrupção na PDVSA, a estatal do petróleo. Ao menos 19 pessoas foram presas, entre militares, juízes e membros da elite da burocracia chavista. O ministro da Energia, Tareck Aissami, renunciou ao cargo. Segundo especialistas que acompanham de perto a política venezuelana, a operação expõe uma cisão interna no chavismo, com duas facções lutando pelo poder.

De um lado, estariam os ‘reformistas’, que defendem uma liberalização da economia e regras mais flexíveis no mercado cambial. O principal expoente desse grupo é Delcy Rodríguez, vice-presidente e ministra da Economia. Ela é apontada como a responsável pelas políticas que reduziram os gastos, controlaram hiperinflação e permitiram a livre circulação de dólares. Com isso, a Venezuela saiu de um dos mais profundos colapsos da história mundial e voltou a registrar níveis modestos de crescimento, ainda que tímidos para padrões da região.

Do outro estaria a linha-dura. Encrustados no Estado venezuelano, chavistas radicais manipulam verbas, empresas e contratos milionários em diversos setores da economia há anos, e consideram essas flexibilizações uma traição ao legado do ex-presidente Hugo Chávez. Um dos representantes desse grupo é Aissami, um aliado de longa data do patrono bolivariano, morto em 2013. Sob Maduro, ele ganhou protagonismo e se tornou gestor do petróleo venezuelano, a galinha dos ovos de ouro do país.

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“A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo”, diz Geoff Ramsey, especialista em Colômbia e Venezuela do Atlantic Council. “Ele é o responsável pela estratégia de evasão das sanções americanas. É alguém que tem muitos esqueletos no armário. Se ele for preso, isso pode ter consequências sérias para a estrutura de poder na Venezuela.”

Em foto de 2017, o presidente venezuelano Nicolás Maduro (E) fala com o então vice, Tareck Aissami, em evento de campanha em Caracas  Foto: Federico Parra / AFP

Rombo em transações escusas

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Acusado de narcotráfico pelo governo americano, com uma recompensa de US$ 10 milhões por sua captura, Tareck Aissami ganhou o favoritismo de Maduro após o governo de Donald Trump impor pesadas sanções econômicas à venda do petróleo venezuelano, com o objetivo de pressionar pelo fim do regime.

Diante das sanções, a PDVSA, comandada pelo ministro de Energia, teve de buscar intermediários em outros países não só para exportar esse petróleo como também para comprar bens e alimentos que se tornaram escassos pela ausência de dólares e de um aparato produtivo interno. De origens sírias, Aissami intermediou contatos no Irã e na Turquia para tornar isso possível.

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Foram esses contratos que entraram na mira de Delcy Rodríguez. Segundo a Bloomberg, uma auditoria interna descobriu um buraco negro financeiro na estatal petrolífera no valor de US$ 21,2 bi. Os pagamentos desaparecidos datam, na maioria, do período entre 2020 e 2022, quando a Venezuela buscou novos intermediários para ajudar a contornar as sanções dos EUA e negociar, embarcar e vender seu petróleo

O gabinete de Rodríguez foi encarregado de rastrear cargas de petróleo não quitadas. Em janeiro, a ministra nomeou um tecnocrata do setor petroquímico, Pedro Tellechea, como diretor da PDVSA. Tellechea suspendeu contratos existentes poucos dias após assumir o cargo, em janeiro. Ainda de acordo com a Bloomberg, Rodríguez se tornou a responsável de fato pela aprovação de todos os novos empreendimentos da PDVSA e assina todos os novos contratos junto com Tellechea.

Esse controle e essa supervisão recentes sobre as finanças da PDVSA provocaram tensão entre Rodríguez e El Aissami. Em uma reunião na semana passada, Delcy informou o rival sobre o início de uma investigação sobre acusações de corrupção dentro da PDVSA, de acordo com fontes a par do encontro. O ministro da Energia, então, decidiu renunciar.

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Moradores se reúnem do lado de fora de suas casas no bairro de San Agustin, em Caracas: três quartos da população da Venezuela vive na extrema pobreza  Foto: Ariana Cubillos /AP

Crise e corrupção

Mais além da política, a disputa entre Delcy Rodríguez e Aissami é também uma disputa por influência econômica. Na última década, Maduro hipotecou o comando da economia venezuelana a militares e à chamada boliburguesia - um grupo de aliados do chavismo que enriqueceu profundamente com empreendimentos estatais na Venezuela.

