Declarações de líderes podem levar a ataques antissemitas como o de Amsterdã, diz comissário da OEA


Para Fernando Lottenberg, crítica política a Israel é legítima, mas discursos de ódio principalmente nas redes fomentam escalada de violência a judeus no mundo todo

Por Carolina Marins
Foto: Divulgação/IBI
Entrevista comFernando LottenbergComissário de monitoramento e combate ao antissemitismo da Organização dos Estados Americanos (OEA)

Na última quinta-feira, 7, torcedores israelenses do Maccabi Tel-Aviv foram emboscados em Amsterdã, capital da Holanda, durante um jogo contra o Ajax pela Liga Europa. Mais de 60 pessoas foram detidas e cerca de dez ficaram feridas nos ataques. Para Fernando Lottenberg, comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo da Organização dos Estados Americanos (OEA), a violência é resultado da escalada nos discursos antissemitas nas redes, em manifestações e disseminados por autoridades.

“As lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã”, disse o comissário, que também é conselheiro do Instituto Brasil-Israel, em entrevista por telefone ao Estadão.

Os ataques, observa Lottenberg, ocorreram dois dias antes do aniversário de 86 anos da Noite dos Cristais (Kristallnacht ou Pogrom de Novembro) quando militares nazistas e civis alemães atacaram judeus em 1938. “Penso que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada: israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia”, afirmou.

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Polícia escolta torcedores do Maccabi Tel-Aviv até o metrô, após apoiadores pró-Palestina marcharem perto do estádio de futebol, em Amsterdã, Holanda, em 7 de novembro de 2024. Foto: Intervision/AP

Confira a entrevista completa:

Como vê o episódio de violência com torcedores do israelenses em Amsterdã?

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Com consternação, pra falar a verdade, porque é uma coisa tão violenta e o que tudo indica, organizada já previamente. Segundo está aparecendo agora na medida que as investigações prosseguem, foi uma combinação pra atacar as pessoas em um determinado lugar. E na antevéspera do que a gente lembra como Noite dos Cristais, ou como é chamado mais recentemente o Pogrom de Novembro, que foi quando quebraram muitas lojas, atacaram, mataram e prenderam judeus na Alemanha em 1938. Então, eu penso também que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada, israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia.

Foram citadas as manifestações em universidades americanas, como manifestar críticas seja a guerra ou ao governo de Israel, sem recair no antissemitismo?

Perfeitamente, uma coisa não tem nada a ver com a outra. A crítica política é legítima e faz parte do contexto democrático. O que não é legítimo, o que não é aceitável é você utilizar expressões discriminatórias como essa que eu citei, ou outras, por exemplo, tinha uma n Universidade Columbia, em abril, que falava: ‘judeus voltem para a Polônia’. O que quer dizer isso? Quer dizer que os judeus não têm um lugar em Israel que devem voltar para onde? Para Auschwitz. Auschwitz era na Polônia e era um campo de extermínio. Precisa ficar atento para esse tipo de coisa e as lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã.

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Como tem sido o trabalho de monitorar o antissemitismo depois do início da guerra em 2023, é clara uma escalada?

Sim. É notório em vários países do mundo. Os números aqui no Brasil, nos Estados Unidos, em países europeus. Agora, a gente precisa tomar um certo cuidado para não ver uma coisa como um fenômeno de causalidade. Ou seja, não é a guerra que causa o aumento do antissemitismo. São os antissemitas que aproveitam eventos como os da guerra para as suas manifestações odiosas e discriminatórias. Funciona como um álibi. Dizem ‘veja o que os judeus fazem, matam crianças’. Então, precisa tomar um certo cuidado com a correlação e a causalidade.

Pessoas recebem os torcedores do time de futebol Maccabi Tel-Aviv enquanto eles chegam no Aeroporto Internacional Ben-Gurion de Israel em 8 de novembro Foto: Tsafrir Abayov/AP
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No Brasil, como a comunidade judaica tem sido impactada por esse aumento dos eventos antissemitas?

