Promotores buscam provas para denunciar crimes de guerra na Ucrânia


País está acionando cerca de 50 mil investigadores, de cinco agências de segurança diferentes, para acusar Rússia no Tribunal Penal Internacional

Por Redação

KIEV - A retirada de tropas da Rússia do norte da Ucrânia e do entorno da capital, Kiev, depois de as forças do presidente Volodmir Zelenski conseguirem resistir ao acosso do Kremlin por semanas tornou pública uma série de indícios de atrocidades cometidas contra a população civil em cidades como Bucha, Chernihiv, Nova Basan, Irpin e Borodianka.

Indícios de execuções em massa, tortura e saques fizeram nos últimos dias a comunidade internacional ampliar as sanções contra a Rússia e denunciar o regime de Vladimir Putin por crimes de guerra. Na Ucrânia, promotores locais tentam reunir provas para conseguir apresentar uma denúncia formal no Tribunal Penal Internacional.

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A Procuradoria Geral estima que a Ucrânia está acionando cerca de 50 mil investigadores, de cinco agências de segurança diferentes, para investigar crimes de guerra. Eles estão conduzindo entrevistas por todo o país e documentando meticulosamente evidências que esperam usar em acusações de crimes de guerra contra o presidente russo, Vladimir Putin, e a força militar que ele enviou para invadir a Ucrânia.

Os investigadores se espalharam pela Ucrânia abordando pequenos grupos de pessoas — principalmente mulheres e idosos — deslocadas que conseguiram abrigo em igrejas, salas de aula e auditórios como este em Kosiv. Eles explicam para os entrevistados que um dia poderá haver compensação pelas vidas de seus parentes e amigos, por ferimentos sofridos e perdas de propriedades — e que a Rússia somente poderá ser responsabilizada se suas vítimas contarem suas histórias em meticuloso detalhe.

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Sentados à esquerda do palco do auditório esvaziado da Escola N.º 2 neste povoado que ainda dormia, a cerca de 50 quilômetros da fronteira com a Romênia, uma mulher e seu filho adulto descreviam para uma promotora de Justiça ucraniana como os tanques russos chegaram em seu vilarejo, próximo de Kiev, em 25 de março, como parte do telhado de sua casa ruiu por causa dos bombardeios russos e como eles ajudaram a enterrar um vizinho idoso no jardim de sua casa, enquanto projéteis assobiavam sobre suas cabeças.

Olga Gazhurova, promotora de 34 anos oriunda da cidade bombardeada de Kharkiv, no nordeste da Ucrânia, anotava o relato em seu computador, fazendo pausas para esclarecimentos. “A partir de que cidade, exatamente, os tanques entraram?”, perguntou ela.

Ira Gavriluk perdeu o irmão e o marido em chacina promovida por soldados russos  Foto: Felipe Dana/AP
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Trabalho de formiguinha

Gazhurova e sua colega de Kharkiv, Olga Petrova, de 47 anos, explicaram na semana passada — diante de um palco pintado com um cenário de campos ucranianos amplos e exuberantes — para as nove pessoas deslocadas sentadas espaçadamente no auditório o processo de coleta de evidências testemunhais e digitais, enquanto uma criança de fralda virava cambalhotas pelo recinto.

Petrova explicou que, segundo as regras do direito internacional, forças militares podem atacar apenas instalações militares e combatentes armados, não civis. “Consequentemente, o que a Federação Russa, o país agressor, está fazendo hoje é considerado crime (…) e estamos tentando provar este crime”, afirmou ela.

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Petrova e Gazhurova iniciaram sua estadia em Kosiv entrevistando pessoas deslocadas na Escola N.º 1, onde Halina Hrimaliuk trabalha como diretora. Com as aulas presenciais suspensas, a educadora de 48 anos assumiu a responsabilidade de abrigar e alimentar 88 deslocados desde 1.º de março.

“As condições daqui são ruins para essas pessoas, mas estamos fazendo o que podemos”, afirmou Hrimaliuk.

“Eu considerava o sistema Judiciário defasado antes desta invasão”, disse Hrimaliuk. “Trabalho em uma escola pública e quando ouvi que promotores viriam para cá, francamente, não acreditei.”

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Disparos contra as janelas das casas

Na Escola N.º 1, na semana passada, crianças de Irpin e Bucha, cidades ao norte de Kiev que foram alvo de bombardeios pesados, jogavam futebol num campo de grama sintética atrás do prédio escolar. Dentro do local, Vira Kovtun, habitante de Bucha, de 71 anos, descreveu entre lágrimas e suspiros de pavor como as forças russas chegaram, em 25 de fevereiro, e despejaram fogo de metralhadoras contra residências, concentrando o alvo em janelas nas quais moradores eram vistos filmando com seus celulares.