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A destruição do aparato produtivo privado, no entanto, jogou o país numa crise de escassez que provocou a emigração de 7 milhões de venezuelanos para diversos países da América Latina, entre eles o Brasil. Nos últimos anos, o governo vem conseguindo amenizar a crise provocada por esse modelo, no qual Aissami, os militares e outros burocratas eram protagonistas.

De que lado, Nicolás?

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A grande dúvida que permanece é de que lado está Maduro. Na noite da renúncia de Aissami, o presidente elogiou o colega como um ‘verdadeiro revolucionário” se afastar do cargo.

Nos dias seguintes, no entanto, o autocrata deu sinais de apoio à facção de Delcy Rodríguez ao nomear Tellechea para substituir Aissami. Outro indicativo de que Maduro estaria descontente com a linha-dura foi a prisão de militares que trabalhavam na PDVSA.

“A corrupção na PDVSA atinge 1/3 da venda do petróleo, mas as investigações são seletivas e servem para expurgar rivais políticos”, disse Francisco Monaldi, da Universidade de Rice, ao Financial Times.

Ramsey acredita que o destino de Aissami dará dicas sobre como Maduro enxerga a questão. “A coisa mais importante agora é saber se ele vai receber uma punição leve ou se será algo mais duro”, afirma.

A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo

Geoff Ramsey, especialista em Venezuela do Atlantic Council

Eleições na mira

Outro fator que pode ter motivado a rinha chavista é a proximidade das eleições do ano que vem. “As eleições de 2024 significam que Maduro precisa de dinheiro para preparar a economia e garantir votos”, escreveu Nicholas Watson, analista de risco político da consultoria Teneo Holdings, em relatório.

A diminuição da oferta de energia provocada pela guerra na Ucrânia fez com que EUA e União Europeia voltassem a procurar os chavistas para negócios. No ano passado, a Chevron voltou a operar na Venezuela e o regime decidiu libertar americanos que estavam presos havia anos no país.

A Casa Branca quer sinais concretos de que eleições justas com a participação da oposição podem ocorrer no ano que vem e as recentes mudanças políticas em vizinhos sul-americanos também indicam que Maduro pode sair do isolamento.

“Os chavistas sempre se uniram, mesmo diante de rivalidades terríveis, mas isso claramente mudou”, pondera Jose Toro Hardy, especialista venezuelano em petróleo. “A oposição deve aproveitar isso e olhar a briga se desenrolar de longe.”

Perto de completar dez anos no poder, o presidente Nicolás Maduro lançou nesta semana uma operação dentro do próprio governo da Venezuela para afastar suspeitos de um desvio de US$ 21,2 bilhões (R$ 112 bilhoes) de corrupção na PDVSA, a estatal do petróleo. Ao menos 19 pessoas foram presas, entre militares, juízes e membros da elite da burocracia chavista. O ministro da Energia, Tareck Aissami, renunciou ao cargo. Segundo especialistas que acompanham de perto a política venezuelana, a operação expõe uma cisão interna no chavismo, com duas facções lutando pelo poder.

De um lado, estariam os ‘reformistas’, que defendem uma liberalização da economia e regras mais flexíveis no mercado cambial. O principal expoente desse grupo é Delcy Rodríguez, vice-presidente e ministra da Economia. Ela é apontada como a responsável pelas políticas que reduziram os gastos, controlaram hiperinflação e permitiram a livre circulação de dólares. Com isso, a Venezuela saiu de um dos mais profundos colapsos da história mundial e voltou a registrar níveis modestos de crescimento, ainda que tímidos para padrões da região.

Do outro estaria a linha-dura. Encrustados no Estado venezuelano, chavistas radicais manipulam verbas, empresas e contratos milionários em diversos setores da economia há anos, e consideram essas flexibilizações uma traição ao legado do ex-presidente Hugo Chávez. Um dos representantes desse grupo é Aissami, um aliado de longa data do patrono bolivariano, morto em 2013. Sob Maduro, ele ganhou protagonismo e se tornou gestor do petróleo venezuelano, a galinha dos ovos de ouro do país.

“A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo”, diz Geoff Ramsey, especialista em Colômbia e Venezuela do Atlantic Council. “Ele é o responsável pela estratégia de evasão das sanções americanas. É alguém que tem muitos esqueletos no armário. Se ele for preso, isso pode ter consequências sérias para a estrutura de poder na Venezuela.”