Os números da Conib mostram isso. Um incremento bastante grande, era de 800%, segundo último levantamento. Logo no começo do conflito, teve um episódio em Arraial da Ajuda, com uma lojista que foi atacada e vários outros. Recentemente, teve um outro episódio na Universidade do Ceará, onde havia um debate sobre Oriente Média, com pessoas de várias correntes, e foi impedido. O Estadão até fez um editorial ontem sobre isso. Então, está chegando aqui também. E não teria por que ser diferente no Brasil. O que você faz com isso? Se opor a esse tipo de conduta e punir quem age dessa maneira. É importante. Nós temos leis no Brasil. O antissemitismo é crime no Brasil. E pessoas que têm tido esse tipo de conduta têm sido punidas. Eu cito um advogado no Ceará que foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, ainda por coisas da época pré-conflito, da época da pandemia, que dizia que os judeus eram responsáveis pela pandemia, etc. Recentemente, houve uma condenação aqui, da Justiça de São Paulo, do Breno Altman, que comparou os judeus a ratos. Então, é importante. Acho que tem que educar, de um lado, tem que mostrar o que é informação correta, histórica, e, de outro, punir quem passa dos limites.

Minha próxima pergunta era justamente se vê uma impunidade ao antissemitismo...

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Olha, depende de onde a gente está falando. Eu vejo, por exemplo, nos Estados Unidos, que está na minha área de cobertura da OEA, existe uma questão lá que é mais difícil de punir esse tipo de manifestação em razão da primeira emenda. Tem determinadas manifestações que são discurso protegido, mesmo quando elas são fascistas, antissemitas ou discriminatórias. No Brasil, não é assim. Aqui, existe lei para isso. E o que eu tenho visto, seja de autoridades policiais, do Ministério Público e do Judiciário, é que, quando provocado, a resposta tem sido firme.

E como tem sido o trabalho como primeiro comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo OEA?

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Nós estamos acompanhando, em todo o continente, são 33 países que fazem parte. E, como eu disse antes, a intensidade é bastante diferente. A gente não tem visto algo tão intenso como os Estados Unidos e Canadá. Acho que esses são os exemplos mais fortes, em termos de números, de incidentes, de gravidade e de repercussão. Mas, também, em outros países, como Uruguai, Chile, estive recentemente na Colômbia, e até aqui no Brasil, nós estamos acompanhando que esse quadro se repete em vários outros países, com menor intensidade, nem sempre no mundo físico, muitas vezes no mundo virtual. As redes se tornaram, de fato, o campo de batalha do ódio. Às vezes, desborda para o real, como em Amsterdã, mas grande parte disso acontece no território virtual. Daí, também, a necessidade de uma regulamentação das redes, de uma melhor moderação de conteúdo. O Supremo Tribunal Federal anunciou que vai analisar essa questão. Acho que a gente não pode mais simplesmente ficar olhando passivamente esse tipo de manifestação se propagar e não fazer nada. Essa visão que a função na OEA me permite ter dos países do hemisfério ocidental leva a essa conclusão de que é necessário um empenho maior. Seja por parte das próprias redes, sendo mais ativas na moderação de conteúdo, como pela regulação pública, seja por lei, seja por decisão judicial. Nós estamos em uma situação bastante perigosa.

Na última quinta-feira, 7, torcedores israelenses do Maccabi Tel-Aviv foram emboscados em Amsterdã, capital da Holanda, durante um jogo contra o Ajax pela Liga Europa. Mais de 60 pessoas foram detidas e cerca de dez ficaram feridas nos ataques. Para Fernando Lottenberg, comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo da Organização dos Estados Americanos (OEA), a violência é resultado da escalada nos discursos antissemitas nas redes, em manifestações e disseminados por autoridades.

“As lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã”, disse o comissário, que também é conselheiro do Instituto Brasil-Israel, em entrevista por telefone ao Estadão.

Os ataques, observa Lottenberg, ocorreram dois dias antes do aniversário de 86 anos da Noite dos Cristais (Kristallnacht ou Pogrom de Novembro) quando militares nazistas e civis alemães atacaram judeus em 1938. “Penso que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada: israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia”, afirmou.

Polícia escolta torcedores do Maccabi Tel-Aviv até o metrô, após apoiadores pró-Palestina marcharem perto do estádio de futebol, em Amsterdã, Holanda, em 7 de novembro de 2024. Foto: Intervision/AP

Confira a entrevista completa:

Como vê o episódio de violência com torcedores do israelenses em Amsterdã?