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“Vimos pessoas sendo mortas. Corpos ficaram espalhados pelas ruas.”

Vira Kovtun, moradora de Bucha, alvo das tropas russas

Kovtun contou que os tanques russos passaram tão perto de sua casa térrea que ela conseguiu ouvir as vozes dos soldados. Depois, as forças ucranianas chegaram e atacaram a coluna russa. Agachada para tentar se proteger do fogo cruzado, Kovtun ouviu um caminhão de combustível russo explodir, e o impacto da explosão arremessou um carro sobre o jardim diante de sua casa. Ela afirmou que sofreu cortes no rosto e em um dos olhos com a explosão. Kovtun disse que escapou pelo vão da porta da frente, que havia sido arrancada pela explosão, e se protegeu atrás de muros de tijolos enquanto corria para se salvar.

Kovtun compartilhou sua experiência com as promotoras numa entrevista de mais de três horas, em 29 de março. Ela afirmou que, no início, ficou surpresa por qualquer um estar disposto a ouvir seu relato: “Parecia ser óbvio o que tinha acontecido, mas então nos demos conta de que precisamos provar que este crime contra pessoas pacíficas ocorreu.”

Cenário da cidade de Bucha, nos arredores de Kiev, após a retirada russa  Foto: Ivor Prickett/The New York Times

O massacre de Bucha

Após a Rússia, no fim de semana, retirar tropas do entorno de Kiev para se concentrar no ataque ao leste e ao sul da Ucrânia, forças ucranianas alcançaram as cidades da área metropolitana que ficaram por mais de um mês sob controle dos militares russos. Em Bucha, o governo encontrou 410 corpos de civis, muitos com sinais de execução, além de covas rasas.

A descoberta provocou protestos em ampla escala da comunidade internacional. O presidente americano, Joe Biden, acusou Putin de ser criminoso de guerra. A União Europeia e o G-7 ampliaram as sanções contra a economia russa.

O papel de investigadores ucranianos nessas cidades atacadas pelos russos é importante porque, a partir deles, será possível juntar provas para uma denúncia em Haia.

O Tribunal Penal Internacional, em Haia, e o sistema Judiciário ucraniano deverão produzir indiciamentos independentes, mas o TPI normalmente processa autoridades graduadas — como presidentes e generais — e países costumam processar agentes de menor patente. A Procuradoria Geral da Ucrânia afirmou que “registrou” 4.204 crimes de guerra, incluindo as mortes de 161 crianças. /WASHINGTON POST, COM TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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O presidente Volodimir Zelenski disse em uma entrevista transmitida neste domingo nos Estados Unidos que as forças russas estão cometendo 'genocídio' na Ucrânia

KIEV - A retirada de tropas da Rússia do norte da Ucrânia e do entorno da capital, Kiev, depois de as forças do presidente Volodmir Zelenski conseguirem resistir ao acosso do Kremlin por semanas tornou pública uma série de indícios de atrocidades cometidas contra a população civil em cidades como Bucha, Chernihiv, Nova Basan, Irpin e Borodianka.

Indícios de execuções em massa, tortura e saques fizeram nos últimos dias a comunidade internacional ampliar as sanções contra a Rússia e denunciar o regime de Vladimir Putin por crimes de guerra. Na Ucrânia, promotores locais tentam reunir provas para conseguir apresentar uma denúncia formal no Tribunal Penal Internacional.

A Procuradoria Geral estima que a Ucrânia está acionando cerca de 50 mil investigadores, de cinco agências de segurança diferentes, para investigar crimes de guerra. Eles estão conduzindo entrevistas por todo o país e documentando meticulosamente evidências que esperam usar em acusações de crimes de guerra contra o presidente russo, Vladimir Putin, e a força militar que ele enviou para invadir a Ucrânia.

Os investigadores se espalharam pela Ucrânia abordando pequenos grupos de pessoas — principalmente mulheres e idosos — deslocadas que conseguiram abrigo em igrejas, salas de aula e auditórios como este em Kosiv. Eles explicam para os entrevistados que um dia poderá haver compensação pelas vidas de seus parentes e amigos, por ferimentos sofridos e perdas de propriedades — e que a Rússia somente poderá ser responsabilizada se suas vítimas contarem suas histórias em meticuloso detalhe.