Em foto de 2017, o presidente venezuelano Nicolás Maduro (E) fala com o então vice, Tareck Aissami, em evento de campanha em Caracas  Foto: Federico Parra / AFP

Rombo em transações escusas

Acusado de narcotráfico pelo governo americano, com uma recompensa de US$ 10 milhões por sua captura, Tareck Aissami ganhou o favoritismo de Maduro após o governo de Donald Trump impor pesadas sanções econômicas à venda do petróleo venezuelano, com o objetivo de pressionar pelo fim do regime.

Diante das sanções, a PDVSA, comandada pelo ministro de Energia, teve de buscar intermediários em outros países não só para exportar esse petróleo como também para comprar bens e alimentos que se tornaram escassos pela ausência de dólares e de um aparato produtivo interno. De origens sírias, Aissami intermediou contatos no Irã e na Turquia para tornar isso possível.

Foram esses contratos que entraram na mira de Delcy Rodríguez. Segundo a Bloomberg, uma auditoria interna descobriu um buraco negro financeiro na estatal petrolífera no valor de US$ 21,2 bi. Os pagamentos desaparecidos datam, na maioria, do período entre 2020 e 2022, quando a Venezuela buscou novos intermediários para ajudar a contornar as sanções dos EUA e negociar, embarcar e vender seu petróleo

O gabinete de Rodríguez foi encarregado de rastrear cargas de petróleo não quitadas. Em janeiro, a ministra nomeou um tecnocrata do setor petroquímico, Pedro Tellechea, como diretor da PDVSA. Tellechea suspendeu contratos existentes poucos dias após assumir o cargo, em janeiro. Ainda de acordo com a Bloomberg, Rodríguez se tornou a responsável de fato pela aprovação de todos os novos empreendimentos da PDVSA e assina todos os novos contratos junto com Tellechea.

Esse controle e essa supervisão recentes sobre as finanças da PDVSA provocaram tensão entre Rodríguez e El Aissami. Em uma reunião na semana passada, Delcy informou o rival sobre o início de uma investigação sobre acusações de corrupção dentro da PDVSA, de acordo com fontes a par do encontro. O ministro da Energia, então, decidiu renunciar.

Moradores se reúnem do lado de fora de suas casas no bairro de San Agustin, em Caracas: três quartos da população da Venezuela vive na extrema pobreza  Foto: Ariana Cubillos /AP

Crise e corrupção

Mais além da política, a disputa entre Delcy Rodríguez e Aissami é também uma disputa por influência econômica. Na última década, Maduro hipotecou o comando da economia venezuelana a militares e à chamada boliburguesia - um grupo de aliados do chavismo que enriqueceu profundamente com empreendimentos estatais na Venezuela.

A destruição do aparato produtivo privado, no entanto, jogou o país numa crise de escassez que provocou a emigração de 7 milhões de venezuelanos para diversos países da América Latina, entre eles o Brasil. Nos últimos anos, o governo vem conseguindo amenizar a crise provocada por esse modelo, no qual Aissami, os militares e outros burocratas eram protagonistas.

De que lado, Nicolás?

A grande dúvida que permanece é de que lado está Maduro. Na noite da renúncia de Aissami, o presidente elogiou o colega como um ‘verdadeiro revolucionário” se afastar do cargo.

Nos dias seguintes, no entanto, o autocrata deu sinais de apoio à facção de Delcy Rodríguez ao nomear Tellechea para substituir Aissami. Outro indicativo de que Maduro estaria descontente com a linha-dura foi a prisão de militares que trabalhavam na PDVSA.

“A corrupção na PDVSA atinge 1/3 da venda do petróleo, mas as investigações são seletivas e servem para expurgar rivais políticos”, disse Francisco Monaldi, da Universidade de Rice, ao Financial Times.

Ramsey acredita que o destino de Aissami dará dicas sobre como Maduro enxerga a questão. “A coisa mais importante agora é saber se ele vai receber uma punição leve ou se será algo mais duro”, afirma.

A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo

Geoff Ramsey, especialista em Venezuela do Atlantic Council

Eleições na mira

Outro fator que pode ter motivado a rinha chavista é a proximidade das eleições do ano que vem. “As eleições de 2024 significam que Maduro precisa de dinheiro para preparar a economia e garantir votos”, escreveu Nicholas Watson, analista de risco político da consultoria Teneo Holdings, em relatório.