Com consternação, pra falar a verdade, porque é uma coisa tão violenta e o que tudo indica, organizada já previamente. Segundo está aparecendo agora na medida que as investigações prosseguem, foi uma combinação pra atacar as pessoas em um determinado lugar. E na antevéspera do que a gente lembra como Noite dos Cristais, ou como é chamado mais recentemente o Pogrom de Novembro, que foi quando quebraram muitas lojas, atacaram, mataram e prenderam judeus na Alemanha em 1938. Então, eu penso também que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada, israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia.

Foram citadas as manifestações em universidades americanas, como manifestar críticas seja a guerra ou ao governo de Israel, sem recair no antissemitismo?

Perfeitamente, uma coisa não tem nada a ver com a outra. A crítica política é legítima e faz parte do contexto democrático. O que não é legítimo, o que não é aceitável é você utilizar expressões discriminatórias como essa que eu citei, ou outras, por exemplo, tinha uma n Universidade Columbia, em abril, que falava: ‘judeus voltem para a Polônia’. O que quer dizer isso? Quer dizer que os judeus não têm um lugar em Israel que devem voltar para onde? Para Auschwitz. Auschwitz era na Polônia e era um campo de extermínio. Precisa ficar atento para esse tipo de coisa e as lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã.

Como tem sido o trabalho de monitorar o antissemitismo depois do início da guerra em 2023, é clara uma escalada?

Sim. É notório em vários países do mundo. Os números aqui no Brasil, nos Estados Unidos, em países europeus. Agora, a gente precisa tomar um certo cuidado para não ver uma coisa como um fenômeno de causalidade. Ou seja, não é a guerra que causa o aumento do antissemitismo. São os antissemitas que aproveitam eventos como os da guerra para as suas manifestações odiosas e discriminatórias. Funciona como um álibi. Dizem ‘veja o que os judeus fazem, matam crianças’. Então, precisa tomar um certo cuidado com a correlação e a causalidade.

Pessoas recebem os torcedores do time de futebol Maccabi Tel-Aviv enquanto eles chegam no Aeroporto Internacional Ben-Gurion de Israel em 8 de novembro Foto: Tsafrir Abayov/AP

No Brasil, como a comunidade judaica tem sido impactada por esse aumento dos eventos antissemitas?

Os números da Conib mostram isso. Um incremento bastante grande, era de 800%, segundo último levantamento. Logo no começo do conflito, teve um episódio em Arraial da Ajuda, com uma lojista que foi atacada e vários outros. Recentemente, teve um outro episódio na Universidade do Ceará, onde havia um debate sobre Oriente Média, com pessoas de várias correntes, e foi impedido. O Estadão até fez um editorial ontem sobre isso. Então, está chegando aqui também. E não teria por que ser diferente no Brasil. O que você faz com isso? Se opor a esse tipo de conduta e punir quem age dessa maneira. É importante. Nós temos leis no Brasil. O antissemitismo é crime no Brasil. E pessoas que têm tido esse tipo de conduta têm sido punidas. Eu cito um advogado no Ceará que foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, ainda por coisas da época pré-conflito, da época da pandemia, que dizia que os judeus eram responsáveis pela pandemia, etc. Recentemente, houve uma condenação aqui, da Justiça de São Paulo, do Breno Altman, que comparou os judeus a ratos. Então, é importante. Acho que tem que educar, de um lado, tem que mostrar o que é informação correta, histórica, e, de outro, punir quem passa dos limites.

Minha próxima pergunta era justamente se vê uma impunidade ao antissemitismo...

Olha, depende de onde a gente está falando. Eu vejo, por exemplo, nos Estados Unidos, que está na minha área de cobertura da OEA, existe uma questão lá que é mais difícil de punir esse tipo de manifestação em razão da primeira emenda. Tem determinadas manifestações que são discurso protegido, mesmo quando elas são fascistas, antissemitas ou discriminatórias. No Brasil, não é assim. Aqui, existe lei para isso. E o que eu tenho visto, seja de autoridades policiais, do Ministério Público e do Judiciário, é que, quando provocado, a resposta tem sido firme.

E como tem sido o trabalho como primeiro comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo OEA?