Sentados à esquerda do palco do auditório esvaziado da Escola N.º 2 neste povoado que ainda dormia, a cerca de 50 quilômetros da fronteira com a Romênia, uma mulher e seu filho adulto descreviam para uma promotora de Justiça ucraniana como os tanques russos chegaram em seu vilarejo, próximo de Kiev, em 25 de março, como parte do telhado de sua casa ruiu por causa dos bombardeios russos e como eles ajudaram a enterrar um vizinho idoso no jardim de sua casa, enquanto projéteis assobiavam sobre suas cabeças.

Olga Gazhurova, promotora de 34 anos oriunda da cidade bombardeada de Kharkiv, no nordeste da Ucrânia, anotava o relato em seu computador, fazendo pausas para esclarecimentos. “A partir de que cidade, exatamente, os tanques entraram?”, perguntou ela.

Ira Gavriluk perdeu o irmão e o marido em chacina promovida por soldados russos  Foto: Felipe Dana/AP

Trabalho de formiguinha

Gazhurova e sua colega de Kharkiv, Olga Petrova, de 47 anos, explicaram na semana passada — diante de um palco pintado com um cenário de campos ucranianos amplos e exuberantes — para as nove pessoas deslocadas sentadas espaçadamente no auditório o processo de coleta de evidências testemunhais e digitais, enquanto uma criança de fralda virava cambalhotas pelo recinto.

Petrova explicou que, segundo as regras do direito internacional, forças militares podem atacar apenas instalações militares e combatentes armados, não civis. “Consequentemente, o que a Federação Russa, o país agressor, está fazendo hoje é considerado crime (…) e estamos tentando provar este crime”, afirmou ela.

Petrova e Gazhurova iniciaram sua estadia em Kosiv entrevistando pessoas deslocadas na Escola N.º 1, onde Halina Hrimaliuk trabalha como diretora. Com as aulas presenciais suspensas, a educadora de 48 anos assumiu a responsabilidade de abrigar e alimentar 88 deslocados desde 1.º de março.

“As condições daqui são ruins para essas pessoas, mas estamos fazendo o que podemos”, afirmou Hrimaliuk.

“Eu considerava o sistema Judiciário defasado antes desta invasão”, disse Hrimaliuk. “Trabalho em uma escola pública e quando ouvi que promotores viriam para cá, francamente, não acreditei.”

Disparos contra as janelas das casas

Na Escola N.º 1, na semana passada, crianças de Irpin e Bucha, cidades ao norte de Kiev que foram alvo de bombardeios pesados, jogavam futebol num campo de grama sintética atrás do prédio escolar. Dentro do local, Vira Kovtun, habitante de Bucha, de 71 anos, descreveu entre lágrimas e suspiros de pavor como as forças russas chegaram, em 25 de fevereiro, e despejaram fogo de metralhadoras contra residências, concentrando o alvo em janelas nas quais moradores eram vistos filmando com seus celulares.

“Vimos pessoas sendo mortas. Corpos ficaram espalhados pelas ruas.”

Vira Kovtun, moradora de Bucha, alvo das tropas russas

Kovtun contou que os tanques russos passaram tão perto de sua casa térrea que ela conseguiu ouvir as vozes dos soldados. Depois, as forças ucranianas chegaram e atacaram a coluna russa. Agachada para tentar se proteger do fogo cruzado, Kovtun ouviu um caminhão de combustível russo explodir, e o impacto da explosão arremessou um carro sobre o jardim diante de sua casa. Ela afirmou que sofreu cortes no rosto e em um dos olhos com a explosão. Kovtun disse que escapou pelo vão da porta da frente, que havia sido arrancada pela explosão, e se protegeu atrás de muros de tijolos enquanto corria para se salvar.

Kovtun compartilhou sua experiência com as promotoras numa entrevista de mais de três horas, em 29 de março. Ela afirmou que, no início, ficou surpresa por qualquer um estar disposto a ouvir seu relato: “Parecia ser óbvio o que tinha acontecido, mas então nos demos conta de que precisamos provar que este crime contra pessoas pacíficas ocorreu.”

Cenário da cidade de Bucha, nos arredores de Kiev, após a retirada russa  Foto: Ivor Prickett/The New York Times

O massacre de Bucha

Após a Rússia, no fim de semana, retirar tropas do entorno de Kiev para se concentrar no ataque ao leste e ao sul da Ucrânia, forças ucranianas alcançaram as cidades da área metropolitana que ficaram por mais de um mês sob controle dos militares russos. Em Bucha, o governo encontrou 410 corpos de civis, muitos com sinais de execução, além de covas rasas.