A diminuição da oferta de energia provocada pela guerra na Ucrânia fez com que EUA e União Europeia voltassem a procurar os chavistas para negócios. No ano passado, a Chevron voltou a operar na Venezuela e o regime decidiu libertar americanos que estavam presos havia anos no país.

A Casa Branca quer sinais concretos de que eleições justas com a participação da oposição podem ocorrer no ano que vem e as recentes mudanças políticas em vizinhos sul-americanos também indicam que Maduro pode sair do isolamento.

“Os chavistas sempre se uniram, mesmo diante de rivalidades terríveis, mas isso claramente mudou”, pondera Jose Toro Hardy, especialista venezuelano em petróleo. “A oposição deve aproveitar isso e olhar a briga se desenrolar de longe.”

Perto de completar dez anos no poder, o presidente Nicolás Maduro lançou nesta semana uma operação dentro do próprio governo da Venezuela para afastar suspeitos de um desvio de US$ 21,2 bilhões (R$ 112 bilhoes) de corrupção na PDVSA, a estatal do petróleo. Ao menos 19 pessoas foram presas, entre militares, juízes e membros da elite da burocracia chavista. O ministro da Energia, Tareck Aissami, renunciou ao cargo. Segundo especialistas que acompanham de perto a política venezuelana, a operação expõe uma cisão interna no chavismo, com duas facções lutando pelo poder.

De um lado, estariam os ‘reformistas’, que defendem uma liberalização da economia e regras mais flexíveis no mercado cambial. O principal expoente desse grupo é Delcy Rodríguez, vice-presidente e ministra da Economia. Ela é apontada como a responsável pelas políticas que reduziram os gastos, controlaram hiperinflação e permitiram a livre circulação de dólares. Com isso, a Venezuela saiu de um dos mais profundos colapsos da história mundial e voltou a registrar níveis modestos de crescimento, ainda que tímidos para padrões da região.

Do outro estaria a linha-dura. Encrustados no Estado venezuelano, chavistas radicais manipulam verbas, empresas e contratos milionários em diversos setores da economia há anos, e consideram essas flexibilizações uma traição ao legado do ex-presidente Hugo Chávez. Um dos representantes desse grupo é Aissami, um aliado de longa data do patrono bolivariano, morto em 2013. Sob Maduro, ele ganhou protagonismo e se tornou gestor do petróleo venezuelano, a galinha dos ovos de ouro do país.

“A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo”, diz Geoff Ramsey, especialista em Colômbia e Venezuela do Atlantic Council. “Ele é o responsável pela estratégia de evasão das sanções americanas. É alguém que tem muitos esqueletos no armário. Se ele for preso, isso pode ter consequências sérias para a estrutura de poder na Venezuela.”

Em foto de 2017, o presidente venezuelano Nicolás Maduro (E) fala com o então vice, Tareck Aissami, em evento de campanha em Caracas  Foto: Federico Parra / AFP

Rombo em transações escusas

Acusado de narcotráfico pelo governo americano, com uma recompensa de US$ 10 milhões por sua captura, Tareck Aissami ganhou o favoritismo de Maduro após o governo de Donald Trump impor pesadas sanções econômicas à venda do petróleo venezuelano, com o objetivo de pressionar pelo fim do regime.

Diante das sanções, a PDVSA, comandada pelo ministro de Energia, teve de buscar intermediários em outros países não só para exportar esse petróleo como também para comprar bens e alimentos que se tornaram escassos pela ausência de dólares e de um aparato produtivo interno. De origens sírias, Aissami intermediou contatos no Irã e na Turquia para tornar isso possível.

Foram esses contratos que entraram na mira de Delcy Rodríguez. Segundo a Bloomberg, uma auditoria interna descobriu um buraco negro financeiro na estatal petrolífera no valor de US$ 21,2 bi. Os pagamentos desaparecidos datam, na maioria, do período entre 2020 e 2022, quando a Venezuela buscou novos intermediários para ajudar a contornar as sanções dos EUA e negociar, embarcar e vender seu petróleo

O gabinete de Rodríguez foi encarregado de rastrear cargas de petróleo não quitadas. Em janeiro, a ministra nomeou um tecnocrata do setor petroquímico, Pedro Tellechea, como diretor da PDVSA. Tellechea suspendeu contratos existentes poucos dias após assumir o cargo, em janeiro. Ainda de acordo com a Bloomberg, Rodríguez se tornou a responsável de fato pela aprovação de todos os novos empreendimentos da PDVSA e assina todos os novos contratos junto com Tellechea.