Nós estamos acompanhando, em todo o continente, são 33 países que fazem parte. E, como eu disse antes, a intensidade é bastante diferente. A gente não tem visto algo tão intenso como os Estados Unidos e Canadá. Acho que esses são os exemplos mais fortes, em termos de números, de incidentes, de gravidade e de repercussão. Mas, também, em outros países, como Uruguai, Chile, estive recentemente na Colômbia, e até aqui no Brasil, nós estamos acompanhando que esse quadro se repete em vários outros países, com menor intensidade, nem sempre no mundo físico, muitas vezes no mundo virtual. As redes se tornaram, de fato, o campo de batalha do ódio. Às vezes, desborda para o real, como em Amsterdã, mas grande parte disso acontece no território virtual. Daí, também, a necessidade de uma regulamentação das redes, de uma melhor moderação de conteúdo. O Supremo Tribunal Federal anunciou que vai analisar essa questão. Acho que a gente não pode mais simplesmente ficar olhando passivamente esse tipo de manifestação se propagar e não fazer nada. Essa visão que a função na OEA me permite ter dos países do hemisfério ocidental leva a essa conclusão de que é necessário um empenho maior. Seja por parte das próprias redes, sendo mais ativas na moderação de conteúdo, como pela regulação pública, seja por lei, seja por decisão judicial. Nós estamos em uma situação bastante perigosa.

Na última quinta-feira, 7, torcedores israelenses do Maccabi Tel-Aviv foram emboscados em Amsterdã, capital da Holanda, durante um jogo contra o Ajax pela Liga Europa. Mais de 60 pessoas foram detidas e cerca de dez ficaram feridas nos ataques. Para Fernando Lottenberg, comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo da Organização dos Estados Americanos (OEA), a violência é resultado da escalada nos discursos antissemitas nas redes, em manifestações e disseminados por autoridades.

“As lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã”, disse o comissário, que também é conselheiro do Instituto Brasil-Israel, em entrevista por telefone ao Estadão.

Os ataques, observa Lottenberg, ocorreram dois dias antes do aniversário de 86 anos da Noite dos Cristais (Kristallnacht ou Pogrom de Novembro) quando militares nazistas e civis alemães atacaram judeus em 1938. “Penso que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada: israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia”, afirmou.

Polícia escolta torcedores do Maccabi Tel-Aviv até o metrô, após apoiadores pró-Palestina marcharem perto do estádio de futebol, em Amsterdã, Holanda, em 7 de novembro de 2024. Foto: Intervision/AP

Confira a entrevista completa:

Como vê o episódio de violência com torcedores do israelenses em Amsterdã?

Com consternação, pra falar a verdade, porque é uma coisa tão violenta e o que tudo indica, organizada já previamente. Segundo está aparecendo agora na medida que as investigações prosseguem, foi uma combinação pra atacar as pessoas em um determinado lugar. E na antevéspera do que a gente lembra como Noite dos Cristais, ou como é chamado mais recentemente o Pogrom de Novembro, que foi quando quebraram muitas lojas, atacaram, mataram e prenderam judeus na Alemanha em 1938. Então, eu penso também que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada, israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia.

Foram citadas as manifestações em universidades americanas, como manifestar críticas seja a guerra ou ao governo de Israel, sem recair no antissemitismo?

Perfeitamente, uma coisa não tem nada a ver com a outra. A crítica política é legítima e faz parte do contexto democrático. O que não é legítimo, o que não é aceitável é você utilizar expressões discriminatórias como essa que eu citei, ou outras, por exemplo, tinha uma n Universidade Columbia, em abril, que falava: ‘judeus voltem para a Polônia’. O que quer dizer isso? Quer dizer que os judeus não têm um lugar em Israel que devem voltar para onde? Para Auschwitz. Auschwitz era na Polônia e era um campo de extermínio. Precisa ficar atento para esse tipo de coisa e as lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã.

Como tem sido o trabalho de monitorar o antissemitismo depois do início da guerra em 2023, é clara uma escalada?

Sim. É notório em vários países do mundo. Os números aqui no Brasil, nos Estados Unidos, em países europeus. Agora, a gente precisa tomar um certo cuidado para não ver uma coisa como um fenômeno de causalidade. Ou seja, não é a guerra que causa o aumento do antissemitismo. São os antissemitas que aproveitam eventos como os da guerra para as suas manifestações odiosas e discriminatórias. Funciona como um álibi. Dizem ‘veja o que os judeus fazem, matam crianças’. Então, precisa tomar um certo cuidado com a correlação e a causalidade.

Pessoas recebem os torcedores do time de futebol Maccabi Tel-Aviv enquanto eles chegam no Aeroporto Internacional Ben-Gurion de Israel em 8 de novembro Foto: Tsafrir Abayov/AP

No Brasil, como a comunidade judaica tem sido impactada por esse aumento dos eventos antissemitas?