A descoberta provocou protestos em ampla escala da comunidade internacional. O presidente americano, Joe Biden, acusou Putin de ser criminoso de guerra. A União Europeia e o G-7 ampliaram as sanções contra a economia russa.

O papel de investigadores ucranianos nessas cidades atacadas pelos russos é importante porque, a partir deles, será possível juntar provas para uma denúncia em Haia.

O Tribunal Penal Internacional, em Haia, e o sistema Judiciário ucraniano deverão produzir indiciamentos independentes, mas o TPI normalmente processa autoridades graduadas — como presidentes e generais — e países costumam processar agentes de menor patente. A Procuradoria Geral da Ucrânia afirmou que “registrou” 4.204 crimes de guerra, incluindo as mortes de 161 crianças. /WASHINGTON POST, COM TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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O presidente Volodimir Zelenski disse em uma entrevista transmitida neste domingo nos Estados Unidos que as forças russas estão cometendo 'genocídio' na Ucrânia

KIEV - A retirada de tropas da Rússia do norte da Ucrânia e do entorno da capital, Kiev, depois de as forças do presidente Volodmir Zelenski conseguirem resistir ao acosso do Kremlin por semanas tornou pública uma série de indícios de atrocidades cometidas contra a população civil em cidades como Bucha, Chernihiv, Nova Basan, Irpin e Borodianka.

Indícios de execuções em massa, tortura e saques fizeram nos últimos dias a comunidade internacional ampliar as sanções contra a Rússia e denunciar o regime de Vladimir Putin por crimes de guerra. Na Ucrânia, promotores locais tentam reunir provas para conseguir apresentar uma denúncia formal no Tribunal Penal Internacional.

A Procuradoria Geral estima que a Ucrânia está acionando cerca de 50 mil investigadores, de cinco agências de segurança diferentes, para investigar crimes de guerra. Eles estão conduzindo entrevistas por todo o país e documentando meticulosamente evidências que esperam usar em acusações de crimes de guerra contra o presidente russo, Vladimir Putin, e a força militar que ele enviou para invadir a Ucrânia.

Os investigadores se espalharam pela Ucrânia abordando pequenos grupos de pessoas — principalmente mulheres e idosos — deslocadas que conseguiram abrigo em igrejas, salas de aula e auditórios como este em Kosiv. Eles explicam para os entrevistados que um dia poderá haver compensação pelas vidas de seus parentes e amigos, por ferimentos sofridos e perdas de propriedades — e que a Rússia somente poderá ser responsabilizada se suas vítimas contarem suas histórias em meticuloso detalhe.

Sentados à esquerda do palco do auditório esvaziado da Escola N.º 2 neste povoado que ainda dormia, a cerca de 50 quilômetros da fronteira com a Romênia, uma mulher e seu filho adulto descreviam para uma promotora de Justiça ucraniana como os tanques russos chegaram em seu vilarejo, próximo de Kiev, em 25 de março, como parte do telhado de sua casa ruiu por causa dos bombardeios russos e como eles ajudaram a enterrar um vizinho idoso no jardim de sua casa, enquanto projéteis assobiavam sobre suas cabeças.

Olga Gazhurova, promotora de 34 anos oriunda da cidade bombardeada de Kharkiv, no nordeste da Ucrânia, anotava o relato em seu computador, fazendo pausas para esclarecimentos. “A partir de que cidade, exatamente, os tanques entraram?”, perguntou ela.

Ira Gavriluk perdeu o irmão e o marido em chacina promovida por soldados russos  Foto: Felipe Dana/AP

Trabalho de formiguinha

Gazhurova e sua colega de Kharkiv, Olga Petrova, de 47 anos, explicaram na semana passada — diante de um palco pintado com um cenário de campos ucranianos amplos e exuberantes — para as nove pessoas deslocadas sentadas espaçadamente no auditório o processo de coleta de evidências testemunhais e digitais, enquanto uma criança de fralda virava cambalhotas pelo recinto.

Petrova explicou que, segundo as regras do direito internacional, forças militares podem atacar apenas instalações militares e combatentes armados, não civis. “Consequentemente, o que a Federação Russa, o país agressor, está fazendo hoje é considerado crime (…) e estamos tentando provar este crime”, afirmou ela.

Petrova e Gazhurova iniciaram sua estadia em Kosiv entrevistando pessoas deslocadas na Escola N.º 1, onde Halina Hrimaliuk trabalha como diretora. Com as aulas presenciais suspensas, a educadora de 48 anos assumiu a responsabilidade de abrigar e alimentar 88 deslocados desde 1.º de março.