Esse controle e essa supervisão recentes sobre as finanças da PDVSA provocaram tensão entre Rodríguez e El Aissami. Em uma reunião na semana passada, Delcy informou o rival sobre o início de uma investigação sobre acusações de corrupção dentro da PDVSA, de acordo com fontes a par do encontro. O ministro da Energia, então, decidiu renunciar.

Moradores se reúnem do lado de fora de suas casas no bairro de San Agustin, em Caracas: três quartos da população da Venezuela vive na extrema pobreza  Foto: Ariana Cubillos /AP

Crise e corrupção

Mais além da política, a disputa entre Delcy Rodríguez e Aissami é também uma disputa por influência econômica. Na última década, Maduro hipotecou o comando da economia venezuelana a militares e à chamada boliburguesia - um grupo de aliados do chavismo que enriqueceu profundamente com empreendimentos estatais na Venezuela.

A destruição do aparato produtivo privado, no entanto, jogou o país numa crise de escassez que provocou a emigração de 7 milhões de venezuelanos para diversos países da América Latina, entre eles o Brasil. Nos últimos anos, o governo vem conseguindo amenizar a crise provocada por esse modelo, no qual Aissami, os militares e outros burocratas eram protagonistas.

De que lado, Nicolás?

A grande dúvida que permanece é de que lado está Maduro. Na noite da renúncia de Aissami, o presidente elogiou o colega como um ‘verdadeiro revolucionário” se afastar do cargo.

Nos dias seguintes, no entanto, o autocrata deu sinais de apoio à facção de Delcy Rodríguez ao nomear Tellechea para substituir Aissami. Outro indicativo de que Maduro estaria descontente com a linha-dura foi a prisão de militares que trabalhavam na PDVSA.

“A corrupção na PDVSA atinge 1/3 da venda do petróleo, mas as investigações são seletivas e servem para expurgar rivais políticos”, disse Francisco Monaldi, da Universidade de Rice, ao Financial Times.

Ramsey acredita que o destino de Aissami dará dicas sobre como Maduro enxerga a questão. “A coisa mais importante agora é saber se ele vai receber uma punição leve ou se será algo mais duro”, afirma.

A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo

Geoff Ramsey, especialista em Venezuela do Atlantic Council

Eleições na mira

Outro fator que pode ter motivado a rinha chavista é a proximidade das eleições do ano que vem. “As eleições de 2024 significam que Maduro precisa de dinheiro para preparar a economia e garantir votos”, escreveu Nicholas Watson, analista de risco político da consultoria Teneo Holdings, em relatório.

A diminuição da oferta de energia provocada pela guerra na Ucrânia fez com que EUA e União Europeia voltassem a procurar os chavistas para negócios. No ano passado, a Chevron voltou a operar na Venezuela e o regime decidiu libertar americanos que estavam presos havia anos no país.

A Casa Branca quer sinais concretos de que eleições justas com a participação da oposição podem ocorrer no ano que vem e as recentes mudanças políticas em vizinhos sul-americanos também indicam que Maduro pode sair do isolamento.

“Os chavistas sempre se uniram, mesmo diante de rivalidades terríveis, mas isso claramente mudou”, pondera Jose Toro Hardy, especialista venezuelano em petróleo. “A oposição deve aproveitar isso e olhar a briga se desenrolar de longe.”

Perto de completar dez anos no poder, o presidente Nicolás Maduro lançou nesta semana uma operação dentro do próprio governo da Venezuela para afastar suspeitos de um desvio de US$ 21,2 bilhões (R$ 112 bilhoes) de corrupção na PDVSA, a estatal do petróleo. Ao menos 19 pessoas foram presas, entre militares, juízes e membros da elite da burocracia chavista. O ministro da Energia, Tareck Aissami, renunciou ao cargo. Segundo especialistas que acompanham de perto a política venezuelana, a operação expõe uma cisão interna no chavismo, com duas facções lutando pelo poder.

De um lado, estariam os ‘reformistas’, que defendem uma liberalização da economia e regras mais flexíveis no mercado cambial. O principal expoente desse grupo é Delcy Rodríguez, vice-presidente e ministra da Economia. Ela é apontada como a responsável pelas políticas que reduziram os gastos, controlaram hiperinflação e permitiram a livre circulação de dólares. Com isso, a Venezuela saiu de um dos mais profundos colapsos da história mundial e voltou a registrar níveis modestos de crescimento, ainda que tímidos para padrões da região.