Os números da Conib mostram isso. Um incremento bastante grande, era de 800%, segundo último levantamento. Logo no começo do conflito, teve um episódio em Arraial da Ajuda, com uma lojista que foi atacada e vários outros. Recentemente, teve um outro episódio na Universidade do Ceará, onde havia um debate sobre Oriente Média, com pessoas de várias correntes, e foi impedido. O Estadão até fez um editorial ontem sobre isso. Então, está chegando aqui também. E não teria por que ser diferente no Brasil. O que você faz com isso? Se opor a esse tipo de conduta e punir quem age dessa maneira. É importante. Nós temos leis no Brasil. O antissemitismo é crime no Brasil. E pessoas que têm tido esse tipo de conduta têm sido punidas. Eu cito um advogado no Ceará que foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, ainda por coisas da época pré-conflito, da época da pandemia, que dizia que os judeus eram responsáveis pela pandemia, etc. Recentemente, houve uma condenação aqui, da Justiça de São Paulo, do Breno Altman, que comparou os judeus a ratos. Então, é importante. Acho que tem que educar, de um lado, tem que mostrar o que é informação correta, histórica, e, de outro, punir quem passa dos limites.

Minha próxima pergunta era justamente se vê uma impunidade ao antissemitismo...

Olha, depende de onde a gente está falando. Eu vejo, por exemplo, nos Estados Unidos, que está na minha área de cobertura da OEA, existe uma questão lá que é mais difícil de punir esse tipo de manifestação em razão da primeira emenda. Tem determinadas manifestações que são discurso protegido, mesmo quando elas são fascistas, antissemitas ou discriminatórias. No Brasil, não é assim. Aqui, existe lei para isso. E o que eu tenho visto, seja de autoridades policiais, do Ministério Público e do Judiciário, é que, quando provocado, a resposta tem sido firme.

E como tem sido o trabalho como primeiro comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo OEA?

Nós estamos acompanhando, em todo o continente, são 33 países que fazem parte. E, como eu disse antes, a intensidade é bastante diferente. A gente não tem visto algo tão intenso como os Estados Unidos e Canadá. Acho que esses são os exemplos mais fortes, em termos de números, de incidentes, de gravidade e de repercussão. Mas, também, em outros países, como Uruguai, Chile, estive recentemente na Colômbia, e até aqui no Brasil, nós estamos acompanhando que esse quadro se repete em vários outros países, com menor intensidade, nem sempre no mundo físico, muitas vezes no mundo virtual. As redes se tornaram, de fato, o campo de batalha do ódio. Às vezes, desborda para o real, como em Amsterdã, mas grande parte disso acontece no território virtual. Daí, também, a necessidade de uma regulamentação das redes, de uma melhor moderação de conteúdo. O Supremo Tribunal Federal anunciou que vai analisar essa questão. Acho que a gente não pode mais simplesmente ficar olhando passivamente esse tipo de manifestação se propagar e não fazer nada. Essa visão que a função na OEA me permite ter dos países do hemisfério ocidental leva a essa conclusão de que é necessário um empenho maior. Seja por parte das próprias redes, sendo mais ativas na moderação de conteúdo, como pela regulação pública, seja por lei, seja por decisão judicial. Nós estamos em uma situação bastante perigosa.

Na última quinta-feira, 7, torcedores israelenses do Maccabi Tel-Aviv foram emboscados em Amsterdã, capital da Holanda, durante um jogo contra o Ajax pela Liga Europa. Mais de 60 pessoas foram detidas e cerca de dez ficaram feridas nos ataques. Para Fernando Lottenberg, comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo da Organização dos Estados Americanos (OEA), a violência é resultado da escalada nos discursos antissemitas nas redes, em manifestações e disseminados por autoridades.

“As lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã”, disse o comissário, que também é conselheiro do Instituto Brasil-Israel, em entrevista por telefone ao Estadão.

Os ataques, observa Lottenberg, ocorreram dois dias antes do aniversário de 86 anos da Noite dos Cristais (Kristallnacht ou Pogrom de Novembro) quando militares nazistas e civis alemães atacaram judeus em 1938. “Penso que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada: israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia”, afirmou.

Polícia escolta torcedores do Maccabi Tel-Aviv até o metrô, após apoiadores pró-Palestina marcharem perto do estádio de futebol, em Amsterdã, Holanda, em 7 de novembro de 2024. Foto: Intervision/AP

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Como vê o episódio de violência com torcedores do israelenses em Amsterdã?