“As condições daqui são ruins para essas pessoas, mas estamos fazendo o que podemos”, afirmou Hrimaliuk.

“Eu considerava o sistema Judiciário defasado antes desta invasão”, disse Hrimaliuk. “Trabalho em uma escola pública e quando ouvi que promotores viriam para cá, francamente, não acreditei.”

Disparos contra as janelas das casas

Na Escola N.º 1, na semana passada, crianças de Irpin e Bucha, cidades ao norte de Kiev que foram alvo de bombardeios pesados, jogavam futebol num campo de grama sintética atrás do prédio escolar. Dentro do local, Vira Kovtun, habitante de Bucha, de 71 anos, descreveu entre lágrimas e suspiros de pavor como as forças russas chegaram, em 25 de fevereiro, e despejaram fogo de metralhadoras contra residências, concentrando o alvo em janelas nas quais moradores eram vistos filmando com seus celulares.

“Vimos pessoas sendo mortas. Corpos ficaram espalhados pelas ruas.”

Vira Kovtun, moradora de Bucha, alvo das tropas russas

Kovtun contou que os tanques russos passaram tão perto de sua casa térrea que ela conseguiu ouvir as vozes dos soldados. Depois, as forças ucranianas chegaram e atacaram a coluna russa. Agachada para tentar se proteger do fogo cruzado, Kovtun ouviu um caminhão de combustível russo explodir, e o impacto da explosão arremessou um carro sobre o jardim diante de sua casa. Ela afirmou que sofreu cortes no rosto e em um dos olhos com a explosão. Kovtun disse que escapou pelo vão da porta da frente, que havia sido arrancada pela explosão, e se protegeu atrás de muros de tijolos enquanto corria para se salvar.

Kovtun compartilhou sua experiência com as promotoras numa entrevista de mais de três horas, em 29 de março. Ela afirmou que, no início, ficou surpresa por qualquer um estar disposto a ouvir seu relato: “Parecia ser óbvio o que tinha acontecido, mas então nos demos conta de que precisamos provar que este crime contra pessoas pacíficas ocorreu.”

Cenário da cidade de Bucha, nos arredores de Kiev, após a retirada russa  Foto: Ivor Prickett/The New York Times

O massacre de Bucha

Após a Rússia, no fim de semana, retirar tropas do entorno de Kiev para se concentrar no ataque ao leste e ao sul da Ucrânia, forças ucranianas alcançaram as cidades da área metropolitana que ficaram por mais de um mês sob controle dos militares russos. Em Bucha, o governo encontrou 410 corpos de civis, muitos com sinais de execução, além de covas rasas.

A descoberta provocou protestos em ampla escala da comunidade internacional. O presidente americano, Joe Biden, acusou Putin de ser criminoso de guerra. A União Europeia e o G-7 ampliaram as sanções contra a economia russa.

O papel de investigadores ucranianos nessas cidades atacadas pelos russos é importante porque, a partir deles, será possível juntar provas para uma denúncia em Haia.

O Tribunal Penal Internacional, em Haia, e o sistema Judiciário ucraniano deverão produzir indiciamentos independentes, mas o TPI normalmente processa autoridades graduadas — como presidentes e generais — e países costumam processar agentes de menor patente. A Procuradoria Geral da Ucrânia afirmou que “registrou” 4.204 crimes de guerra, incluindo as mortes de 161 crianças. /WASHINGTON POST, COM TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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O presidente Volodimir Zelenski disse em uma entrevista transmitida neste domingo nos Estados Unidos que as forças russas estão cometendo 'genocídio' na Ucrânia

KIEV - A retirada de tropas da Rússia do norte da Ucrânia e do entorno da capital, Kiev, depois de as forças do presidente Volodmir Zelenski conseguirem resistir ao acosso do Kremlin por semanas tornou pública uma série de indícios de atrocidades cometidas contra a população civil em cidades como Bucha, Chernihiv, Nova Basan, Irpin e Borodianka.

Indícios de execuções em massa, tortura e saques fizeram nos últimos dias a comunidade internacional ampliar as sanções contra a Rússia e denunciar o regime de Vladimir Putin por crimes de guerra. Na Ucrânia, promotores locais tentam reunir provas para conseguir apresentar uma denúncia formal no Tribunal Penal Internacional.