Do outro estaria a linha-dura. Encrustados no Estado venezuelano, chavistas radicais manipulam verbas, empresas e contratos milionários em diversos setores da economia há anos, e consideram essas flexibilizações uma traição ao legado do ex-presidente Hugo Chávez. Um dos representantes desse grupo é Aissami, um aliado de longa data do patrono bolivariano, morto em 2013. Sob Maduro, ele ganhou protagonismo e se tornou gestor do petróleo venezuelano, a galinha dos ovos de ouro do país.

“A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo”, diz Geoff Ramsey, especialista em Colômbia e Venezuela do Atlantic Council. “Ele é o responsável pela estratégia de evasão das sanções americanas. É alguém que tem muitos esqueletos no armário. Se ele for preso, isso pode ter consequências sérias para a estrutura de poder na Venezuela.”

Em foto de 2017, o presidente venezuelano Nicolás Maduro (E) fala com o então vice, Tareck Aissami, em evento de campanha em Caracas  Foto: Federico Parra / AFP

Rombo em transações escusas

Acusado de narcotráfico pelo governo americano, com uma recompensa de US$ 10 milhões por sua captura, Tareck Aissami ganhou o favoritismo de Maduro após o governo de Donald Trump impor pesadas sanções econômicas à venda do petróleo venezuelano, com o objetivo de pressionar pelo fim do regime.

Diante das sanções, a PDVSA, comandada pelo ministro de Energia, teve de buscar intermediários em outros países não só para exportar esse petróleo como também para comprar bens e alimentos que se tornaram escassos pela ausência de dólares e de um aparato produtivo interno. De origens sírias, Aissami intermediou contatos no Irã e na Turquia para tornar isso possível.

Foram esses contratos que entraram na mira de Delcy Rodríguez. Segundo a Bloomberg, uma auditoria interna descobriu um buraco negro financeiro na estatal petrolífera no valor de US$ 21,2 bi. Os pagamentos desaparecidos datam, na maioria, do período entre 2020 e 2022, quando a Venezuela buscou novos intermediários para ajudar a contornar as sanções dos EUA e negociar, embarcar e vender seu petróleo

O gabinete de Rodríguez foi encarregado de rastrear cargas de petróleo não quitadas. Em janeiro, a ministra nomeou um tecnocrata do setor petroquímico, Pedro Tellechea, como diretor da PDVSA. Tellechea suspendeu contratos existentes poucos dias após assumir o cargo, em janeiro. Ainda de acordo com a Bloomberg, Rodríguez se tornou a responsável de fato pela aprovação de todos os novos empreendimentos da PDVSA e assina todos os novos contratos junto com Tellechea.

Esse controle e essa supervisão recentes sobre as finanças da PDVSA provocaram tensão entre Rodríguez e El Aissami. Em uma reunião na semana passada, Delcy informou o rival sobre o início de uma investigação sobre acusações de corrupção dentro da PDVSA, de acordo com fontes a par do encontro. O ministro da Energia, então, decidiu renunciar.

Moradores se reúnem do lado de fora de suas casas no bairro de San Agustin, em Caracas: três quartos da população da Venezuela vive na extrema pobreza  Foto: Ariana Cubillos /AP

Crise e corrupção

Mais além da política, a disputa entre Delcy Rodríguez e Aissami é também uma disputa por influência econômica. Na última década, Maduro hipotecou o comando da economia venezuelana a militares e à chamada boliburguesia - um grupo de aliados do chavismo que enriqueceu profundamente com empreendimentos estatais na Venezuela.

A destruição do aparato produtivo privado, no entanto, jogou o país numa crise de escassez que provocou a emigração de 7 milhões de venezuelanos para diversos países da América Latina, entre eles o Brasil. Nos últimos anos, o governo vem conseguindo amenizar a crise provocada por esse modelo, no qual Aissami, os militares e outros burocratas eram protagonistas.

De que lado, Nicolás?

A grande dúvida que permanece é de que lado está Maduro. Na noite da renúncia de Aissami, o presidente elogiou o colega como um ‘verdadeiro revolucionário” se afastar do cargo.

Nos dias seguintes, no entanto, o autocrata deu sinais de apoio à facção de Delcy Rodríguez ao nomear Tellechea para substituir Aissami. Outro indicativo de que Maduro estaria descontente com a linha-dura foi a prisão de militares que trabalhavam na PDVSA.