Com consternação, pra falar a verdade, porque é uma coisa tão violenta e o que tudo indica, organizada já previamente. Segundo está aparecendo agora na medida que as investigações prosseguem, foi uma combinação pra atacar as pessoas em um determinado lugar. E na antevéspera do que a gente lembra como Noite dos Cristais, ou como é chamado mais recentemente o Pogrom de Novembro, que foi quando quebraram muitas lojas, atacaram, mataram e prenderam judeus na Alemanha em 1938. Então, eu penso também que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada, israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia.

Foram citadas as manifestações em universidades americanas, como manifestar críticas seja a guerra ou ao governo de Israel, sem recair no antissemitismo?

Perfeitamente, uma coisa não tem nada a ver com a outra. A crítica política é legítima e faz parte do contexto democrático. O que não é legítimo, o que não é aceitável é você utilizar expressões discriminatórias como essa que eu citei, ou outras, por exemplo, tinha uma n Universidade Columbia, em abril, que falava: ‘judeus voltem para a Polônia’. O que quer dizer isso? Quer dizer que os judeus não têm um lugar em Israel que devem voltar para onde? Para Auschwitz. Auschwitz era na Polônia e era um campo de extermínio. Precisa ficar atento para esse tipo de coisa e as lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã.

Como tem sido o trabalho de monitorar o antissemitismo depois do início da guerra em 2023, é clara uma escalada?

Sim. É notório em vários países do mundo. Os números aqui no Brasil, nos Estados Unidos, em países europeus. Agora, a gente precisa tomar um certo cuidado para não ver uma coisa como um fenômeno de causalidade. Ou seja, não é a guerra que causa o aumento do antissemitismo. São os antissemitas que aproveitam eventos como os da guerra para as suas manifestações odiosas e discriminatórias. Funciona como um álibi. Dizem ‘veja o que os judeus fazem, matam crianças’. Então, precisa tomar um certo cuidado com a correlação e a causalidade.

Pessoas recebem os torcedores do time de futebol Maccabi Tel-Aviv enquanto eles chegam no Aeroporto Internacional Ben-Gurion de Israel em 8 de novembro Foto: Tsafrir Abayov/AP

No Brasil, como a comunidade judaica tem sido impactada por esse aumento dos eventos antissemitas?

Os números da Conib mostram isso. Um incremento bastante grande, era de 800%, segundo último levantamento. Logo no começo do conflito, teve um episódio em Arraial da Ajuda, com uma lojista que foi atacada e vários outros. Recentemente, teve um outro episódio na Universidade do Ceará, onde havia um debate sobre Oriente Média, com pessoas de várias correntes, e foi impedido. O Estadão até fez um editorial ontem sobre isso. Então, está chegando aqui também. E não teria por que ser diferente no Brasil. O que você faz com isso? Se opor a esse tipo de conduta e punir quem age dessa maneira. É importante. Nós temos leis no Brasil. O antissemitismo é crime no Brasil. E pessoas que têm tido esse tipo de conduta têm sido punidas. Eu cito um advogado no Ceará que foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, ainda por coisas da época pré-conflito, da época da pandemia, que dizia que os judeus eram responsáveis pela pandemia, etc. Recentemente, houve uma condenação aqui, da Justiça de São Paulo, do Breno Altman, que comparou os judeus a ratos. Então, é importante. Acho que tem que educar, de um lado, tem que mostrar o que é informação correta, histórica, e, de outro, punir quem passa dos limites.

Minha próxima pergunta era justamente se vê uma impunidade ao antissemitismo...

Olha, depende de onde a gente está falando. Eu vejo, por exemplo, nos Estados Unidos, que está na minha área de cobertura da OEA, existe uma questão lá que é mais difícil de punir esse tipo de manifestação em razão da primeira emenda. Tem determinadas manifestações que são discurso protegido, mesmo quando elas são fascistas, antissemitas ou discriminatórias. No Brasil, não é assim. Aqui, existe lei para isso. E o que eu tenho visto, seja de autoridades policiais, do Ministério Público e do Judiciário, é que, quando provocado, a resposta tem sido firme.

E como tem sido o trabalho como primeiro comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo OEA?