A Procuradoria Geral estima que a Ucrânia está acionando cerca de 50 mil investigadores, de cinco agências de segurança diferentes, para investigar crimes de guerra. Eles estão conduzindo entrevistas por todo o país e documentando meticulosamente evidências que esperam usar em acusações de crimes de guerra contra o presidente russo, Vladimir Putin, e a força militar que ele enviou para invadir a Ucrânia.

Os investigadores se espalharam pela Ucrânia abordando pequenos grupos de pessoas — principalmente mulheres e idosos — deslocadas que conseguiram abrigo em igrejas, salas de aula e auditórios como este em Kosiv. Eles explicam para os entrevistados que um dia poderá haver compensação pelas vidas de seus parentes e amigos, por ferimentos sofridos e perdas de propriedades — e que a Rússia somente poderá ser responsabilizada se suas vítimas contarem suas histórias em meticuloso detalhe.

Sentados à esquerda do palco do auditório esvaziado da Escola N.º 2 neste povoado que ainda dormia, a cerca de 50 quilômetros da fronteira com a Romênia, uma mulher e seu filho adulto descreviam para uma promotora de Justiça ucraniana como os tanques russos chegaram em seu vilarejo, próximo de Kiev, em 25 de março, como parte do telhado de sua casa ruiu por causa dos bombardeios russos e como eles ajudaram a enterrar um vizinho idoso no jardim de sua casa, enquanto projéteis assobiavam sobre suas cabeças.

Olga Gazhurova, promotora de 34 anos oriunda da cidade bombardeada de Kharkiv, no nordeste da Ucrânia, anotava o relato em seu computador, fazendo pausas para esclarecimentos. “A partir de que cidade, exatamente, os tanques entraram?”, perguntou ela.

Ira Gavriluk perdeu o irmão e o marido em chacina promovida por soldados russos  Foto: Felipe Dana/AP

Trabalho de formiguinha

Gazhurova e sua colega de Kharkiv, Olga Petrova, de 47 anos, explicaram na semana passada — diante de um palco pintado com um cenário de campos ucranianos amplos e exuberantes — para as nove pessoas deslocadas sentadas espaçadamente no auditório o processo de coleta de evidências testemunhais e digitais, enquanto uma criança de fralda virava cambalhotas pelo recinto.

Petrova explicou que, segundo as regras do direito internacional, forças militares podem atacar apenas instalações militares e combatentes armados, não civis. “Consequentemente, o que a Federação Russa, o país agressor, está fazendo hoje é considerado crime (…) e estamos tentando provar este crime”, afirmou ela.

Petrova e Gazhurova iniciaram sua estadia em Kosiv entrevistando pessoas deslocadas na Escola N.º 1, onde Halina Hrimaliuk trabalha como diretora. Com as aulas presenciais suspensas, a educadora de 48 anos assumiu a responsabilidade de abrigar e alimentar 88 deslocados desde 1.º de março.

“As condições daqui são ruins para essas pessoas, mas estamos fazendo o que podemos”, afirmou Hrimaliuk.

“Eu considerava o sistema Judiciário defasado antes desta invasão”, disse Hrimaliuk. “Trabalho em uma escola pública e quando ouvi que promotores viriam para cá, francamente, não acreditei.”

Disparos contra as janelas das casas

Na Escola N.º 1, na semana passada, crianças de Irpin e Bucha, cidades ao norte de Kiev que foram alvo de bombardeios pesados, jogavam futebol num campo de grama sintética atrás do prédio escolar. Dentro do local, Vira Kovtun, habitante de Bucha, de 71 anos, descreveu entre lágrimas e suspiros de pavor como as forças russas chegaram, em 25 de fevereiro, e despejaram fogo de metralhadoras contra residências, concentrando o alvo em janelas nas quais moradores eram vistos filmando com seus celulares.

“Vimos pessoas sendo mortas. Corpos ficaram espalhados pelas ruas.”

Vira Kovtun, moradora de Bucha, alvo das tropas russas

Kovtun contou que os tanques russos passaram tão perto de sua casa térrea que ela conseguiu ouvir as vozes dos soldados. Depois, as forças ucranianas chegaram e atacaram a coluna russa. Agachada para tentar se proteger do fogo cruzado, Kovtun ouviu um caminhão de combustível russo explodir, e o impacto da explosão arremessou um carro sobre o jardim diante de sua casa. Ela afirmou que sofreu cortes no rosto e em um dos olhos com a explosão. Kovtun disse que escapou pelo vão da porta da frente, que havia sido arrancada pela explosão, e se protegeu atrás de muros de tijolos enquanto corria para se salvar.