“A corrupção na PDVSA atinge 1/3 da venda do petróleo, mas as investigações são seletivas e servem para expurgar rivais políticos”, disse Francisco Monaldi, da Universidade de Rice, ao Financial Times.

Ramsey acredita que o destino de Aissami dará dicas sobre como Maduro enxerga a questão. “A coisa mais importante agora é saber se ele vai receber uma punição leve ou se será algo mais duro”, afirma.

A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo

Geoff Ramsey, especialista em Venezuela do Atlantic Council

Eleições na mira

Outro fator que pode ter motivado a rinha chavista é a proximidade das eleições do ano que vem. “As eleições de 2024 significam que Maduro precisa de dinheiro para preparar a economia e garantir votos”, escreveu Nicholas Watson, analista de risco político da consultoria Teneo Holdings, em relatório.

A diminuição da oferta de energia provocada pela guerra na Ucrânia fez com que EUA e União Europeia voltassem a procurar os chavistas para negócios. No ano passado, a Chevron voltou a operar na Venezuela e o regime decidiu libertar americanos que estavam presos havia anos no país.

A Casa Branca quer sinais concretos de que eleições justas com a participação da oposição podem ocorrer no ano que vem e as recentes mudanças políticas em vizinhos sul-americanos também indicam que Maduro pode sair do isolamento.

“Os chavistas sempre se uniram, mesmo diante de rivalidades terríveis, mas isso claramente mudou”, pondera Jose Toro Hardy, especialista venezuelano em petróleo. “A oposição deve aproveitar isso e olhar a briga se desenrolar de longe.”

Perto de completar dez anos no poder, o presidente Nicolás Maduro lançou nesta semana uma operação dentro do próprio governo da Venezuela para afastar suspeitos de um desvio de US$ 21,2 bilhões (R$ 112 bilhoes) de corrupção na PDVSA, a estatal do petróleo. Ao menos 19 pessoas foram presas, entre militares, juízes e membros da elite da burocracia chavista. O ministro da Energia, Tareck Aissami, renunciou ao cargo. Segundo especialistas que acompanham de perto a política venezuelana, a operação expõe uma cisão interna no chavismo, com duas facções lutando pelo poder.

De um lado, estariam os ‘reformistas’, que defendem uma liberalização da economia e regras mais flexíveis no mercado cambial. O principal expoente desse grupo é Delcy Rodríguez, vice-presidente e ministra da Economia. Ela é apontada como a responsável pelas políticas que reduziram os gastos, controlaram hiperinflação e permitiram a livre circulação de dólares. Com isso, a Venezuela saiu de um dos mais profundos colapsos da história mundial e voltou a registrar níveis modestos de crescimento, ainda que tímidos para padrões da região.

Do outro estaria a linha-dura. Encrustados no Estado venezuelano, chavistas radicais manipulam verbas, empresas e contratos milionários em diversos setores da economia há anos, e consideram essas flexibilizações uma traição ao legado do ex-presidente Hugo Chávez. Um dos representantes desse grupo é Aissami, um aliado de longa data do patrono bolivariano, morto em 2013. Sob Maduro, ele ganhou protagonismo e se tornou gestor do petróleo venezuelano, a galinha dos ovos de ouro do país.

“A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo”, diz Geoff Ramsey, especialista em Colômbia e Venezuela do Atlantic Council. “Ele é o responsável pela estratégia de evasão das sanções americanas. É alguém que tem muitos esqueletos no armário. Se ele for preso, isso pode ter consequências sérias para a estrutura de poder na Venezuela.”

Em foto de 2017, o presidente venezuelano Nicolás Maduro (E) fala com o então vice, Tareck Aissami, em evento de campanha em Caracas  Foto: Federico Parra / AFP

Rombo em transações escusas

Acusado de narcotráfico pelo governo americano, com uma recompensa de US$ 10 milhões por sua captura, Tareck Aissami ganhou o favoritismo de Maduro após o governo de Donald Trump impor pesadas sanções econômicas à venda do petróleo venezuelano, com o objetivo de pressionar pelo fim do regime.

Diante das sanções, a PDVSA, comandada pelo ministro de Energia, teve de buscar intermediários em outros países não só para exportar esse petróleo como também para comprar bens e alimentos que se tornaram escassos pela ausência de dólares e de um aparato produtivo interno. De origens sírias, Aissami intermediou contatos no Irã e na Turquia para tornar isso possível.