Nós estamos acompanhando, em todo o continente, são 33 países que fazem parte. E, como eu disse antes, a intensidade é bastante diferente. A gente não tem visto algo tão intenso como os Estados Unidos e Canadá. Acho que esses são os exemplos mais fortes, em termos de números, de incidentes, de gravidade e de repercussão. Mas, também, em outros países, como Uruguai, Chile, estive recentemente na Colômbia, e até aqui no Brasil, nós estamos acompanhando que esse quadro se repete em vários outros países, com menor intensidade, nem sempre no mundo físico, muitas vezes no mundo virtual. As redes se tornaram, de fato, o campo de batalha do ódio. Às vezes, desborda para o real, como em Amsterdã, mas grande parte disso acontece no território virtual. Daí, também, a necessidade de uma regulamentação das redes, de uma melhor moderação de conteúdo. O Supremo Tribunal Federal anunciou que vai analisar essa questão. Acho que a gente não pode mais simplesmente ficar olhando passivamente esse tipo de manifestação se propagar e não fazer nada. Essa visão que a função na OEA me permite ter dos países do hemisfério ocidental leva a essa conclusão de que é necessário um empenho maior. Seja por parte das próprias redes, sendo mais ativas na moderação de conteúdo, como pela regulação pública, seja por lei, seja por decisão judicial. Nós estamos em uma situação bastante perigosa.

Na última quinta-feira, 7, torcedores israelenses do Maccabi Tel-Aviv foram emboscados em Amsterdã, capital da Holanda, durante um jogo contra o Ajax pela Liga Europa. Mais de 60 pessoas foram detidas e cerca de dez ficaram feridas nos ataques. Para Fernando Lottenberg, comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo da Organização dos Estados Americanos (OEA), a violência é resultado da escalada nos discursos antissemitas nas redes, em manifestações e disseminados por autoridades.

“As lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã”, disse o comissário, que também é conselheiro do Instituto Brasil-Israel, em entrevista por telefone ao Estadão.

Os ataques, observa Lottenberg, ocorreram dois dias antes do aniversário de 86 anos da Noite dos Cristais (Kristallnacht ou Pogrom de Novembro) quando militares nazistas e civis alemães atacaram judeus em 1938. “Penso que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada: israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia”, afirmou.

Polícia escolta torcedores do Maccabi Tel-Aviv até o metrô, após apoiadores pró-Palestina marcharem perto do estádio de futebol, em Amsterdã, Holanda, em 7 de novembro de 2024. Foto: Intervision/AP

Confira a entrevista completa:

Como vê o episódio de violência com torcedores do israelenses em Amsterdã?

Com consternação, pra falar a verdade, porque é uma coisa tão violenta e o que tudo indica, organizada já previamente. Segundo está aparecendo agora na medida que as investigações prosseguem, foi uma combinação pra atacar as pessoas em um determinado lugar. E na antevéspera do que a gente lembra como Noite dos Cristais, ou como é chamado mais recentemente o Pogrom de Novembro, que foi quando quebraram muitas lojas, atacaram, mataram e prenderam judeus na Alemanha em 1938. Então, eu penso também que isso não ocorre por acaso. A gente tem visto manifestações, seja em universidades americanas, nas ruas de Londres, nas ruas de Paris, pessoas pedindo ‘a globalização da intifada’. Isso é a globalização da intifada, israelenses e judeus atacados violentamente nas ruas de uma capital europeia.

Foram citadas as manifestações em universidades americanas, como manifestar críticas seja a guerra ou ao governo de Israel, sem recair no antissemitismo?

Perfeitamente, uma coisa não tem nada a ver com a outra. A crítica política é legítima e faz parte do contexto democrático. O que não é legítimo, o que não é aceitável é você utilizar expressões discriminatórias como essa que eu citei, ou outras, por exemplo, tinha uma n Universidade Columbia, em abril, que falava: ‘judeus voltem para a Polônia’. O que quer dizer isso? Quer dizer que os judeus não têm um lugar em Israel que devem voltar para onde? Para Auschwitz. Auschwitz era na Polônia e era um campo de extermínio. Precisa ficar atento para esse tipo de coisa e as lideranças políticas também têm que ser cuidadosas nas suas declarações, porque essas palavras podem ser interpretadas como uma licença para ir para o próximo passo, que é sair da questão verbal e partir para uma ação concreta, como a gente viu em Amsterdã.

Como tem sido o trabalho de monitorar o antissemitismo depois do início da guerra em 2023, é clara uma escalada?