Kovtun compartilhou sua experiência com as promotoras numa entrevista de mais de três horas, em 29 de março. Ela afirmou que, no início, ficou surpresa por qualquer um estar disposto a ouvir seu relato: “Parecia ser óbvio o que tinha acontecido, mas então nos demos conta de que precisamos provar que este crime contra pessoas pacíficas ocorreu.”

Cenário da cidade de Bucha, nos arredores de Kiev, após a retirada russa  Foto: Ivor Prickett/The New York Times

O massacre de Bucha

Após a Rússia, no fim de semana, retirar tropas do entorno de Kiev para se concentrar no ataque ao leste e ao sul da Ucrânia, forças ucranianas alcançaram as cidades da área metropolitana que ficaram por mais de um mês sob controle dos militares russos. Em Bucha, o governo encontrou 410 corpos de civis, muitos com sinais de execução, além de covas rasas.

A descoberta provocou protestos em ampla escala da comunidade internacional. O presidente americano, Joe Biden, acusou Putin de ser criminoso de guerra. A União Europeia e o G-7 ampliaram as sanções contra a economia russa.

O papel de investigadores ucranianos nessas cidades atacadas pelos russos é importante porque, a partir deles, será possível juntar provas para uma denúncia em Haia.

O Tribunal Penal Internacional, em Haia, e o sistema Judiciário ucraniano deverão produzir indiciamentos independentes, mas o TPI normalmente processa autoridades graduadas — como presidentes e generais — e países costumam processar agentes de menor patente. A Procuradoria Geral da Ucrânia afirmou que “registrou” 4.204 crimes de guerra, incluindo as mortes de 161 crianças. /WASHINGTON POST, COM TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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O presidente Volodimir Zelenski disse em uma entrevista transmitida neste domingo nos Estados Unidos que as forças russas estão cometendo 'genocídio' na Ucrânia

KIEV - A retirada de tropas da Rússia do norte da Ucrânia e do entorno da capital, Kiev, depois de as forças do presidente Volodmir Zelenski conseguirem resistir ao acosso do Kremlin por semanas tornou pública uma série de indícios de atrocidades cometidas contra a população civil em cidades como Bucha, Chernihiv, Nova Basan, Irpin e Borodianka.

Indícios de execuções em massa, tortura e saques fizeram nos últimos dias a comunidade internacional ampliar as sanções contra a Rússia e denunciar o regime de Vladimir Putin por crimes de guerra. Na Ucrânia, promotores locais tentam reunir provas para conseguir apresentar uma denúncia formal no Tribunal Penal Internacional.

A Procuradoria Geral estima que a Ucrânia está acionando cerca de 50 mil investigadores, de cinco agências de segurança diferentes, para investigar crimes de guerra. Eles estão conduzindo entrevistas por todo o país e documentando meticulosamente evidências que esperam usar em acusações de crimes de guerra contra o presidente russo, Vladimir Putin, e a força militar que ele enviou para invadir a Ucrânia.

Os investigadores se espalharam pela Ucrânia abordando pequenos grupos de pessoas — principalmente mulheres e idosos — deslocadas que conseguiram abrigo em igrejas, salas de aula e auditórios como este em Kosiv. Eles explicam para os entrevistados que um dia poderá haver compensação pelas vidas de seus parentes e amigos, por ferimentos sofridos e perdas de propriedades — e que a Rússia somente poderá ser responsabilizada se suas vítimas contarem suas histórias em meticuloso detalhe.

Sentados à esquerda do palco do auditório esvaziado da Escola N.º 2 neste povoado que ainda dormia, a cerca de 50 quilômetros da fronteira com a Romênia, uma mulher e seu filho adulto descreviam para uma promotora de Justiça ucraniana como os tanques russos chegaram em seu vilarejo, próximo de Kiev, em 25 de março, como parte do telhado de sua casa ruiu por causa dos bombardeios russos e como eles ajudaram a enterrar um vizinho idoso no jardim de sua casa, enquanto projéteis assobiavam sobre suas cabeças.

Olga Gazhurova, promotora de 34 anos oriunda da cidade bombardeada de Kharkiv, no nordeste da Ucrânia, anotava o relato em seu computador, fazendo pausas para esclarecimentos. “A partir de que cidade, exatamente, os tanques entraram?”, perguntou ela.