Foram esses contratos que entraram na mira de Delcy Rodríguez. Segundo a Bloomberg, uma auditoria interna descobriu um buraco negro financeiro na estatal petrolífera no valor de US$ 21,2 bi. Os pagamentos desaparecidos datam, na maioria, do período entre 2020 e 2022, quando a Venezuela buscou novos intermediários para ajudar a contornar as sanções dos EUA e negociar, embarcar e vender seu petróleo

O gabinete de Rodríguez foi encarregado de rastrear cargas de petróleo não quitadas. Em janeiro, a ministra nomeou um tecnocrata do setor petroquímico, Pedro Tellechea, como diretor da PDVSA. Tellechea suspendeu contratos existentes poucos dias após assumir o cargo, em janeiro. Ainda de acordo com a Bloomberg, Rodríguez se tornou a responsável de fato pela aprovação de todos os novos empreendimentos da PDVSA e assina todos os novos contratos junto com Tellechea.

Esse controle e essa supervisão recentes sobre as finanças da PDVSA provocaram tensão entre Rodríguez e El Aissami. Em uma reunião na semana passada, Delcy informou o rival sobre o início de uma investigação sobre acusações de corrupção dentro da PDVSA, de acordo com fontes a par do encontro. O ministro da Energia, então, decidiu renunciar.

Moradores se reúnem do lado de fora de suas casas no bairro de San Agustin, em Caracas: três quartos da população da Venezuela vive na extrema pobreza  Foto: Ariana Cubillos /AP

Crise e corrupção

Mais além da política, a disputa entre Delcy Rodríguez e Aissami é também uma disputa por influência econômica. Na última década, Maduro hipotecou o comando da economia venezuelana a militares e à chamada boliburguesia - um grupo de aliados do chavismo que enriqueceu profundamente com empreendimentos estatais na Venezuela.

A destruição do aparato produtivo privado, no entanto, jogou o país numa crise de escassez que provocou a emigração de 7 milhões de venezuelanos para diversos países da América Latina, entre eles o Brasil. Nos últimos anos, o governo vem conseguindo amenizar a crise provocada por esse modelo, no qual Aissami, os militares e outros burocratas eram protagonistas.

De que lado, Nicolás?

A grande dúvida que permanece é de que lado está Maduro. Na noite da renúncia de Aissami, o presidente elogiou o colega como um ‘verdadeiro revolucionário” se afastar do cargo.

Nos dias seguintes, no entanto, o autocrata deu sinais de apoio à facção de Delcy Rodríguez ao nomear Tellechea para substituir Aissami. Outro indicativo de que Maduro estaria descontente com a linha-dura foi a prisão de militares que trabalhavam na PDVSA.

“A corrupção na PDVSA atinge 1/3 da venda do petróleo, mas as investigações são seletivas e servem para expurgar rivais políticos”, disse Francisco Monaldi, da Universidade de Rice, ao Financial Times.

Ramsey acredita que o destino de Aissami dará dicas sobre como Maduro enxerga a questão. “A coisa mais importante agora é saber se ele vai receber uma punição leve ou se será algo mais duro”, afirma.

A renúncia de Aissami é a ultima e maior evidência dessa disputa interna de poder no chavismo

Geoff Ramsey, especialista em Venezuela do Atlantic Council

Eleições na mira

Outro fator que pode ter motivado a rinha chavista é a proximidade das eleições do ano que vem. “As eleições de 2024 significam que Maduro precisa de dinheiro para preparar a economia e garantir votos”, escreveu Nicholas Watson, analista de risco político da consultoria Teneo Holdings, em relatório.

A diminuição da oferta de energia provocada pela guerra na Ucrânia fez com que EUA e União Europeia voltassem a procurar os chavistas para negócios. No ano passado, a Chevron voltou a operar na Venezuela e o regime decidiu libertar americanos que estavam presos havia anos no país.

A Casa Branca quer sinais concretos de que eleições justas com a participação da oposição podem ocorrer no ano que vem e as recentes mudanças políticas em vizinhos sul-americanos também indicam que Maduro pode sair do isolamento.

“Os chavistas sempre se uniram, mesmo diante de rivalidades terríveis, mas isso claramente mudou”, pondera Jose Toro Hardy, especialista venezuelano em petróleo. “A oposição deve aproveitar isso e olhar a briga se desenrolar de longe.”

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