Sim. É notório em vários países do mundo. Os números aqui no Brasil, nos Estados Unidos, em países europeus. Agora, a gente precisa tomar um certo cuidado para não ver uma coisa como um fenômeno de causalidade. Ou seja, não é a guerra que causa o aumento do antissemitismo. São os antissemitas que aproveitam eventos como os da guerra para as suas manifestações odiosas e discriminatórias. Funciona como um álibi. Dizem ‘veja o que os judeus fazem, matam crianças’. Então, precisa tomar um certo cuidado com a correlação e a causalidade.

Pessoas recebem os torcedores do time de futebol Maccabi Tel-Aviv enquanto eles chegam no Aeroporto Internacional Ben-Gurion de Israel em 8 de novembro Foto: Tsafrir Abayov/AP

No Brasil, como a comunidade judaica tem sido impactada por esse aumento dos eventos antissemitas?

Os números da Conib mostram isso. Um incremento bastante grande, era de 800%, segundo último levantamento. Logo no começo do conflito, teve um episódio em Arraial da Ajuda, com uma lojista que foi atacada e vários outros. Recentemente, teve um outro episódio na Universidade do Ceará, onde havia um debate sobre Oriente Média, com pessoas de várias correntes, e foi impedido. O Estadão até fez um editorial ontem sobre isso. Então, está chegando aqui também. E não teria por que ser diferente no Brasil. O que você faz com isso? Se opor a esse tipo de conduta e punir quem age dessa maneira. É importante. Nós temos leis no Brasil. O antissemitismo é crime no Brasil. E pessoas que têm tido esse tipo de conduta têm sido punidas. Eu cito um advogado no Ceará que foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, ainda por coisas da época pré-conflito, da época da pandemia, que dizia que os judeus eram responsáveis pela pandemia, etc. Recentemente, houve uma condenação aqui, da Justiça de São Paulo, do Breno Altman, que comparou os judeus a ratos. Então, é importante. Acho que tem que educar, de um lado, tem que mostrar o que é informação correta, histórica, e, de outro, punir quem passa dos limites.

Minha próxima pergunta era justamente se vê uma impunidade ao antissemitismo...

Olha, depende de onde a gente está falando. Eu vejo, por exemplo, nos Estados Unidos, que está na minha área de cobertura da OEA, existe uma questão lá que é mais difícil de punir esse tipo de manifestação em razão da primeira emenda. Tem determinadas manifestações que são discurso protegido, mesmo quando elas são fascistas, antissemitas ou discriminatórias. No Brasil, não é assim. Aqui, existe lei para isso. E o que eu tenho visto, seja de autoridades policiais, do Ministério Público e do Judiciário, é que, quando provocado, a resposta tem sido firme.

E como tem sido o trabalho como primeiro comissário de monitoramento e combate ao antissemitismo OEA?

Nós estamos acompanhando, em todo o continente, são 33 países que fazem parte. E, como eu disse antes, a intensidade é bastante diferente. A gente não tem visto algo tão intenso como os Estados Unidos e Canadá. Acho que esses são os exemplos mais fortes, em termos de números, de incidentes, de gravidade e de repercussão. Mas, também, em outros países, como Uruguai, Chile, estive recentemente na Colômbia, e até aqui no Brasil, nós estamos acompanhando que esse quadro se repete em vários outros países, com menor intensidade, nem sempre no mundo físico, muitas vezes no mundo virtual. As redes se tornaram, de fato, o campo de batalha do ódio. Às vezes, desborda para o real, como em Amsterdã, mas grande parte disso acontece no território virtual. Daí, também, a necessidade de uma regulamentação das redes, de uma melhor moderação de conteúdo. O Supremo Tribunal Federal anunciou que vai analisar essa questão. Acho que a gente não pode mais simplesmente ficar olhando passivamente esse tipo de manifestação se propagar e não fazer nada. Essa visão que a função na OEA me permite ter dos países do hemisfério ocidental leva a essa conclusão de que é necessário um empenho maior. Seja por parte das próprias redes, sendo mais ativas na moderação de conteúdo, como pela regulação pública, seja por lei, seja por decisão judicial. Nós estamos em uma situação bastante perigosa.

Entrevista por Carolina Marins

Jornalista formada pela ECA-USP. Repórter da editoria de Internacional, com interesse em América Latina. Já fiz coberturas in loco na Argentina, em Israel e na Ucrânia

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