Ira Gavriluk perdeu o irmão e o marido em chacina promovida por soldados russos  Foto: Felipe Dana/AP

Trabalho de formiguinha

Gazhurova e sua colega de Kharkiv, Olga Petrova, de 47 anos, explicaram na semana passada — diante de um palco pintado com um cenário de campos ucranianos amplos e exuberantes — para as nove pessoas deslocadas sentadas espaçadamente no auditório o processo de coleta de evidências testemunhais e digitais, enquanto uma criança de fralda virava cambalhotas pelo recinto.

Petrova explicou que, segundo as regras do direito internacional, forças militares podem atacar apenas instalações militares e combatentes armados, não civis. “Consequentemente, o que a Federação Russa, o país agressor, está fazendo hoje é considerado crime (…) e estamos tentando provar este crime”, afirmou ela.

Petrova e Gazhurova iniciaram sua estadia em Kosiv entrevistando pessoas deslocadas na Escola N.º 1, onde Halina Hrimaliuk trabalha como diretora. Com as aulas presenciais suspensas, a educadora de 48 anos assumiu a responsabilidade de abrigar e alimentar 88 deslocados desde 1.º de março.

“As condições daqui são ruins para essas pessoas, mas estamos fazendo o que podemos”, afirmou Hrimaliuk.

“Eu considerava o sistema Judiciário defasado antes desta invasão”, disse Hrimaliuk. “Trabalho em uma escola pública e quando ouvi que promotores viriam para cá, francamente, não acreditei.”

Disparos contra as janelas das casas

Na Escola N.º 1, na semana passada, crianças de Irpin e Bucha, cidades ao norte de Kiev que foram alvo de bombardeios pesados, jogavam futebol num campo de grama sintética atrás do prédio escolar. Dentro do local, Vira Kovtun, habitante de Bucha, de 71 anos, descreveu entre lágrimas e suspiros de pavor como as forças russas chegaram, em 25 de fevereiro, e despejaram fogo de metralhadoras contra residências, concentrando o alvo em janelas nas quais moradores eram vistos filmando com seus celulares.

“Vimos pessoas sendo mortas. Corpos ficaram espalhados pelas ruas.”

Vira Kovtun, moradora de Bucha, alvo das tropas russas

Kovtun contou que os tanques russos passaram tão perto de sua casa térrea que ela conseguiu ouvir as vozes dos soldados. Depois, as forças ucranianas chegaram e atacaram a coluna russa. Agachada para tentar se proteger do fogo cruzado, Kovtun ouviu um caminhão de combustível russo explodir, e o impacto da explosão arremessou um carro sobre o jardim diante de sua casa. Ela afirmou que sofreu cortes no rosto e em um dos olhos com a explosão. Kovtun disse que escapou pelo vão da porta da frente, que havia sido arrancada pela explosão, e se protegeu atrás de muros de tijolos enquanto corria para se salvar.

Kovtun compartilhou sua experiência com as promotoras numa entrevista de mais de três horas, em 29 de março. Ela afirmou que, no início, ficou surpresa por qualquer um estar disposto a ouvir seu relato: “Parecia ser óbvio o que tinha acontecido, mas então nos demos conta de que precisamos provar que este crime contra pessoas pacíficas ocorreu.”

Cenário da cidade de Bucha, nos arredores de Kiev, após a retirada russa  Foto: Ivor Prickett/The New York Times

O massacre de Bucha

Após a Rússia, no fim de semana, retirar tropas do entorno de Kiev para se concentrar no ataque ao leste e ao sul da Ucrânia, forças ucranianas alcançaram as cidades da área metropolitana que ficaram por mais de um mês sob controle dos militares russos. Em Bucha, o governo encontrou 410 corpos de civis, muitos com sinais de execução, além de covas rasas.

A descoberta provocou protestos em ampla escala da comunidade internacional. O presidente americano, Joe Biden, acusou Putin de ser criminoso de guerra. A União Europeia e o G-7 ampliaram as sanções contra a economia russa.

O papel de investigadores ucranianos nessas cidades atacadas pelos russos é importante porque, a partir deles, será possível juntar provas para uma denúncia em Haia.

O Tribunal Penal Internacional, em Haia, e o sistema Judiciário ucraniano deverão produzir indiciamentos independentes, mas o TPI normalmente processa autoridades graduadas — como presidentes e generais — e países costumam processar agentes de menor patente. A Procuradoria Geral da Ucrânia afirmou que “registrou” 4.204 crimes de guerra, incluindo as mortes de 161 crianças. /WASHINGTON POST, COM TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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O presidente Volodimir Zelenski disse em uma entrevista transmitida neste domingo nos Estados Unidos que as forças russas estão cometendo 'genocídio' na Ucrânia

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